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O grupo das cinco potências emergentes pode mais do que duplicar depois de ter convidado seis países da América Latina, África e Médio Oriente para aderir à organização já a partir do dia 1 de janeiro do próximo ano, na sua primeira expansão em mais de dez anos — e pode passar a representar quase metade da população mundial e mais de um quarto do PIB global. “O mundo entrou num novo período de turbulência e transformação. Nós, os BRICS, devemos ter sempre em mente o propósito fundador de nos fortalecermos através da unidade“, sublinhou o Presidente chinês durante a 15.ª cimeira do grupo, que decorreu nos últimos dias em Joanesburgo e em que foi estendida a passadeira para a entrada da Argentina, da Etiópia, do Egito, do Irão, da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos.
Quando os atuais líderes dos BRICS se juntaram aos possíveis novos membros para a foto de grupo da cimeira, captava-se um primeiro vislumbre da ordem mundial que o grupo que junta o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e África do Sul não esconde querer construir para substituir a ordem atual, que diz ser injusta para os seus países e que vê como ultrapassada. A expansão é apenas um passo nesse caminho, um ponto de partida para uma cooperação mais alargada no seio da organização, como o descreveu o líder chinês, carimbando o momento como “histórico”.
E quem mais sai a ganhar com a mudança? A China e o próprio Xi Jinping, que nos últimos anos tem sido o mais vocal defensor de um alargamento do grupo, considera Diana Soller. Em declarações ao Observador, a especialista em assuntos internacionais sublinha que, nas contas de Pequim, este alargamento permite ganhar um maior peso no panorama internacional e, por outro lado, integrar dois importantes financiadores, uma forma de partilhar o fardo económico de uma organização que sai cara. Apesar das garantias de vários líderes de que não querem rivalizar com os Estados Unidos e o grupo das sete economias mais desenvolvidas, o caminho traçado parece ser esse.
Esta pode ser apenas a primeira fase do alargamento e mais adesões podem estar a caminho, admitiu o Presidente de África do Sul, o último país a integrar as fileiras do grupo, em 2010. A porta fica, para já, aberta a futuras adesões, numa altura em que dezenas de países mantêm o interesse em juntar-se ao grupo. Por agora, os BRICS têm de preparar o caminho para a integração dos novos membros, alguns dos quais ainda estão a avaliar o convite — até por divisões e disputas antigas.
A expansão do clube dos cinco
Passaram mais de 20 anos desde que o economista Jim O`Neill, da Goldman Sachs, cunhou o termo BRIC para descrever a ascensão do Brasil, da Rússia, da China e da Índia no panorama mundial. A organização só viria a formalizar-se em 2009, integrando um ano depois a África do Sul, e embarca agora “num novo capítulo no esforço de construir um mundo que é justo, um mundo que é inclusivo e próspero”, defendeu o Presidente sul-africano Cyril Ramaphosa.
Como demonstrado pela expansão dos BRICS e a longa lista de países que aguardam uma adesão — mais de 40 estados mostraram interesse em integrar o grupo e 22 candidataram-se formalmente –, a oferta de uma ordem mundial alternativa está a ser bem recebida no Sul Global, onde muitos países denunciam um sistema internacional que veem dominado pelos Estados Unidos e seus aliados. “Os BRICS são claramente atrativos para estes países no Sul Global e o convite para que seis países se juntem a partir de janeiro de 2024 é um momento histórico“, diz Steven Gruzd, que chefia o departamento de governação africana e diplomacia no Instituto de Assuntos Internacionais de África do Sul, em Joanesburgo.
“Os BRICS estão a aumentar o seu alcance e influência”, destaca o investigador. As declarações conjuntas dos líderes na última semana vão precisamente ao encontro dessa vontade de ter uma voz mais forte nos assuntos globais, com apelos repetidos a uma “maior representação” dos mercados emergentes e países em desenvolvimento nas instituições internacionais, desde as Nações Unidas ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial. O caminho para lá passa, na visão dos BRICS, pelo alargamento das suas fileiras que, segundo Steven Gruzd, não pode ser separado do momento que se vive atualmente e que vê como um sintoma de um mundo muito dividido.
