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O CDS às voltas com a Democracia-Cristã

No dia de aniversário do CDS, José Ribeiro e Castro escreve um ensaio sobre a relação entre o partido e a democracia-cristã. Como é que tudo começou e como chegámos até aqui?

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Este ensaio foi escrito há cerca de dois anos, a pedido, para o projecto de uma revista que o IDL – Instituto Amaro da Costa tencionava publicar sobre diferentes visões políticas à direita. Penso que esse projecto foi, entretanto, abandonado. Por isso, pedi para ser publicado, hoje, em virtude de ser dia de aniversário do CDS: faz 47 anos. Agradeço ao Observador a possibilidade desta minha homenagem.

Quando era estudante na Faculdade de Direito de Lisboa, passei o Verão inteiro do meu 2.º ano a estudar economia. Era praxe entre os professores da faculdade, nessa época, limitar as notas em escadinha: no 1.º ano, ninguém tinha mais de 15; no 2.º, ninguém mais de 16; e assim sucessivamente, até folgar a bitola no 5.º e último ano, que era aquele que fixava a média de curso, na licenciatura. A última nota de cada ano era tida como a que dava a deixa para poder aspirar ao degrau acima no ano seguinte. A minha ideia foi deixar Economia Política para a 2.ª época de exames, a fim de me preparar melhor e atacar uma nota mais alta. Muito li, muito estudei economia nesse Verão de 1972. Entre os livros que mais me marcaram esteve o “Economia – uma análise introdutória” do norte-americano Paul Samuelson, que marcou várias gerações da segunda metade do séc. XX. O 1.º volume, em língua portuguesa, fora publicado pouco antes pela Fundação Calouste Gulbenkian – o 2.º volume só sairia em 1973. Foi ali que encontrei uma ideia que nunca mais esqueci e cito muitas vezes.

Samuelson estava a explicar o funcionamento do mercado, o mecanismo dos preços, a livre empresa e a chamada “concorrência perfeita”, bem como os seus limites, quando remata assim: “Um cínico devia dizer da concorrência perfeita o que Bernard Shaw disse do cristianismo: o seu único problema é nunca ter sido tentado na prática.”

É uma ideia muito provocadora. Há grandes inspirações que não resultam, não por serem más, mas só porque não são realmente aplicadas.

Nas palavras de Samuelson, seria assim com o cristianismo na ordem moral e dos comportamentos humanos e sociais (como observara Bernard Shaw); e seria assim também com a concorrência perfeita no funcionamento do mercado. Esta seria, acrescento eu, como a água quimicamente pura: só existe em laboratório e nas páginas dos livros de química.

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Voltarei a este problema. Mas, sendo o propósito deste ensaio reflectir sobre a democracia-cristã em Portugal nas últimas décadas, é tempo de a introduzir, recordando o seu começo e o seu tronco principal.

O tronco da doutrina social da Igreja

A democracia-cristã não é uma operação directa da Igreja, mas encontra em documentos do Papado e de outros na Igreja o desafio que a fez despertar. É uma terceira via – ou melhor, o eco, no mundo dos leigos, da terceira via proposta pela Igreja face à crise social e da economia que interpelou fortemente o séc. XIX europeu. A doutrina social da Igreja avança, propondo uma alternativa ao marxismo socialista e ao capitalismo liberal. Mas vai mais longe do que apenas esta abordagem sócio-económica e vai tomando posição, a partir dos princípios fundamentais do cristianismo e dos seus valores, sobre um vasto leque de outras questões políticas: o poder, o Estado, a família, a pessoa no centro de tudo, a empresa, o trabalho, etc.

A encíclica mais referida como a primeira de todas é a Rerum novarum (“Das coisas novas”) de Leão XIII, em 1891, cuidando da condição dos operários e, mais amplamente, da questão social. Podemos considerá-la como a encíclica fundadora: foi cinco vezes expressamente celebrada e revisitada por outros Papas nas décadas posteriores, nos seus 40, 70, 80, 90 e 100 anos.

Mas este mesmo Papa já tinha emitido outras: a Immortale Dei (“A obra imortal de Deus”), de 1885, sobre a constituição cristã dos Estados; a Diuturnum illud (“A prolongada e terrível guerra”), de 1887, sobre a origem do Poder; a Libertas praestantissimum (“A liberdade, dom excelente”), de 1888, sobre a liberdade humana; e a Sapientiae christianae (“Voltar aos princípios cristãos”), de 1890, sobre o dever cívico dos cristãos. É deste conjunto variado de documentos matriciais de Leão XIII que arranca a definição da doutrina social da Igreja contemporânea.

A democracia-cristã não é uma operação directa da Igreja, mas encontra em documentos do Papado e de outros na Igreja o desafio que a fez despertar. É uma terceira via – ou melhor, o eco, no mundo dos leigos, da terceira via proposta pela Igreja face à crise social e da economia que interpelou fortemente o séc. XIX europeu.

A produção doutrinária dos Papas nunca mais deixou de abordar estes problemas e outros conexos, enriquecendo o corpo doutrinário dos cristãos, contribuindo para o debate intelectual de cada época, construindo uma história de pensamento e inspirando, para quem quisesse meter pés ao caminho, a acção política e social concreta.

Bento XV deixou-nos a Ad Beatissimi Apostolorum Principis (“Ao abençoado Príncipe dos Apóstolos”), de 1914, afirmando a Paz e condenando a guerra, pouco depois de ter deflagrado a 1.ª Guerra Mundial.

Pio XI escreveu a Quadragesimo Anno (“No quadragésimo ano”), de 1931, celebrando o 40.º aniversário da Rerum Novarum e reflectindo sobre a reconstrução da ordem social; a Non abbiamo bisogno (“Não temos necessidade”), de 1931, condenando o fascismo; a Divini Redemptoris (“A promessa dum Redentor divino”) e a Mit brennender Sorge (“Com profunda preocupação”), ambas de 1937, fazendo a condenação, respectivamente, do comunismo e do nazismo.

Pio XII publicou a Fidei donum (“O dom da Fé”), de 1957, sobre a situação das missões católicas particularmente em África; e a Ad apostolorum principis (“Ao Príncipe dos Apóstolos”), de 1958, com exortações e normas para a Igreja Católica na China.

S. João XXIII legou-nos a Mater et Magistra (“Mãe e Mestra”), de 1961, sobre a evolução da questão social à luz da doutrina cristã, nos 70 anos da Rerum Novarum; e a Pacem in Terris (“A Paz na Terra”), de 1963, apontando à paz de todos os povos na base da verdade, justiça, caridade e liberdade. Segue-se, documento fundamental emitido pelo Concílio Vaticano II, a Constituição pastoral Gaudium et spes (“As alegrias e as esperanças”), de 1965, que actualiza o entendimento das relações entre a Igreja Católica e o mundo onde está e actua.

