Era provavelmente a tarefa mais complicada do futebol feminino internacional: vencer os Estados Unidos. Para chegar aos oitavos de final do Campeonato do Mundo, para carimbar esse feito inacreditável na primeira presença de sempre na competição, Portugal tinha de vencer as bicampeãs mundiais. Algo que nunca tinha feito. Vencer uma seleção a quem nunca tinha sequer marcado um golo, sofrendo 39 ao longo de 10 jogos.

Ainda assim, a Seleção Nacional chegava à última jornada da fase de grupos do Mundial com um objetivo já alcançado — o facto de chegar precisamente a esse jogo com possibilidades de apuramento e até a depender da própria sorte, precisando “apenas” de ganhar sem estar a olhar para outros resultados. Depois da derrota contra os Países Baixos e a história vitória contra o Vietname, Portugal encarava o confronto com os Estados Unidos com a esperança de quem sabia que, no futebol, absolutamente tudo é possível.

Ficha de jogo

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Portugal-Estados Unidos, 0-0

Fase de grupos do Campeonato do Mundo feminino

Eden Park, em Auckland (Nova Zelândia)

Árbitra: Rebecca Welch (Inglaterra)

Portugal: Inês Pereira, Ana Borges, Carole Costa, Diana Gomes, Catarina Amado (Joana Marchão, 90′), Andreia Norton (Telma Encarnação, 82′), Dolores Silva, Tatiana Pinto, Kika Nazareth (Andreia Jacinto, 62′), Diana Silva (Ana Capeta, 90′), Jéssica Silva

Suplentes não utilizadas: Patrícia Morais, Rute Costa, Lúcia Alves, Ana Seiça, Carolina Mendes, Fátima Pinto, Sílvia Rebelo, Ana Rute

Treinador: Francisco Neto

Estados Unidos: Alyssa Naeher, Naomi Girma, Julie Ertz, Emily Fox, Crystal Dunn (Kelley O’Hara, 90+7′), Andi Sullivan, Lindsey Horan (Emily Sonnett, 84′), Rose Lavelle, Lynn Williams (Trinity Rodman, 84′), Alex Morgan (Alyssa Thompson, 90+7′), Sophia Smith (Megan Rapinoe, 61′)

Suplentes não utilizadas: Aubrey Kingsbury, Casey Murphy, Savannah DeMelo, Sofia Huerta, Kristie Mewis, Alana Cook, Ashley Sanchez

Treinador: Vlatko Andonovski

Golos: nada a registar

Ação disciplinar: cartão amarelo a Rose Lavelle (39′), a Sophia Smith (52′), a Carole Costa (56′), a Diana Gomes (72′), a Naomi Girma (81′), a Catarina Amado (85′)

“A equipa sente-se motivada, com vontade de jogar. É mais uma oportunidade, mais um momento, mais um jogo de Campeonato do Mundo, mais uma ocasião para representarmos o nosso país ao mais alto nível. Trabalhámos muito e meritoriamente estamos na posição em que nos colocámos: chegar ao último jogo a depender só de nós, num grupo extremamente difícil. Estamos com muita ambição e com muita vontade de fazer as coisas bem”, explicou Francisco Neto na antevisão da partida desta terça-feira.

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Contra as norte-americanas, campeãs do mundo em 2015 e 2019, o selecionador nacional voltava à base e repetia quase por inteiro o onze inicial que defrontou os Países Baixos — trocando apenas Fátima Pinto, que se lesionou já na Nova Zelândia, por Kika Nazareth. Do outro lado, Vlatko Andonovski fazia duas alterações face ao empate contra os Países Baixos, retirando Savannah DeMelo e Trinity Rodman e lançando Rose Lavelle e Lynn Williams, mantendo a titularidade de Alex Morgan.

Os Estados Unidos começaram o jogo a todo o gás, procurando chegar ao golo da tranquilidade muito depressa: Alex Morgan apareceu a desviar ao primeiro poste logo nos instantes iniciais (3′), Lynn Williams cabeceou para Inês Pereira defender (5′) e a mesma Morgan atirou ao lado após uma incursão de Lindsey Horan na esquerda (6′). Portugal aguentou o ímpeto inicial das norte-americanas e mostrou desde logo que não dava o jogo por perdido, com Andreia Norton a rematar pouco por cima (9′) depois de uma boa movimentação portuguesa na direita (e um passe de calcanhar de Jéssica Silva).

