A vida política nacional, para lá da Covid-19, tem sido marcada por dois assuntos; as eleições presidenciais e o ministro das finanças. Não é muito, pois não?

No campo da Covid-19 que vai merecendo análises frequentes e sucessivas discute-se a economia e os eventos.

No campo económico, enquanto o Governo anda a tentar tapar a desgraça para que também contribuiu, o que nos interessa é saber quem vai pagar as contas, preferencialmente e muito justamente a solidariedade europeia, a tal que nunca chega sem contrapartidas. No meio disto tudo há a TAP de que os contribuintes não se conseguem livrar.

Quanto a eventos, depois das tolices do 25 de abril e da manifestação do 1 de maio, tivemos um espetáculo no Campo Pequeno. Não vi, não fui, não aprecio o género. Não comento. As touradas não acontecerão. Será para proteção do touro aos vírus, já que dos maus tratos ninguém os protege. A festa do Avante, uma espécie de festa brava com laivos de cultura e política, não pode ser classificada como festival. Pode acontecer com público. Webomício não dá. Longe vão os anos dos AREA que até têm um disco gravada na dita festa, com som razoável, cuja atuação foi antecedida de uma peroração contra os coronéis gregos. “Impara a leggere le cose intorno a te finché non se ne scoprirà la realtà…”

Já me esquecia do futebol que serve sempre para entreter e fazer esquecer. Voltou! Com o desporto rei regressaram os magníficos programas televisivos que, reconheçamos a evidência, transformam a restante programação “generalista” em acervos de alta cultura.

Presidenciais? Os mais futuristas dirão que não têm futuro. Está feito. MRS sempre! Assim seja.

Há uma frase do Dr. António Costa, citada como tendo sido proferida em 28 de agosto de 2014, que muito se ajustaria às Presidenciais que se avizinham: “O país precisa de novos protagonistas, que rompam com este ciclo de vistas curtas em que temos estado bloqueados nos últimos anos”.

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Obviamente falava de si, o mais míope de todos. Não estava, seguramente, a pensar numa nova visão para o desempenho presidencial.

O nosso PR, o Prof. Rebelo de Sousa, faz uma leitura situacionista dos poderes presidenciais. É como o Diário de Notícias nos tempos de Estado Novo. Existe para dizer bem do Governo. É um estilo. Marcelo deve a primeira eleição ao PS e ficará a dever a segunda também. Marcelo foi eleito à custa do medo da eleição do candidato oficial do PS nas últimas eleições, Sampaio da Nóvoa. O PS, ao não ter apoiado a Dra. Maria de Belém nas últimas eleições, garantiu a eleição de Marcelo, coisa de que não nos devemos esquecer. Não quer isto dizer que o Dr. António Costa ou o PS tenham já declarado apoio ao Prof. Rebelo de Sousa. Não têm de o fazer, não é preciso. Marcelo é o candidato natural de “todos”, é para isso que ele tem trabalhado incansavelmente e com méritos que as sondagens confirmam. Precisava de mais gravitas mas, sejamos justos, a sua forma de estar, o seu ser egocêntrico e vaidoso granjeou-lhe uma popularidade que nem cançonetistas famosos na razão direta da sua mediocridade alguma vez alcançaram.

Para Marcelo e para Portugal, o resultado da exposição mediática permanente, reiteradamente banal e popularucha, foi a perda da eficácia do poder da palavra. Por mais que os comentadores, amigos, aliados e alguns jornalistas se esforcem por enaltecer as palavras do Presidente da República, já ninguém lhe liga nenhuma. Marcelo tornou-se num crooner sem voz. Gastou-se e gastou a nossa paciência. E depois há aquela tendência para o disparate que o persegue ultimamente. As três pérolas mais recentes foram; condecorar os profissionais que trataram o primeiro doente com Covid-19 em Portugal, como se fosse possível identificar esses “únicos” profissionais e mais ninguém merecesse distinção; entender que a pandemia de gripe de 1918 terá sido uma oportunidade perdida para a consolidação da democracia portuguesa da 1ª república; e, no topo, a cerimónia ecuménica para homenagear os mortos da Covid-19, como se morrer de outra coisa qualquer não fosse motivo de luto cerimonial. São só exemplos recentes. A lista de grandes frases políticas é demasiado grande para caber aqui.

