Luís Castro Henriques entrou na administração da AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) em 2014, chegando à presidência do organismo em 2017. Termina o mandato em dezembro e já assumiu que não vai continuar. Em entrevista ao Observador, garante que ainda não sabe o que vai fazer a seguir. “É uma preocupação que terei daqui a umas semanas mas acho que é uma preocupação que irá ser resolvida rapidamente”, concluiu.
Mas sai porque se fecha um ciclo. Um ciclo que, diz, foi de recordes. Recorde de projetos de investimento em carteira e contratualizados. Este ano, no entanto, não se fecharão contratos, devido ao ciclo dos fundos estruturais. No entanto, admite que está, agora, na altura de pensar no fomento das exportações. As empresas têm estado bem nessa componente, mas Portugal pode ir mais longe. E acredita que até nem é de descartar poder alcançar os 75% do PIB. As exportações valem hoje cerca de 45% do PIB, com este ano a superar os 100 mil milhões de euros.
O que o faz sair da AICEP?
A concretização da missão que me foi dada em 2014, na prática. O objetivo em 2014 era relativamente simples e continua a ser o mesmo, mas mais facilitado hoje em dia, que era aumentar o investimento, sobretudo o investimento externo de natureza industrial, e criar postos de trabalho. Estamos a falar de uma altura em que a taxa de desemprego estava nos dois dígitos e, portanto, era muito complicado. Era também complicado posicionar o país para investimento industrial, que é investimento de longo prazo, que exige muita ponderação. Depois passei de CFO para CEO e, nestes últimos anos, estive à frente à agência, o que permitiu fazer todo o ciclo de investimento, o PT 2020 — aliás, eu entrei ainda no final do QREN e depois fiz o PT 2020 todo. Ao concretizar isso colocava-se a questão: será que faz sentido fazer outro ciclo? Eu olho muito para a missão, o objetivo que temos em cima da mesa e, às vezes, nem sempre os mandatos de três anos batem certo com isso. Creio que agora a natureza dos desafios será um bocadinho diferente e isso seria um ciclo novo. Faria sentido fazer esse ciclo novo? Eu achei que já iria ser muito tempo. Acho que também é importante nas organizações, a certa altura, virem outras pessoas. Os desafios são claros, já temos também muito trabalho estratégico preparado, mas agora é preciso vir uma equipa nova.
Mas o ciclo novo é por causa do PT 2030?
Não é só o PT 2030. Há duas coisas. Creio que os desafios desta década para a agência são de natureza diferente e muito mais indexados ao posicionamento das exportações. Subir as exportações em preço, sobretudo. Portanto, será muito associado ao que nós chamamos a ‘estratégia marca país’, ao posicionamento do país. O que é significativamente diferente do desafio que eu tinha, que era muito ligado ao investimento. Creio que a máquina do investimento está montada, os resultados estão à vista e, aliás, este ano, que é um ano em que não há quadro comunitário, não há novos contratos, mas mesmo assim vamos outra vez bater de longe o recorde de novos clientes. Isso é algo que fica e não vejo motivo para que não continue. Agora, é preciso desenvolver as outras dimensões, é preciso capitalizar todo o investimento que se fez na internacionalização das empresas nestes últimos anos com desafios diferentes. E é preciso ter aqui uma perspetiva de longo prazo. A ideia seria estar mais um ciclo de cinco ou seis anos e já seria demasiado tempo.
Não foi abordado ou convidado para ser reconduzido?
Não gosto de falar de conversas privadas que tenho com membros do Governo sobre essa matéria. A questão nunca se colocou dessa forma.
Pela sua vontade?
Eu saio claramente pela minha vontade.
Então havia vontade do Governo para que ficasse, chegou a ver abordagens nesse sentido?
Reitero que não comento conversas privadas. O que posso dizer é que tenho tido uma relação até muito positiva com o Governo. A minha função é estritamente técnica, tem objetivos concretos e claros. Falou-se há muitos meses que estava a chegar ao fim deste mandato e que eu não iria fazer outro mandato completo. Chegou a altura de mudar.
O facto de ter entrado na AICEP durante um governo PSD/CDS e depois de ter sido escolhido para a presidência por um Governo ligado ao PS que significado tem? É possível haver gestores em organismos públicos sem ligações partidárias?
Posso falar do meu caso. Creio que sim.
Não tem ligação qualquer partidária?
Não.
Falou da boa relação com o governo. A relação foi melhor com este governo ou com o anterior?
A relação com o governo foi sempre muito positiva. Até posso dizer que o mandato que recebi de todos os governos, e já passaram cinco governos diferentes, foi sempre o mesmo, e foi: ‘faça mais e melhor, traga mais investimento e aumente as exportações’. Nunca tive qualquer restrição no mandato em qualquer enquadramento político. Sempre tivemos uma relação positiva. Como é óbvio, a AICEP tenta trazer os melhores resultados possíveis para o país. É absolutamente consensual que o país precisa de aumentar o investimento e as exportações. Aliás, na própria conferência em que o senhor primeiro-ministro interveio e explicou que eu saía de livre vontade, também agradeci a membros de todos os governos com quem trabalhei.
