Se Marcelo Rebelo de Sousa falou verdade quando disse que ponderou não se recandidatar por causa das tragédias no Interior, e se António Costa foi igualmente sincero quando afirmou a coesão territorial como “a” prioridade política interna dos seus governos pós-incêndios de 2017, então existe hoje uma contradição grave na política governamental. É que o Presidente, o primeiro-ministro, o ministro da Economia, o ministro da Administração Interna, a ministra do Trabalho e da Segurança Social e a ministra da Coesão, entre outros, puxam para um lado – o lado de dar ao Interior de Portugal condições de viabilidade para reter e fixar pessoas, conhecimento e atividade económica. E o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior puxa para o outro lado!
Nada me move – muito pelo contrário! – contra a ministra Elvira Fortunato e o seu secretário de Estado do Ensino Superior, Pedro Teixeira, que são académicos e políticos estimáveis. Mas o facto é que as suas políticas recentes contra as instituições de Ensino Superior do Interior – coordenadas pela venerável iminência parda que é Alberto Amaral – vão dar cabo de uma das poucas formas inteligentes de atrair, fixar e reter novas gerações nas cidades e vilas portuguesas que ficam longe de Porto e Lisboa: o ensino superior, a tecnologia e a ciência.
Alberto Amaral – e os responsáveis ministeriais com ele – argumentam com os custos de ensinar, investigar e produzir ciência no Interior, e argumentam também com o despovoamento crescente dos distritos encostados à fronteira com Espanha. A questão é que não fazem as contas certas! O ponto não é somar o que custa ter ensino superior em Vila Real, Bragança, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, etc: o ponto é comparar o que custará ao país, como um todo, deixar de ter, todos os anos, jovens – portugueses e estrangeiros, nomeadamente da CPLP – nestas cidades e regiões!
O que está em causa não é fazer contas pueris aos óbitos e nascimentos segundo a tendência atual para justificar o encolhimento de universidades e politécnicos no Interior: prever o declínio demográfico se nada se fizer, não é ciência, é preguiça. A verdadeira questão é saber como é que Portugal poderá ter um saldo migratório positivo nas regiões mais despovoadas, ou seja, um crescimento real de população.
É óbvio que isso não será possível sem a alavanca do ensino superior e das pessoas que este atrai e fixa. Se o ensino tem custos, estes custos são, para o todo nacional, infinitamente inferiores aos que o país teria de pagar se não tentasse inverter o despovoamento e a desertificação de dois terços do seu território.
O ensino superior é a forma mais barata – repito: barata! – de promover a coesão territorial. E é também a forma mais inteligente, mais estrutural e com maior potencial de atingir esse objetivo.
É por isso muito errada a forma como o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior diminuiu drasticamente o número de vagas para alunos internacionais, e para alunos dos concursos especiais, nas instituições de ensino superior. No caso do Politécnico da Guarda, a que presido, as novas regras atribuíram-lhe apenas nove (9) vagas… para três mil candidatos internacionais!
As centenas de estudantes que deixarão de vir para a Guarda por essa razão, serão menos centenas de potenciais imigrantes que Portugal, um país envelhecido, tanto precisa. Nas cidades do Interior serão menos milhares de imigrantes integrados e aculturados da melhor maneira possível – a frequência do ensino superior! Imigrantes que maioritariamente falam a mesma língua que a população que os acolhe e que aprenderam, e se formaram, segundo os mesmos padrões pedagógicos e científicos que os nacionais.
Impedir a vinda desses estudantes asfixia as instituições do Interior e, pior, prejudica a fixação de pessoas qualificadas nas suas regiões. Ao dificultar este tipo de imigração, cria-se espaço para outra, sem qualificações nem laços culturais com os residentes, que é dominada por grandes redes de tráfico transnacional de seres humanos: a atual política do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior favorece os populismos xenófobos que alimentam forças anti-democráticas e racistas em Portugal.
Em síntese, as políticas de ensino superior devem apoiar o Interior. Não conspirarem contra ele!