O próprio tema sobre a adesão — que publicamente todos os membros diziam apoiar — não foi completamente pacífico e trouxe ao de cima algumas divisões internas. A China há muito que a promovia, no esforço para construir uma ordem mundial multipolar e de desafiar o domínio ocidental, uma estratégia que tem em comum com a Rússia, que desejava a entrada do Irão. Inicialmente o Brasil não estava totalmente convencido, mas pareceu mais aberto perante a possibilidade de integrar a Argentina, que apoiou publicamente, enquanto a África do Sul foi ultrapassando as suas reservas. A maior oposição veio da Índia, que tem forjado relações mais próximas com os EUA e não estava tão inclinada em criar uma oposição direta ao Ocidente.
Estas diferenças foram visíveis nas deliberações, que se prolongaram até ao último minuto. Um oficial com conhecimento das discussões disse inclusivamente à agência Reuters que o acordo sobre a expansão chegou a ser atrasado depois de o primeiro-ministro da Índia acrescentar novos critérios de admissão, nomeadamente que os países não fossem alvo de sanções, como era o caso do Irão. “De certa forma a China parece ter conseguido convencer a Índia e os outros membros de que a expansão é uma boa ideia“, aponta Harsh Pant, que lidera o programa de Estudos Estratégicos do Observer Research Foundation, em Nova Deli.
“Tudo me leva a crer que estes membros terão sido escolhidos a dedo pela China, ainda que com algumas cedências ao outros estados dos BRICS”, concorda Diana Soller. “Pequim é talvez quem tem verdadeiramente a ganhar com o alargamento, porque vê esta organização como uma organização anti-hegemonia americana”, explica.
Os seis convites anunciados na cimeira de Joanesburgo trazem uma mescla de situações governativas e económicas para o seio dos BRICS. De um lado países como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, dois dos grandes produtores mundiais de petróleo, do outro a Argentina, gravemente afetada pela inflação e desesperada por investimento estrangeiro. Há também a Etiópia, que recupera de uma guerra civil prolongada, e o Egito, cuja economia enfrenta uma crise e é o segundo maior devedor do FMI — a Argentina é o primeiro. Não esquecendo o Irão, isolado pelas sanções ocidentais, mas também com grandes reservas de petróleo e gás natural.
Da Argentina ao Irão. O perfil dos países que foram convidados a aderir aos BRICS
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Os BRICS estenderam convites a seis países. A Arábia Saudita era um dos nomes em destaque, mas para já ainda não aceitou a proposta, enquanto a Indonésia, que se pensava estar entre os principais candidatos a membros, saiu desiludida. As escolhas trouxeram algumas surpresas, sendo a maior talvez o convite ao Irão.
Irão: Detém a segunda maior reserva de gás mundial e um quarto das reservas de petróleo no Médio Oriente. A economia, que foi classificada como a 22.ª maior do mundo em 2022, tem sido atormentada pela inflação, o crescimento lento e pelas sanções económicas dos EUA. Nos últimos anos, reforçou as ligações económicas com a China e forjou uma parceria militar e de segurança mais próxima com a Rússia – é acusado de fornecer drones usados para atacar a Ucrânia.
Argentina: Tem a terceira maior economia da América Latina e a 23.º a nível mundial. O seu principal parceiro económico é o Brasil. Enfrenta uma das taxas de inflação mais elevadas do mundo, que voltou a ultrapassar os 100% pela primeira vez em três décadas. O convite, que teve o apoio direto do Presidente do Brasil, mas também da China e da Índia, é visto pelo Presidente argentino como uma grande oportunidade económica.
Egito: É um dos principais beneficiários do apoio dos EUA, mas há muito que mantém uma relação com a Rússia e tem laços comerciais crescentes com a China. Nos últimos anos tem enfrentado uma crise económica agravada pela pandemia de Covid-19 e pela invasão russa da Ucrânia, sendo que o valor da sua moeda caiu para metade em 18 meses e a inflação anual subiu para um recorde de 36,5% em julho. Uma onda de empréstimos ao longo dos últimos oito anos tornou o pagamento da dívida externa cada vez mais difícil.
Etiópia: Tem uma das economias de crescimento mais rápido de África, mas foi muito afetado pela guerra civil na região de Tigray – que chegou ao fim em novembro do ano passado – e lida atualmente com um novo conflito que opõe as forças armadas e uma milícia na região de Amhara. Tem a segunda maior população de África, mas a sua economia ocupa apenas o 59.º lugar no mundo, segundo o FMI, e tem menos de metade do tamanho do menor membro dos BRICS (África do Sul).