A tutela direta é dos Negócios Estrangeiros, embora haja uma perninha das Finanças, por ser um organismo público, e também da Economia por causa da missão que têm. São demasiadas tutelas? E acha que está bem colocado nos Negócios Estrangeiros ou deveria evoluir para outra pasta? Que conselho daria agora que já tem esta experiência?
Ao longo de nove anos nunca comentei decisões políticas nem decisões diretas do Governo. A AICEP trabalha com o que tem e tenta fazer o melhor. Essa é uma decisão da organização do Governo. Cabe ao Governo decidir como é que se quer organizar. É natural que a AICEP tenha várias tutelas e sobretudo muitas interações com muitos membros do Governo, dada a nossa atividade. Se pegar no lado do investimento, nós temos relações com quase todos os ministérios, que vão do Ambiente à Economia e aos Negócios Estrangeiros. Se pegarmos nas exportações, temos Negócios Estrangeiros e Economia. Se pegarmos em temas financeiros temos as Finanças. A forma como a tutela é organizada é uma decisão do Governo, cada governo decide organizar-se como prefere. Depois, no dia a dia, temos interações com estes mistérios todos. É absolutamente natural.
Mas é uma relação fácil? Nunca teve nenhum entrave nas suas funções por ter quase uma tri-tutela?
Não. Tivemos os cenários quase todos, três tutelas, duas tutelas, quatro tutelas. Para mim, um entrave seria um entrave aos objetivos da agência. Nunca tivemos. Pode ser mais complexo em termos de trabalho administrativo, pode ser mais complexo em termos de trabalho de coordenação mas é uma decisão de organização do Governo e para nós não é um tema.
Nessas tutelas todas, houve algum período de incompatibilidade ou dificuldade com algum ministro?
Não. Nunca tivemos nenhuma complicação de maior.
Quando cessar funções não tem qualquer inibição legal ou por estatutária em ir para uma empresa ou para algum setor. Creio que a AICEP não tem como têm, por exemplo, os reguladores.
Há aqui duas dimensões. Uma é a inibição legal e é óbvio que não posso ir para empresas a quem tenha concedido incentivos.
Mas é porque acha que não deve, não é por estar inibido pelos estatutos.
A lei tem incompatibilidades concretas em relação a isso, como gestor público. E bem. Depois há também um critério ético. Sobretudo para empresas com quem uma agência do Estado tenha tido uma relação financeira não faz sentido ir.
Isso limita-lhe muito as opções futuras?
Tendo em conta a quantidade de investimento que fomentámos nos últimos anos, sim. Mas eu não vejo isso dessa forma. Temos de endereçar cada desafio por si e aqui o desafio era, claramente, trazer mais investimento, fomentar o investimento dos que já cá estavam, e portanto será uma limitação dos próximos anos.
Acha que os estatutos deviam prever essa inibição, por exemplo de dois anos?
A lei já tem prevista [a inibição] com empresas com quem tenha tido relacionamento financeiro, sobretudo incentivos. No caso da AICEP é preciso perceber que são negociados. Portanto, há atos que são analisados caso a caso, portanto faz sentido que não se possa trabalhar com essas empresas. A lei prevê bem. Não creio que nessa matéria seja preciso rever.
E em relação à limitação de mandatos que não existe?
Não. Acho que é preciso olhar para os mandatos pelos objetivos que pretendemos atingir e nem todos os objetivos são possíveis de atingir num mandato de três anos. Acho que faz sentido discutir se são três anos ou um bocadinho mais. Agora inibição não. Pode ser que um ciclo seja mais longo. Eu, na prática, vou estar na AICEP nove anos, porque entrei primeiro como CFO. O que foi particularmente útil para a preparação, porque depois o desafio como presidente tem outras naturezas outros desafios.
Foi útil ter passado primeiro como administrador antes de chegar a presidente?
Foi particularmente útil.
Seria, então, uma recomendação informal que faria para o futuro?
Claramente é uma vantagem, sem dúvida. Ainda por cima, nesses primeiros três anos tinha pelouros muito importantes. Sempre tive o pelouro do investimento e toda área financeira, e fica-se com um conhecimento muito aprofundado do que é a agência. Obviamente consegue-se capitalizar depois quando se avança para outras funções.
Rui Rio, quando foi presidente do PSD, foi uma das personalidades que verbalizou críticas à AICEP, dizendo até que a entidade dava um apoio “muito ineficaz e nalguns casos até apoio nenhum”, e dizia que as queixas tinham aumentado. Isto não foi há muito tempo. Tem recebido queixas?
Não me envolvo em política porque acho que a função é explícita, concreta e clara. Não comento o debate político, que é natural em democracia. Mas, numa perspetiva técnica de avaliação de queixas, acho que não, antes pelo contrário.
Mas acha que há uma perceção errada do trabalho da AICEP por parte dos partidos, por exemplo?
Não.
Nunca houve ou foi mudando?
A minha preocupação primordial é servir empresas e servir o tecido económico do país. Tenho de me preocupar se as empresas se queixam em relação aos nossos serviços e, como qualquer entidade que presta serviços, é óbvio que recebemos algumas queixas e há coisas que podiam ser feitas melhor. Mas no geral recebo muito mais palavras de louvor em relação a trabalhos das nossas equipas, seja em Portugal ou fora, seja de clientes novos ou de clientes antigos, do que queixas. Depois também há muitas recomendações de operações que podíamos fazer melhor, e é absolutamente natural.
