Não há retratos de António Costa nas paredes da sede do PS/Madeira (em 2015 foi polémica a manutenção de um retrato de António José Seguro após o atual secretário-geral já exercer funções há meses), mas na sala do líder regional socialista, onde decorreu a entrevista ao Observador, há um quadro de Mário Soares. As regionais da Madeira foram a única eleição que o histórico fundador nunca conseguiu ver o PS vencer. Já para António Costa a Madeira é assumidamente uma “obsessão“, que escapou por pouco em 2019. Depois de Paulo Cafôfo roubar a maioria ao PSD/Madeira, desta vez é um rosto mais desconhecido, Sérgio Gonçalves, o candidato do PS que tenta uma tarefa quase impossível: liderar o governo regional, que há quase meio século está nas mãos do PSD.
Pelas sondagens, já estaria perdido, mas na sede regional socialista acredita-se que os estudos de opinião são “martelados”. Sérgio Gonçalves, que agora tem a missão de corresponder à obsessão de Costa, ataca Miguel Albuquerque, que acusa de ter enriquecido depois de ter chegado à Quinta Vigia. Em entrevista ao Observador, na sede no Funchal, o líder do PS/Madeira acusou os governos PSD (de Jardim e Albuquerque) de gastos de 900 milhões de euros em obras desnecessárias. Além disso, desconfia que o PSD se possa unir ao Chega para manter o poder, caso disso necessite. O socialista desvaloriza ainda as suspeitas de corrupção que pendem sobre o antecessor, Paulo Cafôfo. E admite coligar-se com todos (incluindo a IL) à exceção de PSD, CDS e Chega.
Quanto à falta de notoriedade, o candidato do PS/Madeira garante que os madeirenses o conseguem identificar nas ruas, mas um pequeno teste — feito pelo Observador e que pode ser lido no fim desta entrevista — mostra que, pelo menos pela amostra, a notoriedade pública não é o forte de Sérgio Gonçalves.
“Governo PSD gastou 900 milhões em obras desnecessárias”
Nas propostas que apresenta há medidas como baixar o IVA de 22% para 16%, redução do IRS, subsídio de insularidade para os funcionários, aumento do complemento solidário para idosos. Sabe quanto custam as medidas que propõe?
Sabemos exatamente aquilo de que a Madeira precisa. É a região do país que tem um dos mais elevados índices de pobreza e exclusão social. Em resultado de quase 50 anos de governação do PSD, temos problemas de acesso à saúde, com listas de espera que duplicaram. Desde que Miguel Albuquerque é presidente do governo temos uma grande franja da população carenciada em termos de habitação. E não falamos só de pessoas com menos possibilidades, mas de jovens que não conseguem comprar ou arrendar uma casa. Falamos da classe média estrangulada com o aumento do custo de vida. Todas estas medidas são fundamentais para aumentar os rendimentos dos madeirenses, valorizar salários e permitir melhorar as condições de vida.
Mas o que lhe perguntei é se tem ideia de quanto é que tudo isto que propõe vai custar.
Quando falamos da redução de IVA são cerca de 24 milhões de perda de receita por cada ponto percentual. Neste momento temos uma taxa normal de IVA de 22%, quando podemos reduzir até aos 16%. Seis pontos percentuais daria 150 milhões de euros. E o Governo regional, desde 2022 até à data, já arrecadou verbas suficientes para acomodar toda esta redução. No ano passado foram 87 milhões de receita extraordinária de IVA, este ano são quase 40 milhões até à data. Portanto, se tivesse sido implementada esta redução de IVA já haveria margem suficiente [para aplicar esta medida] sem qualquer impacto nas contas públicas.
Mas se essa importância passa a ser anual…
Ao reduzirmos de 22% para 16% isso significa que, ao fim de um ano, as pessoas terão um mês de poupança nas idas ao supermercado, nas bombas de gasolina. É muito significativo para as famílias. Além de essa redução ser acomodada pela receita extraordinária de IVA que já houve, temos também o efeito multiplicador que isso tem na economia: significa mais dinheiro no bolso das pessoas, mais consumo ou mais poupança. E isso tem efeitos até em termos de receita fiscal. Nós temos um exemplo muito concreto nos Açores: quando foi aplicado o diferencial máximo de 30% em todos os impostos, as receitas dos vários impostos, não só do IVA, mas do IRS, subiram. Portanto, não é por reduzirmos as taxas que a receita fiscal se reduz. Mantemos a sustentabilidade das contas públicas, com uma diferença: o dinheiro deixa de estar nos cofres do governo regional e passa a estar nos bolsos das pessoas, que tanto precisam para fazer face a este aumento do custo de vida.
