Há dias dei comigo a pensar se os vários milhões de dólares que a indústria automóvel investiu para criar carros autónomos teriam sido suficientes para construir um robô que conduzisse… O princípio seria o mesmo, evidentemente, sendo que quando não estivesse a conduzir, o robô poderia fazer uma série de outras coisas (incluindo aspirar a casa), que um carro que conduza sozinho não consegue fazer.

Vem esta minha reflexão exatamente a propósito do tema deste meu artigo: o que os seus filhos deviam estar a aprender. Irá o leitor dizer (e com toda a razão) que este é mais um que escreve umas coisas sobre isto do futuro da educação e sobre a forma como ela se deve relacionar com a globalização, a internet das coisas, a digitalização da economia, o futuro do trabalho e tantas outras. É verdade, sendo que eu nasci em 1990 e, portanto, esses temas são praticamente tão velhos quanto eu.

É por isso que o que me preocupa, na verdade, são os mais novos estudantes das nossas escolas, o que lhes ensinamos e o que eles aprendem. Ou, de uma forma mais atual: tudo o que não lhes ensinamos, e tudo o que temos a mania de que eles deviam saber.

O fenómeno é grave e acontece pelo sistema de ensino fora. Damos prioridade às ciências e não valorizamos a criatividade, focamos a aprendizagem nas línguas mas não apostamos na filosofia, na ética e nos direitos humanos, consideramos fundamentais as disciplinas que vão a exame, mas não damos lugar à educação não formal e ao desenvolvimento integral da pessoa, deixando para segundo plano o desporto, a ecologia ou o saber-fazer. No ensino superior, criamos mais vezes os cursos para encaixar os professores que já fazem parte do quadro do que para dar formação específica (e útil) aos alunos que os frequentam, e assistimos no geral à desatualização dos conteúdos, dos programas e das formas de ensinar no nosso país.

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Entretanto, a discussão pública do setor parece concentrar-se em questões financeiras e laborais – mais ou menos a propósito das exigências dos sindicatos ao Governo – em vez de abordar a qualidade do ensino ou a mudança dos paradigmas pedagógicos. Ou seja, vira-se para si própria, em vez de se virar para o futuro.

Esta não é uma visão contra quem faz parte do sistema hoje, porque se chegámos a este nível de educação no nosso país é porque todos os professores o conseguiram com tantas gerações de alunos nos últimos anos. Devemos estar-lhes gratos, valorizar a sua participação na escola e na academia, e o legado que deixaram em gerações de portugueses sempre melhores. O problema não deixa, porém, de estar à vista de quem o quiser ver e não acredito que seja preciso sensibilizar ninguém para este assunto. Precisamos de transportar a educação para este século e para isso é preciso rejuvenescer o corpo docente e abandonar o estigma de que só tem palavra no que se ensina quem já está instalado no sistema. Escolas e instituições de ensino superior têm de estar mais abertas ao diálogo e à participação da sociedade, têm de ser menos conservadoras no seu funcionamento e tentar responder mais vezes a esta pergunta: o que deviam estar a aprender os seus filhos?

Deixo-lhe a minha resposta. O que os seus filhos deviam estar a aprender é tudo o que se prevê que uma máquina não vá saber ou poder fazer num futuro próximo: filosofia e ética, arte e cultura, criatividade e desporto, relações pessoais e assistência pessoal.

Presidente do Conselho Nacional de Juventude
‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.