Paulo VI publicou: a Populorum Progressio (“O desenvolvimento dos povos”) de 1967, dedicada à cooperação entre os povos e ao problema dos países em desenvolvimento; a Octogesima Adveniens (“O 80º aniversário”), de 1971, que comemora os 80 anos da Rerum Novarum, renovando e reafirmando o compromisso social e político dos cristãos, que são chamados à acção; e a Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi (“Anunciar o Evangelho”), de 1975, proclamando o anúncio do Evangelho como tarefa de todos os católicos e não só do clero e religiosos consagrados.

S. João Paulo II acrescenta: a Redemptor Hominis (“O Redentor do Homem”), de 1979, que marca uma linha para o seu pontificado, analisando os problemas contemporâneos do Homem e propondo soluções baseadas na compreensão mais profunda do ser humano; a Laborem Exercens (“É mediante o trabalho”), de 1981, abordando as questões do trabalho, no 90.º aniversário da Rerum Novarum; a Exortação Apostólica Familiaris Consortio (“A Família”), também de 1981, sobre a função da família cristã no mundo de hoje; a Sollicitudo Rei Socialis (“A solicitude social da Igreja”), de 1987, assinalando o 20.º aniversário da Populorum Progressio, com a reafirmação da preocupação social da Igreja; a Centesimus Annus (“O Centenário”), de 1991, que comemora os 100 anos da Rerum Novarum, recordando os grandes traços doutrinários da encíclica fundadora e desenvolvendo os seus princípios, transpostos para o mundo de hoje, sujeito também às suas “coisas novas”; a Tertio Millenio Adveniente (“O Terceiro Milénio”), de 1994, reflectindo sobre a preparação para o Grande Jubileu do Ano 2000 e o início do terceiro milénio da era cristã; e a Evangelium Vitae (“O Evangelho da vida”), de 1995, sobre o valor e a inviolabilidade da vida humana.

Bento XVI escreveu: Deus Caritas Est (“Deus é amor”), de 2005, sobre o amor cristão; Caritas in Veritate (“A caridade na verdade”), de 2009, sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na verdade.

Enfim, o Papa Francisco apresentou a Laudato si (“Louvado sejas”), de 2015, sobre o cuidado que devemos ter com a Casa Comum, fazendo irromper a doutrina social da Igreja pelas questões ambientais do nosso tempo. E, recentemente, interpelou-nos pela Fratelli Tutti (“Todos irmãos”) sobre a fraternidade e a amizade social.

Adelino Amaro da Costa – cabe recordar – lia e anotava os textos papais, assim como as mensagens da Conferência Episcopal. Vi-o ler e anotar as últimas exortações apostólicas de Paulo VI, Gaudete in Domino e Evangelii Nuntiandi, e a primeira encíclica de S. João Paulo II, Redemptor Hominis. O Adelino era inspiração, porque absorvia a inspiração. Não citava, não debitava. Processava e comunicava, quando e como lhe vinha ao espírito. Era um democrata-cristão natural.

Ora, com aquele tão rico repositório, não é por falta de doutrina e da sua cuidada e criteriosa actualização que a democracia-cristã falha. Este conjunto de encíclicas referenciais é, aliás, muito mais rico, uma vez que é completado e desenvolvido por múltiplas Cartas e outros textos de orientação dos Papas, de cardeais, de Conferências Episcopais e dos bispos, ajustando-os a temas, a tempos ou a povos específicos; e por milhares e milhares de páginas não só de outros eclesiásticos, mas de numerosíssimos leigos empenhados, desde pensadores a jornalistas, de comentadores a professores, de políticos a diversos activistas e actores sociais.

Adelino Amaro da Costa lia e anotava os textos papais, assim como as mensagens da Conferência Episcopal

A democracia-cristã e o CDS, partido doutrinário

A democracia-cristã é uma grande construção do pensamento político do século XX, com forte projecção na Europa e na América Latina, sobretudo na segunda metade do século passado. Para alguns historiadores das ideias, esta é a segunda democracia-cristã, que é a que nos interessa. No pós-guerra, conquista forte influência nos seis países membros instituidores das Comunidades Europeias – com Konrad Adenuaer, Alcide De Gasperi e Robert Schuman entre os mais celebrados “pais-fundadores”. E é também através de partidos associados na ODCA (Organização Democrata-Cristã da América) que, na mesma época, ganha grande projecção em muitos países latino-americanos. Quando o CDS é fundado, em 1974, beneficia desta idade de ouro da democracia-cristã, sendo muito atraído e abraçado por ela.

A primeira coisa a determinar a respeito do CDS é se é, ou não, um partido ideológico ou doutrinário. Como se sabe, penso que é um partido doutrinário e creio ter sido eu, em vários debates e escritos, a propor e a adoptar essa formulação. Seria seguida por outros e ganhou curso corrente.

Distingo doutrina de ideologia, segundo este critério: a ideologia acredita no poder automático das ideias, as quais produziriam efeitos garantidos após serem aplicadas, e crê, muitas vezes, no poder de gerarem um Homem novo, uma sociedade nova, etc.; a doutrina descrê desta possibilidade e pensa que a natureza humana e social é o que é, estudando-a e procurando conhecê-la bem, mas acredita que um conjunto de valores, de princípios, de critérios e de regras de comportamento permitem ao Homem e à sociedade fazerem-se melhores e refazerem-se cada vez melhores – numa palavra, valoriza a perfectibilidade.

O CDS é deste segundo tipo. Foi construído a partir de uma Declaração de Princípios, inspirada no “humanismo personalista”, que marcou os seus primeiros passos e a sua viagem. O CDS não foi feito em torno ou atrás de um homem ou uma mulher (o líder), mas de um texto, que é a referência e a fonte da sua doutrina. E consolidou-se neste modelo, por contraste com o outro partido do mesmo espaço, o PPD (mais tarde, PSD), que era um partido sem grande ideologia definida e que se desenvolveu segundo o modelo de um catch-all-party (“partido apanha-todos”). Mesmo que o CDS quisesse ter seguido também este modelo (o que, nos primeiros anos, nunca quis), não poderia desenvolver-se – o mesmo espaço político não consentiria dois partidos de modelo igual, ideologicamente indistintos.

O PPD/PSD atraiu e fixou as pessoas mais dadas ao pragmatismo, enquanto o CDS atraiu e fixou aquelas mais exigentes com critérios de valor

É pena que o CDS seja um partido que cuide muito pouco e tão mal da sua história. Basta olhar ao portal electrónico. Desapareceram publicações, não há arquivo do órgão oficial do partido enquanto se publicou, há documentos que se perderam, não há registo e depósito de moções, comunicados, tomadas de posição política, praticou-se nalguns períodos a memória selectiva, foi deitado fora muito material fotográfico. A partir de certa altura, houve pouco amor ao partido. Isto explica muito a falta de consistência institucional e torna mais difícil a quem chega de novo compreender o que aconteceu.

O CDS desenvolveu-se como um partido doutrinário por duas razões determinantes: a sua origem (um texto) e a sua circunstância (a competição com um partido catch-all). Ser um partido doutrinário dava-lhe uma mais forte razão de ser e demarcava o seu território de segurança face ao vizinho, que era de maior tamanho.

