Portugal necessita de uma nova abordagem à inovação para passar a ser considerado mais do que apenas um “inovador moderado“, abaixo da média europeia, como foi considerado por um estudo recente da Comissão Europeia. Com esse objetivo, a COTEC Portugal associou-se à consultora EY para definir “Uma nova arquitetura da inovação empresarial em Portugal”, um relatório em que além de se rebaterem alguns “mitos” relacionados com a inovação também se fazem cinco recomendações para fomentar a cultura inovadora nas empresas.

Além de ser considerado, pelo European Innovation Scoreboard (EIS), um “inovador moderado” — o que não é brilhante numa escala dividida em “inovadores líderes, fortes, moderados e modestos”–, Portugal foi, também, considerado apenas o 31º país mais inovador do mundo num estudo publicado pela Universidade de Cornell, pelo INSEAD e pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual.

Os resultados não são famosos, sobretudo tendo em conta que um estudo da EY revelou que não falta em Portugal ambiente político, económico e regulamentar propício à inovação. Os principais desafios, contudo, estão ligados à qualificação dos recursos humanos (e a retenção dos quadros mais qualificados); o investimento das empresas em investigação e desenvolvimento (I&D), que é “muito dependente” do Estado; ao baixo grau de colaboração existente entre as empresas, o Estado, universidade e centros tecnológicos; e o baixo grau de maturidade tecnológica do mercado.

Não basta responder com maior eficiência e rapidez aos clientes de hoje, é igualmente necessário antecipar as prioridades dos clientes de amanhã, não só dos atuais, mas acima de tudo antecipar as necessidades de outros clientes potenciais, identificando em que nichos e sectores estarão os maiores problemas”, afirma Francisco Lacerda, presidente da direção da COTEC Portugal.

O relatório defende que “a inovação não é abstrata nem aleatória” — isso é “um mito”. Ao invés, a inovação deve ser vista como “uma competência da empresa trabalhada de forma contínua e sustentada”. Outro “mito” é que a inovação passa por “novos produtos ou tecnologia”. “A inovação existe além de produtos existentes ou novos: a captura de maior valor é frequentemente ao nível de modelo de negócio e procura da próxima geração da procura”, lembra o relatório.

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São, também, “mitos” que a inovação não possa ser “aprendida” ou que seja uma responsabilidade exclusiva dos departamentos de I&D: “apesar de a competência de I&D ser importante para a extração de valor, muitas ideias inovadoras vêm de outras unidades de negócio”, defendem a consultora EY e a COTEC, uma associação empresarial para a promoção da inovação e a cooperação tecnológica empresarial.

O desafio das empresas é renovar o negócio presente enquanto criam o negócio do futuro. Trata-se de um exercício de liderança e de gestão muito exigente pela necessidade de realocar recursos, gerir diferentes horizontes, e criar novas competências assentes nas existentes”, afirma Jorge Portugal, diretor-geral da COTEC Portugal.

Rebatidos estes “mitos”, a COTEC e a EY fazem um conjunto de “recomendações para a ativação sustentável de competências de inovação“.

Alinhar a estratégia de inovação e de negócio

É necessário envolver toda a gente, internamente, e obter as perspetivas de todos sobre o negócio atual, o que pode passar por entrevistas e workshops. Esse será um contributo importante para identificar mudanças nas necessidades do consumidor e novas tendências no negócio. Sinónimo: identificar oportunidades e ameaças.

Introduzir uma “visão ambidextra” no negócio

Para estruturar a inovação numa empresa a COTEC/EY recomendam uma sequência de três etapas que vão ajudar a introduzir o que se chama de “visão ambidextra”. A primeira dessas três etapas passa por identificar as competências internas (o que ajuda, também, a perceber em que competências é preciso investir mais). Depois, recomenda-se que seja desenhado um ecossistema externo de inovação, encontrando parceiros fora da empresa que possam estimular o progresso e a inovação (idealmente, tanto na empresa em questão como nas parceiras) — são, no fundo, modelos de open innovation. Finalmente, é boa ideia definir horizontes temporais sobre os objetivos que se querem atingir e em que momento.

Ajustar o modelo organizacional e o grau de abertura ao exterior

É um diagnóstico frequentemente feito à generalidade das empresas portuguesas: são muito fechadas sobre si mesmas. Uma grande proporção das Pequenas e Médias Empresas (PME), preponderantes no tecido empresarial português, tem uma governança com contornos de empresa familiar (ou pouco mais). E, também por essa razão, há uma tendência para olhar para as outras empresas como concorrência (e muito poucas vezes como possíveis parceiros). Mas a COTEC e a EY defendem que não só é importante uma abertura ao exterior outside in, em que se obtém “conhecimento do ecossistema para fazer face a desafios e desenvolver competências”, como, também, uma abertura inside out, em que se “partilha conhecimento com o ecossistema para antecipar desafios e criar oportunidades”. Mas também fará sentido, em muitos casos, ajustar o modelo organizacional dedicado à inovação — como, por exemplo, o programa da Google “20% Time”, em que os empregados dedicam um quinto do seu tempo a ideias inovadoras que acreditam poderem beneficiar a empresa no longo prazo.

Organizar o processo de inovação com ferramentas próprias

Tão importante como o empenho no processo de inovação é a organização desse mesmo processo. E existem ferramentas e métodos próprios que podem dar uma ajuda valiosa. A COTEC e a EY recomendam o método “Real-Win-Worth”, ou RWW, que ajuda a esquematizar as hipóteses de sucesso e fracasso, além dos riscos potenciais. Há, também, matrizes de avaliação de risco que criam um ponto de partida visual sobre a diversidade do portefólio de projetos. Esse tipo de matrizes vai ser útil para categorizar os projetos conforme o nível de ambição e conforme as áreas de foco na cadeia de valor.

Transformar a cultura de inovação: colaboração, criatividade, autonomia e comunicação

A transformação cultural na empresa, que começa pelo topo da estrutura, implica desenvolver quatro competências cruciais nos colaboradores: promover a colaboração entre equipas multidisciplinares, que “permite romper silos de informação”; incorporar criatividade nas rotinas diárias das equipas, ajudando a identificar oportunidades de melhoria; promover a autonomia e a capacidade de identificar situações de execução concreta das ideias geradas; e estimular a “comunicação frequente e o diálogo aberto sobre ideias, riscos e oportunidades”.

“Comece pequeno, pense grande. Se falhar, falhe rápido — e aprenda com isso”, remata o relatório.