Normalmente, um artigo deste género começaria por revelar a identidade dos dois chefs, ambos de restaurantes muitíssimo bem cotados na lista World’s 50 Best. Infelizmente para quem nos lê, isso não pode acontecer, pelo menos para já. Tudo por respeito ao espírito da segunda edição do festival Gelinaz Grand Shuffle, criado pelo jornalista e gastrónomo italiano Andrea Petrini, e que se baseia, precisamente, na surpresa: 40 chefs de alguns dos melhores restaurantes do mundo, incluindo os lisboetas Belcanto e Loco foram baralhados e repartidos pelos respetivos restaurantes. Ou seja, tal como José Avillez (Belcanto) e Alexandre Silva (Loco) estão, por esta altura, em destinos incertos, outros dois chefs estão em Lisboa para esta quinta-feira à noite tomarem conta de cada uma dessas cozinhas.

O Observador — que escreveu sobre o evento quando este foi apresentado — esteve com os dois chefs, sabe quem são e o que têm preparado. Mas só quinta-feira às 20h é que poderá ser revelada a sua identidade, através da plataforma Gelinaz. Tanto um como o outro têm dividido o seu tempo entre briefings e preparações nas cozinhas de Loco e Belcanto e visitas a mercados locais, que também serviram de inspiração à construção dos respetivos menus.

Processed with VSCO with a6 preset

Era este o cenário na cozinha do Loco durante a preparação do jantar Gelinaz.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

O/a chef que vai ocupar o lugar de Avillez, por exemplo, só decidiu o primeiro prato que irá servir depois de ter provado as folhas de uma begónia numa florista de Lisboa. Já quem veio substituir Alexandre Silva foi com Ana Músico e Paulo Barata, da Amuse Bouche, também eles peças fundamentais neste evento, à Meca dos citrinos em Portugal, o Lugar do Olhar Feliz. E não foi de mãos a abanar: da sua terra-natal trouxe um citrino que não fazia parte da extensíssima coleção de Jean Paul Brigand. Já em Lisboa, terá caído no goto de Açucena Veloso, a carismática peixeira do Mercado 31 de Janeiro.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

As equipas de cada restaurante têm, como é óbvio, acompanhado de perto os dois convidados. Ontem à tarde, no Loco, por exemplo, decidiam-se os vinhos que vão acompanhar a contenda. Uma tarefa menos fácil do que se possa pensar. “A minha comida é muito difícil de emparelhar com vinhos”, explicava o/a chef mistério. Sérgio Antunes, o sommelier da casa, desdobrava-se em sugestões a cada comentário. A dada altura, já eram tantas as garrafas em cima da mesa que o/a convidado/a pediu que lhe tirassem uma fotografia para enviar para casa: “É para verem como estou a trabalhar no duro”, disse a sorrir.

Processed with VSCO with c1 preset

A reunião um dia antes do jantar, no Loco, começou assim e acabou com uma mesa cheia de garrafas para decidir o pairing de vinhos. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Cada chef trouxe consigo alguns produtos de casa. Não muitos — o menu devia ser influenciado pelo destino final. “Trouxe poucos ingredientes mas são mágicos”, disse o/a chef (temporário) do Belcanto. Entre eles, coisas como salsichas de cavalo ou caranguejo real. Também queria trazer pão de centeio mas teve de se contentar com o que arranjou em Portugal. “Não é bem o que pretendo mas vai ter de servir”, explicava, enquanto David Jesus, o braço-direito de Avillez, distribuía trabalho pela restante equipa do restaurante. A tecnologia facilita — no telemóvel do/a chef mistério estavam todos os pratos e as respetivas descrições.

À despensa do Belcanto, por sua vez, chegaram especiarias diversas, açúcar de côco ou uma pasta de camarão fermentado. Alguns pratos vão ser picantes — será uma pista? — e é importante que a equipa saiba exatamente como é que devem ser servidos, parte importante da experiência no restaurante. Outra será o momento cénico preparado para receber os convidados (os bilhetes estão esgotados há meses) e marcar o início da refeição, às 20h em ponto. Convém, por isso, chegar a horas.