Não foi um encontro como os primeiros seis, ou não tivesse a Seleção sofrido pela primeira vez golos na fase de qualificação (dois), acabou com o resultado dos primeiros seis. O facto de haver mais equipas qualificadas para o Campeonato da Europa alargou o leque de apurados por grupo e fez com que, a três jornadas do final, equipas favoritas como Portugal, França ou Bélgica já tivessem carimbado a presença na Alemanha em 2024. No entanto, mais do que um ponto de chegada, este era mais um estágio de crescimento. Outro degrau para ser subido, tendo em conta a metamorfose de uma equipa que iniciou um novo ciclo com Roberto Martínez, que ganhou uma nova identidade independentemente do esquema tático que utilize mas que continua ainda num processo de consolidação de processos e ideias sempre em competição. E o próximo teste surgia em Zenica, com um Estádio Bilino Polje esgotado e com grande reforço de medidas de segurança.

Bósnia-Portugal. Seleção tenta garantir primeiro lugar do grupo após qualificação para o Europeu

“É importante seguir com o mesmo foco, ganhar o grupo, que é um objetivo claro. Depois, precisamos de fazer mudanças, de frescura. Foi um jogo muito exigente frente à Eslováquia. Vamos ver se são precisas muitas mudanças mas a ideia é continuar como no estágio de setembro e tentar ter o número mínimo de mudanças”, tinha antecipado o técnico espanhol no lançamento da partida, entre elogios ao que é nesta fase a Bósnia com a chegada de Savo Milosevic. “A estrutura e as ideias são diferentes, os jogadores são os mesmos. Valem mais do que aquilo que os resultados têm demonstrado. Pjanic é o cérebro, Dzeko esteve no top 3 de pontas de lança na época passada, há o Kolasinac, jogadores jovens com potencial. É uma final para eles na qualificação e precisamos de igualar o nível emocional desta Bósnia”, acrescentou ainda Roberto Martínez.

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Havendo esse objetivo de manter o percurso 100% vitorioso na qualificação para assegurar desde já também o primeiro lugar do grupo, de preferência voltando a não sofrer golos como aconteceu nos seis jogos iniciais, o selecionador nacional não colocava de parte a vontade (e necessidade) de ter este tipo de encontros para ir colocando a equipa a ser testada. “É importante preparar o Euro com estes jogos: com intensidade, um nível competitivo muito alto, onde podemos ajustar e crescer como equipa. Mudar por mudar não tem sentido. Estamos em outubro e precisamos de seguir na linha do trabalho que fazemos no treino. É importante contar com todos mas sem fazer mudanças sem a ideia de mostrar o melhor nível”, apontara, com o enfoque claro na ideia de poder fazer alterações mas sem baixar o nível global da equipa até este momento.

“Acho que para ganhar sete jogos precisas de muito boa estrutura e trabalhar muito no duro. A nossa equipa trabalhou muito defensivamente e isso deu-nos muitas ocasiões de golo. Contra a Eslováquia, a primeira parte foi muito boa e na segunda assumiram riscos. Tiveram três remates à baliza com dois golos mas para nós a reação ao golo da Eslováquia foi muito boa. É disso que precisamos. Precisava de ver a reação dos jogadores ao sofrer o primeiro golo e gostei muito. Estou muito satisfeito com o trabalho da equipa com e sem bola”, realçou, recuperando o momento em que a Seleção consentiu o primeiro golo nesta qualificação antes de Cristiano Ronaldo bisar com o 3-1 e garantir um triunfo que chegaria pela margem mínima (3-2).

De forma inevitável, o capitão, que foi alvo de uma homenagem no Estádio do Dragão pelos 200 jogos pela equipa A, foi o grande destaque da noite e na chegada agora à Bósnia mas Martínez deixou também rasgados elogios na conferência de antevisão também a Bruno Fernandes, “o sonho para qualquer treinador”, tal como já fizera com outras referências como Bernardo Silva ou Pepe. Agora, e mais uma vez, Bruno Fernandes e Ronaldo voltaram a ser dois dos melhores. Todavia, a fantástica exibição sobretudo nos 45 minutos iniciais em termos coletivos teve mais destaques individuais. Gonçalo Inácio, a dar o passo em frente na afirmação na Seleção A não só em momento decisivo mas também na construção e no passe longo que originou dois golos. Otávio, um “monstro” competitivo que encheu o campo ao lado de Danilo. João Félix, um jogador que parece outro desde que assumiu a segunda vida em Barcelona. E foi ele o MVP, voltando aos bons velhos tempos em que jogava solto, leve, de forma alegre e a deixar marca efetiva na ficha de jogo com uma assistência e um golo. Martínez deu-lhe a mão quando precisou, Félix deu-lhe o futebol que o técnico precisa.

Ficha de jogo

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Bósnia-Portugal, 0-5

8.ª jornada do grupo J de qualificação para o Europeu

Estádio Bilino Polje, em Zenica (Bósnia)

Árbitro: Halil Umut Meler (Turquia)

Bósnia: Sehic (Vasilj, 72′); Dedic, Barisic (Gojkovic, 72′), Hadzikadunic, Kolasinac; Cimirot, Pjanic; Stevanovic (Hamulic, 65′), Rahmanovic (Hadziahmetovic, 46′), Demirovic (Gazibegovic, 46′) e  Dzeko

Suplentes não utilizados: Piric, Menalo, Prevljak, Varesanovic, Bilbija, Basic e Ziljkic

Treinador: Savo Milosevic

Portugal: Diogo Costa; João Cancelo, Rúben Dias, Gonçalo Inácio, Diogo Dalot; Danilo, Otávio (João Neves, 85′); Rafael Leão (Pedro Neto, 65′), Bruno Fernandes (Rúben Neves, 79′), João Félix (Vitinha, 79′) e Cristiano Ronaldo (Diogo Jota, 65′)