Arábia Saudita: Nos últimos anos procurou assumir um papel de maior liderança no Médio Oriente, desejando equilibrar as parcerias tradicionais que mantém com os EUA e Europa com os maiores parceiros comerciais, a China e a Índia. Se aceitar o convite, o maior exportador mundial de petróleo bruto vai passar a estar no mesmo bloco económico que um dos maiores importadores mundiais, a China. Já faz parte com a Rússia da Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
Emirados Árabes Unidos: Depende de garantias de segurança dos EUA – é de Washington que recebe a maior parte das armas –, mas economicamente têm prosperado em relações não ocidentais. O Presidente, Mohammed bin Zayed, tem procurado uma maior aproximação à China e à Rússia – esteve duas vezes na Rússia no último ano e a Força Aérea nacional anunciou treinos militares com a China.
E o que teria Jim O`Neill a dizer sobre a expansão da organização cuja denominação ajudou a cunhar? Desde que os ministros dos Negócios Estrangeiros do Brasil e da Rússia propuseram a ideia de criar um agrupamento político formal do BRIC, em 2009, o economista questionou o propósito da organização, tirando o facto de servir como um gesto simbólico. Agora voltou a fazê-lo. “A decisão não parece ter sido decidida com base em quaisquer critérios objetivos claros e muito menos económicos. Por que não convidar a Indonésia? Porquê a Argentina e não o México, ou a Etiópia e não a Nigéria?”, questionou num artigo publicado pelo Project Syndicate e posteriormente pelo think tank Chatham House.
Um momento “histórico” ou um “erro político”?
Na cimeira em Joanesburgo, que num sinal da influência crescente do grupo BRICS juntou mais de 60 países e contou com a presença do secretário-geral das Nações Unidas, foi aplaudido o anúncio da expansão. Se um BRICS mais alargado levanta algumas dúvidas sobre o nível de coesão interno — especialmente numa organização que funciona com base no consenso e que já somava membros com diferenças em termos de sistemas governativos, escala de economias e objetivos de política externa — também gera perguntas sobre o potencial para competir com os países desenvolvidos e outras organizações internacionais.
Afinal, podem os BRICS assumir-se agora como um maior desafio para organizações como o G7? As respostas variam. Num artigo publicado pelo Atlantic Council vários especialistas internacionais debateram a questão. O economista Hung Tran, do Centro Geoeconómico do think tank norte-americano, considera que a expansão traz um renovado vigor ao bloco. O investigador antecipa que a Argentina e Arábia Saudita podem ajudar os BRICS a fazer chegar a sua visão mais longe no G20, uma vez que ambos os países pertencem ao grupo. Assim, do mesmo modo que o G7 coordena as posições dos países desenvolvidos antes das reuniões do G20, os BRICS poderiam fazer o mesmo quanto aos países emergentes. “Com um forte eixo China-Rússia-Irão, o grupo pode acabar por pressionar posições antiocidentais, tornando mais difícil alcançar compromissos no G20”, assume.
Com o tempo, os BRICS têm o potencial de minar o poder de países como os EUA, sublinha Jonathan Panikoff, do programa do Médio Oriente do Atlantic Council. O investigador refere-se à possibilidade de afetar as políticas norte-americanas para punir ou isolar estados, mas também de prejudicar os seus interesses económicos, especialmente se procurarem métodos alternativos de comércio e pagamento. Já Rama Yade, diretor do departamento de África, aponta que “o grupo deve ser levado a sério” e que, sabendo isso, os EUA estão a monitorizar a situação atentamente. Apesar de destacar as grandes ambições dos BRICS, lembra que enfrentam novos desafios uma vez que serão onze vozes.
É que mais membros pode significar mais interesses em conflito no seio da organização, onde o consenso na tomada de decisão dá a cada estado membro o poder de veto, e pôr em risco o objetivo de desafiar o sistema global. E podem estar em jogo interesses distintos e rivalidades antigas. Países como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, que recentemente têm apostado na construção de laços com a China, são tradicionalmente aliados próximos dos EUA. Já o Irão tem sido um dos maiores alvos de sanções dos norte-americanos — reforçadas devido ao fornecimento de armas usadas pela Rússia para combater na Ucrânia — e dele pode esperar-se uma maior oposição ao Ocidente. Para não falar da rivalidade entre Arábia Saudita e Irão, que este ano restabeleceram ligações diplomáticas rompidas em 2016 numa aproximação mediada pela China, ou das tensões persistentes entre o Egito e a Etiópia sobre a disputa das águas do rio Nilo.
