“Retratos Fantasmas”

Kleber Mendonça Filho, realizador de “O Som em Redor”, “Aquarius” e “Bacurau”, fica literalmente “em casa” neste documentário que abre na moradia do seu Recife natal em que vive desde os anos 70, passa depois para o decadente centro histórico da cidade e evoca os grandes cinemas que outrora lá se encontravam e foram quase todos fechando com a gradual degradação da zona. Kleber frequentou-os, tal como sucessivas gerações dos seus conterrâneos, lá fazendo muita da sua educação cinéfila. Pelo meio, e entre imagens de arquivo ou rodadas pelo realizador, vemos como a sua casa, a cidade, o seu centro e as salas de cinema e outros locais desaparecidos são omnipresentes nos seus filmes, caseiros e ainda amadores e depois já profissionais, documentários ou de ficção. O tom de “Retratos Fantasmas” não é de nostalgia magoada ou chorona, mas sim de constatação da inevitabilidade da mudança em todos os espaços registados no filme (as várias obras na casa da família, a ruína da casa vizinha, a decadência do centro histórico do Recife após uma era de apogeu e prosperidade, o fecho, seguido de demolição, abandono ou reaproveitamento, dos cinemas clássicos da zona). Sente-se, no entanto, como que uma retracção a exibir sentimentos – ou então, é a narração átona de Kleber que deixa essa impressão – que de forma alguma cairiam mal à fita, ou junto dos espectadores. Já o final de “Retratos Fantasmas”, em que o realizador apanha um Uber que tem um condutor muito peculiar, é desconcertante e destoa do resto do filme. Fica uma pergunta: porque é que nenhum cineasta português fez ainda um documentário como este sobre Lisboa ou o Porto?

“A Conspiração do Cairo”

O protagonista deste novo filme do realizador sueco-egípcio Tarik Saleh é o jovem Adam (Tawfeek Barhom), órfão de mãe e filho de um pescador, que ganha uma bolsa para ir estudar Teologia na Universidade Islâmica Al-Azhar, do Cairo, a mais poderosa e prestigiada instituição do seu género do mundo muçulmano. Lá chegado, Adam vai ser recrutado como informador por um homem dos serviços secretos, o coronel Ibrahim (Fares Fares), e ver-se no meio da batalha que se trava nos bastidores pela eleição do novo presidente da instituição entre três imãs, Negm, o xeque Cego que representa a independência em relação ao governo, Al Durani, o xeque mais radical, próximo dos Irmãos Muçulmanos, e o xeque Beblawi, homem moderado e discreto, que é o favorito do poder cairota. Tal como o policial de fundo socio-político “The Nile Hilton Incident” (2017), que Tarik Saleh, após ter sido expulso do Egipto, foi obrigado a ir rodar a Marrocos, apesar de se ambientar no Cairo, “A Conspiração do Cairo” foi filmado na Turquia, mesmo passando-se também na capital do Egipto, onde o realizador voltou a ser impedido de trabalhar. “A Conspiração do Cairo” foi escolhido como filme da semana pelo Observador.

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