João Galamba faz-se. Quem diria que, depois de um início titubeante e cheio de peripécias, o Ministro das Infraestruturas estaria agora mais adulto e menos arrogante? Na semana passada, Galamba disse que achava que um aeroporto em Santarém é longe. Trata-se da sua declaração mais humilde até agora. Só pode ter vindo de um homem a quem o poder, se algum dia lhe subiu à cabeça, já desceu de lá aos repelões. Deve ter sido a gravidade.

Galamba mostrou que mantém uma ligação ao povo. É um de nós. Como um português comum, sabe que que a deslocação a Santarém é chata e morosa. Pensa como cidadão e não como Ministro. Vê-se que não se deslumbrou com as benesses de membro do Governo que circula a 270 km/h nas estradas do país. Com motorista, batedores e total marimbanço pelas regras de trânsito, o aeroporto até podia ser em Castelo Branco que ia parecer sempre aqui ao lado. João Galamba solidarizou-se connosco.

Só que o problema não é o aeroporto de Santarém ser longe de Lisboa. O problema é que, neste momento, o aeroporto de Lisboa é longe de Lisboa. São mais parecidos do que se julga: o aeroporto de Santarém só existe em maquete, mas o de Lisboa parece que é a gozar. Na semana passada fui de táxi para a Portela e demorei 45 minutos da rotunda do relógio ao terminal. Ainda bem que o relógio não funciona, para não aumentar a ansiedade. Felizmente, o voo era da TAP e estava com o costumeiro atraso de hora e meia, por isso até acabei por ganhar algum tempo.

Fala-se muito das distâncias entre o aeroporto e o centro de Lisboa, mas a proximidade do aeroporto da Portela é um erro de perspectiva. Em linha recta é verdade que é perto. Mas, com o trânsito caótico, as obras na cidade e o tamanho ridículo do cais das partidas – com lugar para 3 ubers e 5 táxis ao mesmo tempo –, chegar lá é um desafio. É como o meu fígado: teoricamente, estou muito perto dele, na medida em que está dentro de mim; na prática, chegar lá dá muito mais trabalho do que parece.

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Mesmo depois de alcançar o aeroporto, entrar no avião é outra aventura. Passar o controlo de segurança é um martírio. Neste momento, o raio X das malas tem um tempo de espera similar ao de um raio X no SNS. Até já lhe chamam o “raio Xiiii!”, que é o que exclama os passageiros quando se apercebem do tamanho da fila.

O aeroporto da Portela é o único no mundo onde, além de ser proibido transportar embalagens com mais de 100 ml, não é aconselhável transportar embalagens com prazo de validade inferior a 2 meses, não vão estragar-se enquanto se aguarda. Cá, quando o segurança diz ao passageiro para tirar os sapatos, é para avaliar as solas. Dependendo do seu estado, se o voo não atravessar um mar muito profundo, recomenda-lhe que vá a pé.

A confusão no aeroporto de Lisboa faz lembrar a fita “Assalto ao aeroporto”, com Bruce Willis. A única diferença é que o aeroporto do filme foi alvo de um ataque terrorista levado a cabo por um bando de mercenários comandado pelo antigo oficial do Exército, Coronel William Stuart, em conluio com um esquadrão das Forças Especiais, liderado pelo renegado Major Grant, que pretendem soltar o seu amado líder, General Ramon Esperanza, enquanto o de Lisboa foi alvo de 6 décadas de governos portugueses. Aliás, tratando-se de Portugal, é perda de tempo estarmos a discutir onde vamos construir o novo aeroporto. Uma vez que a obra só vai estar concluída lá para 2080, devíamos era estar a decidir o melhor sítio para construir o novo terminal de teletransporte.

Ontem li uma notícia sobre o passageiro com mais horas de voo no mundo. Tom Stuker, um americano de 69 anos, comprou um passe da United Airlines em 1990 e, desde então, já fez de borla o equivalente a 7 viagens à Lua.

Deve haver um equivalente português. Alguém que tenha passado os últimos 30 anos a viajar na TAP. Aposto que tem o recorde mundial de horas de espera. O equivalente a 3782 sessões do Godot no Teatro D. Maria II.