“Resultados do investimento são claros”
Em qual das missões da AICEP considera que, no seu mandato, poderia ter ido mais longe ou feito melhor?
É sempre ingrato sermos nós a avaliar o nosso próprio trabalho. Os resultados do investimento são claros. Aí transformámos o paradigma de captação de investimento do país, de implementação de investimento. A competitividade da própria agência em relação a outros mudou muito. Talvez pudéssemos ter explorado mais alguns mercados.
Como por exemplo?
Não queria entrar nessa discussão porque também fizemos um trabalho, nestes últimos dois anos, de preparar uma série de documentos estratégicos para o próximo plano estratégico. Será a nova gestão a fazer a avaliação. O que me cabe fazer é preparar essa informação e garantir que, depois, poderão tomar as melhores decisões possíveis. E temos feito uma série de missões a vários mercados, onde depois avaliamos qual é a tipologia de relacionamento que temos nesse mercado. Não temos de ter presença permanente em todos os mercados, porque isso tem custos muito significativos. Temos de definir bem isso. Agora há um conjunto de mercados onde se calhar nem faz sentido ter presença permanente, mas faz sentido ter algum tipo de relacionamento. E definir esse tipo de relacionamento é uma coisa que o próximo plano estratégico terá de fazer. Durante estes nove anos tivemos períodos em que abrimos delegações, também tivemos períodos em que encerrámos. A AICEP vive também de trabalhar os ciclos económicos, por isso há países que estão num enquadramento positivo depois passam por um período em que é mais difícil fazer negócio. Mas diria que hoje em dia temos uma rede externa muito resiliente e muito focada em mercados de elevado valor acrescentado. Acabei de abrir as duas últimas delegações do mandato em Helsínquia e Oslo e estou absolutamente convencido que vão contribuir com muitas centenas de milhões de euros de exportações nos próximos anos. Não vai ser de um dia para o outro. Do ponto de vista de investimento, até a própria Finlândia já tem contribuído de forma relevante para Portugal e estou convencido que irá aumentar.
De todas as missões que lhe cabem qual é que lhe ocupa mais tempo: a internacionalização e o aumento das exportações; a captação de investimento; ou a promoção de Portugal e a cooperação com os mercados?
Os clientes da AICEP, desde os investidores aos exportadores. O que ocupa a larguíssima maioria da minha agenda e as minhas prioridades é, obviamente, perceber como é que Portugal pode dar uma resposta competitiva seja ao investimento seja às exportações. Houve períodos em que o tema mais premente era o investimento, depois o investimento entrou numa rota de crescimento e tivemos períodos em que o tema crítico eram as exportações. Basta relembrar um bocadinho aquele período da Covid. No primeiro confinamento ninguém sabia o que ia acontecer, tivemos de dinamizar task forces para tudo e mais alguma coisa, para resolver os problemas imediatos que as empresas tinham a exportar naquele momento. Isso variou muito. O cerne da minha preocupação são as empresas que investem e exportam a partir de Portugal.
Exportações podem crescer mais
O governo traçou como objetivo dentro de uma década que as exportações cheguem a 50% do PIB. Acha possível que se chegue a este valor?
Eu creio que vamos lá chegar bastante antes do final da década.
Estamos com 45%…
No primeiro semestre chegámos a 49%. Vamos assumir que pode ser conjuntural, estamos a ter um ano fantástico. Este ano vamos bater outra vez o recorde absoluto de exportações de bens e serviços. Vamos ultrapassar mais de 100 mil milhões de euros de exportações, que é uma barreira muito interessante. Estou convencido que este ano vamos ficar acima dos 45%. Para a AICEP o que interessa é perceber se estamos a ir na tendência certa, e onde é que estamos a ser competitivos e onde estamos a ganhar quota de mercado ou onde é que estamos a subir em valor. Estou convencido que nós vamos chegar aos 50% nos próximos dois anos.
Vamos ter que redefinir as metas?
Sim e bem. Temos de começar a preparar para chegar aos 60 ou 65%, provavelmente até chegar aos 75%. Isso são trabalhos de décadas. Se há algo que nós conseguimos comprovar esta última década é que conseguimos fazer isso. Não há motivo nenhum para não continuarmos [a crescer]. Nós somos um país pequeno geograficamente e do ponto de vista demográfico e se queremos crescer, e ambicionamos todos um melhor nível de vida, temos de continuar a exportar e temos de perceber qual é a equação que nos permite manter uma taxa de investimento inovador relevante que permita sistematicamente ter este círculo virtuoso de aumento exportações. O investimento que a AICEP trabalha é todo de natureza exportadora.
75% não é uma fasquia demasiado elevada para a dimensão do país?
Não estou a dizer que é para atingirmos até 2032… O que eu estou a dizer é que se estamos a chegar a 50% tem de começar o processo de reflexão para chegar a 60%. Coloca-se a questão: faz sentido abrandar as exportações? A resposta é não, nem pensar. Então agora como é que vamos chegar ao próximo patamar? Gostava de passar a mensagem é de que conseguimos com o que fizemos nesta última década. Dá trabalho, é preciso ser insistente, resiliente é preciso definir qual é o verdadeiro ângulo da competitividade do país e isso foi um trabalho que se fez em 2014/2015, mudar a narrativa da abordagem com a consequente mudança da tipologia de clientes que abordávamos. Agora é preciso voltar a fazer essa reflexão. O ângulo de investimento está estabilizado para esta próxima década. O nosso fator competitivo diferenciador está claríssimo e é o talento, é isso que nos permite diferenciar e apresentar soluções competitivas para investimento industrial, para investimento em serviços e para investimento em I&D.
