1. A estagnação da economia portuguesa tornou-se um tema de primeira linha. O país percebeu, finalmente, que tem sido ultrapassado pelas economias dos países do Leste Europeu e o debate público já não deixa passar o assunto sem exigir explicações ou soluções. Um dos momentos inesquecíveis dos duelos televisivos resulta precisamente daí: quando António Costa foi pressionado e tentou sacudir esse fracasso afirmando que “a história explica” o porquê de Portugal estar a ficar para trás. Tanto PSD como IL fizeram do tema o coração da sua campanha eleitoral — e acertaram. A esquerda, que não tem uma resposta para este atraso económico português, ficou de fora da conversa — o que a fragilizou. O tema veio para ficar, e ainda bem.
  2. Apesar de muitas discussões irrelevantes nestas últimas semanas, houve temas e propostas eleitorais inovadoras que conseguiram sobressair. Desde a flat tax ou a privatização da TAP à organização de serviços públicos de forma integrada com o sector privado (na saúde ou educação), a IL foi o partido que melhor conseguiu introduzir as suas ideias na campanha. Concorde-se ou discorde-se dessas propostas, o essencial da mensagem passou: é possível implementar políticas públicas diferentes daquelas que Portugal discute há 20 anos. E este arejamento do debate público, só por si, contribui para o desenvolvimento do país.
  3. Enquanto os partidos da geringonça tentaram reanimar um projecto esgotado (BE e CDU sofrerão as consequências eleitorais disso), a candidatura do Livre mostrou que a esquerda pode ser radical sem cair nos clichés anti-sistema. O Livre tem inúmeras propostas duvidosas no seu programa (como o insólito subsídio de desemprego para quem se despede), mas evidenciou uma inclinação dialogante, ecologista e europeísta que o diferencia, pela positiva, dos partidos que, à esquerda, vivem de estar sempre a prometer rupturas. A esquerda radical portuguesa deve evoluir para além das suas raízes ideológicas herdadas da Guerra Fria e a campanha do Livre foi um esforço nesse sentido.
  4. A ecologia deixou de ser um tema acantonado no activismo do BE. Da esquerda (PAN, Livre, PS) à direita (IL, CDS, PSD), os partidos esforçaram-se para propor soluções que lidem com as alterações climáticas e a protecção do eco-sistema. É particularmente de salutar que, à direita, se tenha finalmente abraçado o tema — que é uma prioridade dos eleitores jovens e que será cada vez mais importante para as nossas vidas.
  5. O populismo de André Ventura ficou exposto nas suas fragilidades e incoerências. Porque teve de participar em vários debates televisivos, a sua eficácia foi-se esvaziando: os seus desempenhos tornaram-se repetitivos, o seu estilo belicoso gerou aversão, as suas propostas eleitorais não resistiram ao contraditório, os seus ziguezagues reivindicativos para negociações exibiram com clareza a instabilidade que provocaria num governo à direita. Depois de ter sonhado com resultados de dois dígitos, André Ventura fez tudo bem para apanhar uma desilusão no dia 30.

A campanha eleitoral termina amanhã. Ainda bem. As últimas semanas deram-nos uma longa lista de incompetências e fracassos políticos. Alguns discretos — a inexistência de críticas à gestão da pandemia pelo governo ou a ausência completa da Educação nas prioridades para o desenvolvimento do país (sobretudo, agora, que voltamos a ter milhares de crianças sem ensino presencial). Outros ruidosos — a incapacidade de organizar as eleições com regras adequadas ao contexto pandémico e o colapso da estratégia eleitoral do PS (que só dá tiros nos pés). Mas também mostraram uma evolução no debate político que seria injusto não assinalar. No meio de tanto pessimismo, um pouco de esperança: o surgimento de novos partidos gerou um aumento da concorrência, que fez muito bem à política portuguesa. A campanha já o mostrou. Agora, resta esperar que tal se veja também na governação.

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