A cerimónia de abertura do Ano Judicial realiza-se esta terça-feira marcada por uma onda de greves no setor e uma manifestação de funcionários judiciais em frente ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em Lisboa, onde decorre o evento.

O acto solene, presidido pelo Presidente da República, assinala a estreia da procuradora-geral da República, Lucília Gago, e do presidente do STJ, António Joaquim Piçarra, nas intervenções que fazem parte daquele ritual judiciário.

Juízes, procuradores, funcionários judiciais, inspetores da PJ, guardas prisionais e trabalhadores dos Registos são os profissionais da justiça que têm vindo a realizar ou a marcar greves contra as políticas do Governo, contestando a revisão dos estatutos profissionais, as tabelas remuneratórias, congelamento das promoções e a falta de pessoal, entre outras reivindicações.

A cerimónia decorrerá numa altura em que o Pacto de Justiça, aprovado pelas profissões forenses em janeiro de 2018, ainda não foi implementado, apesar das grandes expectativas criadas pelo desafio para a criação de um Pacto de Justiça alargado lançado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimónia de abertura do Ano Judicial de 2016.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Após vários reveses, juízes, procuradores do Ministério Público, solicitadores e funcionários judiciais aprovaram, em janeiro do ano passado, um entendimento alargado sobre várias matérias.

Alterações nos mecanismos de cobrança, penhoras e vendas e nos regimes de custas e criação de mecanismos de agilização da investigação e repressão dos crimes económico-financeiros são algumas das 80 medidas do Pacto de Justiça. Unificação das jurisdições comum e administrativa e fiscal e especialização dos tribunais superiores constavam também do pacto.

Defronte do STJ – que fica ao lado do Ministério da Justiça – ocorrerá também hoje uma manifestação dos funcionários judiciais, que nos últimos meses de 2018 realizaram uma greve parcial. Estes trabalhadores protestam contra o congelamento das promoções, o atraso na revisão do estatuto, défice de pessoal e recuperação de tempo de serviço.

A cerimónia de abertura do Ano Judicial é marcada pelos discursos do bastonário dos Advogados, procuradora-geral da República, Ministra da Justiça, presidente da Assembleia da República, presidente do STJ e Presidente da República.

Juízes desmarcam dia de greve em janeiro após retoma de negociações

A Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP) desconvocou entretanto a greve marcada para 23 de janeiro, após terem sido reatadas as negociações com o Governo sobre as alterações ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, disse o presidente da ASJP à Lusa.

Manuel Soares explicou à agência Lusa que a decisão de suspender o dia de greve foi tomada após uma reunião com a Ministra das Justiça, que decorreu em dezembro, e com a posterior entrega aos juízes de uma proposta escrita sobre as matérias em causa.

Apesar da desconvocação da greve a 23 de janeiro, os juízes mantêm, por agora, os restantes dias já marcados até outubro.

A proposta escrita é tecnicamente complexa e estamos a analisá-la. Enquanto estamos a conversar e a discutir matérias que nos separam não nos parece razoável executar essa medida [greve] e por essa razão desmarcamos”, adiantou o presidente da associação sindical.

A desconvocação do dia de greve marcado para janeiro é, no entender da associação, “um sinal de abertura e disponibilidade para conversar” com o Governo sobre as matérias do Estatuto nas quais divergem.

Após um longo processo negocial que terminou com divergências e o cumprimento de dez dias de greve, o dirigente sindical congratulou-se com a disponibilidade para negociar mostrada agora pelo Governo.

Estamos em negociações formais ainda reservadas, mas já percebemos quais são as dificuldades do Governo e acho que o Governo já percebeu as dos juízes. Há matérias sobre as quais estamos de acordo, mas há algumas importantes sobre as quais não estamos de acordo ainda e não sabemos se é possível chegar”, frisou.

Sobre a possibilidade de serem desconvocados os restantes dez dias de greve marcados até outubro, Manuel Soares apenas lembrou que a ASJP marcou os protestos sempre na convicção de que não era preciso executá-los.

Nós marcámos estas greves com a esperança e convicção de que não era preciso realizá-las e mantemos esse desejo”, afirmou.

A greve de 21 dias intercalados, marcada entre 20 de novembro de 2018 ano e outubro deste ano, resulta da contestação em torno da proposta de revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), já aprovado na generalidade pela Assembleia da República e que a associação sindical considera estar incompleta, nomeadamente em matéria remuneratória.

Entende a ASJP que os juízes não podem aceitar que se aprove um Estatuto que não assegure de forma adequada o aprofundamento da independência judicial nem resolva bloqueios na carreira com quase três décadas, prolongando, com custos sociais desnecessários, um conflito que se arrasta já há demasiado tempo.