Tudo isto foi um processo natural, não planeado num qualquer laboratório ou num centro de operações. À direita do PS, o PPD/PSD atraiu e fixou as pessoas mais dadas ao pragmatismo e às utilidades imediatas, enquanto o CDS atraiu e fixou aquelas mais exigentes com critérios de valor, com a coerência, com a harmonia sistémica, com um pensamento largo e compreensivo.

Todos conhecemos nos mesmos espaços, nas nossas empresas, nos nossos bairros, nas nossas famílias, aqueles que são mais sensíveis a uma visão e abordagem e aqueles que são mais sensíveis à outra. Os primeiros tendem a ser PSD; os segundos, CDS. Aos primeiros, chamaremos os “pragmáticos”, aos segundos os “doutrinários” (ou “ideológicos”). Mas ambos recorrem, é claro, às duas inspirações: os pragmáticos precisam de uma orientação que os guie; os doutrinários também têm de ser pragmáticos, na hora de agir. A diferença está no que é posto em primeiro lugar e no que tem mais peso e prioridade no momento de decidir. Grosso modo, foi assim.

A segunda coisa a determinar a respeito do CDS é se é, ou não, um partido democrata-cristão. A minha posição é sim. Pelo menos, o CDS foi. Está naturalmente à disposição de quem manda no partido que o continue a ser, ou não. É matéria que tem sido abundantemente discutida e posta em causa – o que prejudica o partido. Nada pior do que uma organização que passa frequentemente a mensagem de não saber o que é.

A identificação do CDS com a democracia-cristã

O CDS não foi criado como democrata-cristão no acto da fundação e pelos seus fundadores – como, aliás, está escrito nas memórias de Diogo Freitas do Amaral. Podemos encontrar no conjunto da Declaração de Princípios, em particular na afirmação do “humanismo personalista”, uma identidade (ou, se quisermos, uma “sub-identidade”) democrata-cristã. Mas a verdade é que esta não está aí proclamada.

A democracia-cristã foi afirmada posteriormente, como corolário natural de um não muito longo processo, sendo colectivamente assumida pelo povo do CDS, que chegou a ser de 876.000 eleitores – senão mais, embora nunca contados. Logo no 1.º Congresso, em Janeiro de 1975 – o célebre do Palácio de Cristal –, ainda houve tempo para debater parte dos Estatutos, antes de o Congresso ser interrompido pelo violento boicote dos extremistas de esquerda. Num debate em que ainda pude intervir, o Congresso decidiu adoptar como referência “os valores éticos, sociais e democráticos do humanismo personalista de inspiração cristã” (alínea b) do artigo 2.º), em vez de apenas o “humanismo personalista”, como referido na Declaração de Princípios. Esta disposição estatutária ainda se mantém, mas qualquer menção à democracia-cristã, por extenso, apenas surgiu bastante mais tarde num Congresso que substituiu a difusão do “ideário centrista”, que era o texto original, pela do “ideário democrata-cristão” (alínea f) do artigo 2.º) – creio que assim terá acontecido no Congresso em que o CDS adoptou, no início da década de 1990, a denominação de Partido Popular. Ao mesmo tempo, desde as primeiras semanas, as referências à doutrina social da Igreja eram frequentes em intervenções de dirigentes do CDS. Uma vez mais, nada disto resultava de planeamento; era assim, espontaneamente, porque as pessoas pensavam assim.

O primeiro Programa partidário do CDS, também adoptado formalmente naquele 1.º Congresso (embora a aprovação só acontecesse, numa sessão quase clandestina em Fevereiro, posterior ao boicote do Palácio de Cristal), afirmava o “partido centrista”, ao mesmo tempo que identificava que o programa “se encontra repassado, do princípio ao fim, por uma nítida inspiração cristã, de harmonia com as convicções e ideais profundos do Povo Português.” E defendia “o humanismo personalista como filosofia básica da nossa acção.”

A plena e progressiva identificação do CDS com a democracia-cristã foi o contributo determinante não dos fundadores, mas das circunstâncias.

Por um lado, o território estava livre: o Partido da Democracia-Cristã (PDC) não singrou autonomamente; e o PPD/PSD, onde também havia destacadas figuras de índole democrata-cristã ou personalista, quis rumar à Internacional Socialista e escolheu a afirmação pela social-democracia.

Por outro lado, estabeleceu-se uma poderosíssima relação entre o CDS e a UEDC (União Europeia Democrata-Cristã), bem como os partidos membros desta. Este relacionamento foi estabelecido logo em Setembro de 1974, numa ofensiva europeia de Freitas do Amaral e Amaro da Costa, e foi amor à primeira vista. Os dirigentes dos congéneres europeus do CDS rapidamente desenvolveram fortíssima admiração e genuíno apreço pelo CDS, pelos dirigentes deste e pelo trabalho político desenvolvido.

Logo no 1.º Congresso, em Janeiro de 1975 – o célebre do Palácio de Cristal –, ainda houve tempo para debater parte dos Estatutos, antes de o Congresso ser interrompido pelo violento boicote dos extremistas de esquerda. Num debate em que ainda pude intervir, o Congresso decidiu adoptar como referência “os valores éticos, sociais e democráticos do humanismo personalista de inspiração cristã”

No histórico Congresso do Palácio de Cristal (Janeiro 1975), tendo o CDS menos de seis meses de vida, estavam já presentes altos dirigentes da UEDC e de vários dos partidos membros, assim como do Partido Conservador britânico – o que contribuiu muito para que a violência contra o Congresso não subisse e todos os congressistas acabassem libertados, ilesos. E essas relações foram-se consolidando e crescendo sempre.

O IDL, por exemplo, é um fruto dessa relação – no caso, com a Fundação Konrad Adenauer, da esfera da CDU alemã. E, em 1976, o desenlace consistente e firme acontece de uma forma não planeada: aconteceu naturalmente. Na campanha para as legislativas de Abril de 1976, o CDS adoptou o slogan que fora o da primeira campanha de Helmut Kohl como candidato a Chanceler: Alternativa 76 – desde aqui, a ideia de “Alternativa” jamais largaria a linguagem do CDS e o seu subsconsciente colectivo. E o 2.º Congresso, realizado em Julho de 1976, decorreu já numa onda claramente democrata-cristã, sob o mote “Pelo Personalismo Comunitário: um Compromisso Popular e Europeu”. Para a imprensa, o CDS passara a ser o partido dos “centristas e democratas-cristãos”. E, consagração mais alta daquela relação e daquele percurso, o primeiro fundador do CDS, Diogo Freitas do Amaral, viria a ser eleito Presidente da União Europeia Democrata-Cristã, em 1981/83, o único português a merecer esta distinção e esta confiança.

