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“Os tempos estão bastante agitados. Toda a gente está muito nervosa.” Como confessou uma fonte do grupo político do Identidade e Democracia (ID) ao jornal Politico, reina a confusão entre os partidos conservadores, de direita radical e de extrema-direita na Europa — e ninguém sabe bem o que acontecerá às famílias europeias dos Conservadores e Reformistas Europeus (ECR, sigla em inglês) e do ID após o dia 9 de junho. Nem sequer é claro a que grupo os diferentes partidos de direita espalhados pelos 27 Estados-membros se juntarão. “O espaço político da direita está relativamente fluido neste momento”, corrobora ao Observador Sofia Vasilopoulou, professora de políticas europeias na King’s College London.
Em Portugal, o Chega, que pertence ao grupo do ID, não descarta mudar-se para os conservadores e reformistas europeus. No debate desta terça-feira transmitido pela RTP, o cabeça de lista do partido, António Tânger-Corrêa não excluiu nenhum cenário, assegurando apenas que haverá “negociações sobre as várias plataformas políticas”. Integrando partidos como a Liga italiana de Matteo Salvini e o União Nacional (UN) de Marine Le Pen, o ID assistiu a um “game changer”, como reconheceu o cabeça de lista do Chega: o facto de a UN ter rompido com a Alternativa para a Alemanha (AfD, sigla em alemão), após declarações polémicas do cabeça-de-lista às europeias sobre as SS, a organização paramilitar ligada ao regime nazi de Adolf Hitler. E estas palavras levaram mesmo à expulsão desta quinta-feira do partido germânico do ID.
Na família política ao lado, a situação também é incerta. Existe, contudo, outra variável que pode mudar completamente a configuração dos conservadores e reformistas. A primeira-ministra italiana e cabeça-de-lista pelos Irmãos de Itália, Giorgia Meloni, não esconde que mantém boas relações com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, do Partido Popular Europeu (PPE). E, dependendo do número de eurodeputados que as duas forças políticas conseguirem eleger, a líder italiana já admitiu que quer criar uma coligação “à direita” no Parlamento Europeu.
Há uma linha vermelha para os populares sobre um possível acordo com os conservadores: as opiniões sobre a guerra na Ucrânia. O PPE é completamente a favor do auxílio a Kiev, assim como grande maioria dos partidos do ECR. Já entre o grupo da Identidade e Democracia, as opiniões dividem-se: por um lado, critica-se a invasão russa, mas algumas forças políticas do ID, como o Partido para a Liberdade da Áustria (FPÖ), têm lançado duras críticas à presidência ucraniana e à ajuda europeia a Kiev.
Todas as contas e a “influência dos grupos” políticos estão “dependente dos resultados das eleições”, diz ao Observador Saila Heinikoski, membro do Instituto Finlandês para as Relações Internacionais. As sondagens mostram um claro crescimento do espaço político da direita, com o ECR e o ID a subirem consideravelmente o número de eurodeputados. Os populares deverão vencer as eleições europeias, seguidos da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D). O terceiro lugar está entre os liberais do Renew e o ECR ou o ID.
No horizonte, há também a possibilidade de o ID e o ECR se unirem e formarem apenas um grupo. Em novembro de 2023, ao Observador, Diogo Pacheco Amorim, do Chega, classificou como “ideal” que houvesse apenas uma família política. Mas essa realidade não se deverá materializar, acreditam vários especialistas ouvidos pelo Observador. Natural da Chéquia, país que tem mais do que um partido deste espectro político, o membro do think tank Instituto de Relações Internacionais de Praga, Jan Kovář, considera o cenário “altamente improvável”.
Moderada, “ma non troppo”. Como Giorgia Meloni pôs Salvini no bolso e encantou Von der Leyen
Animosidades nacionais e tema da Ucrânia. O que distingue o ECR do ID
O general Roberto Vannacci foi o escolhido por Matteo Salvini como cabeça da lista da Liga nas eleições europeias. O líder do partido ignorava as polémicas do militar, suspenso das Forças Armadas por escrever um livro em que alega que os homossexuais não são normais e em que diz que os italianos só podem ser brancos. No mesmo espaço político, é uma figura que contrasta com Giorgia Meloni, cabeça de lista do Irmãos de Itália, que tem adotado, pelo menos publicamente, uma postura mais moderada do que o esperado.
