A ministra da Habitação recusa ter havido um recuo na abrangência dos apoios às rendas, assumindo Marina Gonçalves que esse apoio chegou em junho a 185 mil famílias quando no início se esperava que haveria apoio a 150 mil agregados. E há ainda avaliações em curso com base na entrega das declarações do IRS referente a 2022.

Já após a aprovação do apoio, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, assinou um despacho, noticiado pelo Dinheiro Vivo, a instruir os serviços da Autoridade Tributária (AT) a considerar os rendimentos brutos e também aqueles que estão sujeitos a taxas especiais, como a pensão de alimentos ou os relativos a rendas, para apurar o valor do subsídio. No Decreto-Lei n.º 20-B/2023 de 22 de março, determinava-se que deviam ser considerados o total do rendimento para determinação da taxa apurado pela AT na liquidação do IRS , ou seja, considerando-se a matéria coletável.

Segundo tem sido noticiado, o despacho de Nuno Félix diminui a abrangência do acesso ao apoio já que são considerados mais rendimentos.

Mas Marina Gonçalves contesta esta leitura, dizendo que é normal haver despachos interpretativos. “É procedimento normal e não é um recuo”. Tratou-se, disse, numa audição regimental do Parlamento, de “clarificar a legislação sem por em causa a atribuição do apoio. Se há algum recuo não consigo dar-lhe razão. Os factos provam o contrário”, realçando que o apoio chega a 185 mil famílias.

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Mas o PSD acusou o Governo de incompetência. “As normas interpretativas podem existir quando há dúvidas. O governo não tem dúvidas. É uma situação flagrante de incompetência atroz e o PSD não vai deixar passar esta situação”.

Finanças vão mudar lei do apoio às rendas para clarificar rendimentos a considerar

O Ministério das Finanças já tinha indicado que iria clarificar o diploma, subsistindo dúvidas, mas sem explicar se a nova interpretação se deve ao custo que a medida teria. Já na semana passada, na audição ao ministro das Finanças, Fernando Medina foi questionado sobre o apoio às rendas, garantindo que o Governo cumpriu “integralmente” o que se propôs a fazer e que a “única interpretação razoável é a do despacho”.  “O programa de apoio dá resposta a um conjunto de famílias, mais do que governo tinha estimado, com um impacto médio estimado de 100 euros por agregado”, declarou o ministro das Finanças.

Medina defende despacho que clarifica apoio às rendas e diz que discordância “resulta da crítica pela crítica”

Este é um tema que está também a dominar a audição de Marina Gonçalves, quem o deputado do Chega, Filipe Melo, acusou de não estar preparada para a pasta. E apelidou a polémica do apoio à renda como “uma trapalhada que o Governo não soube gerir. Ficava-lhe bem assumir que erraram, mas não tem essa humildade. Falharam e vão continuar a falhar e tentam remediar com uma ilegalidade [despacho do secretário de Estado]”.

Marina Gonçalves contrapõe, salientando que o apoio à renda foi uma medida do Governo e não apresentada por qualquer partido no Parlamento. E quando foi discutida houve debate sobre como se conseguiria automatizar a distribuição do apoio, tornando-o mais automático e eficaz no objetivo de chegar às famílias. “Por isso mantemos o que dissemos e que está na lei, que vamos olhar para os rendimentos apurados na liquidação do IRS, é o que está a ser feito. Se queremos ser sérios no debate temos de dizer as coisas como elas são, aquilo que explicámos e a efetividade da medida foi como a apresentámos. Os despachos interpretativos servem para clarificar, aqui [no Parlamento] já se fez várias vezes. Não há contradição”, respondeu a ministra da Habitação ao Chega.

Ainda assim, Marina Gonçalves acabou por indicar três situações em que as famílias não receberam os apoios, apesar de terem direito. O automatismo pode não estar a funcionar por três razões: falta de IBAN atualizado junto do Fisco e segurança social — estão neste caso cerca de 28 mil famílias –; há ainda cerca de 20 mil famílias cujas prestações são de até 20 euros e por isso o pagamento é semestral, devendo receber o apoio este mês; e há ainda um conjunto de famílias na situação de uma taxa de esforço acima de 100% cuja situação será avaliada com a declaração de IRS de 2022 com rendimentos mais atualizados. Neste caso, “teremos de fazer esta avaliação em função dos rendimentos de 2022 e percebermos o porquê dessa taxa de esforço”.

Marina Gonçalves garante, assim, que “há casos em que não recebeu mas irá receber”. Há ainda um quarto caso que tem de ser visto mais casuisticamente que pode estar relacionado com a extração de dados erradas. Mas aí “tem de se avaliar caso a caso”.

Em relação aos apoios no crédito à habitação, Marina Gonçalves diz que o Governo está preocupado com a evolução das taxas de juro. “Temos de garantir que as medidas que criámos são robustas e respondem aos problemas das famílias”. Essa é “uma medida em curso e não temos dados para verificar ainda a sua eficácia no terreno”, mas está a ser seguido.

De qualquer forma, a ministra da Habitação assume que a prioridade do Governo para o acesso dos jovens à habitação, nomeadamente, foi no âmbito do arrendamento e não nos apoios à compra de casa.