Os jogos dos apuramentos para Mundiais ou Europeus não opõem, normalmente, as seleções de qualidade teoricamente mais elevada. As regras dos sorteios da FIFA e da UEFA foram delineadas para evitar isso mesmo, a coexistência de seleções mais fortes nos mesmos grupos, de forma a dar mais chances às nações mais modestas e não esgotar as vagas de qualificação de cada grupo com os países ditos favoritos ou candidatos à conquista do título. Desta vez, porém, e com a introdução da Liga das Nações nas contas do apuramento para o Euro 2020, Holanda e Alemanha ficaram ambas no Grupo C e protagonizavam este domingo o jogo grande das duas primeiras jornadas da qualificação.

As duas seleções passam atualmente por uma fase de transformação: a Holanda falhou a qualificação para o Euro 2016 e o Mundial 2018 e a Alemanha, campeã do mundo em 2014, não conseguiu passar da fase do grupos do último Campeonato do Mundo que a seleção francesa acabou por vencer. Holandeses e alemães, dois colossos europeus, passam por um período de renovação que assenta numa nova geração, no caso dos primeiros, e no fim da geração anterior, no caso dos segundos.

Se a Holanda de Ronald Koeman é atualmente o resultado de uma vaga de talento que surge principalmente da formação do Ajax — como De Jong e De Ligt — mas não só, com Quincy Promes e Van Dijk à cabeça, a Alemanha de Joachim Löw fechou a era anterior e fechou também a porta aos veteranos Hummels, Müller e Boateng, fora das opções por decisão do próprio selecionador. Na qualificação para o Europeu, a seleção holandesa goleou a Bielorrússia na primeira jornada (4-0) e os alemães folgaram, disputando um particular com a Sérvia onde não foram além de um empate (1-1) que agudizou ainda mais as preocupações em relação aos objetivos a curto-médio prazo e tornou palpáveis as ressalvas em relação ao apuramento.

O avançado Ryan Babel foi o elemento mais perigoso dos holandeses durante a primeira parte

Na Johan Cruyff Arena e no dia em que se assinalam três anos da morte do médio que dá nome ao estádio do Ajax, a Holanda começou mais forte e encostou a Alemanha às cordas durante o primeiro quarto de hora, deixando à vista as fragilidades da Mannschaft na saída de bola. Koeman apostava em Depay enquanto elemento mais avançado, com o veterano Babel na ala direita e Promes na esquerda e um meio-campo sob a batuta de De Jong; do outro lado, Löw apostava em Gnabry e Sané (que, de forma polémica, ficou de fora das opções do selecionador para o Mundial) enquanto dupla atacante e apoiados nas costas por Goretzka, a funcionar como falso ’10’, e Kroos e Kimmich como pêndulo de ligação com a defesa.

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No final da primeira parte, o resultado espelhava uma máxima do futebol à qual se torna difícil fugir: onze contra onze e no final ganha a Alemanha. Os holandeses dominaram durante grande parte do tempo e restringiram os alemães aos últimos 30 metros do terreno mas Leroy Sané, na primeira ocasião de golo de que beneficiou, colocou a Alemanha em vantagem (15′). A Holanda poderia ter empatado em duas ocasiões, ambas com Babel a proporcionar enormes defesas a Neuer — que este domingo chegou às 86 internacionalizações, as mesmas que o histórico Oliver Kahn –, mas acabou por não conseguir concretizar e sofreu o segundo golo através de um enorme remate de Gnabry (34′). Quando chegou aos dois golos de vantagem, a Alemanha tomou conta do jogo e assentou no meio-campo contrário, falhando o terceiro apenas porque Cillessen respondeu da melhor forma a um cabeceamento forte de Kehrer. Ao intervalo, Koeman tinha nas mãos uma reviravolta muito complicada de executar contra uma Alemanha que parecia ter voltado ao cinismo de outros tempos.

No regresso para a segunda parte, o selecionador holandês surpreendeu e tirou Ryan Babel, que até estava a ser o elemento mais perigoso, para colocar o jovem Bergwijn. Os holandeses não poderiam ter começado o segundo tempo da melhor forma, com um cabeceamento de De Ligt em resposta a um enorme cruzamento de Depay que encurtou a desvantagem (48′). A Alemanha tentou baixar o ritmo da partida e procurou controlar com bola mas a pressão alta dos holandeses, cheia de intenção e vontade de ir em busca do resultado, acabou por concentrar a luta pela bola no meio-campo alemão e espaçar os setores da seleção de Joachim Löw, que foram perdendo ligação.

Memphis Depay, que marcou dois e deu outros dois a marcar contra a Bielorrússia, voltou a assumir o papel de líder da Holanda e aproveitou uma bola algo perdida já dentro da área alemã para atirar rasteiro para o empate (63′). A cerca de meia-hora do apito final, a seleção holandesa já tinha anulado a desvantagem e estava totalmente galvanizada para procurar a segunda vitória em dois jogos no apuramento para o Euro 2020. A partida acabou por cair em qualidade e velocidade até ao fim mas a Alemanha não se tinha esquecido da máxima do futebol que tinha deixado patente no primeiro tempo. Reus, que só não foi titular porque apresentou queixas físicas nos últimos dias, entrou nos instantes finais e ainda foi a tempo de assistir Schulz para o golo da vitória no último minuto (2-3). No fim de uma segunda parte em que foram em tudo inferiores aos holandeses, uma lição de eficácia dos alemães, que provaram este domingo que o cinismo de outros tempos está mesmo de volta.

Nos outros jogos deste domingo a contar para a qualificação para o Euro 2020, a Rússia goleou o Cazaquistão com um bis de Cheryshev (0-4), o País de Gales de Bale venceu a Eslováquia de Hamsik (1-0), a Escócia venceu San Marino (0-2), Israel venceu a Áustria (4-2), a Hungria surpreendeu e venceu a Croácia de Modric e Rakitic (2-1), a Bélgica de Hazard venceu o Chipre (0-2), a Eslovénia de Oblak empatou com a Macedónia de Ristovski (1-1), a Polónia de Lewandowski venceu a Letónia (2-0) e a Irlanda do Norte venceu a Bielorrússia (2-1).