Do grande contágio para a grande e eficaz vacinação que nos abra a porta do regresso à normalidade com a derrota dos populismos e autoritarismos. São perspectivas optimistas e, por isso mesmo, mais desejos do que previsões

Vacinas eficazes mesmo para o “novo” vírus, ministradas rapidamente e sem problemas. A logística exigida pela vacinação em massa de toda a população mundial, que envolve, além das vacinas em si, a necessidade de ter uma infraestrutura de armazenamento e distribuição e todo um conjunto complementar de material, como as seringas, coloca um desafio histórico a todos os países. A vacina da Pfyzer/BioNTech precisa não apenas de estar guardada a menos 70 graus centígrados, como também exige que sejam ministradas duas doses num intervalo de 21 dias para ser eficaz. E mesmo a eficácia das vacinas é ainda motivo de dúvidas: protege-nos durante quanto tempo? E que efeitos secundários poderão ter, existindo aparentemente apenas a convicção de que mal não fará?

A Agência Europeia do Medicamento (EMA) reúne-se esta segunda-feira dia 21 de Dezembro, tendo antecipado o encontro de 29, esperando-se que a vacina da Pfyzer/BioNTech seja aprovada esta semana.  É aliás incompreensível o tempo que a União levou a aprovar a vacina, numa altura em que nos EUA já está também no mercado a da Moderna.

Na sequência dessa antecipação, Portugal prepara-se para ministrar as primeiras vacinas aos profissionais de saúde nos últimos dias do ano, entre 27 e 29 de Dezembro. Precisamos de deixar ao Pai Natal o desejo de que tudo corra bem por aqui, que seja desmentida a nossa tradicional incapacidade de organização.

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Foi extraordinário aquilo que a ciência conseguiu em tão pouco tempo. A própria história do casal alemão de origem turca da BioNTech é inspiradora – Ozlem Tureci and Ugur Sahin’s são aliás as personalidades do ano do Financial Times. Como evento de baixa probabilidade – não a descoberta da vacina, baseada numa tecnologia em investigação há muitos anos para a cura do cancro, mas sim a história de vida – , esta é uma vacina que poderia ter sido um pedido ao Pai Natal.

No meio desta tendência em que a pandemia parecia começar a estar a ser vencida, eis que surge a má notícia da mutação do vírus, detectada com significado no Reino Unido. Temos em perspectiva novas restrições, com o Conselho Europeu a reunir-se de emergência esta segunda-feira.

E é aqui que precisamos que a trajetória seja no sentido positivo, que as vacinas sejam eficazes também para esta estirpe. . Se estivermos perante uma estirpe resistente às vacinas descobertas, face à primeira avaliação de que este vírus é ainda mais contagioso, vamos entrar em 2021 com uma espécie de nova pandemia. O Pai Natal, enquanto protagonista de boas notícias, fica com este pedido fundamental, que a nova estirpe não resista às vacinas já descobertas.

Recuperação da economia no segundo semestre com um Verão já com turistas. Continua tudo nas mãos da pandemia e, especialmente, de estarmos perante um falso alarme quanto à nova estirpe do vírus. Mas, neste momento, ainda é possível esperar que o Verão tenha mais turismo do que em 2020. E com esse ganho de segurança, dado pelas vacinas, que seja possível o regresso das actividades culturais, uma das áreas mais massacradas pela pandemia pela ausência de mecanismos tão eficazes de apoio, como noutros sectores.

Se não conseguirmos regressar a alguma actividade durante o Verão, a pandemia vai dizimar ainda mais micro e pequenos negócios em Portugal, no sector do turismo e do lazer. Teremos uma recuperação adiada e o próximo ano pode não ser, ainda, de crescimento. Mesmo os recursos europeus, do plano de recuperação e resiliência, pouco ou nada podem fazer para mudar esse cenário, uma vez que os investimentos se centram fundamentalmente no Estado e alguns deles não têm um efeito significativo de arrastamento do resto da economia portuguesa.

Com o que sabemos neste momento, tudo pode correr bem ou muito mal. Tudo depende do que os cientistas vierem a descobrir sobre a nova estirpe do vírus Sars-Cov-2, baptizada como B.1.1.7.  Nos próximos dias saberemos se as vacinas já descobertas são eficazes também para esta estirpe. Se forem, podemos acreditar que não será muito difícil começar a ver a recuperação no Verão, ainda que até ao fim do ano de 21 vejamos o desemprego a subir em Portugal.

Menos radicalização, mais inteligência a lidar com o populismo. Bom senso é o que se pede ao Pai Natal que distribua em boas doses. Contrariamente ao que se esperava, a “Gerigonça” não nos trouxe uma sociedade menos radicalizada. Continuamos, há pelo menos cinco anos, a assistir à dificuldade em aceitar as opiniões dos outros quando são diferentes das nossas – realidade muito exposta na população urbana. E a desenhar-se, também em Portugal, uma oposição entre quem vive nas grandes cidades e quem não vive.

Esperávamos estar livres do populismo mas não estamos. Até à Gerigonça tínhamos um populismo de esquerda que se moderou – não desapareceu  – com as responsabilidades de apoiar o Governo do PS. Aparece-nos agora um populismo de direita, que se manifesta ao mesmo tempo como espelho das preocupações de população menos urbanas ou sub-urbanas.

Boa parte da classe política tem-se revelado incapaz de compreender o que se está a passar. E em vez de “olhar para a Lua olha para o dedo que aponta para a Lua”. Parece nunca se lembrarem das pessoas que estão a mostrar simpatia pelo Chega e atiram-se simplesmente ao seu líder, falando dele sem cessar, em vez de reflectirem sobre os problemas que são referidos por ele.

Neste início de campanha eleitoral para as presidenciais apenas dois candidatos deram ao Chega um tratamento normal, foram eles João Ferreira do PCP e o actual Presidente e candidato Marcelo Rebelo de Sousa.

Marcelo Rebelo de Sousa alertou discretamente que o Chega será aquilo que os outros fizerem dele. “A resposta depende dos outros partidos que estão à direita ou à esquerda: podem maximizá-lo na forma como o tratam ou não tratam, dão-lhe peso se o convertem no centro da sua estratégia, colocam-no no centro do sistema”, disse o Presidente na entrevista à SIC e que aqui no Público se resume.

João Ferreira disse que dava posse a um Governo liderado pelo Chega mas estaria muito atento ao cumprimento da Constituição. “Se um Governo iniciasse funções afrontando a Constituição, demitiria esse Governo”, afirmou João Ferreira em entrevista ao Observador.

Parece tão óbvio o que disse o Presidente – “se o convertem no centro da sua estratégia, colocam-no centro do sistema” – que é com incredulidade que se vê os outros candidatos e alguns partidos políticos não o compreenderem. Como é óbvio e respeitador da democracia em geral e da Constituição em particular o que disse João Ferreira.

Esperemos que o bom senso se generalize, que os protagonistas políticos comecem a perguntar-se porque há pessoas a votarem no Chega, quais as preocupações e os problemas que enfrentam e que, a partir daí, procurem respostas e apresentem propostas.

Com a pandemia e a crise económica temos a mistura para as tentações populistas e até autoritárias. Se viermos a cair nessas tentações, a responsabilidade é dos protagonistas políticos que não foram capazes de nos convencer que o caminho não é por ali. A falta de bom senso no tratamento dos partidos radicais populistas, fazer deles o centro do discurso e das conversas, é a via para mais radicalização e mais simpatia pelo populismo.

Que o Natal nos inspire. Boas Festas.