Os resultados das últimas eleições legislativas deram ao Partido Socialista a segunda maioria absoluta da sua história. Consequentemente, este resultado representa uma derrota para o PSD, que liderou, lidera e liderará a oposição democrática, enquanto único partido que é alternativa ao governo socialista.

Perante este contexto, o PSD tem espaço temporal e político para refletir a reorientar a sua política face aos resultados eleitorais do último dia 30 de janeiro. É uma janela de oportunidade para uma reflexão tranquila, séria, ponderada, participada e concentrada na alternativa que os portugueses esperam e merecem de um partido que existe para os servir, seja na liderança de governos ou na oposição às escolhas políticas de outros.

Ainda que seja expectável que os recentes grupos parlamentares da Iniciativa Liberal e Chega procurem que a política tenha uma certa dose de imediatismo, a verdade é que a maioria absoluta de um partido determina um ambiente mais favorável à discussão de políticas menos imediatas. Ou seja, políticas públicas cujo efeito é sentido no longo prazo e cuja discussão tem estado ausente nestes últimos seis anos, face à necessidade da “defunta gerigonça” tentar provar a necessidade da sua existência anualmente, em cada Orçamento de Estado. Sem discutirem políticas cujo efeito pudesse superar a legislatura que decorria.

Portanto, a expectativa de uma próxima legislatura curta, sem decisões de fundo, revelou-se, após as eleições, uma legislatura com horizonte provável de quatro anos, com condições para decisões mais estruturais e de maior alcance. Porque mesmo que o PS não queira inverter a sua natural tendência para a rejeição de reformas que sempre anuncia, mas nunca protagoniza, caberá ao PSD colocar essa discussão na agenda política como principal partido de oposição.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Por outro lado, a forma como era interpretado o voto dos portugueses mudou. Algo que é perfeitamente normal, porque a sociedade portuguesa não é imutável e altera, naturalmente, as suas escolhas, com os tempos. Os votos dos jovens e de protesto ganharam uma nova dinâmica à direita e os votos cujos rendimentos têm uma dependência direta do Orçamento do Estado parecem ter sido mais concentrados à esquerda.

O próprio quadro político é igualmente único, com a diminuição de partidos como o PCP e BE. E com o enfraquecimento gradual dos sindicatos afetos a estes partidos, o protesto à esquerda do PS está claramente enfraquecido. Ainda assim, será mais provável sentir o protesto à esquerda através dos sindicatos, que terão que provar que conseguem recuperar o seu capital reivindicativo, face à nova maioria no parlamento e diminuta representação do PCP e BE.

É possível, neste contexto, que o protesto e o descontentamento possa ser expresso mais à direita do PS do que o contrário. E é evidente que a construção de uma governação alternativa permanecerá responsabilidade do PSD quer pela sua dimensão nacional, quer pela condição de segundo partido mais votado.

Apesar de o PSD ser o único partido com dimensão para ser alternativa ao PS, a sociedade portuguesa tem hoje um retrato diferente daquele em que o PSD conseguiu obter muitas das suas vitórias eleitorais.

O PSD pode e deve refletir como pode usar a sua dimensão política no caminho expectável de quatro anos da nova legislatura, porque é o único partido capaz de ser alternativa ao PS, após o fim da mesma.

Existem fatores que conferem ao PSD a sua dimensão e que fazem dele o primeiro ou o segundo partido mais votado nas várias eleições legislativas. Ainda que possam ser indicados outros fatores, um deles será seguramente a quantidade e qualidade dos militantes do PSD. Os militantes do PSD são inigualáveis na sua diversidade geográfica, etária e mesmo ideológica, assente numa social-democracia à portuguesa que tem respondido – especialmente em cada momento histórico em que o partido tem responsabilidades de governo – às legítimas aspirações dos portugueses. No fundo, aquela diversidade que faz do PSD o “partido mais português de Portugal”.

Nesse sentido, qualquer momento de reflexão que exista, fruto dos resultados eleitorais, deve ter em consideração a opinião dos militantes. Aliás, deve ter essa opinião como o centro gravitacional de qualquer debate. Contudo, os instrumentos de que o PSD dispõe para que os militantes participem de forma direta numa reflexão tão alargada e tão profunda são limitados. Uma reunião plenária circunscrita a um concelho não reflete a dimensão do PSD e não tem qualquer carácter de excecionalidade. Os plenários concelhios têm o seu lugar natural, como têm as assembleias distritais ou, no plano nacional, a reunião magna, o Congresso. Estes momentos têm a sua natureza própria e são naturalmente circunscritos no tempo e limitados no universo de militantes que mobilizam.

A reflexão que o PSD realizar deve aproveitar a dimensão do partido e deve merecer o caráter de excecionalidade que a atual circunstância determina.

As atuais circunstâncias criam condições para que o PSD possa realizar “convenções” que permitam a participação de todos os militantes pertencentes a cada distrito. Uma reunião magna de militantes onde possamos ter voz, discutindo a futura estratégia do partido e seu papel no desenvolvimento do país. Num formato semelhante ao que se desenvolve nos congressos do PSD, mas realizado em cada distrito e com a participação aberta a todos os militantes que nele estejam inscritos.

Para o partido definir prioridades tem que falar com os portugueses e é apenas lógico que deve falar com os portugueses que são militantes do PSD.

O papel de um militante num partido é mais importante, porque é a vontade dos militantes que determina o caminho do partido. E é assim mesmo que tem de ser.

O processo de convocação de congressos não confere uma voz direta aos militantes do PSD. Convoca-os antes para mais um processo eleitoral, para que a discussão seja realizada no congresso. Ou seja, a convocação de um congresso para discutir o partido iria resultar na chamada dos militantes para mais um ato eleitoral. E a atual circunstância permite que qualquer futuro congresso do PSD possa ser precedido de uma discussão de caráter excecional e com uma dimensão abrangente.

Mas a própria reconfiguração do espaço político à direita do PSD deve ser entendida como uma razão para que essa reflexão tenha uma abrangência que envolva todos os militantes. A política no país irá continuar a desenvolver-se, independentemente do grau de participação do PSD. E no mesmo sentido, os militantes que tenham interesse em participar no debate político no país devem ter oportunidade de o fazer através do PSD. Através destas convenções, verdadeiras reuniões magnas em cada distrito, construiremos uma oportunidade para o PSD aumentar o grau de participação no debate político do país, com o envolvimento dos militantes, de todos nós.

Esta forma abrangente de discussão também permitirá que a futura liderança do PSD, seja ela qual for, esteja à altura da dimensão do partido e evitaremos líderes que só estarão aptos a presidir ao PSD caso este diminua a sua dimensão. Algo que seguramente acontecerá se o PSD decidir refletir sem envolver os militantes.

As lideranças do partido são, evidentemente, circunstanciais e moldadas pelas condições de cada tempo político. Este é um tempo particularmente desafiante e o futuro Presidente do PSD (e a sua equipa) só têm a ganhar se tiverem mais que os votos dos militantes, a sua opinião e, acima de tudo, o seu empenho. Estou certo de que estas convenções distritais serão a oportunidade de reunir essas opiniões e motivar esse empenho.

Será esta proposta que farei no próximo Conselho Nacional do PSD.