Como disse, o que o determinou foi o poder da circunstância, frequentemente o factor mais poderoso em política. Mas esse factor pôde operar, porque tudo o mais lhe era favorável: primeiro, a Declaração de Princípios era dessa estirpe; segundo, a larga maioria dos dirigentes eram dessa índole, muitos tendo passado por movimentos da Acção Católica ou nas suas margens; e, terceiro, o povo do partido também era assim. O povo respondia à chamada do que lhe pareceu ser a mesma melodia que, desde há décadas, ouvia na doutrina social da Igreja. Estava feito. E assim cresceu o CDS: como referi, chegou a contar 876.000 eleitores (16% da votação, em 1976) e, mais tarde, no tempo da AD, sondagens chegaram a cotar o CDS nos 19%, a um palmo dos 20% mágicos.

A perturbação da pax demochristiana

O CDS sempre teve sensibilidades mais liberais e outras mais conservadoras. Há-as assim, em todo o lado, até dentro dos partidos comunistas. É como a classificação dos “falcões” e “pombas”, quando falamos de conflitos armados ou internacionais: há-os assim em todo o lado, os mais duros e intransigentes e os mais moderados e dialogantes. São qualificações relativas, não definições autónomas. Esses liberais e conservadores eram adjectivos, não substantivos. E todos aceitavam e se reviam na comum definição democrata-cristã do partido, que resumia a sua identidade e definia a sua unidade. O CDS viria a crescer na pax demochristiana.

Na década de 1980, isto muda por impulso de indiferenciados de “direita” e de apoiantes de Francisco Lucas Pires. Foi uma decisão deliberada, uma estratégia: passou a falar-se de “democratas-cristãos, conservadores e liberais”. Pode alegar-se que, para esta deriva, contribuiu a constituição, em 1978, da EDU – European Democratic Union, na Europa, e da IDU – International Democratic Union, no plano mundial, já no princípio dos anos 1980, processos em que o CDS se envolveu desde o primeiro momento, com grande entusiasmo.

Dada a presença da Internacional Socialista por todo o lado, tratava-se de federar a nível continental e mundial todos os partidos do centro, centro-direita e direita democrática. Isto correspondia à formulação “democratas-cristãos, conservadores e liberais clássicos”. É possível que este facto tenha inspirado aquela linha no CDS, mas, se isso aconteceu, eram planos que não podiam confundir-se. Uma coisa é uma federação internacional de partidos afins, outra coisa é sugerir ou impor a cada um deles ser tudo ao mesmo tempo. Cada partido tem a sua identidade própria que resulta da sua formação e da sua história. Imaginemos o que aconteceria se quiséssemos convencer Boris Johnson (conservador), Donald Trump (republicano) ou Shinzo Abe (liberal clássico) que esquecessem a forma como os seus partidos se definiram historicamente e passassem a afirmar-se “democratas-cristãos, conservadores e liberais”.

A ideia, no CDS desse período (1983/86), era a de que esta fórmula somava e nos faria crescer. Por mim, que critiquei esse caminho, achei que ia funcionar ao contrário: ia subtrair, isto é, iríamos baixar. Recordo que procuraram explicar-me que a definição única pela democracia-cristã não nos levaria mais longe, nunca nos permitiria ultrapassar os 16%. Respondi que isso dependeria sempre de vários factores eleitorais, mas que o que não estava provado era que qualquer outra definição, que não fosse a democracia-cristã, nos fizesse chegar sequer aos 16%. Esta previsão tem-se cumprido.

Nas eleições de 1983, o CDS colheu 12,6% contra 16% em 1976, a última eleição antes da AD – ou seja, perdeu 3,4 pontos percentuais (pp); não subiu. Pode, porém, entender-se que esta eleição não é significativa, porque disputada na ressaca do fim da AD e Lucas Pires tinha muito escassas semanas de liderança; o novo discurso ainda não produzira efeitos. É verdade – e, nas circunstâncias em que essas eleições foram disputadas, esse resultado era um bom resultado. Mas, em 1985, houve novas eleições, onde o CDS obteve 10% – ou seja, perdeu 6 pp, face a 1976, e 2,6 pp face a 1983; tornou a não subir e, politicamente, perdeu muito mais. Lucas Pires renuncia à liderança do CDS nessa noite eleitoral.

Com Lucas Pires, passou a falar-se de “democratas-cristãos, conservadores e liberais”

Estas perdas de voto do CDS foram direitinhas para o PSD, que, tendo obtido 24,4% em 1976, subiu para 27,2%, em 1983 (mais 2,8 pp), e 29,9% em 1985 (mais 2,7 pp). Em termos agregados, o PSD subira 5,5 pp à custa do CDS, que perdera 6 pp.

O fenómeno tem fácil leitura: o CDS, ao deitar fora a identificação como partido doutrinário democrata-cristão e enveredar por um modelo menos definido de catch-all-party (em modo de três faces) perdeu poder de atracção específico e tornou-se vulnerável a que muitos viajassem para o partido catch-all por excelência: o PSD. O maior atrai mais do que o mais pequeno; o original atrai mais do que a cópia. Foi isto. O estribilho “democratas-cristãos, conservadores e liberais” revelou-se um fiasco.

O pior viria a seguir, ainda nessa onda, quando o CDS recolheu apenas 4,4%, debaixo do rolo compressor do cavaquismo em força. É evidente que o factor maioria absoluta para Cavaco Silva foi o factor determinante desta quebra, tal como na eleição seguinte em 1991. Mas a quebra da identidade característica democrata-cristã derrubou as paredes do CDS e ajudou a que, numa adversidade e perante o apelo exterior de “um partido igual” ou “parecido”, parte significativa do eleitorado migrasse. Sem contemplações. Comparando com 1976, voaram 11,6 pp do eleitorado CDS, mais 5,6 pp do que os fugidos já em 1985. Adriano Moreira animou um discurso democrata-cristão, de forte cunho social. E Freitas do Amaral foi a reafirmação, em pessoa, do primeiro CDS. Mas isso já não dava para contrariar o voto útil que se instalara profundamente no eleitorado, para garantir maioria absoluta a Cavaco Silva. E, segundo creio, aquele problema não foi claramente identificado nessa época e, portanto, também não foi contrariado, nem combatido.

Por mim, é o que penso: o CDS torna-se dispensável – um partido para a troca – se não for um partido doutrinário de cunho democrata-cristão. Outra coisa é outra coisa.

A retoma democrata-cristã

Em 1993, na liderança de Manuel Monteiro, quando muda o nome, o CDS-PP adopta um novo Programa em que consagra claramente a democracia-cristã como referência, fazendo-o logo no princípio: “O Partido Popular é democrata-cristão”. Acrescenta a afirmação de três vertentes deste conceito – “somos humanistas”, “somos personalistas” e “somos democratas” – e conclui: “O Partido Popular, por ser democrata-cristão, é o único representante legítimo, em Portugal, de uma das grandes escolas do pensamento democrático europeu, a escola do humanismo cristão.”

