O grupo de trabalho criado em janeiro para analisar o financiamento das instituições de ensino superior foi extinto pelo ministro Manuel Heitor, depois de os representantes dos politécnicos se terem demitido, por divulgação de “dados manipulados”.

“No domingo passado desfiz o grupo de trabalho apenas porque uma parte do grupo, nomeadamente os institutos politécnicos, terem denunciado a divulgação de dados que tinham sido facilmente manipulados“, disse esta quarta-feira o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior durante uma audição parlamentar.

Manuel Heitor respondia assim à deputada do PSD, Isabel Lopes, que o tinha questionado sobre se era verdade que o Governo se preparava para “retirar 40 milhões de euros do orçamento dos institutos politécnicos para distribuir pelas universidades de Lisboa, do Porto e do ISCTE”. Segundo Isabel Lopes, a proposta estava prevista num estudo da “iniciativa da reitora do ISCTE”, Maria de Lurdes Rodrigues, um “membro destacado do PS”.

“Ao que parece existem tentativas para secar ainda mais o financiamento, mas desta vez é secar o financiamento dos politécnicos favorecendo o das universidades”, acusou a deputada do PSD, questionando o ministro sobre se era verdade que iriam avançar com a transferência de verbas e se iria “ceder à pressão da Dr. Maria de Lurdes Rodrigues?”.

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Manuel Heitor negou a intenção de transferir verbas assim como ter sido pressionado por “qualquer reitor”, dando explicações sobre o caso que considerou ser “um não assunto”.

Depois de vários pedidos “por parte do Conselho de Reitores”, foi criado em janeiro deste ano um grupo de trabalho que contava com dois representantes do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e dois elementos do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) para analisar a distribuição do financiamento das instituições.

O grupo era coordenado pelo subdiretor do Instituto de Gestão Financeira da Educação (IGeFE) mas, até ao momento, tinha apenas feito “recolha de informação”, segundo explicou esta quarta-feira o ministro na comissão parlamentar de Educação.

Na sexta-feira Manuel Heitor esteve de manhã com o presidente do CRUP e durante o dia e fim de semana manteve reuniões com outros reitores até que, no domingo à noite, foi “surpreendido pelo CCISP”, quando, disse, foi informado por representantes dos institutos politécnicos de que “tinha havido uma manipulação abusiva da informação e que tinha sido apresentado um estudo interno pelo CRUP — são livres de apresentar estudos — que não correspondia à verdade e os membros do CCISP demitiram-se desse grupo”. Nesse momento, “decidi cancelar o grupo de trabalho. Aceitei a denúncia do CCISP”, explicou o ministro.

Manuel Heitor disse que se trata de “um não assunto”, considerando que “houve um grupo de trabalho que foi cancelado devido à denúncia de uma das partes desse grupo e, por isso, o trabalho continuará”.

De acordo com o ministro, tal como acontecia até aqui a missão de analisar o financiamento das instituições de ensino superior volta a ser uma função exclusiva do IGeFE, “como sempre foi feito”.

“O IGeFE “apresentará uma proposta que, em tempo oportuno, o Governo, depois de discutir a proposta do Orçamento do Estado para 2022, discutirá diretamente com o CRUP e o CCISP”, disse Manuel Heitor.

As declarações da deputada do PSD foram reprovadas pelo deputado do PS Tiago Estêvão Martins, que considerou uma “acusação muito grave a de associar a gestão de uma Instituição de Ensino Superior (IES) a um partido político por força do livre exercício de vida, de cidadania de um dos seus dirigentes”. “Isto é do mais abusivo e do mais grave que já foi dito nesta comissão. Espero que o PSD tenha tempo para se retratar”, disse Tiago Estêvão Martins.

As críticas recuaram ainda ao tempo em que o PSD era Governo.

Não nos cumpre alimentar ou fomentar conflitos entre IES, porque alias isso é uma política que vem de outros tempos, que certamente conhecerão melhor do que nós, de outros governos e acrescenta muito pouco a esta casa e ao sistema. Serve apenas quem tem como objetivo criar entraves à nossa preocupação em aumentar o financiamento do sistema como um todo”, disse o deputado socialista.

Também Manuel Heitor aproveitou para sublinhar que a sua equipa tem desenvolvido uma política de ensino superior de solidariedade e de trabalho em parceria que é “bem diferente da política que anteriormente o PSD tinha feito, que foi dividir para reinar”. Segundo Tiago Estêvão Martins “a grande preocupação é aumentar o bolo e fazê-lo numa perspetiva de solidariedade entre as instituições”.

Depois da declaração inicial do ministro em que salientou, entre outras coisas, o reforço feito no ensino superior e na ciência, a deputada do PSD, Isabel Lopes, foi a primeira a falar para contestar essa visão.

A social-democrata não aceitou os números apresentados pelo ministro, alertando que “não há capacidade para a manutenção das instalações, para a renovação de equipamentos e redes informáticas e para travar o declínio de muitos dos laboratórios existentes”.

Em resposta, Manuel Heitor voltou a defender que “o financiamento das IES tem uma sustentabilidade financeira clara e adequada”, sublinhando a sua missão de manter o contrato de legislatura que prevê um crescimento de orçamento “responsável” das IES de 2% ao ano.

O ministro apresentou números sobre o reforço de verbas registado nos últimos anos: “Em 31 de maio havia uma receita de 820 milhões de euros, o que significa um acréscimo de 6% face ao período homólogo de 2020”.

Manuel Heitor acrescentou ainda que a receita foi “cerca de 110 milhões de euros superior à despesa das instituições de ensino superior”, sendo que no último ano houve “um aumento efetivo de despesas com pessoal”.