Moderada, “ma non troppo”. Como Giorgia Meloni pôs Salvini no bolso e encantou Von der Leyen
Itália é um dos países na Europa, em que, contrariamente a Portugal ou a Espanha, existe mais de um partido a representar a direita radical e mais conservadora. Disputando o mesmo eleitorado, a solução a que muitos destes partidos chegaram, para se tentarem diferenciar, passou por escolherem grupos políticos diferentes no Parlamento Europeu. Por exemplo, os Irmãos de Itália estão no ERC e a Liga no ID; em França, a mesma coisa: a antiga Frente Nacional de Le Pen no ID, a Reconquista de Éric Zemmour no ECR.
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Por isto, Jan Kovář defende que é “difícil imaginar que alguns membros do ECR ou do ID se juntem a nível europeu por causa da animosidade na política interna e incongruência ideológica”. No caso italiano, o especialista não vê como os Irmãos de Itália e a Liga possam estar na mesma família política, “especialmente depois de Meloni se moderar nas políticas europeias”.
Tal como em Itália ou em França, na Chéquia acontece a mesma coisa. Jan Kovář clarifica que o principal partido do governo — o Partido Democrático Cívico (ODS, sigla em checo) — pertence ao ECR. Ora, no ID, está o Liberdade e Democracia Direta (SPD), um partido da “oposição” ao executivo que o especialista define como de “extrema-direita”, advogando, por exemplo, “a saída checa da União Europeia” e o fim do apoio à Ucrânia, duas bandeiras inimagináveis para o ODS liderado pelo primeiro-ministro Petr Fiala.
Pelas dinâmicas na vida política checa, um grupo alargado que junte desde conservadores reformistas à extrema-direita é um cenário “inconcebível”, diz o analista da Chéquia. Também no entender da especialista finlandesa Saila Heinikoski, uma fusão entre o ECR e ID traria problemas. “Alguns partidos poderiam sair do ECR como resultado desta fusão e seria difícil determinar qual seria a linha oficial em alguns tópicos” se as duas famílias se aglomerassem. “O ID tem visões mais radicais do que o ECR”, sinaliza.
Na sua essência, o ECR foi criado em 2009 após uma separação originada pelos conservadores britânicos, que se afastaram do PPE. A ideia base consistia em criar um grupo político abertamente contra o federalismo europeu, apostando numa União Europeia que preserva as identidades nacionais de todos os Estados-membros. A UE devia ter, assim, menos competências e focar-se na soberania e nas identidades culturais dos países.
Numa nota do site do ECR, os eurodeputados da família política referem que estão focados na “descentralização”, conectando “pessoas e negócios”, promovendo “o comércio livre e justo” e “garantindo uma Europa segura”. “Acreditamos numa União Europeia que respeite os desejos dos seus cidadãos, que gaste o dinheiro dos contribuintes de forma responsável e respeite a soberania dos governos nacionais.”
O ECR não nasceu originalmente contra o projeto europeu, mas nunca omitiu que quer limitar a cooperação entre Estados-membros, afastando por completo a ideia dos Estados Unidos da Europa. Em sentido inverso, o ID acolhe alguns partidos abertamente contra o projeto europeu como um todo, defendendo de forma mais acérrima a soberania dos Estados-membros. Mais insatisfeita com o status quo do que os conservadores, a família Identidade e Democracia deseja “limitar e reformar” a UE.
O ID foi fundado apenas na sequência das últimas eleições europeias. Jörg Meuthen, do Alternativa para a Alemanha, assegurou na altura que os partidos do grupo Identidade e Democracia “não queriam destruir a União Europeia”. “Estamos aqui para ser um espinho na carne do sistema”, declarou o eurodeputado alemão em junho de 2019. Ou seja, este grupo definia-se por um certo cariz antissistema e populista, desejando alterar profundamente as instituições europeias.
Nos estatutos do ID, lê-se que este grupo político deseja “salvaguardar os cidadãos e as nações na Europa”, envergando a bandeira do “direito ao controlo, regulação e limitação da imigração”. Além disso, esta família defende uma “Europa mais segura” com “fronteiras externas bem protegidas” e uma “cooperação para combater o terrorismo e a islamização”.
Contudo, por conta das necessidades eleitorais de cada Estado-membro, nem sempre se respeitam as ideias bases dos diferentes grupos. Em França, a Reconquista de Éric Zemmour, que defende políticas anti-islâmicas e mantém um posicionamento eurocético, está no ECR — principalmente para não competir diretamente com o RN. Também o Vox espanhol, que chegou a propor que não pudesse ser concedida cidadania espanhola a imigrantes “de cultura islâmica” (e que mantém laços próximos com o Chega, que está no ID), faz parte do ECR.
