Qual é o propósito da educação na nossa sociedade? Todos podemos concordar que ter uma população mais educada cria externalidades positivas para todos. A educação apresenta-se com dois pontos fulcrais para a sociedade. Por um lado, alguém com mais educação tende a transmitir um sinal sobre as suas qualidades inatas, pois as mesmas são necessárias para se adquirir níveis de educação mais elevados. Por outro lado, mais educação deve aumentar a produtividade com o aumento da aquisição de novos conhecimento e competências. Sem estas características, a educação não serve o seu verdadeiro propósito para a sociedade.

Depois de um ano marcado por manifestações e greves comecei a questionar-me sobre as gerações formadas pelo nosso sistema de ensino público na última década. Já por diversas vezes ouvimos o nosso governo anunciar que estamos perante a geração mais bem formada de sempre. Mas será isso uma realidade? Será que dizer que temos o maior número de sempre de pessoas com ensino secundário/superior efetivamente se traduz em trabalhadores mais produtivos? Será que o diploma de ensino secundário/superior tem o reconhecimento que já teve no passado? Qual é que deve ser o valor da educação?

Há algum tempo descobri que um amigo meu tinha finalmente terminado o secundário, depois de ter desistido de o fazer há mais de 10 anos. Logicamente, fiquei extremamente feliz e questionei como foi o processo: fez algumas disciplinas em formato pós-laboral ou fez alguns exames? O meu choque foi tremendo quando descobri que a escola em questão abriu o CV e, com base em experiência profissional supostamente “relevante”, ofereceu ao meu amigo equivalências a todas as disciplinas que faltavam terminar. Mas não é suposto que o certificado do secundário transmitisse um sinal de que quem o adquiriu tem um patamar mínimo de conhecimentos? É suposto acreditar que não é preciso concluir o ensino secundário pois, depois de adquirir experiência profissional “relevante”, é me oferecido o diploma? Não admira que estejamos a melhorar significativamente nas estatísticas, quando a população com ensino secundário e pós-secundário subiu de 16,7% para 24,7% na última década. Claramente, estamos a perder o sinal que a educação deve transmitir. Mas será que pelo menos a geração mais bem formada de sempre está a ficar mais produtiva? Em 2021, Portugal estava em 9.º lugar no ranking da produtividade real do trabalho por hora na União Europeia, com uma diferença de aproximadamente 360% face ao país mais produtivo da União Europeia. A resposta é óbvia de que em termos relativos não somos assim tão produtivos. Finalmente, estarão os resultados da educação a melhorar a aquisição de conhecimentos? Com base nos resultados do PISA 2022 esse também não é o caso, com uma redução dos resultados obtidos face a 2018 nas áreas da matemática, literatura e ciências.

A triste realidade é que, com o passar dos anos, o ónus da educação transitou da entidade do professor para o aluno. A figura de professor está a perder a ritmo elevado o respeito intrínseco que habitualmente teria, tanto do aluno como do encarregado de educação. Não me foco em maus-tratos físicos e emocionais que certos alunos com um sentimento de impunidade realizam aos professores, mas ao respeito à profissão de professor. Por exemplo, atualmente os professores têm imensa dificuldade em reprovar um aluno no ensino obrigatório. Um aluno que mereça reprovar deve reprovar. O sistema atualmente implementado está feito para tentar derrotar os professores que querem fazer o seu trabalho da forma mais justa possível. Um professor deve justificar a razão pela qual vai reprovar o aluno, mas não devia ser tão difícil ao ponto de fazer com que muitos desistam de o fazer devido às chatices acrescidas que isso traz. O elevado grau de entraves e burocracias que um professor no ensino obrigatório tem de enfrentar atualmente é desmedido. Isto tende em traduzir-se em polícias de facilitismos que distorcem a qualidade da nossa educação.

O sistema de ensino público está a perder o seu verdadeiro valor e propósito. Uma população com mais diplomados não deve ser entendida como uma população mais educada.

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