O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, testou positivo para Covid-19. A notícia foi confirmada pelo próprio, numa conferência de imprensa esta terça-feira à tarde, que adiantou ainda estar “bem” e que, para isso, terá contribuído um tratamento com hidroxicloroquina.

“Eu estou muito bem, estou até com vontade de dar uma caminhada. Não o vou fazer, por recomendação médica, mas estou muito bem”, disse.

Jair Bolsonaro disse ainda que vai continuar a trabalhar — “Vou ficar despachando por videoconferência”, disse —, mas, ainda assim, cancelou uma viagem ao estado da Bahia.

Criticado dentro e fora de portas pela gestão da pandemia — cuja contagem oficial foi suspensa, mas que, de acordo com o consórcio dos media brasileiros, já matou 65.631 pessoas e infetou mais de 1 milhão de habitantes —, Jair Bolsonaro voltou a desvalorizar a Covid-19.

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“É como uma chuva: vai atingir você, [mas] alguns não. Alguns têm de tomar cuidado com esse fenómeno. Agora, acontece, infelizmente acontece. Repito que nas pessoas com certa idade, certa saúde ou comorbilidade [doenças associadas] a chance de óbito aumenta bastante”, disse, referindo que, ainda assim, ele próprio não faz parte de um grupo de risco.

A 24 de março, Jair Bolsonaro disse que a Covid-19 seria para a maioria das pessoas uma “gripezinha” e garantiu que, pelo seu “histórico de atleta”, a doença não o preocupava. “Nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou um resfriadinho”, disse à altura. Quatro dias antes, já tinha avisado: “Depois da facada, não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar”, referindo-se à facada de que foi alvo durante a campanha eleitoral presidencial.

Desde então, o Presidente brasileiro tem-se desdobrado em declarações para desvalorizar a gravidade da doença. Bolsonaro já se referiu à Covid-19 como sendo uma “fantasia”, algo “que não é isso tudo que os grandes media propagam” e um vírus que trouxe “histeria”. Disse ainda que a situação no Brasil dificilmente se assemelharia à situação de Itália e Espanha porque “o brasileiro tem que ser estudado, não pega nada”. “Vê o cara pulando em esgoto, sai, mergulha e não acontece nada”, acrescentou. Neste momento, o Brasil é o segundo país do mundo com mais casos e mais mortes registados até ao momento, ficando apenas atrás dos EUA.

Agora, perto do fim da conferência de imprensa, Bolsonaro deu alguns passos atrás, afastando-se dos jornalistas presentes, e tirou a máscara. “Eu estou bem tranquilo, graças a Deus, tudo em paz”, disse já sem máscara. “Aos que criticaram, não tem problema, podem continuar criticando à vontade. Afinal de contas, nós preservarmos a liberdade de expressão, que entendemos como um dos pilares da nossa democracia.”

A fechar, fez um apelo para que a população mais idosa tenha cuidado com o vírus e deixou uma mensagem de tranquilidade aos mais novos.

“Vamos tomar cuidado, em especial os mais idosos, que têm comorbilidade”, disse. “Aos mais jovens: tomem cuidado, mas, se forem acometidos pelo vírus, fiquem tranquilos porque, para vocês, a possibilidade de algo mais grave é próxima de zero.”

O secretário-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS) desejou entretanto uma “recuperação rápida” ao Presidente brasileiro. Em conferência de imprensa a partir da sede da OMS, em Genebra, Tedros Ghebreyesus afirmou esperar que “os sintomas sejam ligeiros e que [Bolsonaro] volte ao trabalho o mais cedo possível para apoiar o seu país”.

Tratado com hidroxicloroquina, o fármaco da discórdia

“A hidroxicloroquina na fase inicial tem uma chance de sucesso por volta de 100%”, disse Jair Bolsonaro, fazendo uma afirmação que não tem qualquer respaldo científico.

O medicamento tornou-se num dos temas mais quentes do debate em torno da pandemia, especialmente dentro do Brasil, após a insistência por parte de Bolsonaro para que todos os doentes com Covid-19 fosse tratados com aquele fármaco, criado originalmente para combater a malária. Esta posição levou à demissão de dois ministros da Saúde do Brasil: Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, ambos médicos. Atualmente, o ministério está a cargo do militar Eduardo Pazuello. “Ele é ruim de imprensa, mas é excelente como gestor na saúde. A gente precisava há muito tempo de alguém com esse perfil”, explicou o presidente, referindo, ainda assim, que ele “não vai ficar lá para sempre”.

O uso de hidroxicloroquina (que também foi defendido por Donald Trump, que chegou a dizer que tomava aquele fármaco de forma preventiva) não reúne consenso dentro da comunidade científica. No domingo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) tomou a decisão de descontinuar o uso daquele fármaco em doentes hospitalizados por Covid-19.

Teste em março deu negativo

A primeira vez que Jair Bolsonaro foi testado para a Covid-19 foi a 12 de março, na sequência de uma visita oficial aos EUA. Apesar de várias pessoas da sua comitiva, incluindo o seu porta-voz, terem testado positivo, o Presidente do Brasil não foi infetado pelo vírus SARS-CoV-2 naquela data.

À altura, chegou a ser noticiado que Jair Bolsonaro tinha recebido um teste positivo para a Covid-19. A notícia foi inicialmente avançada pelo jornal O Dia e posteriormente reiterada pela Fox News, que contactou Eduardo Bolsonaro, deputado e filho do Presidente do Brasil. Este último viria, no entanto, a desmentir ter referido que o seu pai tinha Covid-19.

Depois de o próprio Jair Bolsonaro ter dito que não tinha Covid-19, seguiu-se um processo legal entre o jornal Estado de S. Paulo e a Advocacia-Geral da União (AGU, órgão que representa o Estado brasileiro nos tribunais), com aquele órgão de imprensa a exigir que fosse divulgado o relatório do teste. Só a 13 de maio é que foi divulgado o relatório na íntegra, onde se podia ler: “não detectado”.