A taxa de vacinação da Covid-19 em Portugal atingiu, em 19 de Setembro, 86% das pessoas com pelo menos uma dose e 83% com a vacinação completa, de acordo com o último relatório nacional de vacinação.

Será que com 86% de vacinação conseguiremos controlar a pandemia? Alguns estudos de modelagem no Reino Unido sugerem que, para atingir o limiar da imunidade de grupo com a variante Delta, poderemos ter de vacinar 98% da população.

Uma das razões é a de que o vírus SARS-CoV-2 está a evoluir para uma transmissão aérea mais eficiente. A variante Delta é dez vezes mais infeciosa do que a estirpe SARS-CoV-2, que teve origem em Wuhan.

Os meses de Outono-Inverno de 2021 poderão ser particularmente incertos na trajetória da epidemia. O levantamento progressivo das restrições para níveis mais normais, coincidindo com o retorno das escolas e universidades no outono, poderão causar maiores pressões sobre os cuidados de saúde. Isso pode ser agravado por outras doenças infeciosas sazonais que aumentam de prevalência nesta altura do ano.

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A lição fundamental da pandemia associada à variante Delta não é a necessidade de reforços, é a necessidade de uma abordagem em várias camadas que não dependa apenas de vacinas. A vacinação continua a ser essencial para proteger as pessoas nas nossas comunidades com alto risco de hospitalização e morte, para reduzir a pressão sobre o sistema de saúde e para ajudar a retardar a transmissão. Isso deve ser combinado com todas as outras medidas sociais e de saúde pública.

O ar puro é a arma mais poderosa do Serviço Nacional de Saúde contra a Covid-19.

Medidas de mitigação da transmissão

1. Nos automóveis e transportes públicos

A abertura das janelas (cerca de 5 cm) cria uma corrente de ar que renova o ar no interior, reduzindo rapidamente a concentração de CO2 e, por consequência, os aerossóis contendo vírus. Assim, se viajar num automóvel partilhando o espaço com pessoas de outro agregado familiar, além da máscara obrigatória, abra os quatro vidros das janelas. Quando tal não for possível, a melhor opção, numa configuração com um condutor (no assento da frente e à

esquerda) e um passageiro (no banco de trás, à direita, para o máximo distanciamento), parece ser abrir as janelas mais afastadas dos ocupantes (isto é, frente direita e atrás esquerda).

Numa escola na Virgínia, a abertura de duas janelas do meio e de trás do autocarro escolar, o uso universal de máscaras e o distanciamento adequado, foram eficazes a reduzir a transmissão. Assim, dos 39 casos de Covid-19 diagnosticados (incluindo 37 alunos, um motorista e um auxiliar) presentes nos autocarros escolares durante o período infecioso de Covid-19, não foram registadas transmissões entre alunos e adultos.

Nos outros transportes públicos, na maior parte das vezes, não é possível abrir as janelas, pelo que as autoridades deveriam garantir que no metro, comboio ou autocarro, as condições de purificação do ar estarão asseguradas. Não sabemos, em Portugal, qual a qualidade do ar nestes espaços. Em Espanha, algumas medições nos comboios mostraram uma elevada recirculação do ar!

2. Em espaços fechados

Em espaços públicos interiores, nomeadamente nas escolas, as estratégias passam por abrir as janelas o máximo possível durante o horário escolar e garantir uma boa ventilação durante os intervalos. Para obter o melhor fluxo e renovação de ar, é recomendável abrir as janelas e as portas em dois lados diferentes da sala, de forma a condicionar uma ventilação cruzada. Nas Astúrias, o governo local forneceu medidores de CO2 a vários agrupamentos escolares, o que facilita a medição do impacto destas medidas. Numa publicação oficial do CDC, demonstrou-se que a incidência da Covid-19 foi 37% menor nas escolas que obrigaram professores e funcionários a usar máscaras e 39% menor nas escolas que melhoraram a ventilação. As estratégias de ventilação associadas à menor incidência escolar de infeções incluíram apenas métodos de ventilação natural (incidência 35% menor) ou em combinação com métodos de filtragem (incidência 48% menor). Todas estas medidas devem ser estendidas a outros locais, como os ginásios. Estas ações puderam evitar a infeção nos 50 utentes de um ginásio da Virgínia quando um personal trainer ficou infetado.