Portugal pode ter um nível de contratualização de dois mil milhões ao ano
Qual é o atual pipeline que está a ser negociado pela AICEP e ainda não concluído?
Pipeline é o universo completo de projetos em análise e quando digo em análise são projetos que estão a olhar para Portugal, portanto em que estamos numa fase completa de concorrência com muitos outros países. Depois, o funil vai ficando cada vez mais fino e temos o pipeline já em fase final. E nesse, hoje em dia, estamos a falar à volta de 2,5 mil milhões. Nós concretizámos 2,7 mil milhões de contratualização em 2021 e eu acho que é perfeitamente razoável termos uma tendência de dois mil milhões nos próximos anos, havendo as ferramentas — não esquecer que estamos num ano de transição de quadros em que as ferramentas não estão abertas. Mas o pipeline em fase final, chamemos-lhe assim, está mais ou menos nos 2,5 mil milhões.
Que já está em negociação?
Na prática quer dizer que estamos a concorrer já com muito poucos países — com dois, no máximo com três. O pipeline representa o universo de oportunidades de investimento que podem aparecer em Portugal. E esse é um número muito interessante. O pipeline de 2014, numa década até hoje, multiplicou-se 10 vezes [até aos 10 mil milhões], quer dizer que conseguimos entrar num universo muito mais alargado de oportunidades em que Portugal é considerado. É um resultado fantástico. E o que estamos a ver é que concretizamos três vezes mais novos clientes por ano do que há uma década.
Tem uma ideia da percentagem de concretização desse global e do afunilado?
Com este pipeline tão grande temos de ver como é que vai ser o comportamento, porque este pipeline muito grande também dá outro sinal muito interessante para o país que é o de termos começado a ter projetos de muito maior dimensão do que tínhamos há 10 anos. Hoje em dia temos sistematicamente também projetos de várias centenas de milhões e alguns até mega projetos acima dos 1.000 milhões que estão em discussão.
Mil milhões num pipeline de 2.000 milhões?
No pipeline global [10 mil milhões] que multiplicou 10 vezes. Em 2014 quando nós abordávamos investidores, sobretudo os que não operavam em Portugal, era muito complicado vender Portugal como um destino de investimento industrial. Ainda por cima estava a sair de um programa de intervenção da troika e portanto na altura os 1.000 milhões de euros de pipeline [global] era o que conseguíamos com alguma dificuldade. Com o trabalho todo que foi feito, a captação até individualizada através da nossa rede de scouts, etc, de repente estamos com um pipeline 10 vezes maior. Portanto o número de oportunidades é muito maior. Respondendo à pergunta anterior, nós hoje em dia convertemos pelo menos três vezes mais clientes por ano do que convertíamos há nove anos.
Pipeline de investimento este ano é de 10 mil milhões de euros
Clientes não significa valor do investimento… Em termos de valor de investimento concretizou mais quanto?
Contratualização são quase 5.000 milhões no PT 2020 de investimento produtivo. Não estou a incluir aqui os 2,2 mil milhões de investimento à internacionalização, investimento que as PME fazem na internacionalização e que é financiado a 45% por nós na sua atividade comercial. No investimento produtivo, estamos a falar sobretudo de fábricas, de unidades produtivas e centros de engenharia, aí concretizámos quase 5 mil milhões no PT 2020. O que representa uma subida de quase 100%, de 90%, do negócio em relação ao QREN. Portanto, duplicámos o negócio de captação de investimento.
Consegue dar-nos algumas pistas de qual foi o investimento que mais demorou ou mais trabalho deu a negociar e a concretizar?
São muitos. O investimento industrial demora algum tempo. Cada projeto tem os seus desafios. Às vezes até projetos de clientes que já estão em Portugal, mas que são de natureza diferente, vão procurar incentivos diferentes, etc. Todos têm os seus desafios. Tivemos desafios enormes de licenciamento em alguns dos projetos porque eram coisas novas, porque eram em zonas que não estavam inicialmente previstas, tivemos desafios grandes por exemplo em negociações de incentivos com alguns projetos e conseguimos explicar bem aos clientes. Isso deu resultado. Foi algo que se montou ao longo dos anos. Mesmo o processo comercial transformou-se em 2015/ 2016. Todos os projetos têm as suas dificuldades, dá muito trabalho, mas também dá imenso gozo concretizá-los. A vantagem da nossa atividade é que literalmente podemos olhar para a lista de projetos e dizer ‘vá ali a Águeda ver, vá ali ao Fundão ver, vá ali a Braga ver, vá ali Évora ver ‘.
Fazemos a pergunta de outra forma. Qual foi a maior frustração do investimento que teve quase a vir para Portugal e não veio?
