Quando o surfista John John Florence não está a rasgar as ondas em cima de uma prancha, encontra-se a velejar com amigos. Para a entourage do atleta, o dia no mar a bordo do veleiro Jacare* tem um sabor especial. Não precisa de se preocupar com os custos do passeio, comprovando o que a sabedoria popular apregoa: o melhor barco é o do amigo.

Mas como é que se encontra um amigo com veleiro? Primeiro há que encontrar um amigo. Um amigo a sério. Um amigo valioso. A tarefa é difícil. Requer sacrifícios e investimentos.

Contudo, o que significa um amigo valioso? Será possível avaliar uma amizade? E o que explica a sua evolução? Assentamos a nossa resposta em quatro pilares, emprestados da ciência económica.

Custo de oportunidade

É fácil encontrar a amizade em miúdo porque é uma fase em que o tempo disponível abunda, reduzindo o preço que pagamos para conviver com o Afonso, o Pedro ou a Vera. O sacrifício de tempo é, pois, diminuto. Ao envelhecermos, as ocupações limitam-nos e o valor do nosso tempo fica mais caro (já reparou certamente que a remuneração por hora de trabalho tem tendência a aumentar ao longo da vida profissional). Consequentemente, somos obrigados a uma escolha mais apurada daqueles com quem vamos para os copos ou cujas mágoas estamos dispostos a escutar.

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Utilidade marginal decrescente

Em conversa numa festa, há uns meses, um dos autores deste ensaio ouviu dizer que uma pessoa tem “três amigos na vida”. Embora acreditemos que a velha máxima de “poucos, mas bons” se aplica à amizade, perguntámo-nos se existiria um número óptimo de amigos.

De facto, a satisfação extra que obtemos à medida que alargarmos o círculo social parece diminuir. Isto acontece porque a nossa necessidade de amizade vai sendo preenchida. A chamada lei da utilidade marginal defende que temos prazer quando consumimos um bem, mas que o consumo da unidade seguinte já não proporciona tanto prazer. Ter mais amigos é bom, mas o valor unitário de cada amigo será, em teoria, menor. (Ainda assim, acreditamos que um portefólio de amigos diversificado é um dos vértices da amizade.)

Procura e oferta

O contrato social da amizade tem outras nuances. Começa por ser invisível para as crianças, as quais adquirem amigos de uma forma orgânica, natural, sem escolhas nem preconceitos. Eventualmente a seleção torna-se mais aguçada. A procura e a oferta começam a escassear. Deixamos de querer incluir pessoas no nosso círculo, paramos de oferecer amizade a quem cruza os nossos dias. Sobrevivem os laços mais fortes. É o darwinismo da amizade.

Dividendos

O que retiramos então das curvas e contracurvas das relações humanas? O sentimento de relevância – porque conseguimos ocupar espaço na alma dos outros – é recheado com outros benefícios.

Como a evolução da amizade acompanha o crescimento dos indivíduos, vemo-los ocupar posições na sociedade. Seguem-se as ofertas de bilhetes para a bola, as consultas médicas sem filas de espera, a redução dos juros no banco, a abertura das portas dos seus veleiros. E colhemos, satisfeitos, os dividendos dos nossos investimentos. Subimos a bordo do barco, içamos as velas, fazemo-nos ao mar e percebemos afinal que a amizade é tanta que não cabe numa equação. Nesses momentos, sentimos apenas gratidão.

*Episódio 4 da série Twelve, disponível no Youtube.