Thomas Henry Alex Robson-Kanu tem nome de príncipe, mas a vida nem sempre foi fácil. Galês, nascido em Londres e com segunda nacionalidade nigeriana, assinou aos dez anos pelo Arsenal. Ficou pelos gunners até aos 15, altura em que já não convencia ninguém. “Eu era um dos jogadores mais pequenos”, contou o The Guardian, antes deste Europeu arrancar. “Não era rápido o suficiente, não forte o suficiente ou grande o suficiente.” Por isso, o adeus. Doze anos depois, aí está ele a empurrar o seu país para onde nunca esteve: na meia-final de um grande torneio internacional. O País de Gales venceu a Bélgica (3-1) e será o adversário de Portugal, na quarta-feira, em Lyon, pelas 20 horas.

A sorte de Robson-Kanu foi mesmo um tal de Brendan Rodgers, que seria no futuro treinador do Swansea, Liverpool e Celtic, gostar do que viu e chamá-lo para o Reading. Rodgers era o responsável pela academia do clube. Por lá ficaria entre 2004 e 2016, com alguns empréstimos pelo meio. Agora está sem clube, e marcou o segundo golo do País de Gales, que prometia lançar a equipa para a meia-final contra os portugueses. Vokes, a quatro minutos do fim, ajudaria à festa e confirmaria a vitória.

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Gales não entrou muito “acordadinho”, como diria Fernando Santos. Aos 7′, os belgas tiveram uma chance tripla, dentro da área, mas o milagre galês aconteceu. E o zero-zero manteve-se. Mas o que tem de acontecer, tem muita força e Nainggolan, seis minutos depois, fez aquele que talvez seja o golaço do Europeu. Hazard e Witsel ajudaram a baralhar a defesa, com trocas de bola à entrada da área e movimentações. E lá decidiram tocar para o médio da Roma, que preferiu não ajeitar. É o chamado “é já daqui”. Que golaço, senhores.

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Nos minutos a seguir só dava Bélgica, com os seus craques a jogar a seu bel-prazer. Estava fácil. E os galeses não arranjavam forma de se ligarem. Mas isso mudaria. E seria coincidente com o golo do empate, que surgiu num canto de Aaron Ramsey, o médio do Arsenal que é um craque de primeira. O galês bateu e o capitão, que na adolescência foi um terrível empregado de mesa — “eu esquecia-me do que pediam”, disse ao The Guardian no mesmo artigo –, entrou com tudo e meteu a bola dentro da baliza de Courtois, 1-1. A partir daqui, a equipa cresceu e não foi brincadeira.

É tentador referir que esta equipa é Gareth Bale mais dez, mas é injusto. E um erro tremendo. Aaron Ramsey, que viu amarelo e que falhará o jogo com Portugal, é um 10 vagabundo, que anda por todo o lado a piscar o olho aos espaços. Tem um toque de bola sublime, sabe muito, e tem golo. Bate as bolas paradas, cruza bem. Enfim, tem sido o jogador mais influente do Europeu, com um golo e quatro assistências em cinco jogos. Depois há Joe Allen, que no Liverpool é mais discreto, mas aqui parece um Xavi, com as devidas distâncias. Têm coração e cresceram. Sem ser Bale a levá-los para a frente. Na frente há o tal senhor desempregado, que segura bem, vira bem, remata bem…

A Bélgica já estava a sentir muitas dificuldades para domar os britânicos. Axel Witsel e o autor do golaço no um-zero pareciam insuficientes. O País de Gales joga num sistema com três defesas, que sem bola se transforma numa linha de cinco, à imagem do que a Itália de Conte faz. Às vezes gosta de tocar e segurar o jogo, outras, muito à britânica, gosta de atacar com toda a velocidade do mundo e até partir o jogo. Quando se tem Bale é normal pensar assim.

A segunda parte começou como a primeira, com a Bélgica a sacudir os galeses. O cabeceamento de Lukaku, que hoje tinha o irmão Jordan em campo, saiu ao lado. Depois foi Hazard, a tentar de longe, depois de uma abertura maravilhosa de Kevin De Bruyne, com a trivela. A Bélgica prometia encostar os homens de vermelho para trás.

Aos 55′, o momento queixo-no-chão-que-nós-é-que-vamos-às-meias. O homem do jogo para a UEFA, o tal rapaz de 27 anos sem emprego, o tal que não era forte, nem rápido, nem jeitoso, recebeu a bola na área e o tempo parece que parou. Havia um apoio de um galês a surgir pela esquerda, por isso toda a gente pensava que Robson-Kanu, que estava de costas para Courtois, ia passar para ele. O ex-avançado do Reading preferiu tocar de calcanhar e enganar três (!) defesas belgas. Três. E depois escolheu o lado, empurrando a sua seleção para as “meias”, 2-1.

A Bélgica continuaria a bater à porta. Mertens e Batshuayi entraram, mas pouco conseguiriam fazer. Lukaku, Fellaini e Witsel tentaram bater Hennessey, mas sem sucesso. Aquilo já não ia fugir aos homens do Reino (ainda) Unido.

Quem marcaria, para sentenciar a coisa, seriam os galeses, por Sam Vokes. O avançado do Burnley entrou aos 80′ e marcou a Courtois aos 85′, de cabeça, imperial. Três-um. Ahh, o trocadilho fácil: três golos para o País de Gales. Ponto final em Lille.

Na estreia em Campeonatos da Europa, Gales consegue atingir as meias-finais. Mais: Gales não participava num grande torneio desde 1958, altura em que jogou o Campeonato do Mundo na Suécia (o único em que participou). Os britânicos passaram os grupos e só caíram com um golo de um génio chamado Edson Arantes do Nascimento. Ou Pelé. Onde vai parar esta gente?…