Mesmo com diferenças nacionais, há temas que geram consenso entre os dois grupos políticos. Um deles é a migração. “É um tópico importante para dois grupos. Partilham visões similares”, frisa Saila Heinikoski. “Agora que o pacto da UE sobre asilo e migração está completo, não deve ser um assunto central no próximo mandato. De qualquer modo, estes grupos, ao ganharem mais eurodeputados, podem ter mais influência do que tinham” na temática.
Outro ponto em comum relaciona-se com as críticas das duas famílias políticas ao Pacto Ecológico Europeu, diz Sofia Vasilopoulou. Ainda assim, neste tema, o ECR e o ID também podem encontrar “parceiros” entre os populares e os liberais europeus.
Meloni e Von der Leyen. O “entendimento” informal que pode mudar o jogo
Em meados de maio, a presidente da Comissão Europeia visitou Roma, algo que faz com alguma regularidade desde há uns meses para cá. Encontrou-se com a primeira-ministra italiana. Pelo meio, aproveitou para fazer campanha ao lado de Antonio Tajani, ex-presidente do Parlamento Europeu e cabeça de lista do partido Forza Italia (antiga força de Silvio Berlusconi), da mesma família política do que Ursula von der Leyen (PPE).
Questionada sobre se colocaria de lado uma aliança entre o ECR e o PPE em Roma, Ursula von der Leyen deixou no ar uma resposta vaga. “É mais importante do que nunca uma coligação de partidos pró-europeus quando os nossos interesses comuns estão em jogo“, disse a presidente da Comissão Europeia, que lembrou que a situação na Europa é “séria” e os desafios são “enormes”.
A presidente da Comissão Europeia pareceu estipular as linhas vermelhas para uma possível aliança após as eleições de 9 de junho. Ursula von der Leyen prometeu trabalhar com todos aqueles que estejam “claramente comprometidos com o Estado de Direito, a União Europeia e a Ucrânia”. Nenhuma destas condições parece afastar diretamente a chefe do executivo de Itália.
Por sua vez, Giorgia Meloni não fecha a porta a uma aliança com os populares, cativando-os com a aparente moderação que tem demonstrado no plano internacional. Na apresentação dos candidatos dos Irmãos de Itália para estas europeias, a primeira-ministra italiana determinou que quer “criar uma maioria” que junte “as forças de centro-direita” e que “coloque a esquerda na oposição”. Reconhecendo ser uma tarefa difícil, a chefe do executivo assegurou ser “possível” e que esta solução deve “tentar-se”. Prometeu, ainda assim, manter as suas “raízes populares” e ser uma “pessoa com quem se pode conversar sem formalidades e sem distância”.
A tarefa será de facto difícil, já que os socialistas devem ser a segunda força mais votada, de acordo com as sondagens. Os liberais poderão ainda ficar em terceiro, ou então muito perto. Colocando de parte a formação de maiorias do Parlamento Europeu, a configuração do hemiciclo é essencial para Ursula von der Leyen ser reeleita presidente da Comissão, uma vez que precisa dos votos de 361 parlamentares. À revista Foreign Policy, o porta-voz do PPE, Pedro López, detalha as contas da equipa da presidente da Comissão Europeia.
“Ela deve assumir que nem todos os parlamentares nesses grupos [PPE, Socialistas e Liberais] vão votar nela”, sublinha o porta-voz, ilustrando: “Nem todos no estão contentes com ela, muitos entre os socialistas dizem que ela está muito próxima de Meloni, por isso não a vão apoiar. Vai ser apertado”. É aqui que, segundo Pedro López, “entra” a primeira-ministra de Itália. “Se [os Irmãos de Itália] tiverem 24, 25 eurodeputados, então serão críticos” para a reeleição de Ursula von der Leyen.
No que concerne às alianças no Parlamento Europeu, o desejo de Giorgia Meloni dificilmente se concretizará. Os números atuais das sondagens preveem que é impossível formar uma maioria entre conservadores e populares, a não que haja uma transferência massiva de membros do ID para o ECR. A grande coligação — entre Renew (liberais), S&D (socialistas) e PPE — deverá continuar a ser dominante no hemiciclo europeu.
Neste sentido, o S&D já avisou a responsável europeia que nunca “cooperará, nem formará qualquer coligação com a extrema-direita”. “Não há cooperação ou aliança com o ERC ou o ID no Parlamento Europeu”, avisaram. No mesmo sentido, os liberais do Renew e os Verdes rejeitaram quaisquer associações com aquelas duas famílias políticas.