A eleição de Paulo Portas, em 1998, foi feita também com uma moção claramente democrata-cristã: “Na questão ideológica, o PP reafirma que é um partido democrata-cristão”. Mas logo, é verdade, acrescenta, “estando aberto às correntes do liberalismo responsável e do conservadorismo moderado, que procurará integrar e significar”. Isto, porém, era diferente do estribilho “democratas-cristãos, conservadores e liberais”, como se o CDS tivesse três faces ou três naturezas, todas colocadas indistintamente no mesmo patamar. O texto, que se dizia ter sido escrito por Luís Nobre Guedes, indicava que se procuraria “integrar” essas correntes, o que se explicitava melhor um pouco adiante: “Parece-nos útil actualizar o que é a democracia-cristã (…) e qual a capacidade integradora que há de revelar, acolhendo, do liberalismo, alguns princípios necessários à realização do indivíduo e, do conservadorismo, algumas ideias necessárias ao equilíbrio da sociedade e do Estado.” Esta situação não seria diferente daquela que existia no princípio do partido: um partido democrata-cristão, onde pessoas de sensibilidade liberal ou conservadora estavam integradas, sem quaisquer problemas, nem distinções. No mais, a moção reafirmava a “inspiração no humanismo cristão (…) como trave-mestra do nosso corpo doutrinário”, apontava para “a força de um novo personalismo” na “renovação ideológica que o PP vai empreender” e prometia, para 1999, “um Congresso programático”, onde seria lançado “um Manifesto da democracia-cristã portuguesa para o século XXI”. Estes últimos pontos não foram cumpridos.

A moção por que fui eleito Presidente do CDS, em 2005, traduziu naturalmente aquelas que são há muito as minhas ideias e teses. Cito alguns trechos mais relevantes em que abordava o tema da democracia-cristã:

  • “O CDS-PP é um partido democrata-cristão, claramente personalista na sua afirmação matricial e na sua ambição e vocação maioritárias. É daí que partimos e é aí que queremos chegar. É à volta deste eixo doutrinário fundamental que a formação, a afirmação, a consolidação, o crescimento e o alargamento do partido se fazem.”
  • “Nós pertencemos ao modelo de um partido doutrinário. Claramente. Marcadamente. Podia-se, em abstracto, ter escolhido outro modelo. Podia. Mas seria outro partido. Não seria o nosso partido.”
  • “Ter a doutrina personalista e democrata-cristã claramente afirmada, cultivada, conhecida, estudada, aprofundada, declinada e reconhecida é o maior, o mais sólido e o mais poderoso dos capitais políticos intemporais do CDS, do nosso partido.”
  • “Já houve tempos na história do partido em que se quis como que abrir um debate fracturante entre os conceitos democrata-cristão, conservador e liberal. Seria um erro reabrir essas questões. Sempre que partimos à aventura de um partido menos caracterizado, perdemos.”
  • “O CDS, afirmando-se democrata-cristão, sempre teve correntes mais conservadoras e correntes mais liberais. E assim deve continuar tranquilamente, em torno de uma matriz clara, comum, que corresponde à nossa base de apoio preponderante, democrata-cristã e personalista.”
  • “Não é tempo de qualquer artificial guerra civil ideológica no CDS-PP ou em seu redor; antes é tempo de fundamental reafirmação matricial, em torno do sólido tronco democrata-cristão, contemporâneo, personalista, aberto.”

Um efeito curioso desses dois anos (2005/07) é que passámos a ser todos, outra vez, “centristas e democratas-cristãos”. Não fiz nada por isso. Aconteceu porque a imprensa assim o repristinou. Antes da minha presidência, éramos tratados como os “populares”, o que vinha da presidência de Manuel Monteiro e da adopção do nome Partido Popular.

O regresso do tríptico

Com o regresso de Paulo Portas à liderança do partido, depois do meu derrube, a questão voltou a ser questionada e o debate reaberto, sobretudo a partir de 2011. Foi inclusive instituído e consagrado o direito de tendência, o que se destinava, segundo informação transmitida à imprensa, a organizar três tendências: a democrata-cristã, a conservadora e a liberal. A única que tentou formar-se, na altura, foi a liberal; mas não conseguiu reunir as condições necessárias junto dos militantes do partido e acabou por desistir. Só muito mais tarde, já na liderança de Assunção Cristas, viria a constituir-se a primeira tendência: a TEM – Tendência Esperança Em Movimento.

O partido, a partir da segunda liderança de Paulo Portas, voltou a insistir na trilogia conservadores, democratas-cristãos e liberais, na convicção de que este caminho correspondia a uma abertura e o faria crescer, tendo o pico desta discussão sido atingido, em 2018, por alturas do segundo Congresso da liderança de Assunção Cristas, o 27.º Congresso, em Lamego. De um lado, posicionavam-se os “pragmáticos”; do outro, os “ideológicos” – um debate, por sinal, um pouco estúpido, como vários de ambos os lados reconheceram, mas que soou efectivamente assim. Contestou-se a utilidade da ideologia e apontou-se que, em vez dela, o partido forneceria “respostas concretas aos problemas das pessoas”.

É pena que o CDS continue a rodopiar constantemente em torno desta questão, o que é, pelo menos, sinal de uma identidade pouco amadurecida. Isto prejudica muito a sua capacidade de afirmação e cria descontentamentos cíclicos, ora de uns, ora de outros.

O primeiro problema está na negação de um partido com identidade doutrinária clara, bem definida – fosse a democrata-cristã ou outra qualquer. O segundo problema é a tentação de querer que o CDS seja um catch-all-party, replicando no seu espaço o modelo do PSD – o que só potencia o voto útil e o esvaziamento do CDS. O terceiro problema é a colocação no mesmo patamar de três identidades – democrata-cristã, conservadora e liberal –, competindo entre si ou ensaiando uma convergência abstracta, que ninguém explica, ninguém mostra, ninguém esclarece.

Este estribilho “democratas-cristãos, conservadores, liberais” é declamado, nesta sua segunda fase recente, em termos mais agressivos do que no tempo da breve liderança de Lucas Pires, o que é de molde a agravar os danos. Agora, não se trata apenas de uns acenos ou de novos temperos para a travessa comum da democracia-cristã, mas de novas definições do partido, apodando a democracia-cristã, ora entre dentes, ora em ataques azedos, de “direita confessional”, assim a afastando, depois de estigmatizada – o que torna inevitável naturalmente a reacção dos que mais se sintam democratas-cristãos.

É pena que o CDS continue a rodopiar constantemente em torno desta questão, o que é, pelo menos, sinal de uma identidade pouco amadurecida. Isto prejudica muito a sua capacidade de afirmação e cria descontentamentos cíclicos, ora de uns, ora de outros.