Ultrapassada a forte entrada adversária, a Seleção Nacional subiu as linhas e passou a explorar a profundidade nas costas da defesa norte-americana, algo que iria repetir várias vezes ao longo da primeira parte. Jéssica Silva teve a melhor oportunidade portuguesa até ao intervalo, ao rematar ao lado depois de um passe a rasgar de Kika (16′), e Portugal foi anulando a reação adversária à perda da bola, conseguindo quase sempre ganhar os ressaltos e acabando por ter mais posse e maior presença no último terço contrário.

Apesar de demonstrar claras dificuldades em criar oportunidades de golo — para além do remate de Jéssica Silva, só Kika voltou a tentar marcar, com um remate de longe que passou pouco por cima (39′) –, a seleção portuguesa esteve quase sempre inserida no meio-campo dos Estados Unidos e conseguia estancar as investidas norte-americanas. Algumas jogadoras portuguesas estavam nas suas melhores versões, entre o acerto defensivo de Ana Borges, a combatividade de Andreia Norton e a criatividade de Tatiana Pinto, e quase só se pedia que o jogo descaísse mais para a esquerda do que para a direita, já que Catarina Amado tinha poucas chances de subir no terreno.

O jogo chegou ao intervalo ainda sem golos e com os Países Baixos já a golear o Vietname, ou seja, com Portugal a precisar de vencer os Estados Unidos para seguir em frente. Ainda assim, a Seleção Nacional deixava ótimas indicações da primeira parte, demonstrando níveis de agressividade e intensidade impressionantes contra as norte-americanas. O golo, porém, continuava sem aparecer.

Nenhum dos treinadores fez alterações ao intervalo e Portugal pareceu regressar com a mesma lógica de pensamento. Os Estados Unidos, porém, procuravam repetir a entrada impetuosa da primeira parte e ficaram muito perto do golo logo nos primeiros instantes, com Diana Gomes a intercetar um remate de Alex Morgan (54′) e as aproximações à baliza de Inês Pereira a tornarem-se recorrentes.

Vlatko Andonovski foi o primeiro a mexer, trocando Sophia Smith por Megan Rapinoe, e Francisco Neto respondeu quase de imediato com a entrada de Andreia Jacinto para o lugar de Kika — o selecionador nacional refrescava o meio-campo, numa substituição que parecia ser mais para conter os Estados Unidos do que propriamente para ferir o adversário. A verdade é que, tal como tinha acontecido na primeira parte, Portugal voltou a conseguir conter o ímpeto norte-americano, puxando o jogo para a zona do meio-campo e mantendo uma organização defensiva que permitia não ter muitos calafrios.

Ainda assim, não existia posse de bola portuguesa no último terço contrário — e Telma Encarnação só entrou a 10 minutos do fim, com Ana Capeta e Joana Marchão a serem lançadas já em cima do minuto 90. A árbitra da partida decretou oito minutos de descontos e foi nesses oito minutos de descontos que Portugal ficou a um poste da história: Ana Capeta apareceu praticamente isolada perto da grande área, aguentou a pressão e atirou rasteiro, acertando em cheio no poste. O empate já não desapareceu e a Seleção está fora do Mundial, com os Estados Unidos a garantirem o apuramento através do segundo lugar do Grupo E, com os Países Baixos a assegurarem a liderança do grupo com uma goleada imposta ao Vietname.

Todas as 32 seleções que marcaram presença na fase de grupos do Campeonato do Mundo foram convidadas pela organização a escolher uma música para tocar no estádio no final de uma vitória. Quando Portugal derrotou o Vietname, ouviu-se Mariza na Nova Zelândia, e ouviu-se principalmente um verso de um refrão: “Sei que o melhor de mim está para chegar”. Esta Seleção Nacional, esta Seleção Nacional estreante, sai do Mundial com apenas um golo sofrido, um empate, uma derrota e uma vitória do grupo mais difícil da competição. Sim, o melhor delas está mesmo para chegar.