(risos) Por acaso não há nenhum que diga que tenho um grande amargo de boca. Nós assinámos centenas de contratos — em 2021 foram 90 e muitos — algo radicalmente diferente do que era há uma década. Destes contratos todos que assinámos temos cerca de quatro que não foram concretizados: um por clara incapacidade da empresa desenvolver o projeto; outro porque todo o processo de instalação da empresa tinha complicações em termos de timing de mercado e portanto tiveram de optar por outra solução; outra empresa em que o mercado mudou — esse até estavam já quase a construir as fundações da fábrica — mas de repente apercebem-se que não faria sentido fazer investimento; e houve um que mudou com o Covid e que eu tenho alguma pena porque era mais um investimento grande no automóvel em Portugal. Mas com o Covid apareceu-lhes uma solução feita, pronta para puderem seguir. E foi um racional que a empresa fez. A empresa chegou a contratualizar o terreno, as obras, e ainda hoje mantém alguma operação cá, portanto está bem com o país, com o trabalho que fizemos que ainda mantém uma parte dos serviços a partir de cá. Não tenho assim grandes arrependimentos. Mas posso responder ao outro lado. Acho que é uma enorme vitória o que se conseguiu no setor aeronáutico, o facto de hoje em dia termos também a Airbus a produzir de cá. Até posso ir mais longe: era um objetivo que tínhamos. É muito importante que tenhamos diversificação mesmo dentro dos próprios sectores. Não só o setor tem o seu ciclo como cada empresa também tem o seu ciclo. Esse foi um projeto que deu muito trabalho e foi extremamente competitivo e estamos muito contentes. E todo o aumento — aliás é o maior setor investidor no PT 2020 — que fizemos no setor automóvel, nos componentes automóveis, é muito significativo e isso deixa-me muito contente porque hoje em dia temos produção quase total da cadeia de valor de um automóvel, mas já temos várias empresas e vários casos angariados em 2020 e em 2021 de empresas que produzem componentes que nem sequer são incorporados nas OEM [Original Equipment Manufacturer, construtoras] que estão cá em Portugal, utilizam a força competitiva de Portugal para exportar para o centro da Europa e já relacionados com a mobilidade elétrica, com o automóvel elétrico. Isso foi um trabalho de transformação grande e que se conseguiu concretizar e que continua em curso. É um padrão que nós vemos no pipeline que fica para a frente.
A Autoeuropa é um caso referido de excessiva dependência de Portugal em relação àquela única empresa. Há um risco da Autoeuropa sair de Portugal?
Não creio que isso esteja em cima da mesa. Todos os investidores podem sempre considerar… mas a Autoeuropa tem um modelo novo.
A mobilidade elétrica não faz perigar a fábrica?
O planeamento mantém-se. Aliás o T-Roc está a ter imenso sucesso comercial e a produção aumentou muito significativamente. Acompanhamos, e não tenho qualquer informação contrária. Como é óbvio toda a indústria automóvel está a fazer uma transformação, e algures no tempo há de chegar cá, à Autoeuropa e não só. A dimensão de componentes para nós foi muito importante porque não só assegura competitividade para quem se instalar cá, mas acima de tudo permite a diversificação. O que interessa mais ao país é estar o mais diversificado possível em setores, em geografias e depois dentro desses setores mesmo em termos de próprios componentes.
Mas estamos diversificados? A Autoeuropa e os seus fornecedores têm um peso muito grande.
É óbvio que o maior produtor de automóveis é a Autoeuropa, tem um peso muito importante. Mas com o número de empresas de componentes que trouxemos nos últimos anos, e que vai de Viana do Castelo a Setúbal, passando por muitos pontos no interior, nós conseguimos diversificar. A dependência que tem de alguns OEM é reduzida. Uns produzem para os OEM em Portugal, outros produzem para os OEM em Espanha, outros para França, outros produzem para todos, a lógica tem de ser continuar a diversificar. E o aumento da exportação do setor automóvel tem uma dimensão de componentes muitíssimo relevante que decorre exatamente destes investimentos.
Centros de serviços já empregam mais de 70 mil pessoas em Portugal
Nos últimos anos houve uma grande preocupação e uma grande aposta na captação de centros de serviços para Portugal.
Isso faz-me voltar à questão que colocaram e não respondi totalmente. Sempre que se fala de novos clientes nem tudo representa investimento. Tudo representa investimento, só que nem tudo é mensurável em capex (investimento de capital, em maquinaria), que é esse normalmente que está em causa quando falamos dos 2,7 mil milhões, que é quase tudo investimento em maquinaria, em fábricas novas. Nós não estamos a incluir nesses investimentos, os centros de serviços, essencialmente de software e centros de competências, que é medido em novos clientes. Por dois motivos. Num centro de serviços é um tema de opex [custos operacionais], não é um tema de capex…
São pessoas…
Aí medimos os postos de trabalho criados. Segundo aspeto, a relação contratual é completamente diferente. Nos projetos industriais temos contratos de incentivos, são contratos com regras específicas. Nos centros de serviços não: uns pela velocidade de operação, outros pelo nível de inovação, e têm outro tipo de apoios.
Quantos centros já existem atualmente e quantos postos de trabalho foram criados?
