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O Ministério das Finanças surpreendeu esta semana ao apontar para um défice menos grave do que o esperado

AFP via Getty Images

O Ministério das Finanças surpreendeu esta semana ao apontar para um défice menos grave do que o esperado

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O que fazer à "almofada" de João Leão? Investir "como se estivéssemos numa guerra”, porque “poupar agora é o cúmulo do absurdo”

De forma surpreendente, o ministro das Finanças anunciou que o défice será mais baixo do que o previsto. À esquerda e à direita, economistas criticam Governo por estar demasiado preocupado com dívida.

Depois de tantas medidas de apoio anunciadas ao longo do ano pelo Governo — e de João Leão ter revisto em alta por duas vezes a meta do défice — não passaria pela cabeça da generalidade dos portugueses (e das instituições internacionais) que, afinal, o buraco das contas públicas não seria tão grande como se pensava. Mas foi isso que aconteceu esta quarta-feira, quando o Ministério das Finanças anunciou que o défice será mais próximo de 6,3%, como previsto no verão, do que dos 7,3% estimados em outubro.

O valor não é propriamente baixo, só que num ano de pandemia — que arrastou a maior parte das economias mundiais para recessões sem paralelo em largas décadas, e que significou uma enorme ginástica financeira dos governos para evitar o descalabro de famílias e empresas — as novas expectativas de João Leão não deixam de surpreender.

Em apenas três meses, as contas do ministro das Finanças ganharam uma almofada superior a 3 mil milhões de euros face ao que tinha previsto no OE2021, embora estes números sejam apurados com base em contabilidade pública (numa ótica de caixa), uma metodologia diferente daquela que interessa a Bruxelas (contabilidade nacional, registando os compromissos assumidos).

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O Governo adianta que o défice atingiu 10.320 milhões de euros no ano passado, mas que este valor “difere significativamente do saldo em contas nacionais”. Quanto? O Ministério das Finanças não diz, mas adianta que deve “ficar mais próximo do valor inicialmente previsto no Orçamento Suplementar de 2020”, que foi fixado em 6,3% do PIB. Tudo por causa do comportamento do mercado de trabalho, “bastante mais favorável do que o previsto”, que teve “reflexo na receita fiscal e contributiva”.

Ora, se estiver em causa, de facto, menos um ponto percentual do PIB estarão em causa cerca de 2 mil milhões de euros de poupança. O que significa na prática esta diferença? E o que é que nos diz sobre os próximos tempos?

A “resposta de mínimos”, que “agravou a recessão”

Entre março e dezembro, Portugal “despejou” 4,6 mil milhões de euros na economia para mitigar os efeitos da crise, entre medidas do lado da receita (1,4 mil milhões de euros) e, ainda mais, do lado da despesa (3,2 mil milhões). Apoios que deverão contribuir — tal como em muitos outros países — para uma recessão menos grave do que um cenário em que não houvesse qualquer intervenção estatal (patrocinada pelo BCE). Só que, mesmo com estes apoios, que têm permitido conter uma escalada do desemprego e uma queda abrupta dos rendimentos das famílias, é esperada uma recessão acima dos 8%.

Podia Portugal ter perdido menos riqueza? Tendo em conta os dados desta quarta-feira, o economista Pedro Braz Teixeira é taxativo: “Ao poupar um ponto percentual do PIB [no saldo orçamental], o Governo, na prática, agravou a recessão” do país.

O director do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade diz não compreender toda esta poupança, porque “está em causa a maior recessão dos últimos 100 anos”. Uma circunstância que exigiria todo o poder de fogo disponível.

O primeiro-ministro, António Costa (E), conversa com o ministro das Finanças, João Leão (D), durante a sessão plenária para a votação do Orçamento do Estado 2021 (OE2021), na Assembleia da República, em Lisboa, 26 de novembro de 2020. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

António Costa e João Leão conseguiram uma "almofada" nas contas públicas que não estava prevista há apenas três meses

MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

O Ministério das Finanças dá a entender que o resultado foi inesperado, porque “o comportamento do mercado de trabalho foi bastante mais favorável do que o previsto”, mas Braz Teixeira entende que “o Governo sabia perfeitamente” o que estava a fazer, uma vez que “não estamos a falar de 50 ou 100 milhões de euros”.

A surpresa, na verdade, pode nem ficar por aqui. O economista Ricardo Cabral acredita que “a performance será ainda um pouco melhor em março, quando se apurarem os números”, porque João Leão, que ficou conhecido como o obreiro das cativações quando era secretário de Estado de Mário Centeno, “tem a tendência para ser muito cauteloso”.

“Ao que o Governo se agarrou foi o controlo da despesa”, através de gastos extraordinários, que não se repetem no ano seguinte (“one-off”), nota o economista da Universidade da Madeira. É que, ao contrário da receita, que depende muito do comportamento da atividade económica, “a despesa do Estado é muito facilmente controlada”. Por isso, houve alguns meses de apoios “e não mais”, numa primeira fase, e “relativamente limitados”.

Estado só não poupou em salários e cativações terão dado ajuda

Apesar de ter havido uma subida na despesa de 4,7 mil milhões de euros face a 2019, a verdade é que estava previsto muito mais em junho, no Orçamento Suplementar para 2020. Entre o que João Leão previu então de despesa e o que, de facto, gastou, há uma poupança de 6,8 mil milhões de euros, o que leva Ricardo Cabral a concluir que o ministro das Finanças “tinha margem de manobra para uma política orçamental mais ambiciosa”. Para o economista, o Governo “deu uma resposta de mínimos, que não foi adequada, no Orçamento Suplementar”, e que, “na Zona Euro, é das mais fracas que existe” em percentagem do PIB.