“Tudo isto terá de ser bem gerido”, diz ao Observador Steven Gruzd, antecipando que os atuais membros mais pequenos dos BRICS, como África do Sul, podem ver a sua voz diluída com a duplicação do tamanho da organização. O investigador do Instituto de Assuntos Internacionais da África do Sul desvaloriza, no entanto, o peso que essas diferenças possam ganhar. “Com mais membros há mais hipóteses de divergências, mas acredito que há um acordo no núcleo dos BRICS: a vontade de criar um sistema de governação global mais justo e equitativo”, aponta.
Esta é precisamente a “cola” que tem mantido e deverá continuar a manter os BRICS juntos, destaca Diana Soller. A especialista em assuntos internacionais lembra que, apesar deste objetivo comum, o grupo está longe de ser tão coeso como outras organizações. É o caso do G7, que por concentrar no grupo apenas democracias e ter uma “carga histórica” que não deixa de ser relevante vê os seus laços fortalecidos, explica. Um exemplo prático da coesão, refere, é a forma como ao longo do último ano a organização que se formou para englobar as sete maiores economias tem vindo a adquirir funções políticas com a invasão russa da Ucrânia, estando inclusivamente a trabalhar num documento para dar garantias de segurança à Ucrânia no pós-guerra. “A China pode ter a ilusão de que consegue ser uma espécie de líder incontestado dos BRICS, e pode mesmo vir a sê-lo, mas este tipo de rivalidade vai sempre enfraquecer o grupo”, sublinha.
No alargamento dos BRICS, Diana Soller vê um “erro” do ponto de vista político e um passo “precipitado”, com duas grandes desvantagens. Por um lado, porque tornou o processo de tomada de decisões mais difícil, que pode ser particularmente problemático na ausência de mecanismos para os membros se entenderem entre si. “São estados muito diferentes entre si e a menos que seja a China a decidir tudo e os outros estados a corresponder à sua decisão vai ser muito difícil a tomada de decisão dentro dos BRICS”. Por outro lado, há também o facto de ter sido convidado um país como o Irão, visto como uma pária internacional e que “não prestigia” uma organização internacional.
“Os estados que já pertencem aos BRICS são muito diferentes entre si, mas têm em comum o facto de serem ou tentarem ser potencias regionais, o que lhes trazia credibilidade. Perdem o significado principal ao trazerem para o seu seio um conjunto de rivalidades regionais”, afirma a investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais. Pelo contrário, se conseguirem ultrapassar as suas diferenças, poderão ter uma voz significativa em uníssono. “Aí sim poderá ser mais forte do ponto de vista internacional.”
Quase metade da população mundial e um grande aumento do PIB. Quanto vão crescer os BRICS?
“O mundo nunca mais será o mesmo. O BRICS é hoje mais forte do que o G7“. As palavras são do Presidente do Brasil, Lula da Silva, no seu habitual direto nas redes sociais. Para o chefe de Estado brasileiro, Argentina, Etiópia, Egito, Irão, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos vão tornar o grupo “mais poderoso, mais forte e mais importante”. Certo é que, com a expansão aos seis países, o grupo vai crescer em termos de população e da percentagem de Produto Interno Bruto (PIB) a nível mundial.
No seu estado atual, o grupo representa cerca de 40% da população (3,2 mil milhões de habitantes) e um quarto do PIB global, cerca de 26%. A partir de 1 de janeiro de 2024, vão representar praticamente metade da população global (cerca de 46%), elevar para 29% o PIB conjunto e de 18% para 21% o comércio de bens, segundo dados apresentados por Li Kexin, oficial sénior do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, durante uma conferência de imprensa na semana passada. Em termos de PIB em Paridade do Poder de Compra, o grupo vai crescer de 32% para 36%, ultrapassando o do G7.
A expansão dos BRICS até pode ser um fator importante para alguns dos novos membros, famintos de capital, como o Irão e a Argentina, mas alguns analistas consideram que um benefício económico mais amplo para os membros do bloco está longe de ser certo. “Não sei se diria que é um game changer, mas em termos de abertura dos mercados de consumo há escala“, disse à Reuters Ola El-Shawarby, gestor do Emerging Markets Equity Strategy na Van Eck, em Nova Iorque, confrontado com os dados apresentados por Li Kexin. Por outro lado, a China, o Brasil e a Índia vão beneficiar em termos de acesso fácil ao petróleo, enquanto a Argentina e o Irão vão sair a ganhar em termos de acesso aos mercados e investimento estrangeiro, disse também Jakob Ekholdt, do BankInvest, em Copenhaga.
