José Sócrates vai continuar em prisão preventiva, segundo a indicação do procurador do processo, Rosário Teixeira. Depois de o ex-primeiro-ministro ter recusado a alteração da medida de coação de prisão preventiva para prisão domiciliária com pulseira eletrónica proposta pelo Ministério Público, o MP considerou que deixava de fazer sentido alterar a situação existente.

Segundo o Ministério Público, “subsiste ainda de forma significativa, o perigo de perturbação do inquérito – de perturbação da recolha e da conservação da prova – mantendo-se também, ainda que de forma mais diminuta, o perigo de fuga”. Perigos esses que só poderiam ser controlados através da “permanência na habitação” e “proibição de contactos com os outros intervenientes processuais”, um controlo que só seria possível “através de vigilância eletrónica”. Como o arguido recusou essa medida, a única alternativa foi manter a preventiva.

“Não havendo consentimento à utilização deste meio de controlo à distância, considerou o Ministério Público que a substituição da prisão preventiva ficou inviabilizada, por entender que a medida proposta era a única que acautelava os perigos acima referidos”, diz o comunicado do MP.

Logo depois da proposta do MP, o juiz Carlos Alexandre acatou a proposta do procurador Rosário Teixeira, como é habitual nestas situações. “O Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) proferiu decisão de acolhimento da promoção, mantendo a medida de prisão preventiva”, lê-se numa nota daquele Tribunal.

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“Após a promoção do Ministério Público de substituição da prisão preventiva de José Sócrates pela obrigação deste permanecer na habitação com vigilância eletrónica, o arguido opôs-se à implementação dos mecanismos inerentes à vigilância eletrónica que carecia do seu consentimento, em pronúncia escrita remetida ao tribunal. O Ministério Público notificado da posição do arguido e em face desta promoveu então a manutenção da medida de prisão preventiva pelos fundamentos anteriormente invocados. O Tribunal Central de Instrução Criminal proferir decisão de acolhimento da promoção mantendo a medida de prisão preventiva”, diz o comunicado do TCIC.

A defesa de José Sócrates já se pronunciou e prometeu que ia recorrer da decisão. Mas antes, disparou várias críticas em direção ao juiz Carlos Alexandre e ao procurador Rosário Teixeira. Em declarações aos jornalistas, à porta do Estabelecimento Prisional de Évora, João Araújo começou por dizer que a “defesa não foi notificada, nem convidada a pronunciar-se sobre essa segunda promoção o que é, obviamente, mais uma ilegalidade das muitas que têm ocorrido neste processo”.

Mas a toada de críticas aos responsáveis pela investigação não ficaria por aqui. Além de falar diversas vezes em “ilegalidades” e “vícios” em todo o processo, João Araújo acredita que a decisão de manter José Sócrates em prisão preventiva não passa de “uma vingança mesquinha do sr. procurador  Rosário Teixeira e do sr. juiz Carlos Alexandre, contra uma proposta  a que o arguido que se recusou a vergar. O sr. engenheiro José Sócrates já demonstrou que não se verga, nem quebra”.

Para a defesa de José Sócrates, as propostas do Ministério Público não são mais do que uma manobra de diversão para desviar as atenções da fragilidade do processo construído contra o ex-primeiro-ministro. “[Rosário Teixeira e Carlos Alexandre] estão determinados a ir libertando em prestações suaves para não se notar tanto, para não se perceber tanto”, denunciou João Araújo, acrescentado depois que José Sócrates não iria pactuar com isso.

O advogado voltou a reforçar a ideia de que José Sócrates continua sem saber que factos concretos suportam o processo. “Depois de seis meses e meio” não há ainda qualquer facto concreto que justifique a detenção e a prisão preventiva de Sócrates no âmbito da “Operação Marquês”. À porta da cadeia de Évora, João Araújo defendeu, mais uma vez, que este processo resultava de uma “perseguição pessoal” e “política” ao ex-primeiro-ministro.