Mas o problema da direita não é o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa. Na forma como este tem desempenhado o seu mandato, um qualquer simpático que se deixasse filmar em direto a ir mergulhar em todo o lado, do Tejo ao Atlântico, da banheira a um outro eflúvio, serviria perfeitamente. O problema da direita é não terem candidato. Não basta tentar encontrar um Anacleto, Ambrósio ou Anastácio à direita, tal como se adivinha uma Urraca ou Merciana à esquerda. São nomes. Para nome, chega o do Marcelo Rebelo de Sousa que, sem sombra de dúvida, no género placebo, tem feito um lugarão. Será, na falta de alternativa, o mal menor.

Bem sei que todos, enfim, os do costume elogiaram muito o discurso do nosso PR no passado 10 de junho, uma súmula de vacuidades que definem o novo marcelismo. Ora, eu fiquei com a sensação que estava como que em frente a um filme do genial Manoel de Oliveira. Uma enorme chatice que ninguém se atreve a reconhecer como tal porque, justamente, foi feita pelo respeitabilíssimo Manoel de Oliveira, digo, Marcelo de Sousa. Certo, gostos não se discutem e eu também tenho as minhas preferências artísticas que, como leram atrás, até incluiram extintas bandas de jazz-rock italiano. Marcelo não tem apoiantes, tem fãs, e isso chega amplamente para ganhar uma eleição no século XXI. Pois, por mais que o critique não consigo deixar de admirar o primeiro político a perceber que a política não interessa a ninguém e a fazer disso um programa para Presidência da República. Se continuar assim ainda consegue que haja quem proponha a extinção constitucional do cargo. Reparem, no modelo MRS não faria diferença para a condução dos destinos de Portugal, aliviaria a direita das preocupações pela busca do candidato perfeito e teria o mérito de deixar Marcelo com o último lugar na exposição dos quadros do “Museu de Bélem”, anteriormente designado “da Presidência”. Cuidado!! Ainda acabo monárquico e não posso consentir que seja o Professor Marcelo a conseguir esse feito.

Quanto às finanças, tudo na mesma, assim parece. O pior que se poderia ouvir dizer acerca do Dr. João Leão foi dito pelo Senhor Primeiro-Ministro. É garantia de continuidade. Ou seja, para já e para os anos vindouros vamos ter a continuação da política de cativações acéfalas, sem outra racionalidade que não seja a de poupar. Não vamos ter uma visão das finanças públicas que não seja a da contabilidade. Não haverá estratégia de desenvolvimento e os serviços públicos, com a saúde à cabeça, serão os mais sofredores. O Dr. Mário Centeno, com a legitimidade que o PM lhe conferiu, entendeu seguir uma política neo-salazarista de poupar à outrance. Nada de errado desde que isso tivesse sido assumido. Não foi. Mentiram-nos com a farsa da página da austeridade que tinha sido voltada. Mas como é uma austeridade de esquerda já é uma boa austeridade. Até li a pouca vergonha de que o Dr. Centeno é que tinha salvo Portugal dos défices, como se o trabalho dos antecessores, em tempos de Tróika, não tivesse sido muito mais difícil e exigente. Todavia, será que o Dr. Mário Centeno não poderá regressar ao seu lugar no Banco de Portugal e, consideradas as suas qualidades profissionais e reconhecida competência matemática, assumir o lugar de Governador? Claro que pode.

A maioria dos ex-governantes não ganhou nada com ter sido governante. A perceção pública não é esta, mas a verdade é que quase todos voltam ao que faziam em piores condições e com a reputação ofendida. Os lugares de governo são mal pagos. Desculpe-me a larga maioria dos portugueses que ganha menos do que um ministro, mas se pensarmos nos 400 mil Euros que um CEO de um Banco falido ganha por ano e compararmos com os 60 mil euros anuais brutos que ganha um ministro, talvez nem a isso chegue, convenhamos que não é muito. É certo que um governante ganha notoriedade, mas tem de aturar imenso desgaste pessoal e profissional, incluindo alguns vitupérios que uns quantos, incluindo-me no grupo, vão dizendo e escrevendo por aí. E o parlamento não fica bem ao votar uma lei, claramente ad hominem, para que a vida de um ex-governante fique ainda mais difícil do que já é. Curiosamente, a lei agora aprovada, feita a pensar em Centeno, não vai afetar Centeno. Vai contribuir para que, acrescentada aos baixos salários, risco, responsabilidade e desgaste de um cargo no governo, seja cada vez mais difícil encontrar quem esteja disposto a abdicar da sua vida pessoal e profissional para servir o País. Deixem o Dr. Centeno seguir a sua vida. Não me parece aceitável que aqueles que o bajularam sejam os mesmos que agora o perseguem.