Devemos estar a chegar a 240 centros e entre 70 e 75 mil postos de trabalho. Era um setor que há 12 anos ninguém falava dele, não existia, e é muito interessante ver que nos últimos quatro anos o setor duplicou e ver a tipologia de centros que estão a vir para Portugal. Dominam nestes últimos quatro anos os centros de competências avançadas, ou seja, atividades complexas muitas vezes os backoffices de multinacionais, mas o que cresce mais, de longe, são centros de desenvolvimento de software. Isso é muito interessante porque representa oportunidades relevantes para a tipologia de talento que temos a sair cada vez mais do nosso sistema de formação.
A falta de mão de obra qualificada não é um entrave?
Há 10 anos o problema que eu tinha era o contrário, havia mais de 17% de desemprego e o desemprego jovem a chegar aos 36 ou 37%. [A falta de mão de obra] é um problema que tem de se resolver. Mas se me perguntar qual é o principal desafio competitivo que o país tem na próxima década é o de manter e aumentar o output de talento altamente qualificado que nós temos. Temos de aumentar a dois níveis: não só a capacidade de produção deste talento, seja no sistema universitário seja no ensino técnico, mas também temos de aumentar a capacidade de atrair jovens para estudarem cá e que depois se estabelecem cá. É óbvio que trazendo mais investimento, sendo mais competitivos, e tendo mais atividade também precisamos de mais pessoas para trabalhar e para suprir necessidades destas funções de maior valor acrescentado.
Os agora polémicos vistos para os nómadas digitais ajudam nessa captação ou não tem impacto?
É uma atividade um bocadinho diferente. Os nómadas digitais têm muita mobilidade e têm um impacto na economia interessante mas não podemos comparar com o estabelecimento de centros de serviços ou centros de desenvolvimento de software estruturados com 400 elementos a desenvolver, com salários processados cá, toda uma atividade cá, e todo um centro nevrálgico cá. E é isto que é muito interessante assistir nestes últimos quatro anos. A tipologia de centros que trouxemos para Portugal são centros que têm uma dependência muito maior de know-how, que também implicam uma estabilidade relevante.
O risco de saírem não é tão grande? Normalmente fala-se da fábrica ou da indústria como sendo mais difícil de sair de um país. Os centros de serviços são mais fáceis de sair de um país para outro. Essa tipologia impede que haja essa mobilidade tão grande?
Sim. Uma fábrica é montada para ter uma vida média de 20 a 25 anos. É sempre um período relativamente longo, mas quando chega aos 20 anos está num momento difícil, portanto ou se aposta para mais 20 ou não. As maiores âncoras do país são a dependência do know-how, do conhecimento desenvolvido localmente e portanto os investimentos mais perenes são os investimentos em I&D, que foi aquilo que triplicámos neste último quadro comunitário, porque mexer 600 ou 700 pessoas que têm um know-how específico e que não existe noutro sítio mundo é muitíssimo difícil. A facilidade de mobilidade está indexada ao nível de know-how que esse hub tem, seja ele industrial, seja ele de serviços. Nesse sentido temos trabalhado cada vez mais para trazer para cá centros com maior complexidade, onde a taxa de retenção, a taxa de mobilidade é diferente. Quanto mais simples for a operação mais indexada a sua valorização está meramente ao preço. O que se conseguiu diferenciar, e eu acho que isso é uma enorme vitória do país, foi trabalhar segmentos em que o critério fundamental é o acesso a talento, quem sabe, quem consegue produzir, quem consegue desenvolver estas soluções de software, quem consegue desenvolver soluções de cibersegurança, quem consegue desenvolver soluções de inteligência artificial. Nós fizemos um inquérito há pouco tempo junto de quase todos estes centros de serviços e o segmento que cresce mais em Portugal, mesmo dos que já cá estão, é a inteligência artificial. Centros de desenvolvimento de inteligência artificial como é óbvio são autênticos centros de conhecimento.
Queixas dos investidores? Pedem estabilidade fiscal
Quais são as principais queixas das empresas que querem investir em Portugal: burocracia, carga fiscal?
Não comento nem nunca comentei medidas que são do governo, que são natureza de decisões de governo. Não vou entrar nesse tema. Posso comentar aquilo que oiço dos clientes e aquilo que os clientes põem nos próprios inquéritos. Na burocracia pode-se sempre melhorar, sempre, portanto, é um jogo infinito.
E melhorou ou tem melhorado?
Nós acompanhamos projetos de natureza muito específica, projetos que têm acesso à Comissão permanente de apoio ao investidor, e, por isso, não posso comparar o universo dos nossos projetos com a realidade de todo o trabalho das empresas que operam cá. É sempre um jogo relativo se sou mais ou menos burocrático que outros países, e aí de facto nós temos visto uma tendência em que estamos melhores do que uma série de outros países até do centro da Europa.
Mas estamos pior que outros…
É isso mesmo. Temos é de estar muito atentos. O jogo competitivo é um jogo constante e permanente, quem parar fica para trás. Em relação às queixas que ouvimos… As empresas investidoras e as empresas industriais têm uma preocupação relativamente à estabilidade fiscal. O tema primordial e que acho que é uma preocupação que é preciso ter como país é a necessidade de ter previsibilidade.
Não é muito fácil em Portugal. Qual é o argumento que aponta para defender o país?
