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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

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Controlado e avesso ao risco, Montenegro já não desconfia da vitória. Campanha vai entrar no apelo ao voto útil à direita

Luís Montenegro tem mantido uma campanha confortável, sem correr riscos, acreditando que está na frente. Depois dos mínimos olímpicos, e de alguns imprevistos, AD vai intensificar apelo ao voto útil.

Passam poucos minutos das três da tarde. A caravana da Aliança Democrática vai percorrendo as ruas do centro de Leiria ao ritmo de sempre. Há muito barulho, muita agitação, muita dedicação das jotas (JSD e JP, fundidas, não se cansam de gritar e de gritar e de gritar). Mas quase não há vivalma para confortar. Luís Montenegro faz o seu papel. Cumprimenta quem encontra, troca dois dedos de conversa e, não havendo alternativa na rua, entra em cada loja que está aberta para cumprimentar quem lá estiver – geralmente quase ninguém. Paulo Cavaleiro, figura discreta mesmo sendo secretário-geral adjunto do PSD, vai uns metros à frente, como sempre. É ele quem aborda os lojistas, pergunta se querem receber Montenegro e depois faz sinal à máquina azul e laranja de que é terreno amigo, paragem segura. E Montenegro lá entra. É a campanha confortável, sem  correr riscos, própria de quem parece ir e sente que está na frente. Própria de quem acredita que não precisa de correr mais – só de manter.

A ideia (não assumida abertamente) é evitar tudo aquilo que possa fragilizar a coligação e galvanizar o PS. Na comitiva que acompanha Luís Montenegro, instalou-se a convicção de que só um cataclismo o pode afastar da vitória a 10 de março. Segundo os dados que vão chegando à campanha da Aliança Democrática, as sondagens oficiais coincidem com as sondagens que se vão fazendo para consumo interno. Está tudo a correr de acordo com as expectativas à exceção de um pequeno irritante: o número de indecisos continua a ser maior do que seria de esperar. Entre esses indecisos, há dois grupos: os indecisos que estão entre o Chega e a Aliança Democrática – maioritariamente homens, com o 12.º ano de escolaridade ou menos; e os indecisos que oscilam entre o PSD e o PS, na sua maioria mulheres e com qualificações superiores.

Estes dois indicadores explicam as reações diferentes da coligação aos mais recentes desenvolvimentos. Por um lado, a aparição de Passos e o facto de Carlos Moedas ter recuperado o tema da imigração não assustam porque, em teoria, confortam o eleitorado masculino e mais conservador que pode pender para o Chega; por outro lado, também ajuda a perceber a irritação da equipa de Luís Montenegro com as declarações de Paulo Núncio sobre o aborto — até porque não constam, nem vão constar do programa de um eventual governo PSD/CDS. Era, portanto, tudo o que não deveria ter acontecido. Neste momento, a regra número um da AD é uma: não cometer erros.

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Tem sido sempre assim ao longo da primeira metade da campanha eleitoral da coligação. Não que Luís Montenegro seja alérgico ao contacto com a rua. Mas, numa semana inteiramente dedicada aos distritos menos populosos do país, o líder do PSD foi vítima da própria realidade: não há gente na rua. Depois, esteve (e vai estar sempre) engolido pela muralha de jornalistas, repórteres, câmaras, cabos e jotas que o seguem e que, na ânsia de acompanhar todos os passos e compassos de Montenegro, tornam quase impossível um momento de alguma interação natural com quem se cruza com ele.

Foi assim em Beja, Portalegre, Évora e Leiria. E foi assim até numa visita a uma fábrica têxtil em Avelar, Leiria, um espaço exíguo, perfeitamente controlado, quase laboratorial, onde era suposto que o líder alimentasse o boneco de “homem do povo”. Mas o entusiasmo do cordão humano foi tal que o afastou de quem estava a trabalhar – sobretudo mulheres, algumas imigrantes. Montenegro disse “bom dia, bom trabalho” à distância. Nada mais. Ao contrário do que é hábito em campanhas eleitorais, tem faltado o circo. Até Rui Rio, que jurava odiar o carnaval mediático, tinha o cantor Emanuel como convidado em vários comícios. Mas Rio precisava de arriscar. Montenegro, aparentemente, já não.

Até a ideia-chave de Montenegro em cada discurso vai nesse sentido: “Mudança segura“, promete repetidamente o líder do PSD. Numa primeira semana de campanha em que já correu um risco calculado – a presença de Pedro Passos Coelho – e em que teve de gerir o “amadorismo” (assim reagiu a direção do PSD às declarações de Paulo Núncio sobre o referendo ao aborto), Montenegro tem apostado numa estratégia rígida e de grande disciplina em relação à mensagem. Sim, teve de lidar com temas delicados como a imigração (que o PSD acha que conseguiu capitalizar), as pensões (que obrigou o líder social-democrata a travar-se de razões com duas reformadas) ou com o aborto (que caiu aos trambolhões graças ao erro do parceiro junior de coligação). Sim, desprotegeu o centro de que assumidamente precisa para vencer eleições. Mas, até ver, nada disso parece estar a criar embaraços de maior para Montenegro.