Ou seja: uma aliança entre populares e conservadores no Parlamento Europeu poderá impedir qualquer apoio de socialistas e liberais, um cenário indesejado pelos populares. O PPE, segundo apurou a Foreign Policy junto de dirigentes daquela família política, acredita que não haverá “qualquer acordo escrito” com o ECR. Apenas um “entendimento” informal entre Ursula von der Leyen e Giorgia Meloni, em que as duas prolongam as boas relações e a aliança implícita.
Porém, entre os populares, cresce o apreço por Giorgia Meloni, havendo até pontos em acordo entre os dois grupos políticos, como medidas mais restritiva nas migrações. “Em vez de escolher o caminho de confronto como o polaco PiS [partido de Lei e Justiça], que usou Bruxelas como um bode expiatório, Meloni escolheu o caminho do diálogo com Bruxelas e os resultados são claros”, disse Pedro López à Foreign Policy. “Ela fez várias modificações ao plano de recuperação italiano e recebeu luz verde da Comissão Europeia. Ela promoveu acordos com a Tunísia e o Egipto [para as migrações]. Ela garantiu que Bruxelas tem em consideração o que importa para os seus eleitores italianos.”
Esta certa recetividade de grande parte do PPE joga, por isso, a favor da primeira-ministra italiana, que pode servir de ponte entre os populares e os grupos mais à direita, assumindo um papel de protagonista no seio da política europeia. Giorgia Meloni, na opinião de Jan Kovář, é uma “força moderadora”, que permite o ECR entender-se com outras forças no Parlamento Europeu. E até se fala na possibilidade de os Irmãos de Itália entrarem na família dos populares.
Por conseguinte, Jan Kovář acredita que “o ECR terá uma voz mais forte no próximo Parlamento Europeu”. “Isto vai levar a uma abordagem mais restritiva nas migrações e nas políticas de asilo e um maior ceticismo nas políticas relativas às alterações climáticas.” Ao mesmo tempo, o especialista checo espera “políticas de comércio mais liberais, que é uma bandeira do ECR”, antevendo um desfecho diferente para o ID.
“Não acredito que o ID seja muito influente no próximo Parlamento Europeu. Se se olhar para os eurodeputados do ID, eles são vocais e têm visibilidade nos seus respetivos países, mas as suas atividades no Parlamento Europeu são medíocres no máximo”, atira Jan Kovář. Em termos políticos, o especialista checo preconiza que os membros desta família vão tentar ganhar visibilidades em temas como as “migrações, o clima e assuntos culturais”, nomeadamente as questões relacionadas com a identidade de género.
O “cordão sanitário” à Alternativa para a Alemanha dentro do ID
Foi um murro na mesa. A União Nacional francesa, cujo cabeça-de-lista para estas europeias é Jordan Bardella, entrou em rota de colisão com a Alternativa para a Alemanha (AfD na sigla original) dentro da família política do Identidade e Democracia. “Não nos vamos sentar com eles durante o próximo mandato no Parlamento Europeu”, assegurou a assessoria do partido francês esta terça-feira.
Declarações sobre nazis levam partido de Le Pen a romper com aliados alemães no Parlamento Europeu
Em causa esteve um comentário do cabeça-de-lista do partido Alternativa para a Alemanha, Maximilian Krah. Numa entrevista ao jornal italiana La Repubblica, o político alemão referiu que “jamais diria que só porque alguém usou um uniforme das SS” é “automaticamente um criminoso”. “Acho que se deveria avaliar se alguém é culpado caso a caso”, defendeu. As declarações causaram polémica e obrigaram o responsável da AfD a demitir-se da cúpula do partido esta quarta-feira, anunciando igualmente que se vai “abster de todas as ações de campanha” até a data das eleições.
Segundo escreveu no X (antigo Twitter), Krah considera que as suas declarações estavam a ser usadas como “pretexto” para prejudicar o partido. “A última coisa que precisamos agora é de um debate sobre mim. A AfD deve manter a sua unidade”, vincou.
O mal estava feito e originou mesmo a expulsão da AfD do ID, oficializada esta quinta-feira. Para além da UN, também a Liga e o partido dinamarquês Partido do Povo (PF na sigla original) indicaram que não se sentariam ao lado da Alternativa para a Alemanha. Marine Le Pen salientou, numa entrevista de rádio, que é “urgente estabelecer um cordão sanitário” à AfD, que tem feito várias “provocações”. “Já não é mais altura de nos distanciarmos, é altura de fazer uma separação daquele movimento”, disse.
