O Instituto Português de Oncologia (IPO) tem um défice de mais de 300 profissionais de saúde, a maioria dos quais enfermeiros — e em especial enfermeiros capacitados para assegurar tratamentos de quimioterapia. Nos planos apresentados para 2021, o IPO reclamava um total de 2.231 profissionais para cumprir na íntegra os tratamentos oncológicos necessários. Há um mês, o número de profissionais que ali trabalhavam era inferior a 1.900 (1.884).

As contas são feitas pelo jornal Público, que na sua edição de esta sexta-feira noticia uma diminuição do número de enfermeiros no IPO ao longo deste ano — desde janeiro saíram do Instituto Português de Oncologia 71, tendo entrado apenas 47.

Ao diário, o médico e presidente do conselho de administração João Oliveira defendeu: “Há atrasos que estamos a tentar resolver, mas, apesar das dificuldades, o IPO não claudicou. A grande maioria dos tratamentos é realizada a tempo, fazemos 250 tratamentos por dia. Não nos foquemos só no IPO. Os hospitais estão com dificuldades por razões que são conhecidas. É necessária uma solução estratégica a nível nacional e o Governo tem nas mãos a forma de ultrapassar o problema”.

O Plano de Recuperação e Resiliência é muito claro na questão dos recursos humanos, fala num regime excecional de contratação. Precisamos de pessoas estáveis no SNS, satisfeitas, não permanentemente preocupadas com a sua subsistência”, apontou João Oliveira ao Público.

Esta segunda-feira, o hematologista e antigo secretário de Estado e antigo ministro da Saúde Fernando Leal da Costa publicava um artigo de opinião no Observador denunciando as carências do IPO. O antigo governante escrevia: “Temos atrasos em muitas áreas. Atrasos na capacidade de fazer exames de imagem, de irradiar, de operar e de administrar quimioterapia endovenosa”.

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Segundo Leal da Costa, “estes atrasos são já insustentáveis” e “falta-nos pessoal, já de forma crítica. Há camas e postos de tratamento que não funcionam porque não temos enfermeiros suficientes. São enfermeiros, muitos, médicos e pessoal técnico, especializado e não especializado, que nos falta”.

O drama do IPO de Lisboa

Duas semanas antes das queixas públicas de Fernando Leal da Costa, um doente do IPO de Lisboa, o DJ português Magazino, já relatava uma situação crítica. Em entrevista publicada a 13 de outubro no Observador, Magazino contava: “Para fazer quimioterapia há duas salas e uma das salas está fechada porque não há enfermeiros. Houve uma série de enfermeiros que se despediram, nem todos os enfermeiros estão habilitados para fazer quimioterapia e há muitos doentes que estão com o tratamento adiado — não pode ser adiado — porque não há enfermeiros para poder administrar a quimioterapia”.

Descrevendo a situação como um momento de “grande crise no IPO”, Magazino relatava: “Hoje pude testemunhar isso. Há uma sala grande onde vamos fazer tratamento que está fechada porque não há enfermeiros para administrarem a quimioterapia. O IPO infelizmente não é o hospital que pague melhor e há muitos enfermeiros que, apesar de gostarem muito de trabalhar no IPO porque sabem que é uma causa, porque trabalham num hospital social… se recebem uma proposta de trabalho mais vantajosa vão para outros sítios”. E acrescentava: “Tanto a minha médica como os enfermeiros com quem falei hoje disseram-me que é mesmo a altura mais crítica de que se lembram no IPO”.

Magazino: “Não desisto. Hoje olhei para aquele saco e pensei: esta ‘quimio’ é que me vai salvar, é desta vez”