Muito embora ainda não esteja esclarecida a eleição presidencial nos Estados Unidos da América, tudo leva a crer que o próximo inquilino da Casa Branca é o democrata Joe Biden.

Apesar de nominalmente católico, o agora eleito presidente não polarizou o voto dos católicos, expressão mais correcta do que ‘voto católico’, que erradamente sugere que os fiéis estão obrigados à disciplina de voto, ou que, em questões políticas opináveis, devem obediência à hierarquia eclesial. Com efeito, o eleitorado católico dividiu-se em partes iguais pelos dois candidatos. Como disse David Gibson, director do Centro de Religião e Cultura da Universidade de Fordham, citado pelo National Catholic Recorder (NCR), “a Igreja Católica nos Estados Unidos está tão dividida como a política do país, e muitas vezes por causa da política”. De acordo com uma sondagem referida pelo Religión Digital, 50% dos católicos brancos apoiaram Biden e 49% votaram Trump (em 2016, 64% escolheram Trump e 31% Hillary Clinton, de acordo com uma análise do Pew Research Center).

Os católicos representam 22% do eleitorado, mas estavam divididos, também por razões étnicas: 67% dos hispânicos apoiaram Biden, enquanto 32% deram o seu voto ao presidente cessante. Entre os evangélicos brancos, cerca de 80% votaram em Trump. Entre os eleitores sem filiação religiosa, Biden obteve 72% dos votos e Trump 26%. Os judeus, que representam apenas 3% do eleitorado, votaram esmagadoramente em Biden, com 68% contra 31%. Entre os muçulmanos, 64% dos votos foram para Biden e 35% para Trump. Finalmente, o candidato republicano teve um excelente resultado entre os mórmons: 71% escolheram-no, contra 24% que preferiram Biden.

O democrata Joe Biden será o segundo presidente dos Estados Unidos católico, depois John Kennedy, também democrata. No entanto, Donald Trump foi o chefe de Estado norte-americano mais pró-vida da História e tinha, provavelmente, um programa mais católico do que o do católico Joe Biden que é, entre outras coisas, pró-aborto.

Biden, que tudo leva a crer será empossado como 46º Presidente dos EUA, nasceu numa família católica e frequenta a paróquia de São José, em Brandywine, Greenville, no Estado de Delaware. Atribui à sua fé “em Deus, na ressurreição e na redenção,” a força que lhe permitiu superar a trágica perda da sua mulher e filha, de um ano, num acidente de viação, bem como a posterior morte do seu filho Beau, de um tumor no cérebro, aos 46 anos de idade, como se escreveu no NCR, citado por Religión Digital. Gosta de se apresentar em público como católico, mostrando nas mãos, em momentos de maior tensão, o terço. No dia da sua eleição presidencial, foi fotografado à saída da missa, trazendo consigo o boletim paroquial. Cita a Bíblia e as encíclicas papais, que referiu repetidamente durante a campanha eleitoral.

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O NCR também recordou que, na última semana da campanha para a eleição presidencial, Joe Biden citou expressamente o actual Pontífice: “O Papa Francisco fez perguntas que, qualquer pessoa que procure liderar esta grande nação, deve responder.” Insistindo na tónica religiosa, a que o eleitorado norte-americano não é alheio, Joe Biden, no seu discurso de alegada vitória, na noite de sábado do passado dia 7, citou, mais uma vez, a Bíblia, que diz “que para tudo há um tempo: um tempo para construir, um tempo para semear e um tempo para curar. Este é o tempo para curar a América.”

Não obstante as aparentemente piedosas palavras do agora presidente eleito, há profundas contradições na vivência católica de Joe Biden, o que explica que muitos católicos tivessem preferido votar no não católico Donald Trump. Por razão dessas suas incoerências, a Biden foi negada, em público, a Comunhão eucarística.

Segundo a ACI Digital, foi o Padre Robert Morey, pároco de St. Anthony, na diocese de Charleston, no Estado de Carolina do Sul, que se recusou a dar a Comunhão, no passado 27 de Outubro, ao ex-vice-presidente, agora eleito presidente dos Estados Unidos. “Lamentavelmente, no domingo passado, tive que negar a Sagrada Comunhão ao ex-vice-presidente Joe Biden”, disse o Pe. Morey, num comunicado enviado à CNA, porque “a Sagrada Comunhão significa que somos um com Deus, entre nós e com a Igreja. As nossas acções devem reflectir isso. Qualquer figura pública que defenda o aborto posiciona-se fora do ensinamento da Igreja”. O Padre Robert Morey, antes de ser ordenado sacerdote, exerceu durante 14 anos como advogado na Carolina do Norte, tendo trabalhado sete anos nos serviços jurídicos da Agência de Proteção Ambiental e no Departamento de Energia dos Estados Unidos. Não será demais elogiar a grande coragem deste presbítero, bem como a coerência pastoral de que deu prova com esta sua atitude que é, tanto lá como cá, tão rara, mas que reproduz a recorrente condenação, por Jesus Cristo, da duplicidade farisaica.

Como é sabido, o Código de Direito Canónico proíbe a Comunhão aos que “obstinadamente perseverem em pecado grave manifesto”. Em 2004, o então Cardeal Joseph Ratzinger recordou ao episcopado dos Estados Unidos que um ministro católico deve recusar a Sagrada Comunhão a qualquer político ‘católico’ que faça “campanha e vote sistematicamente em leis permissivas do aborto e da eutanásia”.

Nestes casos, segundo o Papa emérito, o pároco deve advertir o fiel que está nessa situação de que não pode comungar, enquanto não puser termo à situação objetiva de pecado, e que, se o tentar fazer, ser-lhe-á negada a Eucaristia. Portanto, quando um católico persevera num pecado grave público e, apesar disso, pretende receber a Eucaristia, “o ministro da Sagrada Comunhão deve-se recusar a dar-lha”.

Biden propõe-se garantir, através de uma lei federal, o suposto direito das mulheres ao aborto. No verão passado, numa actividade da Planned Parenthood, responsável por milhares de abortos anuais nos Estados Unidos, Biden prometeu revogar as medidas pró-vida do actual presidente, bem como incrementar o financiamento da Planned Parenthood.

Estas incoerências do ‘católico’ Biden justificam a prudência das declarações do presidente da Conferência Episcopal dos Estados Unidos, José Gómez, Arcebispo de Los Angeles. Na sua saudação ao presidente e à vice-presidente eleitos, fez votos de que ajudem “a realizar a visão que tinham os missionários e pais fundadores dos Estados Unidos: uma nação fiel a Deus, onde a santidade de toda a vida humana seja defendida, e as liberdades de consciência e de religião sejam garantidas”. God bless America!