E quanto às outras propostas?
O subsídio de insularidade é fundamental. É algo que é um direito dos madeirenses e era uma realidade antes do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro. Tivemos essa dupla austeridade em resultado de uma dívida astronómica de 6 mil milhões de euros deixada pelos governos de Alberto João Jardim, que ainda hoje todos pagamos. E pode ser reposto: um funcionário público que ganhe 1300 euros recebe atualmente um subsídio de insularidade de cerca de 200 euros — passará a receber o dobro.
Isso não vai aumentar a dívida do governo regional?
São medidas que temos quantificadas, tal como o complemento solidário de idosos para pensões inferiores a 300 euros, propomos aumentar o complemento regional para 100 euros mensais, o que faz uma grande diferença a quem tem uma pensão de 300 euros. É um aumento muito significativo. Tudo isto pode ser acomodado, não só no aumento de receita fiscal que referi, mas também é preciso ser complementado com uma mudança de políticas. E há aqui uma diferença grande em relação ao PSD, que esbanja milhões de euros em obras desnecessárias, que se prepara para fazer novamente uma delas, o prolongamento da Pontinha.
Ouça aqui a entrevista em podcast.
Fala em obras desnecessárias e tem dito que a Madeira é uma região onde impera o “cimento” em vez do “rendimento”. Que obra foi feita pelo governo regional que não teria feito?
Se perguntar a qualquer madeirense todos lhe sabem apontar a marina do Lugar de Baixo, onde foram gastos mais de 100 milhões de euros, um heliporto no concelho de Porto Moniz que nunca funcionou, uma fábrica de moscas…
…quanto é que custou o heliporto?
Foi uma obra inferior a 2 milhões de euros, mas que todas elas somadas representam milhões.
Estava a dizer mais, pode continuar.
Uma fábrica de algas no Porto Santo, onde foram injetados dezenas de milhões de euros. Campos de desportos de praia. Muitas obras onde se gastaram milhões e milhões de euros. Em 20 anos foram quase 900 milhões de euros, o que, para ter noção da dimensão, significa que podíamos ter três hospitais iguais àquele que está a ser construído agora e que custa 350 milhões de euros.
Há a crítica de a Madeira ser um queijo suíço de betão: a nível de vias rápidas, estradas, túneis, há alguma que fosse necessária?
Não negamos que é necessário desenvolver infraestruturas. A grande maioria das infraestruturas, sobretudo em termos de rede viária, foram feitas. Sobretudo em termos de rede viária, portos, aeroportos. Mas, perante o esbanjar de 900 milhões de euros, nós podíamos já ter o hospital. Por exemplo, os mais de 100 milhões de euros gastos na Marina do Lugar de Baixo, que é uma obra que tem quase 20 anos e que agora está a ser renaturalizada, uma obra desnecessária. Só essa obra permitiria que já há mais de 20 anos tivéssemos algumas dessas estradas. Não dizemos às populações que essas obras não eram necessárias, dizemos que já poderiam estar prontas há 20 anos e que a Madeira já devia ter partido para outro modelo de desenvolvimento com outras prioridades que não o betão. Sobre o betão, uma nota: não temos nada contra o betão, desde que seja para a habitação. Neste momento, a grande prioridade para as obras públicas deve ser dar casas às pessoas, aos mais carenciados, habitações a custos controlados para os jovens e apoiar a classe média.
“São gastos 33 milhões de euros por ano em tachos para PSD e CDS”
Num debate na Assembleia Legislativa, Miguel Albuquerque acusou o PS de “dramatismo chunga”. O PS/Madeira é “chunga”?
