Sabem o que a política portuguesa tem de óptimo? Não vos ocorre nada? Mas há uma coisa. E essa coisa é a previsibilidade. É tudo tão previsivelzinho na política portuguesa. Surpresas estupendas? Esqueçam. Reviravoltas inesperadas? Está bem, está. Mudanças de rumo entusiasmantes? Ah, ah, ah! Essa foi gira! Não. Nada disso. Mas, em contrapartida, sabemos sempre com o que contar. Já é bem bom, caros concidadãos. Portanto, toca de não cuspir no prato. Vamos, isso sim, desfrutar deste amuse-bouche da legislatura que agora principia, que é esta polémica em torno do vice-presidente da Assembleia da República escolhido pelo Chega.

E porque é que a enorme controvérsia em relação à escolha de Diogo Pacheco de Amorim para vice-presidente da Assembleia é um aperitivo para os próximos quatro anos? Porque este é, precisamente, o tipo de sarrabulho que interessará a quase todo o novo Parlamento alimentar. Interessará ao Chega para reforçar a ideia de partido perseguido pelo sistema. Interessará ao PS para que se fale de tudo menos da (soberba? magistral? Divinal?) governação do PS. Interessará ao PCP e ao Bloco de Esquerda para disfarçar o facto de, aos portugueses, parecer (vamos acreditar que é desta) interessar cada vez menos votar em comunistas. E interessará à esquerda em geral para colar toda a direita ao Chega.

Assim sendo, contem com uns próximos quatro anos bem ricos. Ricos, não em ouro, mas em salganhadas envolvendo o Chega. O que distingue claramente os quatro vindouros anos da saudosa Floribella. Que embora também fosse pobre em ouro, pelo menos era rica em sonhos. Esqueçam os sonhos. Isto não vai a lado nenhum.

Bom, mas onde eu queria mesmo ir era ao facto de que se é verdade que a 30 de Janeiro os eleitores deram ao PS a maioria absoluta, no próximo quadriénio o que interessará à grande maioria do novo Parlamento é que a comunicação social dê ao Chega a maioria absoluta da atenção mediática. É com isso que a esquerda fantasia. A esquerda e o próprio Chega, como é óbvio. Se bem que em fantasias separadas. Não há cá misturas. Fantasia essa que começou já a tornar-se realidade com este sururu envolvendo a escolha, por banda de André Ventura, de um indivíduo cujos detratores acusam de querer espatifar este regime.

Foi por esse exacto motivo que, em contrapartida, o PS escolheu para a presidência da Assembleia da República, Edite Estrela. Lembram-se de Edite Estrela? É aquela senhora que tinha um programa na televisão em que falava muito bem Português. Não estão recordados? Ela falava muito bem Português, mas falava ainda melhor de José Sócrates. E agora, diz-vos alguma coisa? Exactamente. É aquela senhora que ia de férias com José Sócrates, com tudo pago por José Sócrates. E é também aquela senhora cujo marido foi sócio de José Sócrates e Armando Vara num negócio. E é aquela senhora cujo primo foi, digamos, professor de José Sócrates quando o ex-primeiro-ministro tirou aquele, digamos, curso, naquela, digamos, universidade, a um, digamos, domingo. Peço desculpa, foi mesmo a um domingo. Este último “digamos” saiu a mais, escapou-me.

Ou seja, o que é que pretendo deixar claro com todo este enquadramento? Desejo apenas confirmar que Edite Estrela é a presidente da Assembleia da República perfeita para fazer frente ao eventual vice-presidente Diogo Pacheco de Amorim. Para enfrentar alguém que supostamente odeia o regime e quer desfazer-se dele para sempre, ninguém mais apropriado do que uma senhora tão próxima do governante deste país que mais acarinhou o regime, ao ponto de querer tomar conta dele para sempre.

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