Esta querela tem muito artificialismo, obedecendo aos tiques superficiais do marketing e indo atrás da opinião externa, em vez de à frente dela, como os partidos devem fazer – os partidos têm, entre outras funções, a de influenciarem a opinião pública e a formação desta. Entre democrata-cristãos e conservadores não há diferenças significativas. Nalguma medida, na Europa, podemos dizer que o democrata-cristão é um conservador católico ou influenciado pelo catolicismo, mesmo em países que ficaram do lado de lá da Contra-Reforma. De um modo geral, onde há democratas-cristãos com peso significativo, não há conservadores; e vice-versa. O pensamento típico conservador é o britânico, com uma tradição muito antiga, mas inaplicável em sociedades que não têm a história do sistema político britânico: guarda enormes ensinamentos para o CDS, mas são ensinamentos, não estão dentro de nós. São coisas que nós admiramos profundamente, coisas deliciosas que nos fazem sorrir, ideias poderosas que nos sacodem – mas é como ver um filme, não é uma comunicação vivencial. Porém, como disse, neste espaço não há possibilidade de conflito estruturado entre conservadores e democratas-cristãos. Só por esquisitice (uma esquisitice que faz mal) se pretende exibir rótulos distintos. O CDS teve sempre desde o início as mais estreitas relações com o Partido Conservador britânico – por exemplo, Freitas do Amaral e Amaro da Costa, quando foi o 11 de Março de 1975, estavam em Londres a convite dos Conservadores a treinar intervenções na televisão, tendo em vista os tempos de antena para as eleições constituintes que seriam pouco depois. E, no Parlamento Europeu, o Partido Conservador esteve, largo tempo, integrado no grupo do PPE, então PPE-DE.

Já com os liberais não é assim. Depende obviamente de quem assim se assume, mas o pensamento liberal é, em muitas questões relevantes, distinto do pensamento democrata-cristão – às vezes, oposto. A democracia-cristã, quando se formou, incorporou naturalmente grandes legados do liberalismo político e do liberalismo económico dos finais do séc. XVIII e princípios do sec. XIX, a que deu um tempero mais social, de informação personalista – isto é, focada na pessoa humana na relação social e não no indivíduo. A democracia-cristã defende a propriedade privada, a livre iniciativa, a economia de mercado – não é por ser “liberal na economia”, é por ser democracia-cristã. A democracia-cristã defende a separação de poderes, o constitucionalismo, os direitos, liberdades e garantias, as eleições livres, o Estado de direito – não é por ser “liberal na política”, é por ser democracia-cristã. Mas a democracia-cristã é sensível a um tipo específico de solidarismo, ausente no pensamento liberal.

Por isso, tenho pensado que, à direita, entre democratas-cristãos e militantes do pensamento liberal, é mais fácil chegar a acordos entre partidos separados do que dentro da mesma casa. Um partido é, entre outras coisas, uma fábrica de produção de respostas e propostas políticas. Como é que se criam e definem “respostas para os problemas concretos das pessoas”, sem uma ideologia clara ou uma base doutrinária estabelecida?

No momento de produzir, é muito perturbador que os construtores não estejam de acordo nem com os ingredientes, nem com a receita. Isso resulta melhor se os partidos gerarem tranquilamente os seus programas políticos e a sua influência de acordo com as suas próprias identidades, podendo chegar mais facilmente a acordos pontuais ou plataformas alargadas, depois de se terem medido eleitoralmente. É por isso que não achei mal – acho bem – o aparecimento da Iniciativa Liberal (IL): havendo liberais legitimamente ansiosos pela sua própria intervenção, é preferível que constituam e afirmem o seu próprio partido do que, sem ofensa, andem a fazer de cucos nos ninhos dos outros.

No CDS original, isto nunca foi um problema. Toda a gente se revia na definição democrata-cristã do partido, compreendia-a e aceitava-a. Vítor Sá Machado, um fundador, que era conhecido como um “liberal”, foi um participante activo desse caminho – foi inclusive o primeiro Presidente do IDL – Instituto Democracia e Liberdade, o primeiro e o maior instrumento de cooperação política entre o CDS e a CDU, isto é, entre os democratas-cristãos portugueses e os democratas-cristãos alemães.

O partido CDS era democrata-cristão e procurava-se, no contínuo trabalho político e doutrinário, enriquecê-lo a partir de outras fontes ou por descobertas próprias. A política é dinâmica, tal como a sociedade. Ninguém queria pô-la a emparceirar com outras correntes ideológicas ou sobrepor-lhe idiossincrasias particulares. Ninguém dizia, nem sugeria que a democracia-cristã estava ultrapassada e era preciso ir buscar modernidade a outros lados. Porque quem o dissesse estaria obviamente a matar o CDS e a potenciar esses outros “lados”.

Esta querela, que se foi arrastando por falta de clareza das direcções do CDS, descontenta muita gente. Descontenta democratas-cristãos, que sentem estar a perder o seu partido. Descontenta liberais, porque criticam que não se vá tão longe quando gostariam. E descontenta também alguns que capricham em afirmar-se “conservadores” distintos dos democratas-cristãos e, para guardarem a sua própria pista, põem-se em bicos de pés, muitas vezes tacticamente ao lado dos “liberais” contra os “democratas-cristãos”. Isto só gera confusão, como na porta giratória de entrada de um hotel: quando esperamos um democrata-cristão, sai-nos um liberal; quando esperamos um liberal, sai-nos um conservador. Tudo vai gerando um clima de desconfiança, na base social e no eleitorado, parecendo um jogo de captação, cuja síntese na cabeça dos eleitores é esta: querem os nossos votos, mas não as nossas ideias.

Creio que isto foi uma das razões principais para a queda do CDS para aqueles 4,2% das eleições de 2019, correspondendo à perda de 7,5 pp relativamente às eleições de 2011, as últimas em que o CDS-PP concorrera com listas próprias. Em parte, repetiu-se a história da segunda metade dos anos 1980. Por um lado, houve muitos eleitores, confundidos ou desapontados, que foram centrifugados pela porta giratória. Por outro lado, houve certamente muito voto útil CDS ou ex-CDS naquela subida significativa que o PSD ainda conseguiu das europeias para as legislativas (de 21,9% para 27,8%, correspondendo a mais 700.000).

Em resumo: o voto CDS fugiu para PSD, para IL e para Chega. Na verdade, ser outra coisa dá noutras coisas.

A crise geral da Democracia-Cristã

É claro que a democracia-cristã atravessa um tempo de crise, no plano internacional e não só em Portugal. A sua idade de ouro terminou poucos anos depois de o CDS se formar e a integrar.

Em Espanha, já não houve um partido democrata-cristão espanhol, embora, à data da fundação do CDS, ainda com o regime franquista, “el equipo democrata-cristiano del Estado español” integrasse cinco partidos, de que só um sobrevive: o PNV, no país basco – o partido catalão acabou por dissolver-se noutras formações, na crise recente; e os outros três nunca fizeram prova de vida, tendo alguns dos seus membros entrado na UCD centrista de Adolfo Suárez e, mais tarde, no PP, o partido comum de “las derechas”, até há poucos anos.

Em Itália, a Operação Mãos Limpas (Mani pulite), no início dos anos 1990, deu cabo do Partido Socialista e também da longamente dominante DCI, que implodiu, gerando vários ramos que foram integrar outros projectos à esquerda, ao centro e à direita – na Itália, a democracia-cristã nunca mais se recompôs.

Na Bélgica, sobrevive no partido flamengo, hoje o CDV; mas o ramo francófono trocou o “cristão” por “humanista”, o CDH. Na Holanda, o CDA mantém-se, mas ressentindo-se ultimamente de um sistema partidário em convulsão constante. No Luxemburgo, o CSV foi-se mantendo sempre bem.

