Algum dia tinha de acontecer. É facto que não tivemos o nosso 11 de Setembro, mas nenhum país, por muito seguro que seja, está livre de ser quase alvo de um hipotético atentado, quem sabe terrorista. E foi precisamente isso que se evitou, in extremis, na passada sexta-feira, quando a Policia Judiciária deteve o jovem que, alegadamente, pretendia provocar um talvez massacre, porventura aproveitando a época de exames na Universidade de Ciências de Lisboa. O que foi bom. Agora interessa perceber se, como costuma acontecer nestes momentos quase históricos que acabam por não ser muitíssimo traumáticos para uma nação – como foi este “10 de Setembro” –, os portugueses se unem em torno do objectivo comum de tornar Portugal um país melhor.
Duvido que os portugueses, em geral, estejam motivados para esta tarefa. Mas tenho a certeza absoluta que o Primeiro-Ministro, em particular, está motivadíssimo para boicotar esta tarefa. Desde logo porque ontem confirmou-se que António Costa recebeu, em São Bento, todos os partidos com assento parlamentar menos o Chega. Portanto, um pequeno passo para um homem que pretende ostracizar o Chega, um salto gigante para a desumanidade com que o Primeiro-Ministro se propõe tratar os portugueses que votaram no partido de André Ventura. Embora, em nome da verdade, não possa afirmar que António Costa abomine os eleitores do Chega. Tanto é que transcrevo esta breve, mas reveladora, troca de impressões entre o Primeiro-Ministro e militantes do terceiro partido mais votado nas legislativas:
Militantes do Chega: Sr. Primeiro-Ministro, como é possível o senhor colocar à margem do processo democrático as centenas de milhares de portugueses que votaram no Chega?
António Costa: À margem do processo democrático. Como assim?
Militantes do Chega: Então, de todos os líderes partidários, André Ventura foi o único que o senhor se recusou receber em São Bento.
António Costa: Pois foi. O que só prova que os eleitores do Chega são centrais na minha estratégia para o governo do país.
Militantes do Chega: Centrais? Mas afinal está a pensar num acordo entre PS e Chega?
António Costa: Não será tanto um acordo. É mais um pacto. Reparem: eu ignoro de forma escandalosa a vontade por vós demonstrada nas urnas, e o Chega serve-me de pretexto para manter a direita fora do poder ad aeternum.
Militantes do Chega: Mas isso faz do Chega um mero instrumento da sua estratégia de poder.
António Costa: Não será tanto um instrumento. É mais um joguete.
Donde resulta claro que o Primeiro-Ministro não desdenha o Chega nem os seus eleitores. Aliás, se houve coisa que estas eleições provaram é que o líder do PS não faz distinções entre portugueses: tanto ignora os portugueses que votaram no Chega, como ignora os portugueses que votaram no estrangeiro. Todos são ignorados por igual. Sendo que no caso dos votos anulados aos emigrantes é justo salientar o também soberbo desdém do Presidente da República. Afinal Marcelo Rebelo de Sousa é o Presidente de todos os portugueses, que ele desdenha. Enquanto António Costa é apenas Primeiro-Ministro dos portugueses residentes em Portugal, que ele desdenha.
Desdém, esse, que se presta a coincidências muito giras. Então não é que enquanto se desenrolava esta vergonhaça elucidativa de como os responsáveis políticos nacionais se borrifam nos portugueses que vivem no estrangeiro, o Presidente da República estava no estrangeiro a elucidar responsáveis políticos internacionais sobre como respeita os portugueses? Há coisas giras. De facto, Marcelo esteve em Paris com Macron, num evento em que se cantou a “Grândola, Vila Morena”. Enquanto nas ruas de Paris a polícia carregava sobre populares fartos das políticas da pandemia. Ou seja, enquanto num lado o povo era quem mais ordenava, no outro a polícia era quem mais ordenava que se malhasse no povo.
Isto pelo menos enquanto o povo não desistisse de se manifestar. Porque na Nova Zelândia as autoridades têm tocado êxitos como a Macarena e o Baby Shark para dispersar protestos anti-vacinas. E nesta comitiva do Presidente da República estava Tony Carreira. Desconfio que já com o intuito de, às tantas, abrirem as janelas e o cançonetista, por via da interpretação dos seus maiores sucessos, mandar os manifestantes parisienses, em pânico, de regresso aos seus lares.
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