Todos os anos no Orçamento do Estado podemos quase reinventar o país, mas a verdade é que há uma série de medidas que se têm mantido absolutamente constantes ao longo dos anos. O que nós demonstramos é que há estabilidade nas ferramentas que temos utilizado. Agora temos um período de hiato porque vamos ter um novo quadro comunitário, mas em relação às ferramentas fiscais ou enquadramento de funcionamento as condições têm-se mais ou menos mantido. Mas eu percebo a preocupação.
Estabilidade política não está dentro dessas preocupações?
Somos dos países mais estáveis do mundo.
Um governo de maioria absoluta ajuda?
Claro que sim, mas quando falo de estabilidade estou a falar dos rankings de estabilidade que nos seguem.
Já tem números do investimento totalmente contratualizado em 2022? E são empresas novas?
Não vai haver investimento contratualizado em 2022. É um período de transição de quadros [de fundos europeus], portanto daí termos fechado todo o investimento [antes] — há uns contratos que estão a ser finalizados mas são coisas absolutamente residuais e sobretudo matérias que administrativamente não conseguiram ser resolvidas em tempo. 2022 não tem contratualização, por isso é que nós temos passado o número de novos clientes. E o que é interessante ver é que 2021 foi um ano recorde absoluto de novos clientes, atingimos 41 novos clientes. Há uma década eram entre 10 e 14 novos clientes e à data de hoje — mas até à lavagem dos cestos é vindima — já ultrapassámos largamente os 41. Anunciámos 42 a meio de outubro e já temos mais uns quantos. Só na área dos serviços, nós na agência celebrávamos um novo cliente em 2014 a cada 10 semanas; na área de serviço este ano conseguimos celebrar um quase todas as semanas.
Necessidade de proximidade já estava a ser uma tendência
Teve mandatos com recordes mas também passou pela pandemia e está a passar pela guerra na Ucrânia. Na altura da pandemia até disse que apesar de estar tudo em casa conseguiram arranjar clientes e angariar investimentos. Mas agora com a guerra há uma maior retração por causa da incerteza?
É um misto. Eu gosto de trabalhar em tendências. Neste momento ainda não conseguimos perceber se é conjuntural ou se vai ser estrutural, infelizmente está a durar muito mais do que todos esperavam. Já vimos uma tendência que é o nearshoring — agora com a guerra há quem use a expressão friendshoring, perto mas também num país amistoso — que começa nos serviços em 2016/17 e na indústria em 2019. As empresas começaram a perceber que tinham esticado ao máximo a cadeia de valor e a cadeia logística e portanto tinham de começar a ter operações diferenciadas por regiões. Como é óbvio tanto o Covid como o atual enquadramento vêm ainda aumentar a premência dessa tendência. O que se vê, neste momento, é que há um aumento desta necessidade de reorganização da cadeia de valor e de cadeia de produção. Sobretudo a Covid veio precipitar ainda mais isto, ou melhor, tornou isto óbvio para toda a gente.
O atual contexto de inflação elevada, que torna os investimentos mais caros, pode limitá-los de alguma forma?
É óbvio que a incerteza como um todo não é positiva para a captação de investimento. Agora do que nós temos visto nos números, esta macro tendência do nearshoring, de reorganização de cadeias de valor, de procura de sítios onde há acesso a talento, onde há talento diferenciado, altamente qualificado, e com uma capacidade de trabalhar em ambiente internacional, aumentou e isso está a sobrepor-se ao enquadramento de incerteza. Relativamente à inflação acaba por não ser um tema na captação de investimento porque está a afetar de forma transversal toda a Europa, portanto afeta, na prática, todos os nossos concorrentes. Está a afetar as margens e não passamos incólumes disto, agora o que é muito interessante ver é o aumento de exportações e a capacidade que as exportadoras portuguesas estão a ter de ganhar quota em mercados altamente competitivos — os nossos principais mercados exportadores são muito competitivos, Alemanha, França Estados Unidos. E sistematicamente estamos a ganhar quota. Obviamente com um impacto grande na margem com o custo de energia, das matérias-primas e com alguns equipamentos que às vezes estão a chegar muito atrasados, mas a verdade é que de facto o salto competitivo que as exportadoras portuguesas deram na última década é absolutamente impressionante. Eu vejo outros colegas meus noutros países na Europa com um problema contrário que é o das empresas fecharem temporariamente a produção. E isto é um sinal de competitividade do nosso setor exportador brutal e tem de ser valorizado, e daí os recordes de exportação.
Em relação a esta guerra na Ucrânia, tiveram alguma vez, este ano, de terminar negociações ou pedir mais informações de clientes ou possíveis clientes por serem entidades sancionadas no âmbito da guerra?
Não. Sobretudo empresas que já têm cá operações que tiveram de fazer realocações de pessoas, aí há um checking securitário feito pelas devidas autoridades, não é sequer por nós, mas nós temos de acompanhar, porque isso tem impacto na operação da empresa.
Nem tinham nenhum investimento russo no pipeline?
Não foi nunca uma questão que se tenha gerado em sede de negociação de incentivos. Nesses projetos onde há negociação de incentivos a nossa avaliação é muito mais profunda. Não se colocou essa questão.
Temos a decorrer o campeonato do mundo de futebol no Qatar que é um país onde há problemas em relação aos direitos humanos e a AICEP há tempos realçou que era um país com várias oportunidades comerciais e de possível relacionamento bilateral. As relações económicas não devem ter em conta estas questões como a dos direitos humanos, de fazer esta avaliação de como é que os regimes totalitários lidam com estas questões e se elas devem ter impacto nas decisões de comércio?