Em França, quando o CDS nasceu, o MRP já tinha desaparecido de cena, após a emergência do gaullismo com a V República, e os democratas-cristãos faziam tentativas, sem grande sucesso, para ressurgirem em lugar marcante na cena política – curiosamente, uma dessas tentativas inspirou-se no CDS português, o Centre des Democrates-Chrétiens de Jean Lecanuet, um dos que estiveram no Congresso do Palácio de Cristal.

Na Suíça, o CVP acusa uma quebra paulatina, mas contínua, desde os anos 1980. Onde a democracia-cristã se manteve sempre bem foi na Alemanha (a CDU e a CSU) e na vizinha Áustria (o ÖVP).

A UCD centrista de Adolfo Suárez juntou vários democratas-cristão

Gianni Ferrari/Cover/Getty Images

Por outro lado, a fim de manter a maioria que detinha, a necessidade de alargar o PPE, tanto ainda no âmbito da UE-15, como, posteriormente, no quadro da UE-28, favoreceu o pragmatismo na escolha e admissão de novos parceiros. Havia muitos Estados sem qualquer tradição democrata-cristã ou onde os partidos democratas-cristãos tinham pouco peso político – algo de semelhante ao que se passara, após o CDS ter saído do PPE, abrindo vaga para que, anos passados, fosse o PSD a entrar.

O mesmo aconteceu no plano mundial, sendo a UMDC – União Mundial da Democracia-Cristã substituída, primeiro, pela IDC – Internacional Democrata-Cristã e, depois, pela IDC – Internacional Democrata Centrista, a fim de poder incluir partidos similares de países sem tradição democrata-cristã e, também, partidos da mesma área política de países sem tradição cristã.

Diga-se, porém, que esta internacionalização aberta não destrói necessariamente a identidade marcada de cada partido, nem a altera. Pode até acontecer o contrário – ela fortalecer-se. Os partidos membros, que, gerados com uma identidade própria no quadro de uma tradição específica, ressentir-se-iam fortemente se quiséssemos alterar-lhes a estrutura de definição ideológica.

É relativamente fácil organizar e gerir essa pluralidade de referências em plataformas de cooperação internacional, cuja função é articular diferentes tradições nacionais no mesmo espaço político continental ou mundial do centro e da direita. Como já aludi, este era um imperativo político-partidário internacional, em que o CDS participou activamente desde os primeiros anos, uma vez que, à direita, não havia nada que se assemelhasse, em cobertura geográfica e política, à Internacional Socialista, presente em quase todo o mundo.

Ao mesmo tempo, toda aquela evolução internacional reflectia e acompanhava uma época de progressiva descristianização da sociedade na Europa e noutros países (não era só a laicidade do Estado, questão resolvida no princípio do séc. XX), com o efeito da menor popularidade automática do selo “cristão” e também muito menor conhecimento público e popular das suas imagens, das suas parábolas e alegorias, dos seus símbolos, da sua linguagem. Ser cristão, no plano público, passou a ser menos valioso e mais exigente.

A democracia-cristã na direita

Uns breves comentários para situar a democracia-cristã no quadro direita/esquerda, como era o propósito geral em que se inseria este ensaio.

A democracia-cristã integra-se sem dúvida na direita europeia, de que constitui, de resto, uma das famílias mais antigas, mais relevantes e com maior património político histórico – até por isso, é muito despropositado desvalorizá-la e pô-la na prateleira. Ainda hoje, apesar de todas as crises e dificuldades, o PPE (que transporta ainda a bandeira democrata-cristã) é o mais numeroso e importante grupo político no Parlamento Europeu. No caso específico do CDS-PP, o acentuar da vertente democrata-cristã foi instrumental no momento de redenominação para Partido Popular e de afirmação programática como partido de direita, tendo sido apagadas as referências ao “ideário centrista”, que foram substituídas pelo “ideário democrata-cristão”.

A democracia-cristã é, mais propriamente, uma família política do centro-direita, cobrindo um espectro de sensibilidades que vai do centro à direita média. Há uma escala muito usada em Ciência Política e em inquéritos de opinião, que classifica as pessoas (os respondentes) e os partidos numa escala de 1 a 10, em que 1 é a posição mais à esquerda e 10 a mais à direita. Nesta escala, arrumo o espaço da Democracia-Cristã no espaço de 6 a 8, posições que legendo deste modo:

6 – centro-direita
7 – direita moderada
8 – direita média

Na América Latina, houve democratas-cristãos mais à esquerda, situados na posição 5 (centro-esquerda) e alguns mesmo na posição 4 (esquerda moderada) – alguns partidos democratas-cristãos latino-americanos tiveram de afirmar-se e, por vezes, que resistir contra regimes autoritários de direita. Na Europa, também relevaram alguns na posição 5, sobretudo em Itália, como se veria com nitidez aquando da implosão da DCI, vindo alguns grupos a juntar-se a partidos de esquerda. O seu espaço político é o de 6 a 8. A família democrata-cristã – como, nos países com essa outra tradição, a de partidos conservadores – é uma importante âncora democrática, cujas consistência, fidelidade, fortaleza e agilidade políticas são determinantes para que as vagas populistas e de radicalismo ou extremismo não ganhem demasiada implantação, nem tenham sucesso.

Aquele posicionamento dominante da democracia-cristã no espaço 6 a 8 explica também a facilidade e a naturalidade da cooperação política a nível nacional e sobretudo, como já vimos, na cooperação partidária internacional com os partidos conservadores e liberais clássicos. Estes também se situam naquele espaço de 6 a 8.

Afirmação personalista, a minha via

Voltando ao fio da democracia-cristã e sua evolução, devo dizer que eu próprio nunca me defini como democrata-cristão, embora responda naturalmente pelo nome – e não tenho qualquer problema com isso.

Sou democrata-cristão, mas sempre gostei mais de me definir como personalista. Tenho escritos sobre isso no começo da minha actividade política, no órgão oficial do CDS “Democracia 76” e na imprensa comum. Atraiu-me muito a corrente personalista – e ainda hoje atrai. É fortíssima como inspiração e até só como palavra. Pareceu-me que faltava apenas dotá-la de operacionalidade política e de músculo de combate.

Seduziu-me a visão da alternativa personalismo versus socialismo, até pela própria força alternativa de contraste das denominações: a afirmação do primado da Pessoa contra o império do Estado. Não tinha – e não tenho – dúvidas sobre o potencial vencedor do personalismo no séc. XXI e como este pode ser a verdadeira resposta, com liberdade, com justiça e com progresso, ao inevitável fracasso do socialismo.

O socialismo já falhou tantas vezes e em tanto lado que é inevitável que esteja para acabar. O primeiro problema do socialismo é que é um erro teórico, como desconfiei aos 18 anos – e os erros teóricos raramente funcionam na prática. O único “socialismo do século XXI”, cunhado pelo “chávismo” na Venezuela, mergulhada em prolongada tragédia, é o que vai acabar. O próximo fracasso anuncia todos os fracassos seguintes, um após outro, depois de todos os outros anteriores e até ao último fracasso para sempre. Mas este fracasso final do socialismo só pode produzir efeitos, se houver um outro corpo de doutrina, um outro tronco de ideias, de valores e de princípios que possa suceder-lhe com vantagem, conjugando Liberdade, Progresso e Justiça. É o personalismo. Lembro o 2.º Congresso do CDS, em 1976: “Pelo personalismo comunitário: um compromisso popular e europeu”.