“José Sócrates não ficou surpreendido, nem desiludido, nem pasmado [com esta decisão]. Trata-se, como vos disse, de uma vingança. Seis meses sem que um único facto relativo à tal corrupção. (…) Isto excede todas as capacidades de compreensão que as pessoas possam ter. (…) Isto é uma perseguição pessoal e politica. Eu como advogado não consigo reconhecer o Direito neste tipo de comportamento”, disse João Araújo.

Os argumentos e as expressões utilizadas por João Araújo são, em tudo, semelhantes às utilizadas por José Sócrates na carta enviada ontem ao juiz Carlos Alexandre e, ao mesmo tempo e com o mesmo conteúdo, às redações de alguns órgãos de comunicação social. No comunicado, o ex-primeiro-ministro garante que está há “seis meses sem acusação”, defende que a sua prisão serviu apenas para o tentar “quebrar e calar” e acusou o MP de estar a tentar “disfarçar o erro original e o sucessivo falhanço” da investigação com um “instrumento de suavização” sob a forma de pulseira eletrónica.

Recorde-se que depois de ter recebido a carta em que o ex-primeiro-ministro elencava os motivos pelos quais não aceitava a pulseira eletrónica (a única das medidas que os arguidos podem recusar), o juiz dispensou a presença de Sócrates em Lisboa e consultou o MP sobre se pretendia propor uma outra medida. A resposta chegou ao fim da tarde desta terça-feira e decisão de juiz seguiu-se-lhe.

A prisão preventiva terá de ser agora reavaliada num prazo de três meses. Se não for aceite o recurso de José Sócrates (que já anunciou que voltará a recorrer desta decisão), significa que até 9 de setembro o ex-primeiro-ministro continuará detido no estabelecimento prisional de Évora. Nessa altura, depois do verão, Portugal estará já mergulhado em período de pré-campanha eleitoral.

Sócrates é suspeito da prática dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.

Comunicado Completo do Ministério Público

Ao abrigo do disposto no art. 86.o, n.o 13, al. b) do Código de Processo Penal, a Procuradoria-Geral da República torna público o seguinte:

O Ministério Público, no âmbito do reexame dos pressupostos das medidas de coação, cujo prazo termina hoje, promoveu a alteração da medida aplicada ao arguido José Sócrates.

À semelhança do que aconteceu recentemente em relação ao arguido Carlos Santos Silva, foi promovida a substituição da prisão preventiva pela obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica.

O arguido José Sócrates não deu o consentimento à aplicação da vigilância eletrónica, consentimento que, nos termos da lei, é obrigatório.

Sobre o arguido recaem suspeitas da prática dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.

O Ministério Público entende subsistir, nesta fase da investigação, de forma significativa, o perigo de perturbação do inquérito – de perturbação da recolha e da conservação da prova – mantendo-se também, ainda que de forma mais diminuta, o perigo de fuga. Estes perigos poderiam ser acautelados com a substituição da prisão preventiva pelas medidas de coação de obrigação de permanência na habitação somada à proibição de contactos com os outros intervenientes processuais, desde que o respetivo cumprimento fosse fiscalizado através de vigilância eletrónica.

Não havendo consentimento à utilização deste meio de controlo à distância, considerou o Ministério Público que a substituição da prisão preventiva ficou inviabilizada, por entender que a medida proposta era a única que acautelava os perigos acima referidos.

O inquérito encontra-se em segredo de justiça.

Comunicado do Tribunal Central de Instrução Criminal

Após a promoção do Ministério Público de substituição da prisão preventiva de José Sócrates pela obrigação deste permanecer na habitação com vigilância eletrónica, o arguido opôs-se à implementação dos mecanismos inerentes à vigilância eletrónica que carecia do seu consentimento, em pronúncia escrita remetida ao tribunal. O Ministério Público notificado da posição do arguido e em face desta promoveu então a manutenção da medida de prisão preventiva pelos fundamentos anteriormente invocados. O Tribunal Central de Instrução Criminal proferiu decisão de acolhimento da promoção mantendo a medida de prisão preventiva”.