A minha função implica lidar com muitos países pelo mundo fora. Essa é uma decisão individual das empresas. Não me estou a desresponsabilizar, estou só a dizer é que as empresas é que têm de perceber se o enquadramento daquele país se enquadra no que pretendem e se se enquadra na sua atividade. O que nos cabe a nós é definir e identificar se há oportunidades de negócio e se não há inibições formais. Em relação à Rússia hoje em dia há inibições formais. E portanto nós fazemos essa análise fria e obviamente apresentamos essas oportunidades. Depois, as empresas têm de decidir o que é que querem fazer. Não vai ser a AICEP a dar a métrica ética ou sobretudo a métrica ética da política externa nacional.
Quando abrem delegações em determinados países existe já algum pensamento. Por exemplo no Irão a AICEP tem uma delegação. E o Irão também é um país que, neste momento, está a ser sancionado e que se está a debater com questões ao nível dos direitos humanos. Vão fechar ou vão manter a delegação no Irão?
A abertura e o encerramento de delegações decorre diretamente do plano estratégico, depois obviamente pode haver matérias oportunísticas decisivas com o governo. Mas é uma matéria estritamente avaliada e avaliada em bloco durante um plano estratégico. Fizemos essa reflexão há três anos e agora vai ser feita. Não me quero pronunciar sobre essa matéria porque é uma questão que a próxima gestão terá de se pronunciar.
Mas estávamos a reforçar que não é apenas uma matéria das empresas. A AICEP acaba por tomar decisões, nomeadamente nas delegações.
Há um primeiro passo que é ver se é um país com o qual temos uma relação diplomática. Se não temos, não temos delegação. Depois há um segundo passo que é, tendo relação diplomática, ver se faz sentido fomentar as oportunidades de negócio ou não. E aí temos três critérios: o primeiro é o enquadramento macroeconómico do país — o outlook é positivo ou não –, segundo aspeto é o da tipologia de negócios que se fazem — sejam os setores seja a forma de organização dos negócios neste país se é viável para empresas portuguesas ou não; e terceira questão fundamental é se as empresas têm interesse ou não nesse país.
Portanto a economia sobrepõe-se…
Quando nós fazemos essa avaliação e também consultamos empresas temos essas matérias em consideração. O tema é muito mais vasto, mas cabe à AICEP fazer esta dimensão técnica da relação económica.
Voltando ainda ao campeonato do mundo, há um grande símbolo de Portugal chamado Cristiano Ronaldo. Que peso é que Ronaldo tem na promoção de Portugal?
O Cristiano Ronaldo é de longe o português com maior notoriedade do mundo. Cristiano Ronaldo, para além disso, é um símbolo muito importante em termos de capacidade de trabalho dos portugueses, capacidade de esforço, capacidade de superação dos portugueses, veicula uma série de valores que são particularmente relevantes para o que nós defendemos que é o talento português. Nesse sentido o Cristino Ronaldo dá-nos um contributo muito positivo e tem uma notoriedade extraordinária para Portugal.
É possível quantificar?
Não consigo. A única coisa que eu conseguiria quantificar é a quantidade de vezes que uma conversa com um investidor novo começa com ‘o país do Cristiano Ronaldo’… É muito importante termos esta noção: o Cristiano Ronaldo de facto gera uma associação positiva sobre Portugal.
Expo Dubai movimentou muita gente num espaço curto de tempo
Que balanço é que faz da presença portuguesa na Expo Dubai? Para que é que servem estes eventos?
Faço um balanço positivo. Ultrapassámos os 800 mil visitantes. Vai-me dizer que é um bocadinho inferior em relação aos objetivos que tínhamos. Certo, mas os objetivos foram definidos antes da Covid. Na prática os últimos dois meses é que foram meses plenos de Expo e tivemos o pavilhão cheio todos os dias. Para mim o impressionante com este enquadramento é que, mesmo assim, tivemos 800 mil visitantes. Isto quer dizer que um pavilhão nacional num evento destes, e foi a primeira vez que aconteceu no Médio Oriente, tem um impacto em termos de notoriedade e de passar uma narrativa em relação ao país muito elevado. Se me pergunta se consigo fazer a ligação direta entre o que vai exportar de mobiliário para o Médio Oriente com a presença que tivemos na Expo, não, não firmámos nenhum contrato lá de exportação mobiliário ou agroalimentar. Agora há uma coisa que eu reconheço: de facto estas Expo movimentam uma massa muito grande de pessoas, portanto é uma oportunidade única para chegar rapidamente a milhões de pessoas.
Acredita que podem vir a ser concretizados negócios devido a essa participação?
A notoriedade do país tem várias dimensões. Quando estamos a trabalhar a notoriedade, o posicionamento do país, temos de o fazer a vários níveis, também a nível cultural e artístico. Faz parte. Não há ninguém que olhe para um país só numa dimensão. E estes eventos são particularmente relevantes porque é uma forma rápida, com investimento significativo sem dúvida, mas é uma forma rápida de chegar a muita gente. Não conheço outros eventos no mundo que tenham este alcance de notoriedade num espaço de tempo tão curto.