Há no ar um medo palpável quanto a uma eventual vitória eleitoral, daqui a duas semanas, do Syriza (o partido-irmão do Bloco de Esquerda na Grécia). E é evidente que esse medo tem levado Merkel, Hollande, Barroso e outros na Europa a comentar a situação grega, alertando para as consequências de um incumprimento para com as instituições internacionais. Desta vez, sem risco de crise sistémica na zona euro caso a Grécia escolha sair da moeda única, essas consequências parecem abater-se em exclusivo sobre os gregos. Mas isso é só na aparência. É que, se assim fosse, não haveria razões para Merkel e os europeus estarem tão preocupados. E eles estão.

Primeiro, por causa da economia e das instituições europeias. É verdade que a Grécia vale menos de 2% do PIB europeu, e que as economias mais frágeis da União Europeia (entre as quais a portuguesa) já não estão tão expostas à dívida grega como no passado. Ou seja, confirma-se que, na teoria, não há risco de uma crise sistémica caso os gregos optem pelo incumprimento. Mas, como se sabe, essa é apenas uma parte da história. A outra é tudo o que um processo político e económico tem de imprevisível: se houvesse incumprimento, se a Grécia saísse do euro, qual seria a reacção dos mercados (queda do valor do euro?), quais seriam as consequências para o projecto da moeda única (cuja adesão se diz ser irrevogável) e de que modo isso afectaria a integração europeia? São demasiadas perguntas sem resposta e que arrastam consigo consequências graves. Sobretudo, arrastam um grau de incerteza acerca da saúde do projecto europeu. E em plena crise económica, ninguém estará interessado em testar os limites do euro. Uma corda, quando estica, pode romper.

Depois, há medo perante um efectivo risco de contágio político. As eleições europeias de 2014 infligiram um golpe cuja ferida não sarou: os partidos tradicionais do centro perderam votos, desgastados com a crise e com as medidas de austeridade, enquanto os partidos radicais ganharam apoios, pretendendo afirmar-se agora nos seus países como alternativa política. Ora, o Syriza está perto de ser o primeiro desses partidos a consegui-lo. E quando essa barreira psicológica for quebrada, sairá reforçada a convicção de que é possível um partido nascido dos extremos liderar um Governo na União Europeia de hoje. Assim, a porta para um contágio político que leve à vitória eleitoral de partidos radicais em Espanha (Podemos) ou França (Front National), entre outros, fica aberta – e toda a gente tem medo do que possa vir a entrar.

Por estas duas principais razões, assume-se como um esforço particularmente inglório por parte dos responsáveis europeus tentar fazer passar a mensagem de um certo distanciamento quanto à Grécia. Ninguém acredita. E, de resto, nunca daria para acreditar. Bruxelas não é, nem poderia ser, indiferente à vitória eleitoral de um partido que põe em risco a sua posição de poder e critica duramente as opções políticas europeias quanto à crise.

O cenário é este: se o Syriza vencer na Grécia, quem perde é Bruxelas. Porque o que vai a votos não são só partidos, mas uma ideia de Europa da qual os gregos poderão, livremente, prescindir. Por isso, em vez de tentar agora influenciar o sentido de voto dos gregos, talvez os dirigentes europeus devessem finalmente aceitar que alguma coisa tem de mudar nas políticas europeias. Antes que seja tarde demais.

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