O Governo dos Açores manifestou nesta quinta-feira a sua oposição à proposta apresentada pelo PAN para a proibição de touradas na região, argumentando que são “espetáculos culturais” previstos constitucionalmente.

“É considerado como uma violação de um direito constitucional. A cultura não pode definir-se por decreto. A Constituição Portuguesa define a liberdade de acesso à cultura, e como tal, o nosso parecer é contrário ao projeto que aqui nos é apresentado“, justificou Sofia Ribeiro, secretária regional da Educação e Assuntos Culturais, ouvida, esta quinta feira, na Comissão de Assuntos Sociais do parlamento açoriano, reunida em Angra do Heroísmo, a propósito da proposta do PAN relativa ao fim das touradas no arquipélago.

Também António Ventura, secretário regional da Agricultura e Desenvolvimento Sustentável, igualmente ouvido pelos deputados, explicou que as touradas têm cada vez mais aficionados na região, sobretudo na ilha Terceira, onde a tradição está mais enraizada, com grande impacto na economia regional.

É uma atividade com cariz tradicional, tem ganho cada vez mais adeptos, principalmente na tauromaquia de rua, chamada de tourada de corda, e são cada vez mais os jovens que participam nas touradas de corda, que só na ilha Terceira são 300 por época”, salientou o governante, recordando que também as quatro touradas de praça realizadas na ilha Terceira “estavam quase completamente cheias”.

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O partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) entregou uma proposta na Assembleia Legislativa dos Açores na qual defende que seja proibida a realização de “touradas, touradas à corda, espetáculos tauromáquicos e variedades taurinas” em toda a região, e que as praças de touros existentes sejam convertidas em “equipamentos multiúsos”, de cariz cultural ou desportivo.

“É fundamental salientar que todas as formas de tauromaquia provocam no touro, e demais animais que participam nas mesmas, como os equídeos, elevados níveis de estresse e sofrimento“, justificou Pedro Neves, deputado único do PAN nos Açores, acrescentando que os touros são também “vítimas de atos de rudeza e violência“.

Um dos argumentos invocados pelo proponente é de que estes espetáculos não são também adequados às crianças e jovens do arquipélago, por poderem ser geradores de “violência”, argumento contestado por Marcos Couto, presidente da Câmara do Comércio e Indústria de Angra do Heroísmo, também ouvido hoje na Comissão de Assuntos Sociais.

“Há aqui um requinte nesta iniciativa que me choca, que é o requinte de proibir esta atividade às crianças”, lamentou o empresário, acrescentando que “há uma tentativa de decepar culturalmente a sociedade, incutindo nos mais jovens um pensamento que os arranca uma parte importantíssima das suas raízes e da sua identidade”, que considera ser “condenável”.

Já durante a manhã, os deputados que integram a comissão parlamentar tinham ouvido representantes de associações nacionais que manifestaram opiniões opostas sobre esta proposta do PAN.

“Ainda bem que nos Açores há pessoas que gostam, há pessoas que não gostam e há pessoas indiferentes às touradas, como em toda a parte”, lembrou Luís Capucha, da Associação de Tertúlias Tauromáquicas de Portugal, defendendo que deve existir “tolerância” entre os que são a favor e os que são contra, e não a tentativa de “negar o direito ao património cultural” a uma parte da população.

Já Sandra Teixeira do Carmo, da Associação Portuguesa e Espanhola de Direito do Animal, lembrou que “os animais mamíferos dotados de sistema nervoso central são sencientes e conscientes” e que “não há nenhuma razão, muito menos do ponto de vista ético”, para que se continue a permitir a realização de espetáculos que “infrinjam dor sobre os animais”.

A proposta do PAN deverá ser discutida e votada no plenário de setembro da Assembleia Legislativa dos Açores.