Concordo com os argumentos que sublinham o populismo e as propostas irrealistas do novo partido espanhol, Podemos. Acho que seria um desastre se algum dia ganhasse umas eleições. Mas a verdade é que o seu líder acumula apoios e o partido lidera as sondagens em Espanha. É certamente importante desmascarar as propostas irrealistas que fazem os seus dirigentes, mas não é suficiente. Por que razão milhões de espanhóis acreditam num demagogo que faz promessas impossíveis de cumprir? Devemos responder a esta questão.

É mais fácil acreditar em mentiras quando percebemos que os partidos tradicionais também mentiram. E foi isso que o PP e o PSOE fizeram aos espanhóis nos últimos anos. Há anos que os dois partidos sabiam que a economia espanhola necessitava de reformas, sobretudo para criar mais empregos. Não as fizeram porque não quiseram tocar em muitos interesses instalados, e muitas vezes no interior dos respectivos partidos. Também sabiam muito bem o que se passava nas Caixas regionais, e nunca quiseram resolver o problema, até ao momento em que o sistema bancário espanhol esteve em risco de colapso.

Não só quiseram adiar o problema, segundo a velha máxima ‘quem estiver no governo que o resolva’, como não disseram a verdade aos espanhóis. Todos os governos gostam de escolher a informação que partilham e que escondem, mas por vezes o preço a pagar torna-se elevado. Foi o que aconteceu em Espanha. Agora, um mentiroso novo convence melhor do que os velhos mentirosos.

Mas pior do que esconder a verdade, foi a corrupção que se instalou no sistema político espanhol. Os casos de corrupção multiplicam-se e os espanhóis, com um desempregado em cada quatro cidadãos, reagem naturalmente com desespero e raiva. Têm razão: os partidos em quem votaram, várias vezes, não foram merecedores dessa confiança. Dar um voto é o bem mais precioso em democracia. E deve ser absolutamente respeitado. No dia em que ganham as eleições, todos os líderes deveriam ter um único pensamento: milhões de pessoas votaram em mim ou no meu partido; o que vou fazer para merecer essa confiança? Parece óbvio que muitos políticos espanhóis não pensaram assim.

Um país onde tanto se sofreu para alcançar a democracia, com uma guerra civil terrível e com um regime brutal, como o de Franco, viu os seus principais partidos abusarem do sistema democrático. Aqueles que deveriam ter sido os guardiães da democracia, fizeram quase tudo para a destruir. Não mereceram a oportunidade que a história lhes ofereceu: construírem uma democracia. O meu maior desejo é nunca chegar à mesma conclusão em relação a Portugal.

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