A perturbação de hiperatividade e défice de atenção, ou simplesmente PHDA, é um dos temas mais atuais e recorrentes no que toca à saúde mental. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a prevalência situa-se entre os 3% a 10% nas crianças em idade escolar, sendo três a quatro vezes mais frequente nos rapazes. O problema? É diagnosticado, muitas das vezes, já numa fase mais avançada da vida.

Foi o que aconteceu com James Guy. Quando tinha 24 anos, há quatro, o nadador britânico continuava a sentir que algo não estava bem apesar de ser recordista nacional, campeão europeu e mundial e ter já duas medalhas olímpicas. Por volta dessa altura, já enquanto adulto, foi diagnosticado com PHDA — e apesar de reconhecer que o diagnóstico o ajudou a perceber o que sempre tinha sentido, o atleta explica que não foi fácil crescer com o problema.

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“Quando tinha 15 anos comecei a ter aulas de apoio, para ter ajuda extra, porque não era propriamente o miúdo mais inteligente do mundo. Era tudo difícil de entender e precisava de que o professor repetisse as coisas quatro vezes, só para conseguir assimilar. Sentia-me excluído. Os meus amigos riam-se e gozavam comigo. Não ligava muito, porque eram meus amigos, mas era embaraçoso”, explicou James Guy, que entretanto conquistou duas medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio, em entrevista à BBC.

O nadador sublinhou que as escolas que frequentou sempre tentaram ajudá-lo e apoiá-lo, mas que não existiam os recursos necessários para identificar o PHDA. Quando deixou de ser adolescente, James Guy percebeu que os sintomas persistiam mesmo fora do contexto escolar e que afetavam o dia-a-dia. “Consigo distrair-me facilmente diariamente. Começo uma coisa, não acabo, faço outra e também não acabo. Esforço-me muito, mas não consigo evitar. Já disse ao meu psicólogo que estou sempre 20 km/h à frente ou 20 km/h atrás, não há ponto intermédio”, indica.

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Os últimos quatro anos têm servido para o nadador passar a viver a própria vida com a consciência do diagnóstico — e também para a British Swimming, incluindo os treinadores, saber dar respostas. “É muito difícil para mim estar sentado e quieto, tenho sempre de estar a fazer alguma coisa. É por isso que a natação é tão boa para mim. Quando chego a casa estou tão cansado que posso só sentar-me no sofá e relaxar. Se o meu treinador está a dizer-me algo pela primeira vez, o meu cérebro nunca vai encaixar. Preciso de ver, fisicamente, e preciso de repetições”, detalha James Guy, que lembra que a ansiedade esteve sempre associada ao PHDA.

“Fico muito ansioso quando tenho uma sessão importante ou uma prova importante, mesmo quando é daqui a seis semanas. Fico com o estômago inchado, sem apetite. Não é um sítio bom para se estar, mas aprendi a ter noção disso e a saber gerir. Às vezes tenho medo de ficar doente porque não quero perder nada na piscina, pesquiso os meus sintomas e tenho a medicação toda preparada. Ligo ao meu psicólogo para ele me dizer para não me preocupar. Se esse apoio não existisse, não sei mesmo como é que conseguiria lidar com o assunto sozinho”, conclui.

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