Aquilo que temos são soluções concretas para os problemas dos madeirenses. Os madeirenses sabem o estilo de governação e o resultado de governação do PSD e de Miguel Albuquerque: uma governação desastrosa, que continua com o legado deixado pelos governos anteriores, de despesismo, de tachos. São 33 milhões de euros por ano gastos em tachos de nomeação para o PSD e para o CDS. E sabem a postura do presidente do governo regional de cada vez que vai à Assembleia: não responde às questões, é incapaz de apresentar soluções para a Madeira e gosta de desrespeitar a autonomia que conquistámos, desrespeitar os deputados, desrespeitar o principal órgão de governo próprio que é a Assembleia Legislativa Regional da Madeira, numa atitude que acaba por ser também de desrespeito pelos madeirenses e por todo o eleitorado.
Ficou ofendido com o termo “chunga”?
Não é uma questão de ficar ofendido: é de achar que o presidente do governo regional deve ter outra postura e deve responder àquilo que são as questões dos deputados e deve, acima de tudo, responder àquilo que são as questões dos madeirenses.
Tem feito várias críticas ao longo da entrevista ao passado de governação, até antes de Albuquerque: Alberto João Jardim foi um mau presidente do governo regional?
A Madeira desenvolveu-se ao longo das últimas décadas, tal como se desenvolveu todo o país, a região autónoma dos Açores, a Europa e o Mundo. A Madeira teve recursos financeiros muito abundantes. Houve, naturalmente, necessidade de se criar alguma economia, de se infraestruturar a região, ampliar o aeroporto, dar melhores condições de acessibilidade em termos portuários e isso foi feito. Nunca questionámos esse desenvolvimento, mas sim o que poderia ter sido feito. Não conseguimos criar um modelo que fugisse da construção e do turismo, que são os dois únicos grandes setores de atividade da Madeira, marcados por precariedade, baixos salários. Fomos incapazes de diversificar a nossa economia, apesar dos enormes recursos que tivemos. Não é uma questão de avaliar o desempenho de um presidente do governo ou outro, é um modelo de um regime que foi construído.
Não é capaz de dizer, portanto, que Alberto João Jardim foi um bom presidente?
Um bom presidente teria também de ter criado condições para melhorar a vida dos madeirenses, para dar outras condições. E dou-lhe um exemplo: nos últimos 10 anos saíram 17 mil pessoas da Madeira. As pessoas continuam a sair da Madeira por falta de oportunidades, por baixos rendimentos, por dificuldade no acesso a cuidados de saúde ou os preços da habitação.
Falou nas dificuldades na saúde, mas defende que as pessoas possam ser atendidas no privado. O Estado não tem condições de ter um sistema de saúde ao qual os madeirenses possam recorrer? É preciso ser um socialista a pedir para se recorrer ao privado…
A nossa proposta para a saúde é muito concreta. É algo que já é uma realidade no continente, nos Açores e só não é na Madeira porque o governo regional não quer. Temos de apresentar uma solução às pessoas e isso passa por apresentar tempos máximos de resposta garantidos na saúde para qualquer ato médico. Um exame, uma cirurgia, uma simples consulta ter um prazo e, excedido esse prazo, a pessoa poder recorrer ao privado sem que tenha de o pagar. O que tem acontecido nos últimos anos é a duplicação do número de atos médicos em lista de espera. Temos mais de 118 mil atos médicos em lista de espera, quando em 2015 tínhamos cerca de 60 mil. Portanto, a situação agravou-se para o dobro desde que Miguel Albuquerque é presidente do Governo. E é preciso não nos esquecermos que, quando Miguel Albuquerque era candidato em 2015, prometeu acabar com as listas de espera numa legislatura.
“António Costa tem uma agenda muito complicada”
Há quatro anos, o candidato do PS dava a entender que a relação com António Costa seria uma vantagem e ia favorecer a região. Caso agora seja eleito presidente acha que a Madeira vai ser melhor tratada pelo Governo PS?
A Madeira tem autonomia e, desde logo, a autonomia não pode continuar a ser uma arma de arremesso político. Os madeirenses já perceberam que têm um Governo com quase 50 anos e que tenta passar a ideia de que, tudo o que está mal, é responsabilidade de terceiros. Temos autonomia a vários níveis: na saúde, na educação. Temos recursos financeiros. Todos os impostos cobrados na região, grosso modo, são receitas da região. Essas verbas são reforçadas com apoios comunitários e do Estado. Portanto, é natural que muitas dessas matérias tenham de ser tratadas com o Estado, independentemente da sua cor política.
