Motores a roncar, champagne a voar e uma senhora chamada Eva a queimar pneus e a desaparecer no horizonte. É isto, entre muitas outras coisas, que significa o regresso da Fórmula 1. Nem tudo é cool e glamour, no entanto, pois as nuvens carregadas de problemas financeiros continuam a pairar sobre o Campeonato Mundial de F1.

Comecemos por Eva. Já a conhecem? Usa um vestido vermelho impecável, o calçado (sem salto alto) é largo para garantir que o chão nunca lhe foge aos pés, enquanto a cauda, aquelas coisas que se veem nos vestidos chiques, oferece equilíbrio e até muda de posição, qual princesa a acenar (DRS). Bom, chega desta descrição bonito-com-suspiros-por-causa-das-mulheres ao jeito de Chico Buarque. Sebastian Vettel, o novo piloto da Ferrari, gosta de dar nomes de senhoras aos seus carros. Eva é a sua nova menina.

Se os números e as evidências da perda de competitividade dos Ferrari não fossem já gritantes, a evolução dos nomes escolhidos pelo alemão ajudam-no a perceber também. Na Red Bull, onde ganhou quatro Mundiais, escolheu Julie, Kate, a irmã perversa de Kate, a apetitosa Liz e a Kylie sem vergonha. Ou seja, muitas vezes soam a “alguém” irreverente, arisca, com personalidade ou desvios no comportamento. Segue-se Eva, uma escolha que remete para o início de tudo. Depois de um ano em que apenas foi três vezes ao pódio (Malásia, Canadá, Japão), Vettel espera agora uma nova era, um novo começo. Uma nova vida.

O primeiro Grande Prémio está agendado para o próximo domingo, em Melbourne, na Austrália, que já está nestas andanças desde 1996. A pista tem 5.3 km e serão dadas 58 voltas, o que se traduz em qualquer coisa como 307 km. A volta mais rápida desta corrida remonta a 2004 e pertence a Michael Schumacher (1:24.125). Para aqueles que esperam um Mundial de F1 mais competitivo, os primeiros testes não auguram nada de bom. Os pilotos da Mercedes, o campeão do mundo Hamilton e Rosberg, cavaram mais de um segundo para os demais pilotos nos treinos — Vettel, por exemplo, ficou a quase 1.5 segundo de Rosberg (distância que encurtaria no segundo treino livre). A Mercedes só não ganhou três GP na época passada: Ricciardo (Red Bull) esboçou o famosíssimo sorriso no Canadá, Hungria e Bélgica.

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Se a reedição do duelo entre Hamilton e Rosberg promete faísca, se há o maior interesse em ver como encaixam Vettel e Kimi Räikkönen na Ferrari, a Toro Rosso, a segunda equipa da Red Bull, oferece outro salero ao Mundial deste ano. Os dois pilotos escolhidos para substituir Jean-Éric Vergne (novo piloto de testes da Ferrari) e Daniil Kvyat (saltou para a Red Bull) na Toro Rosso são igualmente dignos de seguir. Os apelidos não deixam ninguém sem franzir a sobrancelha: um é Carlos Sainz Jr., filho do famoso piloto de WRC, que venceu dois ralis de Portugal em 1991 e 1995; o outro é filho de um ex-piloto de F1 e tem apenas 17 anos. Verstappen, lembra-se? Max sucede a Jos, que disputou 107 corridas entre 1994 e 2003.

UMA CASA ASSOMBRADA

Nem tudo é cor-de-rosa na Fórmula 1. O caso de Fernando Alonso, que deixou a Ferrari para se juntar à McLaren, é um bom exemplo. O espanhol despistou-se na curva 4 do Circuito da Catalunha dia 22 de fevereiro, mas as razões do acidente continuam no segredo dos deuses. Há dúvidas sobre se Alonso desmaiou antes ou depois do embate. Certo é que esteve inconsciente e a memória até lhe roubou 20 anos de vida: acordou em 1995 e disse que era piloto de karts e que queria chegar à Fórmula 1. Agora estará ausente no GP da Austrália.