Le Pen aproxima-se de Meloni, mas garante que não é “a irmã gémea” da PM italiana
Por agora, não são claras quais as reais intenções desta ação política. Surgem várias hipóteses. Uma delas passa inevitavelmente por Marine Le Pen querer formar uma coligação alargada com os conservadores e expulsar a AfD, para que seja mais fácil que isso se concretize e para mostrar uma certa moderação a Giorgia Meloni.
O cientista político Nicolai von Ondarza escreveu na sua conta pessoal do X que uma fusão continua a ser “improvável”, porque existem “muitas diferenças” entre o ERC e o ID. Não obstante, poderá haver um ECR mais forte, em que conviverão nomes como “Meloni, Le Pen, Wilders, Orbán”, enquanto o ID acolhe os “partidos mais radicais”, como a AfD. Ainda assim, o especialista ressalva que também poderá haver saídas dos conservadores, como o checo ODS, que se juntaria ao PPE. “É atrativo em termos políticos, mas permanecem as diferenças políticas e de personalidade.”
Neste contexto, a presença de Marine Le Pen (e outro membros do ID, como André Ventura) na reunião organizada pelo VOX, que pertence ao ECR, e que reuniu vários rostos da direita radical, poderá ser um piscar de olho da política francesa a Giorgia Meloni e aos restantes membros dos conservadores, como o antigo primeiro-ministro polaco Mateusz Morawiecki.
Contudo, as incompatibilidades pessoais e políticas entre as duas mulheres, que querem assumir um papel preponderante na Europa, podem deitar por terra uma possível aliança. O analista político Daniele Albertazzi prevê que, devido à vitória que a antiga Frente Nacional pode obter nas próximas europeias (e a possibilidade de vencer as presidenciais francesas em 2027), Marine Le Pen poderá ficar “ressentida” se deixar que Giorgia Meloni comande os desígnios do ECR. “Demasiadas abelhas-rainha numa colmeia levam à anarquia”, avisa o cientista político no X.
Numa entrevista em abril, Marine Le Pen deixou bem claras as diferenças face a Giorgia Meloni. “Não sou a sua irmã gémea. Mantenho-me fiel a Salvini”, disparou a antiga candidata presidencial francesa. E, contrariamente à primeira-ministra italiana, assume-se como uma “eurocética”, convencida também de que “França deve abandonar o comando integrado militar da NATO”. É ainda “contra a entrega de armas à Ucrânia”.
Enfatizando as diferenças face à primeira-ministra italiana, Marine Le Pen mostra que representa um projeto político diferente, contrapondo-se ao europeísmo e ao atlantismo que têm caracterizado o mandato de Giorgia Meloni. A chefe do executivo italiano propõe-se a ser a “ponte” das direitas, mas os posicionamentos da centro-direita e da direita radical podem ser demasiado longínquos para haver qualquer ponto de encontro.
O impasse e a incógnita: para onde vão os eurodeputados do Fidesz de Viktor Orbán?
A menos de três semanas das eleições europeias, os conservadores e membros da direita radical estão num impasse sobre o futuro, que apenas será desfeito quando os resultados forem conhecidos na íntegra. Além disso, existe outra variável que estes partidos têm de ter em consideração: para onde vão os eurodeputados húngaros do Fidesz, liderado pelo primeiro-ministro Viktor Orbán. Expulsos do Partido Popular Europeu em 2021, não é claro a que grupo político vão pertencer neste mandato.
Em fevereiro, o primeiro-ministro da Hungria assegurou que ia juntar-se ao ECR antes das eleições, mas até ao momento a situação continua incerta. Independentemente disso, Viktor Orbán não tem quaisquer problemas em ver Giorgia Meloni à frente do grupo político. “Já disse no passado que a Hungria era demasiado pequena para apoiar um movimento conservador na Europa por si mesma. As coisas estão a mudar e Itália tem uma primeira-ministra conservadora, que pode liderar os conservadores europeus.”
Ao mesmo tempo que anunciava a sua vontade de aderir ao ECR, o ID convidou Viktor Orbán para integrar a sua família política, não colocando quaisquer obstáculos a acolher os eurodeputados do Fidesz.
Tendo em conta as ambições de Giorgia Meloni, a presença de Viktor Orbán no ECR pode afastar o PPE dos conservadores, devido às tensões existentes, principalmente entre o primeiro-ministro da Hungria e Ursula von der Leyen. A três semanas e meia das eleições europeias, no espaço ideológico europeu que vai dos conservadores à extrema-direita, nada está definido. Só a 9 de junho é que se dissiparão muitas das dúvidas. Mas, até lá, as intrigas nos bastidores da política europeia prometem continuar.