Mas seria melhor a relação ou não?
O que tem de existir são duas coisas: uma inversão de prioridades e passarmos a ter uma maioria de diálogo e que possa falar com a República sobre todas as questões que são importantes para a região. E não usar argumentos para tentar criar um inimigo externo, para desresponsabilizar-se da sua incapacidade. Essa será a grande alteração seja com um governo liderado por António Costa, seja com qualquer outro primeiro-ministro, independentemente da sua cor política. Sou um homem de consensos, de procurar soluções, e é isso que farei.
António Costa vem à campanha em período oficial?
António Costa já esteve duas vezes na Madeira recentemente, a última na semana passada. Naturalmente, não é um líder partidário nacional como qualquer outro. É primeiro-ministro de Portugal, tem uma agenda muito complicada. Deu uma demonstração clara na última vinda cá de que está solidário, que apoia. Nós temos total apoio da estrutura nacional do partido, mas também tenho a certeza de que ele sabe que a estrutura regional é competente e capaz de governar a região. Portanto, não sentirá a necessidade que outros partidos têm de ter os líderes nacionais cá quase em campanha diária, porque isso também é de alguma forma enganar o eleitorado. Não são essas pessoas que se vão candidatar. E os madeirenses sabem que têm duas opções: manter tudo como está, governados por quem os governa há quase 50 anos, ou uma única alternativa possível, que é o PS.
Com Paulo Cafôfo, António Costa não esteve mais presente e mais no terreno?
Sinto total apoio da estrutura nacional, de António Costa. E, portanto, independentemente da presença mais ou menos assídua na Madeira, nós sentimos isso.
Está em campanha oficial há seis dias. Já falou ao telefone com o primeiro-ministro?
Falámos no dia em que cá esteve na Madeira [a 8 de setembro].
Portanto, ainda antes do arranque oficial da campanha.
Sim, julgo que foi na véspera. Não é por um dia que isso acaba por ser relevante, mas temos contacto próximo.
Desde que foi eleito em maio é hábito falar com ele ou é só mais quando vem cá?
Falamos sempre que necessário com total disponibilidade de parte a parte, seja por mensagens, seja até pessoalmente. Eu sou membro do Secretariado Nacional do partido e reúno frequentemente no Largo do Rato, na sede nacional.
Espera que ele ainda lhe ligue mais perto do dia decisivo?
Se houver necessidade disso, sim. Nós fazemos o nosso trabalho. Sabemos que temos apoio para tudo aquilo que for necessário.
Há alguém com quem fale mais? Fala mais, por exemplo, com o presidente Carlos César ou com o secretário-geral adjunto João Torres?
Falo com todos os dirigentes nacionais de partido. São meus colegas de Secretariado Nacional. Falo frequentemente com o secretário-geral adjunto João Torres, com o presidente Carlos César quando necessário.
Não consegue dizer com qual dos três fala mais?
Se tivesse que precisar, com o secretário-geral adjunto, mas por questões logísticas da própria função.
“Há um ziguezague permanente de Albuquerque em relação ao Chega”
Há pouco estávamos a falar de questões governativas. Teme que o PSD e o CDS venham a depender do Chega para Governar?
O meu foco e a minha principal preocupação é apresentar soluções concretas para a vida dos madeirenses, o que nenhum desses partidos que referiu está neste momento a fazer.
Mas há esse risco? Acredita que PSD e CDS aceitariam o Chega se necessitassem do partido para formar uma maioria?
Diria que todos os cenários estão em aberto. Nós sentimos da parte dos madeirenses muita vontade de mudança. Acredito que vão confiar o voto no Partido Socialista, irão optar por uma mudança.
Já sei que me vai dizer que vão ganhar e que a questão não se coloca. Mas o que lhes estou a perguntar é: se o PSD e o CDS precisarem do Chega para formar Governo, acredita que eles vão recorrer ao Chega como aconteceu nos Açores ou é sincera a linha vermelha que Miguel Albuquerque coloca ao Chega?
