A Rússia avançou novamente na Ucrânia, e o Irão atacou mais uma vez Israel. Qual foi, nos dois casos, a preocupação dos governos ocidentais? Esta: evitar uma “escalada”. Como? Limitando a capacidade da Ucrânia e de Israel responderem às agressões. À Ucrânia, americanos e europeus restringem o uso das armas, ou negam-lhas. A Israel, fazem o mesmo, e exigem-lhe um cessar-fogo. Como se o problema estivesse, não nas agressões a que a Ucrânia e Israel foram sujeitos, mas na possibilidade de se defenderem. Querem assim os governos ocidentais evitar a generalização da guerra? Mas perder ou não ganhar uma guerra localizada é a melhor maneira de ter uma guerra geral. O Ocidente está a cometer um grande erro, e vale a pena perceber como e porquê.
É fácil perdermo-nos em pormenores, e esquecer o essencial: a Putin não importam os falantes de russo no Donetsk nem ao Ayatollah Khamenei os árabes de Gaza. O que os assanha é a existência da Ucrânia e de Israel, que encaram como baluartes e símbolos da ordem ocidental. Destruir a Ucrânia e Israel é o primeiro passo com que Putin espera fundar o seu império neo-soviético, e o Ayatollah o seu império religioso. Por isso, qualquer cessar-fogo nunca será mais do que uma pausa para prepararem os próximos ataques.
O erro dos líderes ocidentais está em não reconhecerem que o Ocidente está sujeito às mesmas necessidades e contingências da Rússia e do Irão. Putin e o Ayatollah precisam de vencer estas guerras para levantarem os seus impérios. Mas o Ocidente também precisa de as vencer para manter os seus regimes. Não se trata de espalhar democracia pelo planeta, como há vinte anos. Trata-se de eliminar ameaças e dissuadir agressões. Se a Ucrânia e Israel desaparecessem, a guerra não acabaria: apenas se aproximaria mais do Ocidente, porque a seguir à Ucrânia, a ditadura neo-soviética russa interessar-se-ia pelos países bálticos, e o fundamentalismo islâmico já tem a Espanha e Portugal assinalados como as próximas terras do Islão a libertar do “colonialismo” ocidental.
Estes conflitos são insuportáveis? A vitória é a única maneira de os terminar. Não querem expandir a NATO? Derrotem Putin, de modo que os vizinhos europeus da Rússia não sintam precisar da garantia atlântica, como aconteceu à Finlândia. Querem um Estado árabe na Palestina? Derrotem o Irão e as suas milícias, de modo que esse Estado árabe não se reduza a uma simples base militar de ataque a Israel, como Gaza e o sul do Líbano.
Porque é que os líderes ocidentais, que durante anos apaziguaram Putin e o Ayatollah, resistem a ver as coisas como são? Porque se sentem à frente de regimes e sociedades que eles próprios tornaram vulneráveis. Para se agarrarem ao poder, fomentaram uma dependência do Estado que gerou desequilíbrios financeiros e bloqueios económicos. Para compensar o envelhecimento das populações, deixaram uma migração descontrolada destruir a coesão social. Agora, receiam a polarização política que deriva de tudo isso. Para enfrentar Putin e o Ayatollah, não bastaria a lucidez geopolítica de Churchill: seria preciso também a coragem reformista de Thatcher para desatar os nós do declínio ocidental. Não é provável, portanto, que muita coisa mude na atitude de americanos e europeus. Valha-nos a determinação de Israel e da Ucrânia em se defenderem. Estão a defender todo o Ocidente. Tal como John Donne disse dos sinos, não perguntem por quem os ucranianos e os israelitas lutam: eles lutam por nós. Deixá-los sozinhos é pior do que uma cobardia: é uma estupidez.