3. Distância

É bem conhecida a distância de segurança que deveremos ter: pelo menos um metro, mas idealmente dois metros, das pessoas potencialmente contagiosas. Um estudo mais recente, usando métodos de velocimetria de partículas, sugere que para exposições curtas (10 segundos), uma distância mínima de segurança de 0,75 metros deve ser mantida para diminuir o risco abaixo de 0,1%; para exposições de um e 15 minutos, essa distância aumenta para cerca de 1,1 metros e 1,5 metros, respetivamente. Com a variante Delta, o tempo e a distância parecem ainda encurtar-se como foi demonstrado num recente surto em Sydney.

4. Acrílicos

A colocação de acrílicos entre as carteiras, nos balcões de atendimento público, e mesmo durante debates televisivos, tem aumentado significativamente. Mas será que são eficazes? Esta é uma solução relativamente fácil de instalar e pode ser vista por todos, mas não se tem demonstrado qualquer eficácia. Pode constituir uma barreira para as gotículas (e, portanto, ser útil, por exemplo, em farmácias ou supermercados entre o trabalhador e os clientes nos balcões), mas poderá até aumentar o risco de acumulação de aerossóis ao prejudicar a ventilação dos espaços.

5. Máscaras

É já bem conhecido que, na maioria dos ambientes com níveis baixos de vírus, as máscaras cirúrgicas são eficazes na prevenção da sua disseminação. Já máscaras mais avançadas e outros equipamentos de proteção são necessários em ambientes fechados potencialmente ricos em vírus, como centros médicos e hospitais.

Como ficou demonstrado num estudo realizado no Reino Unido (durante os meses de novembro de 2020 a janeiro de 2021), a utilização de máscaras de tipo FFP3 (com máxima filtração) reduziu significativamente as infeções nos profissionais de saúde.

Um dos aspetos essenciais para a eficácia das máscaras é o seu ajuste e manutenção, o que muitas vezes é negligenciado! É comum verem-se vários cidadãos com o nariz fora da máscara ou com a máscara no queixo… Inclusivamente, para melhorar o ajuste e proteção tem sido recomendado o uso duplo de máscaras (por exemplo, máscara cirúrgica sobreposta por uma máscara têxtil) ou de uma máscara FFP2, ao conferir uma maior proteção na presença de variantes do vírus mais transmissíveis como a variante Delta.

6. Sistemas de purificação do ar portáteis

Equipamentos de purificação do ar portáteis que combinam filtros de partículas de alta eficiência (HEPA) com a irradiação germicida ultravioleta (UV) contribuem para remover rapidamente partículas virais nos espaços fechados, reduzindo, assim, o risco de transmissão.

Um estudo muito recente, patrocinado pelo CDC americano, demonstrou que os purificadores de ar com filtros HEPA portáteis reduzem em 65% a exposição a aerossóis de SARS-CoV-2 simulados em locais fechados, aumentando para 90% quando combinados com uso de máscara. Na Austrália, o uso destes purificadores do ar reduziu significativamente os riscos de contágio quando implementados nos hotéis de quarentena.

Conclusão

Baseados nestas evidências e conselhos práticos, deveríamos seguir um código de conduta de modo a reduzir o risco de transmissão da Covid-19. Se o implementarmos de forma cívica, ajudaremos a manter a economia aberta e a evitar a sobrecarga no sistema de saúde.

Para além da vacinação generalizada que estamos prestes a atingir, as máscaras, o distanciamento e as boas condições de ventilação devem continuar a ser a nova norma!