O Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra esclareceu, na noite desta sexta-feira, que Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins foram suspensos dos cargos “de responsabilidade e/ou representação institucional” a pedido dos próprios. Esta informação foi avançada no seguimento de um primeiro comunicado no qual a instituição dizia apenas que Sousa Santos e Sena Martins se encontravam “suspensos de todos os cargos que ocupavam”.

No primeiro comunicado, o CES demarcou-se ainda das posições que o sociólogo e o antropólogo tomaram publicamente. “O CES respeita o direito de resposta individual, mas demarca-se de todas as posições assumidas publicamente por Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins, nomeadamente no que respeita à intenção do primeiro em avançar judicialmente contra as autoras do capítulo do livro ‘Sexual Misconduct in Academia – Informing an Ethics of Care in the University'”, lê-se no primero documento divulgado no site do CES.

Conforme já anunciado, o CES está a constituir uma comissão independente para averiguação das ocorrências descritas no referido capítulo e “durante este processo e até ao apuramento de conclusões, o CES informa que Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins se encontram suspensos de todos os cargos que ocupavam”.

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Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins recusam todas as acusações feitas contra si. Num livro coletivo publicado pela Routledge intitulado “Sexual Misconduct in Academia” (Má Conduta Sexual na Academia), três investigadoras contam experiências de abusos sexuais. O capítulo “The walls spoke when no one else would. Autoethnographic notes on sexual-power gatekeeping within avant-garde academia” é assinado por Lieselotte Viaene, Catarina Laranjeiro e Miye Nadya Tom. Embora não refiram nomes, nem sequer o da instituição em causa, é fácil juntar as peças e perceber que se referem ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

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A própria instituição reagiu de imediato, através de comunicado, e abriu uma investigação ao sucedido. Boaventura de Sousa Santos disse ao DN reconhecer-se na personagem do Professor Estrela, o alegado assediador. Negou, porém, as acusações de assédio de que é alvo no artigo, deixando mesmo a garantia de que avançará com um processo contra as autoras.

Neste comunicado, o CES fala ainda dos graffiti que surgiram nas paredes da instituição e onde se lia “Boaventura fora. Todas sabemos”.

“O CES informa, igualmente, que os graffiti mencionados no referido capítulo, não tendo sido acompanhados de participações formais, suscitaram na instituição a necessidade de constituir mecanismos mais explícitos de regulação e de denúncia”, acrescenta-se no comunicado, onde se recorda que em 2017 foi aprovado o regulamento da Comissão de Ética. Em 2019 foi aprovado o Código de Conduta do CES e, no final de 2020, foi instituída a Provedoria, que iniciou a sua atividade em 2021.

Queixas formais sobre as situações que envolve,m os dois investigadores não chegaram ao conhecimento dos órgãos de gestão. “Desde que foi criada, em 2021, o CES informa que a Provedoria recebeu duas queixas, nenhuma delas por assédio moral ou sexual”, acrescentando que “os atuais membros dos órgãos de gestão declaram que não têm conhecimento de tentativas de averiguação ou ocultação de eventuais condutas inadequadas que tenham ocorrido no passado”.

Independentemente do tipo de queixas recebidas, e frisando saber “da dificuldade que eventuais vítimas possam ter na denúncia de casos como estes”, o CES sublinha o seu “repúdio por qualquer forma de assédio ou abuso, e solidariza-se com todas as vítimas” de violência desta natureza. “Eventuais casos de conduta inadequada ou não ética não refletem a cultura de trabalho do CES como um todo.”