O défice orçamental ficou nos 2,1% no ano passado, mais baixo que a meta do Governo no Orçamento do Estado para 2016 e que as previsões das instituições internacionais, anunciou esta sexta-feira o Instituto Nacional de Estatística, na primeira notificação a Bruxelas ao abrigo do Procedimento para os Défices Excessivos. Sem perdão fiscal e programa de reavaliação de ativos, défice teria ficado nos 2,4%.

Este registo é o mais baixo desde o 25 de abril de 1974 e deverá permitir a Portugal sair da situação de défice excessivo ainda este ano, caso os números sejam confirmados pelo Eurostat e se a Comissão Europeia, depois de publicar novas previsões (no início de maio), considerar que a trajetória de redução do défice é sustentável.

De acordo com o INE, o défice orçamental em 2016 atingiu os 3.807,3 milhões de euros. O valor final acaba assim quase 320 milhões de euros abaixo do esperado pelo Governo no início do ano, altura em que esperava que a economia crescesse 1,8%, e não os 1,4% que se vieram a verificar.

Já comparando com a meta revista do défice que o Governo entregou à Assembleia da República no início de outubro, no relatório do Orçamento do Estado para 2017, o défice fica três décimas abaixo – a meta foi revista para 2,4% do PIB -, com as administrações públicas a gastarem menos 730,7 milhões de euros que o previsto.

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A meta mais recente seria cumprida mesmo sem as receitas previstas com o perdão fiscal, o programa PERES, e o programa de reavaliação de ativos, que juntos renderam aos cofres públicos 655 milhões de euros só no ano passado, o equivalente a 0,35% do PIB.

No entanto, sem estes dois programas a meta de 2,2% nunca seria cumprida, mesmo que a economia crescesse 1,8% como o Governo previa no início do ano, ficando ainda perto dos 2,4%.

Se o défice orçamental bateu as previsões, a dívida pública foi em sentido contrário. Em parte devido à angariação nos mercados de dinheiro suficiente para o aumento de capital da Caixa Geral de Depósitos, que só aconteceu este ano, a dívida aumentou 1,4 pontos percentuais, para os 130,4% do PIB, quase mais 2.600 milhões de euros que a dívida do ano passado.

Saída do Procedimento por Défices Excessivos mais perto

Com o resultado alcançado no ano passado, Portugal está mais perto de acabar um longo período de dentro do Procedimento por Défices Excessivos, que no ano passado teve o momento mais crítico com a ameaça de sanções.

As garantias dadas pelo Governo a Bruxelas – entre elas pelo menos 445 milhões de euros de cativações transformadas em cortes permanentes – permitiram a Portugal evitar uma multa e um congelamento, ainda que parcial e temporário, dos fundos estruturais.

O resultado agora alcançado permite ao Governo pedir o cancelamento do Procedimento, mas a decisão ainda depende da avaliação Comissão Europeia. O Executivo comunitário vai esperar pelos dados do Eurostat a confirmar os números do INE, em abril, e com base nesses números fará novas previsões para Portugal (e os restantes países da União Europeia). Se nessas previsões, o futuro próximo de Portugal mostrar um défice orçamental abaixo dos 3%, então Portugal sairá, provavelmente em meados de maio, do Procedimento por Défices Excessivos.

A grande dúvida aqui é o impacto que pode ter a Caixa Geral de Depósitos nestas previsões. Mesmo que a Comissão Europeia possa, por decisão política, querer ignorar um aumento do défice provocado por ajudas ao setor financeiro, a verdade é que as regras do PDE obrigam a que o impacto do setor financeiro seja tido em conta. Se o aumento de capital da CGD terá o ou não impacto no défice, é uma questão que vai ser avaliada pelo Eurostat, que deverá ainda ter de tomar uma decisão sobre a forma como essa contabilização, a ser decidida, vai ser registada, já que se não conseguir as imparidades aos anos em que aconteceram, todo o impacto pode ser concentrado no ano em que o aumento de capital é feito: 2017.

O que muda para Portugal

A saída do Procedimento por Défices Excessivos tem impactos práticos diretos e indiretos. Começando pelas regras, se Portugal sair do Procedimento passará a estar sujeito a menos controlo por parte da Comissão Europeia, sobre a evolução das suas contas públicas.

A saída do PDE dá ainda a possibilidade a Portugal de poder aceder à cláusula de flexibilidade prevista nas regras orçamentais europeias, que permite aos países, mediante pedido e autorização prévia da Comissão, ter uma derrapagem nas contas públicas a conta de investimentos e reformas estruturais que possam conduzir a um maior crescimento económico no futuro.

A forma como Portugal passará a ser avaliado pela Comissão Europeia também passará a ser diferente. Isto porque se até agora o objetivo principal era conseguir que o défice ficasse abaixo de 3%, com a saída do PDE a Comissão passa a exigir de Portugal um ajustamento estrutural mínimo que conduzam as contas públicas tendencialmente em direção ao equilíbrio. Se no passado recente, em virtude do objetivo do défice nominal, Bruxelas fechou os olhos ao continuo incumprimento de Portugal desta regra, daqui em diante deverá ser mais exigente.