A pouco menos de três dias do exame nacional de Português, a pressão agudiza-se dia após dia e começo a ser Eça de Queiroz ao ver as lágrimas do desespero cair e pingar sobre a tinta indelével do meus apontamentos. Sou Queiroz ao pensar “Vou meter água neste exame, de certeza”, anunciando, temerosamente, o título Os Maias – Episódios de uma vida de Exame, onde a geração de 2000 crítica ferozmente a linha postiça da sociedade exposta, falsamente, nas redes sociais. Ao fazer isto, sou já vítima de uma deambulação pela malha urbana caracterizada pela (i)mediatização dos costumes, onde procedo à introspecção – à imagem de Cesário (piada pretendida) – e, sem me aperceber, já criei um universo de pensamentos e tipos sociais a partir de um instastory de alguém que nem conheço. Ridículo. Não fosse o Campos salvar-me desta fase decadentista, estou eufórica, subitamente, oiço a minha mãe chamar-me para o almoço e só penso no barulho dos talheres a raspar nos pratos, com a ânsia de terminar o mais rápido possível, para que cada um de nós possa voltar às suas vidas – sim, afinal de contas, pertencemos todos à sociedade fast tudo e só temos de estar orgulhosos, porque o belo é o feroz, as máquinas, a industrialização!!! -, mas isto deixa-me exausta e dou por mim no autocarro como a única consciente, analisando e criticando ativamente a inconsciência comum de todos aqueles que ali viajam, – sou agora Soares – até ligarem a telefonia… agora todos despertam como ovelhas no meu pensamento, onde as guardo todas até formarem um rebanho e já só me interessa a Natureza e a nossa comunhão porque qualquer outra ideia apenas me traz uma profunda dor de pensar e mais queria ser inconsciente como o pássaro que vejo voar da janela do autocarro – ainda sou Soares – do que assim, infeliz e descontente com o meu Presente. No meio disto tudo, sou já apática e ignoro as minhas perturbações na esperança de que o Carpe Diem se cumpra na plenitude e possa, assim, ter a felicidade relativa que procurava.

Ao aperceber-me da natureza fragmentária da obra, concluo que afinal é «Noite» e simplesmente acabei de realizar inúmeras viagens literárias onde o condutor foi o taxista do Ricardo Reis de Saramago. Sim, porque se a minha escrita é agora incerta, culpem o vencedor do Prémio Nobel, já que agora escrevo de acordo com as pausas breves de respiração – vírgulas – e as pausas longas – pontos finais – intercalado por vocativos no discurso indireto livre, Toda a gente sabe que o hóspede do 201, o doutor Reis, Lídia, foi intimado pela pvde. E, ora, dou por mim a pensar sintaticamente nas minhas frases: Mãe vírgula podes passar tracinho me a cesta do pão que é complemento direto nesta frase e eu que sou complemento indireto comprovado pelo deítico pessoal “me” e tu vocativo “Mãe” entre vír – Sim! – diz a minha mãe ao ver tracinho me entrar numa espiral de criação poética absurdamente dolorosa mas necessária e já sem me questionar, continuo assim, «’screvendo à beira-mágoa», rezando a “Prece”, espalhando a Mensagem de que «tudo vale a pena/Se a alma não é pequena» e acreditando que tirarei 20 no Exame «se a tanto me ajudar o engenho e arte» sem reflexão e lamentações do poeta, porque é assim que vamos conquistar o Quinto Império.

E é a Hora, Irmãos, assim me despeço:

Valete, fratres.

Sábado, 15 de junho 2019

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