“Embora o crescimento mais rápido dos países BRICS, em oposição ao do G7 e de outras nações industrializadas, tenha criado as suspeitas de que o bloco é ameaçador à ordem económica mundial estabelecida pelo Ocidente, os novos países membros não exibem necessariamente essas características“, nota também a analista da Statista Katharina Buchholz num artigo de análise publicado pela Forbes. A também jornalista de economia dá exemplos: a recessão argentina de 2018/19, a crise monetária egípcia de 2017, bem como as flutuações no mercado petrolífero que afetaram severamente o Irão, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita em 2015, 2016 e 2019.
Não é provável que haja um benefício económico imediato da adesão para os membros, que já têm extensos laços bilaterais com a China, completa Margaret Myers, diretora do programa Ásia e América Latina no instituto de Diálogo Inter-Americano. Sublinhou, no entanto, em declarações ao The Guardian, que esta é uma mudança significativa e que não deve ser ignorado pelo G7 e pelos intervenientes do Norte Global.
O que se segue então para os BRICS no plano económico? Durante a cimeira já ficaram algumas pistas. Permanece o objetivo da desdolarização, isto é, a substituição do dólar como moeda de referência nas trocas internacionais. “É um objetivo muito ambicioso, mas muito difícil”, sublinha Diana Soller. “As moedas de quaisquer países dos BRICS, mesmo o yuan da China, são moedas mais fracas do que o dólar e o euro. E é muito difícil criar dois tipos de moeda no comércio internacional. Traria grandes vantagens para os países dos BRICS, mas criaria uma confusão enorme nos países”, considera.
Há também no horizonte a possibilidade de se estabelecer uma moeda de referência, à semelhança do euro, para substituir o dólar nas transações comerciais dos BRICS. Esta é uma grande ambição do presidente brasileiro. “A gente não precisa ficar negociando com dólar, a gente pode negociar nas moedas nossas”, disse esta terça-feira. Esta opção, defende a especialista em assuntos internacionais, também não parece muito viável e traz complicações. “Estes países precisam muito de ter controlo da sua política económica. Por exemplo, a Argentina ou o Brasil precisam de ter controlo sobre a sua moeda para criar políticas de combate a problemas como a inflação”, explica.
Uma porta aberta a futuras expansões
Depois de 13 anos de porta fechada, os BRICS vão assumir agora uma política diferente. “Temos um consenso sobre a primeira etapa da expansão e outras virão a seguir”, prometeu o Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, durante a cimeira em Joanesburgo. Um ou outro país que não passou na primeira fase poderá já estar a ser considerado para o futuro. “Haverá uma segunda fase de adesões e a minha expectativa e o meu desejo é que a Algéria esteja entre eles”, assumiu o ministro das Finanças de África do Sul, citado pelo jornal nacional EWN.
As expectativas são grandes sobre o que o futuro dos BRICS pode trazer, admite Harsh Pant, afirmando que não é totalmente claro que os BRICS tenham alcançado muito até agora, além da criação do Banco do Desenvolvimento. “Os BRICS têm à sua frente tempos interessantes e a Índia vai ter de navegar cuidadosamente os desafios que vêm com a expansão”, aponta o diretor do programa de Estudos Estratégicos do Observer Research Foundation, em Nova Deli.
Sobre o peso da África do Sul, a única entrada na organização entre 2010 e 2023, há prestígio por ter organizado uma cimeira de “sucesso”, destaca Steven Gruzd, do Instituto de Assuntos Internacionais da África do Sul. No próximo ano essa tarefa está nas mãos da Rússia, que desta vez se viu representada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, uma vez que recai sobre o Presidente russo um mandado de detenção do Tribunal Penal Internacional.
O Presidente Xi Jinping e a China são claramente os vencedores com esta mudança, mas sobre futuros alargamentos ainda está tudo em aberto, admite Diana Soller. Só vê dois caminhos possíveis: uma avaliação da primeira fase da expansão que determine o avançar da segunda, ou um alargamento por si só, como parte da ideia de que trará cada vez mais peso político. “É preciso esperar para ver”, sublinha.