Apesar da promessa do presidente da FIFA de que todos são bem-vindos no Qatar para o Mundial do Futebol, três hotéis dos 69 recomendados pela organização recusam alojamento a homossexuais.

“Todos são bem-vindos no Qatar, mesmo quando falamos da comunidade LGBTQ+”, garantia, em março deste ano, Gianni Infantino numa entrevista à AP. Porém, uma investigação de três televisões escandinavas mostra que a lista de 69 hotéis que a organização recomenda para as estadias de adeptos no Mundial não é tão inclusiva.

A SVT, da Suécia, a NRK, da Noruega, e DR, da Dinamarca revelaram esta quinta-feira que três hotéis que constam da recomendação da FIFA – The Torch Doha, Magnum Hotel & Suites Westbay e Wyndham Grand Regency – recusam receber homossexuais.

A discriminação contra a comunidade LGBTQ+ não é de agora. No Qatar a homossexualidade é crime e pode ser punida até sete anos de prisão, segundo a Amnista Internacional.

Num trabalho conjunto, os jornalistas das televisões escandinavas tentaram perceber como seria o acolhimento de adeptos homossexuais durante o Mundial de Futebol. Contactaram por telefone ou email todos os hotéis da lista da FIFA, fazendo-se passar por um sueco ou norueguês recém-casado com um homem que procurava um destino de lua de mel.

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Não aceitamos casais gays”, explicou o Magnum Hotel & Suites quando contactado pela equipa.

“Infelizmente não podemos acomodar-vos devido à política do hotel”, disse também o The Torch Doha, em resposta a um email enviado. A mesmo política é seguida pelo Wyndham Grand Regency, que justifica a decisão com base na lei do Qatar.

Contactados mais tarde, de forma oficial, o Wyndham Grand Regency e o Magnum confirmaram não aceitar homossexuais, por se tratar da política do hotel. Já o Torch Doha disse que todos são bem-vindos, mas considera que  as demonstrações públicas de amor não são corretas.

Além destes três hotéis, outros 20 responderam que recebem hóspedes homossexuais, mas com algumas reservas, recomendando que não demonstrem a sua orientação sexual.

Da parte do hotel, não nos importamos, mas gostaria de informar que já tivemos casos em que a polícia levou hóspedes do hotel por estarem numa relação homossexual”, explicou um porta-voz de um dos hotéis.

Um outro estabelecimento lembra que “colocar maquilhagem” ou vestir de “forma gay” é contra a política do país e do governo, mas diz aceitar os hóspedes desde que se “vistam adequadamente” e “não exibam comportamentos sexuais ou se beijem em público”.

Dos restantes hotéis inquiridos pela equipa de investigação, 33 não tiveram objeções e aceitam casais homossexuais sem restrições. Já 13 hotéis não responderam ou estão atualmente a operar como hotéis de quarentena de Covid-19.

Confrontada com estas informações, a FIFA disse que promove um ambiente sem discriminação nas suas atividades e eventos.

“A FIFA está confiante de que todas as medidas necessárias vão ser tomadas para os adeptos LGBTQ+ se sintam bem-vindos e seguros durante ao campeonato”, respondeu a organização através de email.

Já a Comissão do Mundial de Futebol pediu respeito pelas normas culturais do Qatar, enfatizando que se trata de um país conservador e que não aceita demonstrações públicas de amor, independentemente da orientação sexual dos envolvidos. A comissão garante que, como parte das estratégias da organização do evento, os hotéis no Qatar que vão receber os adeptos estão a continuamente a ser avaliados.

Desde que ganhou o direito de receber a competição, têm sido levantadas várias questões no Qatar quanto aos direitos LGBTQ+ no país, mas este não tem sido o único tema em destaque. Este mês, a Humans Rights Watch acusou a FIFA de insultar trabalhadores migrantes, ao desvalorizar as mortes ocorridas em acidentes de trabalho registadas durante a construção de instalações para o Mundial de Futebol.

Humans Rights Watch acusa FIFA de insultar trabalhadores migrantes

A diretora da organização não-governamental (ONG) refere numa carta divulgada a 4 de maio que Gianni Infantino “minimizou de forma surpreendente as mortes e as dificuldades dos trabalhadores migrantes no Qatar, onde, literalmente, construíram o Mundial FIFA2022″.

Em 2021, uma investigação do The Guardian revelava que 6.500 trabalhadores da Índia, Paquistão, Nepal, Bangladesh e Sri Lanka morreram desde que o Qatar conquistou o direito de receber a competição. Feitas as contas, 12 migrantes morreram em cada semana desde janeiro de 2011. O Qatar, porém, tem rejeitado balanços de organizações independentes internacionais, assegurando que tem feito mais pelos migrantes do que qualquer outro país da região.

Também a Amnistia Internacional chama a atenção para o problema, avançando que inúmeras mortes não estão a ser justificadas, referindo que estatísticas oficiais do Qatar dão conta de 15.021 mortes de migrantes entre 2010 e 2019.

Desde que em 2010 a FIFA atribuiu ao Qatar a organização do Mundial de Futebol de 2022, têm surgido várias polémicas em torno do assunto. A competição, na qual Portugal vai marcar presença, decorre entre 21 de novembro e 18 de dezembro.