O australiano David Hicks, que esteve detido na base de Guantánamo, conseguiu que a justiça norte-americana revogasse a condenação que lhe foi imposta por terrorismo, informou o advogado de defesa na quarta-feira. Hicks esteve detido na prisão de Guantánamo de janeiro de 2002 até maio de 2007, altura em que se declarou culpado de ter facultado “apoio material” à rede Al-Qaeda.

O Tribunal da Comissão Militar de Recurso dos Estados Unidos revogou, esta quarta-feira, a sentença proferida em março de 2007, por considerar que tal não configurava então um crime de guerra, pelo que o australiano não poderia ser julgado por um tribunal militar. A decisão, por unanimidade, revogou assim a condenação de sete anos, dos quais apenas nove meses tinham sido expurgados em conformidade com um acordo com o Ministério Público que o permitiu regressar a casa. Desde então, Hicks retractou-se, alegando que confessou ser culpado sob coação.

“Significa que a condenação contra David Hicks foi descartada e ele foi declarado inocente, confirmando assim algo que sempre soubemos”, disse o advogado Stephen Kenny à cadeia televisiva ABC. A defesa de Hicks, assegurando que a confissão fora obtida sob coação, interpôs, em 2013, um recurso junto do tribunal, alegando que o delito não era considerado um crime de guerra quando o australiano foi detido em dezembro de 2001 pelas tropas norte-americanas que entraram no Afeganistão.

O então chamado “talibã australiano” foi transferido pouco tempo depois para a base norte-americana de Guantánamo, onde passou cinco anos detido. Em 2007, foi condenado pelo tribunal militar e dois meses depois transferido para a Austrália para cumprir a pena numa cadeia no sul do país, ficando posteriormente sob prisão domiciliária até que, em 2008, lhe foi concedida liberdade.

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Hicks deu uma conferência de imprensa, acompanhado pelo seu advogado, em Sydney. “Esperámos anos por esta decisão. É um alívio porque acabou”, disse Hicks, que lamentou, porém, o facto de ter sido submetido a “cinco anos e meio de tortura física e psicológica”. O australiano alegou que foi agredido, alvo de abusos sexuais e drogado durante o período que permaneceu na cadeia.

Ainda que, de momento, não pretenda pedir uma indemnização, considerou que “alguém” deve ser responsável pelas despesas médicas decorrentes da tortura, enquanto o seu pai, Terry Hicks, exigiu um gesto por parte dos governos responsáveis pela detenção do seu filho. “Os governos norte-americano e australiano decidiram deixar as coisas como estavam até aqui. Neste momento, acredito que deveriam pedir desculpa”, enfatizou, em declarações à ABC.

O primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, saiu em defesa do então governo de John Howard, apontando que “fez o que devia ser feito”. “Não concordo que tenha de pedir desculpa por ações que os governos australianos tomaram para proteger o nosso país”, disse, instando a que se deixe de lado antigas ameaças terroristas e que se aponte antes o foco às atuais.