Portugal faz parte de uma das regiões mais ricas do globo, a União Europeia, mas que tem vindo a perder importância na economia mundial. A UE tem 450 milhões de habitantes e, em 2022, representa cerca de 15% do PIB mundial. Este valor é semelhante ao dos Estados Unidos (16%), que têm uma população de cerca de 330 milhões de habitantes. Estes dois grandes espaços económicos, ligados pelo Atlântico, representam cerca de 30% da economia mundial. No entanto, como podemos ver na figura, no ano 2000, a UE e os EUA representavam mais de 40% da economia mundial.

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A perda de importância da UE e dos EUA teve como contraponto o maior relevo das economias asiáticas. Nos últimos 20 anos, a Ásia tornou-se o espaço económico mais dinâmico do mundo. O grupo de países da Ásia emergente e em desenvolvimento, do qual faz parte a China, representa hoje cerca de 33% do PIB mundial. Se juntarmos a este grupo o Japão e Taiwan, a Ásia representa cerca de 40% do PIB mundial.

O comércio internacional e as muitas formas que tomou a globalização, com um aumento exponencial da circulação de ideias, tecnologia, bens, serviços e pessoas, beneficiou todas as economias. Uma miríade de bens e inovações tornaram-se disponíveis a biliões de pessoas a preços mais baixos. Mas nenhuma região do globo beneficiou tanto da globalização como a Ásia e, em particular a China, que baseou o seu crescimento nas exportações para o Ocidente.

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A importância do comércio com o Ocidente levou mesmo a China a investir biliões de euros na construção de uma Nova Rota da Seda, uma ligação ferroviária que termina na Alemanha. Com esta ligação comercial, o conceito de Eurásia ganhou outro sentido. Portugal situa-se no extremo ocidental desse espaço geográfico, sem ligações energéticas e ferroviárias ao centro da Europa. Nesse mundo, Portugal voltou a ser finisterra. E o Atlântico perdeu o lugar de espaço comercial mais importante do globo, que ocupou, desde os Descobrimentos iniciados pelos portugueses no século XV, até ao século XX.

O final da presidência de Donald Trump, com a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, parecia confirmar o declínio da democracia americana. A saída caótica do Afeganistão em agosto de 2021 sugeria alguma fragilidade na maior potência militar do globo. A disrupção nas cadeias de fornecimento global mostrou a dependência da economia americana num conjunto de bens essenciais. Nos últimos anos, a China parece disputar a liderança tecnológica dos EUA em áreas fundamentais como a inteligência artificial, que podem vir a traduzir-se numa vantagem comercial e militar.

Talvez uma leitura precipitada destes sinais, que muitos entenderam como de declínio dos EUA, tenham alimentado as ambições imperiais de Vladimir Putin. E podem também ter favorecido a mudança de posicionamento da China, desde a ascensão ao poder de Xi Jinping. A China tornou-se mais assertiva na sua afirmação como potência global, revelando uma ambição de influência que vai além das relações comerciais.

Quer em relação à Rússia, quer em relação à China, os Estados Unidos têm tornado clara a sua resolução em prevalecerem como a potência global. O fornecimento de armamento e o apoio logístico à Ucrânia têm sido decisivos para o recuo do exército russo. Em relação à China os Estados Unidos têm endurecido as suas posições, alargando as restrições às exportações de tecnologias mais avançadas.

Com o fim da Guerra Fria, que se seguiu à Queda do Muro de Berlim em 1989 e ao fim da União Soviética em 1991, o centro da Europa deslocou-se para Leste. Muitas economias pertencentes à esfera de influência da União Soviética aderiram à União Europeia e à Nato. O investimento alemão concentrou-se nos países da Europa Central e de Leste, historicamente o seu espaço de influência. A Rússia foi a solução mais económica para o antigo problema da dependência de combustíveis fósseis da Europa, fortalecendo a interdependência entre esses dois espaços económicos.

A nova ‘guerra fria’ na Europa quebrou aquela interdependência. A UE terá de procurar novos fornecedores, novas fontes de energia e proteger as suas fronteiras a Leste contra a ameaça russa. Nesta transformação da UE, os Estados Unidos terão um papel essencial. Por um lado, são os maiores produtores mundiais de petróleo e de gás, e, por outro, são a maior potência mundial em termos militares. À sua extraordinária riqueza em recursos (são também o maior produtor mundial de cereais), soma-se a sua liderança em termos científicos e tecnológicos. Se os Estados Unidos conseguirem assegurar estabilidade política e a qualidade das suas instituições terão condições para reforçar a sua posição como principal potência mundial na próxima década.

Se a relação entre a UE e os Estados Unidos sair reforçada, o centro da Europa voltará a deslocar-se para Ocidente e o Atlântico tornar-se-á mais relevante. Apesar dos enormes desafios que a UE tem pela frente, se Portugal souber aproveitar esta mudança, poderá melhorar o seu posicionamento na economia mundial e deixar de ser finisterra.