O personalismo não é diferente da democracia-cristã – há quem diga que Jesus Cristo foi o primeiro personalista da História. Se quisermos, o personalismo é uma espécie de medicamento genérico, aplicável em quaisquer circunstâncias, mesmo não cristãs. Mas um cristão como eu, nunca poderá esconder aquele manancial extraordinário de pensamento e de doutrina que nos foi legado por diversos Papas e muitos outros, eclesiásticos e leigos, na sua esteira. As encíclicas da doutrina social da Igreja estão carregadas de humanismo personalista ou personalismo cristão, como não podia deixar de ser. A democracia-cristã transporta o personalismo como inspiração e eixo fundamental.

Revejamos, por exemplo, algumas linhas clássicas do pensamento da doutrina social da Igreja e da democracia-cristã.

  • A verdade, a liberdade e a justiça como três valores fundamentais. Está mal?
  • Um humanismo integral e solidário. Está errado?
  • A unidade e unicidade da pessoa; o respeito da dignidade humana; a liberdade da pessoa; a igualdade em dignidade de todas as pessoas; a sociabilidade humana. Nada disto vale?
  • O valor dos direitos humanos e os direitos e deveres. Não interessam?
  • A liberdade religiosa, um direito humano fundamental. É para não falar nela?
  • O direito à objeção de consciência. Está mal visto?
  • Liberdade de educação e de ensino. É para esquecer?
  • Direitos dos povos e das nações. Não contam?
  • O princípio do bem comum. Não vale nada?
  • O destino universal dos bens. Não presta?
  • A opção preferencial pelos pobres. É só para enfeitar discursos?
  • A dignidade do trabalho e o direito ao trabalho. Não contam?
  • A solidariedade. Interessa?
  • A família, primeira sociedade natural e protagonista da vida social. Está mal?
  • A iniciativa privada e a empresa. São importantes?
  • A função social da propriedade e da empresa. Está errado?
  • O princípio de subsidiariedade. Não é assim? Não o querem, é?
  • A participação e o primado da comunidade civil. Está certo ou está errado?
  • Relações internacionais fundadas na harmonia entre ordem jurídica e ordem moral. Está certo?
  • Colaboração internacional para garantir o direito ao desenvolvimento e luta contra a pobreza. Está certo?
  • O ambiente, um bem coletivo. Está certo?
  • A promoção da paz. Está certo?

As respostas são tão evidentes… Os nossos valores estão certos. Além disso, está sendo construído, desde há mais de um século, um tronco de pensamento fantástico, rico como poucos, sempre renovado, que irradiou por todo o mundo. Vamos jogá-lo fora? Passar a um alfarrabista? E há um povo, boa gente, muito boa gente, gente numerosa, que cresceu a ouvir essa música, a pensar essa filosofia, a cultivar esses sonhos, a olhar esse futuro. Vamos deixá-lo sem representação? Vamos interromper o seu caminho e cortar a sua influência? Não pode ser.

Se sentimos que temos razão, estamos à espera do quê? Como podemos ficar à espera e de quê? Se, tendo olhado o mundo e pensado nele; se, tendo reflectido em tudo com o nosso espírito; se, tendo olhado para o mundo outra vez, no propósito de o fazer melhor – e verificamos que temos razão, que as nossas ideias são boas, que estamos certos, então temos que nos aplicar a realizá-las, a servi-las, a cumpri-las.

Uma coisa, porém, é certa, por mais teorias que façamos e por mais certas que as teorias possam estar, em abstracto: se os dirigentes de um partido não são democratas-cristãos, esse partido não consegue ser democrata-cristão; se os dirigentes de um partido não são personalistas, esse partido não consegue ser personalista. Pode ser pena, mas é assim. Nem pode ser de outra maneira: um partido só pode ser aquilo que são os seus membros, sobretudo os seus dirigentes. Este teste da verdade é que dita e comanda a realidade.

Voltando à pequena história de Paul Samuelson e Bernard Shaw com que comecei este ensaio, é altura de ter presente que, nas ideias e propostas políticas, a mesma reflexão tem cabimento: muitas vezes falham por não serem realmente seguidas pelos seus seguidores. Isto é, por não saírem das gavetas e das prateleiras, por serem abandonadas, antes de cumpridas.

Uma coisa, porém, é certa, por mais teorias que façamos e por mais certas que as teorias possam estar, em abstracto: se os dirigentes de um partido não são democratas-cristãos, esse partido não consegue ser democrata-cristão.

Por vezes, o que não se aplica (e por isso falha) era até espantosamente simples e acessível – ou assim parecia. O cristianismo, na abordagem de Bernard Shaw, pode ser reduzido ao mandamento novo: ama o teu próximo como a ti mesmo. Aparentemente, não há mais simples e mais fácil do que isto: fazer aos outros o que queremos que nos façam a nós. Mas a história do mundo e a vida de cada um de nós mostram quão difícil é. Quase ninguém o consegue fazer. Ninguém o consegue fazer sempre.

O mesmo com a concorrência perfeita, de que cuidava o grande economista Paul Samuelson. Não é fácil entender que não se deve procurar alcançar uma posição dominante no mercado para abusar dela? Não é também fácil entender que não se deve concertar preços para afastar um concorrente ou dominar os consumidores? Entender é, mas fazê-lo…

Copiando o que Samuelson e Bernard Shaw diziam da concorrência perfeita e do cristianismo, se a democracia-cristã falha e se afunda, é por não ser tentada na prática. E, se o personalismo falhar, é porque nem saiu dos tacos de partida.

Lisboa, 19 de Julho de 2021

Neste dia, lembro, em especial, algumas figuras do CDS que já nos deixaram e por que rezamos: Diogo Freitas do Amaral, Adelino Amaro da Costa, Emídio Pinheiro, Ruy Oliveira, João Porto, Nuno Krus Abecasis, Maria Laura Pinheiro, Francisco Lucas Pires, Rui Pena, Valentim Xavier Pintado, Francisco Oliveira Dias, Martins Canaverde, Mário Gaioso, Girão Pereira, Maria José Nogueira Pinto, João Morais Leitão, Jorge Ferreira, Silvério Martins, Lourenço Féria, Maria Adelina Maia Júlio, Raul Miguel Rosado Fernandes, José Carvalho Cardoso, Luís Azevedo Coutinho, Walter Cudell. E lembro aqueles que da Juventude Centrista morreram muito novos, recordando, por todos, o Miguel Portocarrero, longamente detido sem culpa formada, em Custoias e em Caxias, no PREC de 1975, quando tinha 17 anos: não tinha idade para votar, mas já tinha idade para ser preso.

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