Há um ziguezague permanente do presidente do governo regional em relação ao Chega e a quase todas as matérias de governação. No caso do Chega, diz que faz coligação, diz que não faz coligação. O Chega diz que faz coligação, que não faz coligação, que faz acordos, que não faz acordos. E, portanto, essa não é a minha preocupação.
Está disposto, e isso já resultou no Funchal, a fazer uma coligação, neste caso pós-eleitoral, com Bloco de Esquerda, CDU, PAN e Juntos Pelo Povo para afastar o PSD do poder?
Todos os cenários estão em aberto.
Portanto, nenhum destes partidos o incomoda se tiver de fazer parte da futura coligação ou acordo no Parlamento para tirar de lá o PSD?
Não refuto nem rejeito qualquer possibilidade de qualquer que for o resultado.
Mas vou já dizer-lhe outros que vai rejeitar…
Já ia antecipar-me. Há duas linhas vermelhas muito claras e que nós não iremos ultrapassar de forma alguma: uma em relação ao Chega e outra em relação ao PSD/CDS. Porque, naturalmente, quem nos governa há 50 anos e foi incapaz de dar as respostas que os madeirenses precisam, nunca será parte da solução. Sobre o Chega nem é preciso alongar-me mais: é claramente uma linha vermelha que não iremos ultrapassar de forma alguma. Relativamente a outros partidos, é preciso ver se há representatividade parlamentar, se não há.
Só fica a faltar uma força política: a Iniciativa Liberal. Mesmo que eleja um deputado ou dois pode ser fundamental para a formação de uma maioria. Seria possível?
Como lhe disse há pouco, todos os cenários estão em aberto, algo que também julgo ser importante deixar muito claro aos madeirenses: qualquer possibilidade, excetuando as duas linhas vermelhas que referi, que permita exercer a função de presidente do governo, implementar as medidas e as soluções concretas que nós temos para os problemas dos madeirenses, será avaliada, será uma possibilidade, não excluindo ninguém. Ao contrário daquilo que diz Miguel Albuquerque, que se não tiver maioria absoluta se vai embora, eu não vou chantagear os madeirenses, não vou exigir isso, vou apenas apresentar soluções para os seus problemas e aquilo que os preocupa. Não rejeito qualquer um dos outros cenários, mas também não faço futurologia. Tendo oportunidade de ser presidente do governo, não a deixarei cair. Seja com maioria, com governo minoritário ou coligação [pós-eleitoral]. O que motiva é melhorar a vida dos madeirenses.
“Sabemos que há processos a decorrer no Ministério Público” sobre Albuquerque
Acusou Miguel Albuquerque de ter enriquecido à custa dos madeirenses. O que quero perceber é se esse enriquecimento foi ilícito. Ou seja: foi de forma ilegal que ele enriqueceu à custa dos madeirenses?
Sabemos que há processos a decorrer no Ministério Público. Cabe aos tribunais decidir e julgar o que tiver que ser julgado e tirar essas ilações.
Mas quais são as suas suspeitas para fazer essa acusação?
Aquilo que sabemos e é público é que Miguel Albuquerque tem um património hoje declarado, que decorre das declarações que nós todos estamos obrigados a entregar no Tribunal Constitucional, muito diferente do que tinha em 2015. Há processos a decorrer no Ministério Público, que irá deduzir as acusações que entender, irá tirar as conclusões que quiser. Quando fiz referência a isso, limitei-me a factos.
Pode então referir alguns desses factos?
O facto é uma peça jornalística que diz que Miguel Albuquerque é hoje um dos políticos mais ricos do País, quando não era em 2015, quando iniciou funções. Esse é um facto, foi publicado. Limitei-me a referir esse facto.
Sugere então que esse dinheiro foi conseguido de forma ilegal porque há um salário tabelado e o presidente deve exercer em exclusivo essas funções?
Não tenho que sugerir. Essas decisões ficam para os tribunais, ficam para a justiça, que fará, naturalmente, o seu trabalho.
Independentemente das conclusões dessas investigações judiciais de que fala, sabe de alguma coisa, como líder da oposição?
Qualquer pessoa achará estranha essa variação patrimonial, decorrente das declarações. Só Miguel Albuquerque a poderá justificar. Ser de forma lícita ou ilícita, as instâncias próprias têm de fazer investigação, têm de se pronunciar, deduzir eventuais acusações e tirar, naturalmente, as conclusões que têm de ser retiradas.