Coincidência ou não, um dia depois do caso “Núncio”, Assunção Cristas foi a convidada especial do jantar-comício em Ourém, onde apelou diretamente ao vota das mulheres na Aliança Democrática. “Nesta área política, não devemos nada a ninguém. O PSD teve a primeira líder partidária e chama-se Manuela Ferreira Leite. O CDS também teve uma mulher como líder partidária. Quando nos vêm querer dar lições sobre esta matéria, primeiro, meus senhores, arranjem currículo. Queria pedir às mulheres que se empenhem na campanha”, rematou a antiga ministra da Agricultura e ex-líder do CDS.

O balde de tinta verde foi outro imprevisto. Ao contrário dos demais, acredita a coligação, este ajudou a condicionar a agenda mediática e a criar empatia em relação à figura de Montenegro – em Leiria, uma vendedora de castanhas, mais velha, lamentou o que acontecera ao líder do PSD. “Não se faz, não se faz”, disse-lhe ao ouvido.

Depois das reformadas que abordaram Montenegro e o confrontaram com o legado de Pedro Passos Coelho e o período da troika, o objetivo é evitar todo e qualquer tipo de interação vagamente negativa. Em Évora, na quarta-feira, a equipa que acompanha Montenegro impediu os jornalistas de entrarem numa loja onde o esperavam elementos das forças de segurança que queriam falar sobre as reivindicações da classe – os seguranças e o staff de Montenegro falaram com eles antes e providenciaram o encontro discreto, longe das objetivas. A possível interpelação e desconforto nunca chegaram a existir.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Ao contrário do que aconteceu há dois anos com Rui Rio, Luís Montenegro não se expõe aos jornalistas. Vai revelando disciplina e um autocontrolo de quem não se quer desviar um milímetro da mensagem que tem para vender. Não que não tenha momentos para responder às perguntas da comunicação social; mas todos os temas mais polémicos – os cenários de governabilidade, a presença de Pedro Passos Coelho, a questão do aborto, até a maioria absoluta para a AD+IL pedida por Rui Rocha – são chutados para canto, sem que exista margem para cascatas de perguntas. Os adversários mais diretos – Pedro Nuno Santos e André Ventura – ficam sem resposta. Não havendo bate-boca entre candidatos, não há polémicas artificiais. Montenegro aparece a falar de ideias, os outros dois aparecem a falar de Montenegro e da AD. É simples.

Sobre o primeiro, Montenegro vai dizendo que o adversário não tem mais nada para dizer ao país a não ser falar mal do projeto da AD; o segundo fica, simplesmente, sem resposta – até hoje, Montenegro nunca respondeu diretamente a qualquer provocação de Ventura. “Ninguém o ouve”, rematou há dias. Um e o outro vão sendo caracterizados como figuras secundárias desta campanha. Fazer o contrário – responder a ambos à letra – seria permitir que os adversários se colocassem no mesmo plano que Montenegro. E, quem acredita que vai em primeiro lugar, não precisa de (nem deve) olhar para baixo.

Para Montenegro, controlar a narrativa política é determinante. Se a exposição às perguntas da comunicação social foi reduzida aos mínimos olímpicos, em cima do palco, as despesas dos ataques mais duros são reservadas aos convidados de honra – Melo, Passos, Moedas e Cristas, até ver. E não só: um a um, de forma mais ou menos explícita, os aliados vão pedindo uma “maioria robusta”; a equipa do líder social-democrata foge a sete pés desse discurso.

Por um lado, porque acenar agora com uma maioria de direita depois do que aconteceu com António Costa pode assustar os moderados. Depois, porque é importante para AD não embandeirar em arco, recusar o “triunfalismo” precoce e vender a ideia de que a eleição está altamente renhida, para evitar qualquer risco de desmobilização. “Ainda não ganhamos as eleições. Sabemos que as vamos ganhar. Mas só as vamos ganhar a 10 de março”, repetiu o líder social-democrata em Leiria.

Ao mesmo tempo, Montenegro vai reservando para si três ideias fundamentais: o adversário não tem mais nada para oferecer além do discurso do medo; a Aliança Democrática representa a “mudança segura” – logo, aquela mudança que não assusta; e, finalmente, a ideia de que um voto no Chega – raramente nomeado – é um voto desperdiçado.

Esta quinta-feira, de resto, o líder social-democrata começou a endurecer um discurso que deverá marcar o resto da segunda metade da campanha e que estará centrado, essencialmente, no apelo ao voto útil à direita. A partir de Ourém, num jantar-comício com quase duas mil pessoas, uma grande demonstração de força, o líder social-democrata tornou ainda mais claro aquilo que vem dizendo ao longo dos últimos dias.

“Sei que algumas estão cansadas dos partidos que têm governado Portugal. Quando uma pessoa fica indignada é compreensível que queira expressar esse sentimento de revolta. Eu compreendo. Mas sendo legítimo e compreensível esse protesto, aquilo que é desejável para o país, além de castigar o PS, é muito importante que se contribua para mudar de governo. O único voto viável é a Aliança Democrática”, apelou o presidente social-democrata. A campanha de Montenegro vai entrar no segundo ato, convencida de que o essencial está conseguido: Pedro Nuno Santos vai sair derrotado; agora é preciso dramatizar no apelo ao voto útil para chegar à tal “maioria robusta”.

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