Primeira pergunta: qual é o projecto político do PSD para Portugal e, concretamente, em que medida este se distingue da governação socialista? A pergunta soa a cliché num partido que está na oposição, ambiciona governar e quer ser alternativa ao PS. Mas a questão tem importância redobrada no contexto actual. Por um lado, as transformações sociais e tecnológicas dos últimos anos requerem actualização ou mesmo redefinição das prioridades políticas do PSD, que não pode ficar cristalizado no tempo. Por outro lado, o legado de Rui Rio pesa, não somente pelos resultados eleitorais historicamente baixos, mas também pela aposta numa estratégia errada, sustentada na busca de uma pureza ideológica ao centro e em convergências com o governo em dossiers-chave. Ou seja, para além do falhanço eleitoral, a estratégia gerou uma indefinição identitária: o que representa hoje um voto no PSD? Não basta alegar que é um voto contra o PS. Esta pergunta elementar para um partido político tem de ter uma resposta clara, imediata, mobilizadora ou até mesmo inspiradora. Actualmente, não tem. A grande missão do próximo líder do PSD assenta em reconstruir a identidade do partido.

Segunda pergunta: como é que o PSD planeia recuperar a confiança dos vários eleitorados que está a perder? A erosão eleitoral do PSD não começou em 2022, mas tem-se consolidado junto de determinados nichos eleitorais. O caso mais evidente é o da população com mais de 65 anos com baixas qualificações (a maioria), uma vez que os pensionistas votam muito mais PS do que PSD desde 2015 — e, num país envelhecido, não é viável vencer eleições sem disputar este eleitorado. Mas há mais eleitorados que o PSD necessita de segurar: os funcionários públicos (que o PS trata como clientela), os jovens urbanos mais qualificados (que a IL seduziu com eficácia) e o voto de contestação à direita (que está a fugir para o Chega). Geograficamente, também em virtude do poder autárquico, o PSD está a ficar acantonado à região norte, sem expressão a sul de Lisboa e em queda no litoral. De resto, o inquérito pós-eleitoral do ICS-ISCTE dá inúmeras pistas sobre a relação dos eleitores com o PSD. Por exemplo, 31% dos que votaram PSD nas últimas legislativas afirmam estar pouco ou nada satisfeitos com a sua escolha, como quem assume que colocou a cruz no PSD sem grande convicção — para comparação, apenas 6% dos inquiridos que votaram PS estão pouco ou nada satisfeitos com a sua opção. Ao PSD já não basta reconstruir a sua identidade, há que saber inovar na sua actuação na oposição e, assim, reconciliar-se com diferentes perfis de eleitores.

Terceira pergunta: como é que o PSD vai lidar com a fragmentação da direita? A questão não é meramente eleitoral, no sentido da competição pelos votos à direita com a Iniciativa Liberal e o Chega. A questão é estratégica: o PSD ambiciona liderar um projecto de poder que federe os partidos à direita? Se quer ser governo, terá de o fazer. E fazê-lo implica encontrar espaços de entendimento com os partidos à direita para gerar uma mensagem política coerente e mobilizadora — em vez de, cada um por si, a direita aparecer a várias vozes e sem um projecto. O PSD conseguirá facilmente dialogar com a IL e o CDS. Contudo, tem no Chega um obstáculo (que o PS promove), visto que o partido de André Ventura é incompatível com quaisquer entendimentos, seja por razões programáticas, seja por se revelar (nos Açores e em várias autarquias) instável e merecedor de pouca confiança. Assim, ou o próximo líder protagoniza uma federação das direitas democráticas (que trave o Chega), ou ajudará o PS a consolidar a sua posição hegemónica.

Estas três perguntas correspondem aos três passos de reconstrução que o PSD terá de dar: redefinir-se, inovar na oposição para voltar a ser atractivo e, por fim, liderar à direita um projecto reformista para Portugal. É um caminho longo e exigente, mas sem o qual dificilmente o PSD entrará em 2026 com alguma chance de discutir a governação do país. Em vez da habitual contagem de espingardas e do caciquismo dos pequenos interesses, é sobre esse caminho que os candidatos têm o dever de esclarecer o país — o que propõem, que prioridades estabelecem, que reformas destacam e como pretendem modernizar o partido? Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva são dois políticos com prestígio, é certo, mas isso, por si só, deixou de ser suficiente: para além de um líder, o PSD precisa de um rumo. E a direita também.

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