Suspeitas de corrupção no PS/Madeira: “Não era líder do partido nessa altura”
Tem um problema de notoriedade. Se agora formos à rua e abordarmos pessoas aleatoriamente elas vão conhecê-lo?
Não tenho dúvida que sim. Temos as pessoas cada vez mais próximas ao PS. Percebem as mensagens que nós temos passado.
Olham para si e dizem: ‘Está ali o Sérgio Gonçalves’?
Sabem não só que é o Sérgio Gonçalves, como sabem o que o Sérgio Gonçalves e o PS defendem. Sabem que, se o Sérgio Gonçalves for presidente do governo regional, pagarão menos impostos, terão tempos máximos de resposta garantidos na saúde e que não vai gastar 150 milhões a prolongar a Pontinha e vai construir 800 ou 900 casas.
Arriscaria, se nós agora saíssemos à rua no fim desta entrevista durante 1o minutos e encontrarmos 10 pessoas, elas saberiam o seu nome?
Teremos já a seguir uma arruada, está convidado a acompanhar-nos e poderá verificar isso com os seus próprios olhos. [Ver resultado do teste de popularidade no fim deste artigo]
Se não ganhar estas eleições demite-se de presidente do PS/Madeira?
Não faço futurologia, mas tudo aquilo que dependa da vontade popular será respeitado. Todas essas possibilidades serão avaliadas na devida altura. Essa é a última coisa que me preocupa.
Não teria sido normal que o PS repetisse o mesmo candidato de há quatro anos [Paulo Cafôfo]?
São situações que decorreram de decisões pessoais, mas foram as circunstâncias que levaram a esta situação e, neste momento, sinto-me capaz. Fiz toda a minha vida no mundo empresarial e tenho uma excelente equipa, competente em várias áreas. Não somos uma equipa de uma única pessoa.
Ainda relativamente a Paulo Cafôfo, ele também foi envolvido em suspeitas de corrupção. Isso de alguma maneira retirou autoridade ao PS para denunciar casos de alegada corrupção no governo regional?
De forma alguma. O que lhe posso dizer sobre todo esse processo, é que não temos conhecimento de quaisquer acusações, de quaisquer arguidos. Nunca houve qualquer informação relativamente a isso. Partiu de uma mera denúncia anónima, ao contrário de outros processos que já referimos anteriormente, onde existiram buscas à vice-presidência e à presidência do governo regional. Neste casos [do PS], nem foram deduzidas acusações, nem constituídos arguidos e, portanto, é um processo que, na nossa perspetiva, será arquivado e não tem qualquer fundamento.
Consegue garantir que nas autarquias lideradas pelo PS não houve ajustes diretos ou contratos com empresas com ligações ao PS ou de militantes do PS?
Não tenho conhecimento de quaisquer dessas situações. Não estava nem nas autarquias nem na direção do partido à data dos factos, mas aquilo que sei é que não há constituição de arguidos, ninguém foi contactado, ninguém foi ouvido. É um processo todo ele sem fundamento e que parte de uma denúncia anónima, que acaba por ser muito frequente em todo o país em altura de eleições.
Tem alguma pergunta que gostaria de fazer a Miguel Albuquerque?
Faço-lhe a pergunta que fiz no último debate quinzenal que tivemos, que foi o debate do Estado da Região que tivemos no fim da legislatura, que foi: na eventualidade de continuar como presidente do governo regional, iria usar 150 milhões de euros para aumentar a Pontinha ou para construir 800 casas para as pessoas que tanto precisam? A resposta foi: não vou responder, se for presidente do governo, logo veremos. Foi evasivo, mas todos os madeirenses já perceberam quais são as prioridades de Miguel Albuquerque.
Contactei um dirigente do PSD/Madeira antes desta entrevista a perguntar-lhe que questão faria a Sérgio Gonçalves. E o que essa pessoa respondeu foi: “Sérgio, porque é que te meteste nisto?”.
