Apenas 45 imóveis, provenientes do Alojamento Local (AL), foram registados na plataforma Renda Segura, segundo dados revelados pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), “num universo de 338 registos de 188 proprietários distintos”, dando origem a 177 candidaturas concluídas para arrendamento.
Entre estas casas a alugar pela autarquia, confirma-se que “45 são provenientes do AL e 83 são casas mobiladas”.

De acordo com o Registo Nacional de Alojamento Local, a cidade de Lisboa, a 31 de dezembro de 2019, contabilizava quase 25 mil estabelecimentos, e o Executivo contava atrair parte desses proprietários, a braços com uma crise sem precedentes no setor do turismo, para o Programa Renda Segura, desenhado pela CML para responder ao problema habitacional da cidade – e que consiste em arrendar casas a proprietários privados e subarrendá-las no regime de renda acessível com contratos nunca inferiores a cinco anos.

No entanto, olhando para os números, nesta primeira fase o objetivo não foi atingindo. E uma das razões por trás dos pouco mais de 45 alojamentos locais inscritos está a “falta de confiança” na legislação que enquadra a atividade, segundo revelaram ao Observador empresários ligados ao setor (sendo que a maioria preferiu não ser identificado). Todos reconheceram, no entanto, que o Renda Segura tem aspetos positivos, salientando a liquidez imediata e o fim da tributação de mais valias para quem proceda à transferência dos imóveis para o arrendamento habitacional durante 5 anos, mas a “falta de confiança” na legislação é o mais difícil de ultrapassar, como explica Fátima Barata, com dois apartamentos alocados ao AL em zonas de contenção da cidade (áreas específicas onde a CML impõe limites relativos ao número de estabelecimentos).

“Este negócio, nos últimos anos, sofreu profundas alterações legislativas, com agravamentos fiscais que colocaram em risco a sobrevivência do setor. Tenho, por isso, a sensação que fui empurrada contra uma parede para não ter opção e migrar para o arrendamento de longa duração. E, depois, quem me garante que daqui a cinco anos, no fim do contrato, a lei não é novamente alterada, e fico sem opções?”, questiona.

Dúvidas ampliadas com as palavras de Fernando Medina, esta semana, num artigo de opinião publicado no jornal britânico The Independent – onde assumia que “depois do coronavírus, Lisboa vai livrar-se dos “Airbnb” e transformar os arrendamentos de férias de curta duração em “casas para trabalhadores essenciais”.

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Eduardo Miranda, presidente da associação que representa o AL, ALEP, numa publicação do Facebook, manifestou “grande surpresa” no discurso escrito pelo presidente da Câmara de Lisboa, por se tratar de uma opinião “muito distinta” daquela que apresentou, “há poucas semanas”, à associação e, também, “nunca foi uma posição defendida por ele publicamente antes”.

Também Luís Newton, presidente da bancada do PSD na Assembleia Municipal de Lisboa, escreveu que Medina incentivou o alojamento local quando lhe era “politicamente expediente”, mas na presente crise posiciona-se para “espoliar pequenos empresários quando eles estão no seu momento mais frágil”. Para Newton, neste artigo Medina veio “reconhecer o falhanço das políticas de habitação pelas quais é responsável e que tanto jeito deram na sua projeção política quando equilibrava as contas da Câmara, às custa do IMT”.

Em entrevista à TVI, esta segunda-feira, Fernando Medina reconheceu ter-se tratado de uma “interpretação abusiva” do jornal britânico, (entretanto já corrigida), acrescentando que o alojamento local “teve uma importância para responder ao aumento da procura em Lisboa e por outro lado teve um papel na reabilitação da cidade”, afirmou. O autarca explicou, ainda, que o que quis dizer foi que “não podemos ter a mesma cidade” que existia antes da pandemia e que é “tempo de resolver problemas”.

Como seja a “falta de oferta de habitação” para “famílias e classe média”, em Lisboa, acrescenta Eduardo Miranda, e que dificilmente encontram uma solução no Programa Renda Segura. Os dados, divulgados pela CML, dão-lhe razão: T0, T1 e T2 foram as tipologias mais registadas, com um total de 129 imóveis, encontrando-se na plataforma apenas 48 habitações T3 ou mais. O valor médio da renda solicitada foi de 723 euros.

“Quem tem uma boa casa para alugar, espaçosa, no centro de Lisboa, não precisa de a colocar neste programa. Terá sempre procura. Mas quem valoriza a segurança, receando a falta de pagamento do inquilino, a Renda Segura pode ser uma boa opção”, conclui o presidente da ALEP, ressalvando, no entanto, que será sempre uma “pequena parcela” de proprietários.

Segundo a autarquia, das 177 casas propostas já foram realizadas vistorias a 78, sendo que estão agendadas mais 45. Depois do contrato celebrado, o imóvel transita para o site da Renda Acessível, onde os interessados vão poder candidatar-se. O próximo concurso de Renda Acessível deverá abrir “durante o mês de julho”, integrando já as casas arrendadas a proprietários privados no Renda Segura.

A CML revelou, ainda, que foram apresentadas candidaturas em todas as 24 freguesias da cidade, com especial incidência em Santa Maria Maior e São Vicente, com 21 imóveis registados – e onde se concentra grande parte do AL em Lisboa – seguidas das freguesias da Ajuda e Arroios (13 em ambas) e Beato e Penha de França (com 10 em cada freguesia).

Dados que Eduardo Miranda, presidente da ALEP, já antecipava. “Este programa é uma alternativa para quem está desapontado com o negócio, porque chegou à conclusão que é mais trabalhoso do que pensava ou menos rentável. E nesta altura, a antecipação do pagamento de rendas é um argumento forte para quem precisa de equilibrar as contas. O mais importante é que haja um leque de escolhas e opções”.

The Independent muda título de opinião de Fernando Medina