Na Sauber, uma das equipas que luta para sobreviver neste circo, sobram pilotos. O imbróglio é fácil de explicar: Marcus Ericsson e o brasileiro Felipe Nasr foram contratados para conduzir o monolugar com motor Ferrari C34 em 2015, mas Giedo Van der Garde, um piloto de testes que acabou por atuar em sete corridas de 2014, ganhou a batalha judicial, na qual alegava ter-lhe sido prometido um lugar na Sauber para a época 2015. E ganhou. A scuderia defendeu-se afirmando que colocar um piloto que nunca conduziu o carro nem fez testes colocará problemas de segurança. O melhor é ler o artigo que o Observador escreveu sobre o tema. No primeiro dia de testes na Austrália o holandês até apareceu na pista, mas ficou a ver os outros (ver aqui).

Se estes casos pontuais são preocupantes, os problemas financeiros prometem ser uma valente dor de cabeça. A Caterham e a Marussia, por exemplo, desapareceram. Já as frágeis Sauber, Force India e Lotus continuam a bater-se para aguentar na F1. Sim, já se trata de resistir e pagar contas, e não tanto montar espetaculares carros competitivos. Garantir novos patrocinadores e suportar o crescimento colossal em 18 milhões de euros do orçamento das equipas, que resultou da nova aposta em motores híbridos, é um desafio espinhoso. E isto assusta aqueles que pensam o desporto e vivem dele, ou que simplesmente o amam.

Bernie Ecclestone, o homem forte da F1, pondera ajudar estas três equipas em dificuldades, embora existam suspeitas de que se prepara para revolucionar o desporto: menos equipas e um terceiro carro estará em cima da mesa. Essa ideia já tinha sido falada em setembro. “Penso que o deveríamos fazer de qualquer forma. Eu preferia ver a Ferrari com três carros, ou outra equipa de topo com três carros, do que ter equipas a lutar para resistir”, admitiu Ecclestone. 

Jenson Button, campeão do mundo em 2009, mostrou algumas reservas na altura: “Sempre tivemos equipas mais pequenas. É bom tê-los, há muitas personalidades. Óbvio que seria bom se eles não tivessem problemas em resistir [na F1] e que pudessem ser mais competitivos. Mas sempre foi assim na Fórmula 1.”

Se falarmos de receitas televisivas, o futebol e o basquetebol roubam cada vez mais o protagonismo à F1. Segundo o Financial Times (FT), a Premier League vendeu os direitos de transmissão dos jogos por qualquer coisa como sete mil milhões de euros por três anos (apenas no Reino Unido), enquanto o acordo da NBA é mais alargado: quase 23 mil milhões de euros durante nove anos. A F1 recebe menos de dois mil milhões por ano, o que não é assim tão pouco. Mas o FT aponta que as vendas de bilhetes, o interesse das pessoas e o número de participantes estão a descer.

O GP da Alemanha, por exemplo, até corre riscos de não acontecer. Para compensar garantiu-se mais uma corrida no Médio Oriente: Qatar junta-se a Abu Dhabi e Bahrain.

Voltando à Fórmula 1, aquela dos motores furiosos a roncar, dos pneus a deixar a pele espalhada pelo asfalto, o FT aventura-se na previsão do futuro: o jornal britânico rejeita a ideia de a Ferrari ser candidata ao título. Por outro lado, a Mercedes, que só não venceu três corridas no ano passado, estará ainda melhor e com o carro mais afinado. Restam então Red Bull e McLaren para lhes fazerem frente. Os segundos começam com uma contrariedade dura: a ausência de Fernando Alonso. Quanto ao safety car, será esta beleza:

TOP-10 no Mundial de F1 de 2014:

1. Lewis Hamilton – 384 pontos

2. Nico Rosberg – 317

3. Daniel Ricciardo – 238

4. Valtteri Bottas – 186

5. Sebastian Vettel – 167

6. Fernando Alonso – 161

7. Felipe Massa – 134

8. Jenson Button – 126

9. Nick Hülkerberg – 96

10. Sergio Pérez – 59