Muito simples. Porque sou madeirense, porque gosto da minha terra. Porque acho que temos os recursos necessários para sermos muito melhores, para sermos uma terra de oportunidades. Os jovens da Madeira não têm que ver a emigração como uma inevitabilidade. Isto afeta quer os qualificados que saem por baixos rendimentos, por falta de emprego qualificado, quer os menos qualificados, que também saem por baixos rendimentos por culpa de uma governação de 50 anos. Portanto, meti-me nisto para mudar a Madeira.
“Todos os madeirenses têm orgulho em ser portugueses”
Vamos terminar a entrevista com perguntas que lhe pedia que fossem de resposta mais rápida.
Preferia ter Miguel Albuquerque mais quatro anos ou Alberto João Jardim?
Nenhuma delas. Preferia ter uma mudança na Madeira, liderada pelo PS.
A Madeira tinha condições para se tornar um Estado independente de Portugal e a solução era pacífica para todos. Aceitava?
Todos os madeirenses são autonomistas convictos, mas são também portugueses por inteiro. Gostam muito de ser portugueses. Têm orgulho em ser portugueses. O que acontece é que temos um governo regional há demasiado tempo a querer desresponsabilizar-se, a usar a figura do inimigo externo, mas não tenho dúvidas de que todos os madeirenses têm muito orgulho em serem portugueses.
Vamos imaginar que queria abrir um hotel na Madeira: fazia parceria com Bernardo Trindade ou Cristiano Ronaldo?
São dois excelentes parceiros para abrir uma unidade hoteleira, têm provas dadas nas suas áreas profissionais. Provavelmente, convidaria os dois.
A UE permitia que a Zona Franca da Madeira voltasse a ter as características do passado, como quando tinha empresas como a Swatch, e isso significava mais 10 mil postos de trabalho na ilha. Defendia esse regresso?
A Zona Franca, o Centro de Negócios da Madeira, é um instrumento fundamental de diversificação da economia. Tudo aquilo que permita ampliar, captar mais empresas, mais investimento estrangeiro naturalmente que sou absolutamente a favor.
Por falar em Zona Franca, imaginemos que o PS decidia candidatar Ana Gomes , uma pára-quedista, ao governo regional e do outro lado estava Pedro Calado, que é do PSD, mas madeirense. Em quem votava?
Os madeirenses votarão sempre num candidato da Madeira. O PS terá sempre um candidato da Madeira. É um partido autonomista, que respeita as autonomias e esse cenário não se colocaria.
O teste de popularidade: Mafama-2; Sérgio-0
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O desafio foi feito pelo Observador durante a entrevista: está disponível para vir à rua e percebermos se sabem o seu nome? Sérgio Gonçalves devolveu: “Acompanhem-nos na arruada”. E assim foi.
Na esteira da campanha do PS, o Observador abordou 20 pessoas que tinham sido cumprimentadas pelo candidato socialista (e presenteadas com flores ou flyers) e nenhuma delas conseguiu indicar o primeiro e último nome. Duas disseram o primeiro nome e as outras 18 nem esse sabiam.
Três funcionários de uma ótica que assistiram à passagem da caravana justificaram-se com três desculpas diferentes: “Eu a cara conheço, mas sou mau com nomes”, diz o primeiro; “Eu vejo aqui no Google”, acrescenta o segundo; “Assim não estou a ver quem é, é Paulo, né?, arrisca o terceiro”
Uma vendedora de fruta mais à frente, igual: “Só sei que é Sérgio porque eles gritaram. Agora, Sérgio quê? Isso tenho de ver aqui no papel.”
Há, finalmente, duas senhoras que se aproximam e querem ajudar: “O que é que quer saber, menino?” Por essa altura, a banda tocava a música Preço Certo, de Pedro Mafama. “O candidato? Ai isso não sei! A música sei que é do Pedro Mafama”. E a amiga complementa, já indiferente à pergunta inicial: “É o Mafama, esse é que é o conhecido”.
Nem os gritos contínuos de “nós só queremos, o Sérgio presidente” ajudaram à memória dos madeirenses. Ainda assim, nesses poucos minutos que o Observador acompanhou a comitiva socialista ficou evidente que — embora não soubessem quem era — o candidato do PS foi bem tratado quando abordou os eleitores na rua.
O candidato do PS chumbou no teste de notoriedade, passou no teste de aceitação popular.