As eleições municipais e regionais em Espanha, realizadas no passado dia 28 de maio, geraram uma grande festa para a direita espanhola, em particular o PP, com uma vitória retumbante no panorama nacional e alguns destaques em regiões. Contudo, o calculismo de Sánchez e do PSOE vieram ao de cima, optando por interromper a festa e encher a bolha mediática com uma nova notícia: a antecipação das eleições gerais de novembro para julho.

Muitos certamente pensarão “Bom, está a assumir derrota; é necessária uma clarificação tendo em conta os resultados deste último ato eleitoral; Pedro Sanchéz a seguir a lógica de Guterres e não deixar cair Espanha no pântano político”; a questão é que, como bom político que é, o atual Primeiro-Ministro de “nuestros hermanos” terá, evidentemente, alguma carta na manga, que poderá vir do seu homólogo português que, recordemos, é seu “adversário” para um momento futuro.

A vitória do PP, apesar de altamente moralizadora, foi ainda assim curta, tendo em conta os resultados nacionais: a vantagem sobre os socialistas encontra-se nos 3%. Isto obrigou, em certas regiões, a que o partido liderado por Alberto Feijóo faça entendimentos com o VOX para formar maiorias capazes de governar. Será, portanto, fácil de prever que, em julho, uma eventual vitória dos populares com maioria relativa obrigue a entendimentos com o partido de extrema-direita liderado por Santiago Abascal, entendimentos esses que, como se tem visto nos últimos tempos, não são renegados em momento algum por ambas as partes. E é aqui que reside o trunfo de Sanchéz, trunfo esse que nos faz lembrar alguma coisa.

Enquanto que, por cá, a indefinição do PSD de Rui Rio em relação ao Chega deu, em janeiro de 2022, uma maioria absoluta ao PS e a António Costa, desta vez os ventos que costumam vir de Espanha fazem o caminho contrário: Sánchez, com a atual dependência que os populares têm da extrema-direita, e que, em momento algum, optam por os deixar de fora dos acordos, irá jogar essa carta para tentar a sua sobrevivência, o que levará, certamente, a um movimento de voto útil que esvaziará o Podemos e outras forças à esquerda do PSOE.

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Se esta tática resultará tão bem como em Portugal, só em julho saberemos. Não obstante, não deixa de ser no mínimo curioso que o putativo sonho europeu de António Costa possa ser colocado em causa… pela sua própria estratégia ganhadora. Mas como é que Espanha, em particular Pedro Sánchez e o PSOE, e as suas eleições legislativas, têm tanta influência num capítulo que apenas se discutirá daqui por um ano, aquando das eleições europeias?

A praxis das instituições europeias diz-nos que, ao passo que o grupo europeu mais votado para o Parlamento Europeu elege o presidente da Comissão Europeia, a presidência do Conselho Europeu irá para o segundo grupo mais votado. Atualmente, o PPE – família europeia do PSD e do PP espanhol – é o maior grupo no Parlamento Europeu, seguindo-se a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas – S&D, família dos partidos socialistas português e espanhol –, configuração esta que não se afigura mudar nas eleições de 2024. Ou seja, a presidência do Conselho Europeu cairá, em princípio, nas mãos de um Primeiro-Ministro da família do S&D que esteja no cargo, de acordo, igualmente, com a tal praxis.

Não será difícil, portanto, fazer contas: se Pedro Sánchez “cair”, António Costa figurará como o favorito a ocupar este cargo europeu. Com o atual contexto, o Primeiro-Ministro terá, então, que “torcer” pela vitória do PP, mas sempre com a ideia que poderá ser hipotecado pela sua própria estratégia. Quem diria que o feitiço se poderia virar contra o feiticeiro.