Suplentes não utilizados: Rui Patrício, José Sá, Nelson Semedo, António Silva, João Palhinha, Bernardo Silva e Gonçalo Ramos

Treinador: Roberto Martínez

Golos: Ronaldo (5′, g.p. e 20′), Bruno Fernandes (25′), João Cancelo (32′) e João Félix (41′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Hadzikadunic (83′) e Kolasinac (88′)

As dúvidas que inicialmente se apresentavam perante as quatro alterações nas escolhas iniciais abriam ainda algumas dúvidas em termos de esquema tático a apresentar mas os primeiros minutos dissiparam as dúvidas com e sem bola. Assim, e ao contrário do que aconteceu nos jogos que abriram a era Martínez, Danilo foi o pivô defensivo do meio-campo tendo Otávio mais próximo mas recuando apenas para a linha dos centrais para organizar a primeira fase de construção (altura em que o lateral à esquerda subia para uma segunda linha de meio-campo mais pelo centro), Bruno Fernandes ia caindo mais à direita como falso ala a jogar muitas vezes pelo meio ou em combinação com o companheiro de equipa Diogo Dalot (na esquerda havia outra parelha de clubes não de Manchester United mas de Barcelona, com João Cancelo e João Félix) e Rafael Leão assumia uma posição mais central perto de Ronaldo em bola, tendo liberdade para deambular entre corredores quando a bola passava do meio-campo. 4x2x3x1 mais camaleónico era complicado.

Desde o início que Portugal foi melhor em todos os aspetos, sendo que a vantagem no marcador acabou por surgir naquela fase da partida em que ninguém tinha feito muito por justificar: no primeiro remate à baliza da partida, João Félix viu a tentativa na área cortada por Barisic com o braço e Cristiano Ronaldo fez o 1-0 de grande penalidade com uma conversão ao meio da baliza sem hipóteses para Sehic (5′). O que podia ser mais difícil estava feito, o que podia projetar a Seleção para mais uma exibição convincente estava alcançado. E foi isso que se viu nos minutos seguintes, com os bósnios sem qualquer expressão ofensiva perante uma equipa de Roberto Martínez que atacava e criava perigo por todos os corredores. Foi assim que, após uma grande combinação ofensiva com João Félix na direita, Diogo Dalot cruzou atrasado e Bruno Fernandes atirou a rasar o poste (18′). Foi assim que, depois de uma grande saída a partir de trás de Gonçalo Inácio, Félix viu bem o movimento de Ronaldo, isolou o avançado e o número 7 só teve de picar por cima de Sehic (21′).

Olhar para a Bósnia de hoje a comparar com o que já foi é comparar o dia com a noite mas, mesmo assim, o grande mérito do “atropelo” entroncava na capacidade de Portugal com e sem bola, a fazer provavelmente os 45 minutos mais completos desde que Martínez assumiu o cargo de selecionador. Em termos de exibição até depois do 2-0 não ficou por aí, a nível de resultado também não. E mesmo num jogo que entrou quase num ritmo de cada tiro, cada melro, a goleada foi justificada até ao intervalo com mais três golos que mostraram sobretudo a quantidade e qualidade de recursos da equipa: Bruno Fernandez fez o 3-0 a “fuzilar” Sehic após um passe fantástico de Gonçalo Inácio da linha defensiva a procurar a profundidade (25′), João Cancelo marcou o 4-0 com um grande remate ao ângulo de fora da área após assistência de Bruno Fernandes e remate falhado de Ronaldo (32′), João Félix aumentou para 5-0 com Otávio a explorar essa passadeira nas costas da defesa contrária antes de assistir o jovem avançado sozinho na área (41′). Também aqui, como no 2-0, o lance foi inicialmente anulado pelo árbitro assistente mas depois validado com a observação do VAR.

Como seria de esperar, o segundo tempo começou com moldes diferentes do que foi a primeira parte ainda que com Portugal a dominar por completo o encontro como e quando queria entre duas substituições feitas pela Bósnia ao intervalo que pouco ou nada acrescentaram entre aquela tentativa de deixar outra imagem na partida mais por questões de orgulho do que propriamente pelo resultado. Nas bancadas, era a rendição completa. E se quando Ronaldo marcou os dois primeiros golos os próprios adeptos bósnios acompanharam a celebração com um Siiiiiiiiii, a partir do 5-0 quase pediam para que o encontro terminasse o mais depressa possível, de preferência sem mais golos sofridos (marcados, tendo em conta que nem um remate tinham conseguido fazer, era difícil). Enquanto isso não acontecia, faziam a onda pelo estádio e Martínez aproveitava o ambiente para as duas primeiras trocas, com as entradas de Pedro Neto e Diogo Jota, com essa particularidade de Dalot e Cancelo trocarem de flanco porque o ala passou a estar no corredor direito (65′).

Entre o domínio completo de Portugal e a incapacidade da Bósnia, a partida foi-se tornando cada vez mais aborrecida. Até Diogo Costa, que foi apenas um mero espectador sem pagar bilhete em Zenica, não gostou de estar no estádio nesses minutos perante o ritmo mais baixo e a menor intensidade da partida, que serviu no final para promover a estreia de João Neves pela Seleção A com cinco minutos mais descontos que premeiam a ascensão meteórica que o jovem médio do Benfica teve em 2023. Em tudo o resto, foram muitos poucos os motivos de interesse sendo que o mais importante estava garantido com a oitava vitória noutros tantos jogos, um total de 32 golos marcados e apenas dois sofridos e o primeiro lugar do grupo garantido.