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O gabinete de João Leão justificou esta diferença (que representa cerca de metade do orçamento da Saúde) com a tal resistência do mercado de trabalho, que significa menos gastos sociais, mas também com “a ligeira recuperação da economia” na segunda metade do ano face ao primeiro semestre, de acordo com declarações das Finanças ao jornal Eco.

Só que uma comparação cuidada entre o boletim de execução orçamental e o Orçamento Suplementar (ambos em contabilidade pública) permite concluir que há várias rubricas que ficaram aquém do planeado em toda a administração pública.

Com a aquisição de bens e serviços, o Estado gastou menos 1.555 milhões de euros; em subsídios foram menos 743 milhões de euros; em transferências correntes 753 milhões; e em juros 322 milhões de euros.

A maior poupança, no entanto, advém de outras despesas correntes, em que se gastou menos 2 mil milhões de euros do que o valor previsto no Orçamento Suplementar. O boletim de execução orçamental não avança com qualquer nota explicativa, mas esta rubrica inclui habitualmente a reserva orçamental — o dinheiro que está cativo, à espera de autorização do ministro das Finanças para ser gasto. No total, todas estas rubricas representam 5,4 mil milhões de euros de poupança.

O ministro das Finanças “tinha margem de manobra para uma política orçamental mais ambiciosa (...), deu uma resposta de mínimos, que não foi adequada, no Orçamento Suplementar”, e que, “na Zona Euro, é das mais fracas que existe”
Ricardo Cabral, economista da Universidade da Madeira

A única rubrica em que houve derrapagem face ao que tinha sido autorizado pela Assembleia da República foi a despesa com pessoal, e apenas ligeira — uma subida de cerca de 200 milhões de euros.

Em relação ao dinheiro que entrou nos cofres do Estado, Ricardo Cabral nota que “as contribuições sociais caíram muito pouco e as de IRS relativamente menos”, pelo efeito do mercado laboral, mas “a queda do lado das receitas foi superior ao que o Governo esperava” no OE2020 Suplementar, à boleia do IVA e de outros impostos. Em junho, Mário Centeno e João Leão previam que o Estado arrecadasse 87,6 mil milhões de euros, mas o ano acabou com receitas de 84,1 mil milhões de euros.

Governo foi “demasiado poupado” nos apoios

Os economistas Braz Teixeira e Ricardo Cabral concordam que o momento exigia que houvesse ainda mais intervenção do Estado junto das famílias e das empresas. O coordenador do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade salienta que “podia ter havido mais apoios às pessoas que mais precisam, empresários que tinham pequenos negócios que não foram tão ajudados quanto podiam ter sido”, criticando ainda os “muitos obstáculos aos apoios” e a “demora e burocracia” dessas ajudas.

Também Ricardo Cabral vê o Governo a ser “demasiado poupado” nos apoios sociais, dando como contraponto o exemplo dos EUA, que distribuiu “bastante dinheiro” e, por isso, “a economia está a reagir um pouco melhor” do que Portugal ou a Zona Euro.

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A maior fatia dos apoios em Portugal foi dada pela Segurança Social, com o lay-off simplificado à cabeça no lado da despesa. A medida que agora é ressuscitada para o novo confinamento foi um dos primeiros paliativos a serem lançados pelo Governo, com a duração máxima de três meses para proteger postos de trabalho. Esta medida extraordinária de apoio à manutenção dos contratos de trabalho tinha duas opções — suspensão de contratos de trabalho ou redução dos horários dos trabalhadores —, em que os salários eram cortados até um máximo de 33%.

A partir de julho, passou, no entanto, a estar apenas disponível para empresas que tenham sido obrigadas a fechar por imposição legal (o mesmo registo que vigora neste momento). No total, o lay-off custou ao Estado 823 milhões de euros até dezembro.

A seguir, ainda no verão, ficaram disponíveis o apoio extraordinário à redução da atividade económica, para trabalhadores independentes que tenham sido obrigados a fechar durante o confinamento (280 milhões de euros gastos) e o apoio extraordinário à retoma progressiva de atividade, para empresas com quebras de pelo menos 25% por causa da pandemia (159 milhões). Do lado da receita, destaque para a isenção da Taxa Social Única (que deverá ter custado 509 milhões de euros).

A empresa Confecções GOUCAM adaptou a fábrica para produzir máscaras e batas cirúrgicas utilizadas no contexto da pandemia covid-19, Viseu, 27 de abril de 2020. A produção destes equipamentos de proteção individual já se encontram certificados pelo INFARMED. (ACOMPANHA TEXTO DE 28/04/2020) NUNO ANDRÉ FERREIRA/LUSA

NUNO ANDRÉ FERREIRA/LUSA

No âmbito das ajudas fiscais, a suspensão dos pagamentos por conta de IRC vai custando ao Estado 695 milhões de euros, a prorrogação do pagamento do IVA 75 milhões de euros e a suspensão de execuções fiscais 69 milhões de euros.

Há ainda o incentivo extraordinário à normalização (284 milhões), e, na Saúde, os gastos com equipamentos de proteção individual, medicamentos e outros — que valem 550 milhões de euros.

Associações patronais exigem mais

Ao longo de toda a pandemia não faltaram avisos dos representantes patronais sobre a necessidade de mais apoios (e de mais rapidez na sua distribuição). E agora que se sabe que o resultado orçamental foi melhor do que o esperado, voltam à carga.

A Confederação Empresarial de Portugal (CIP) salienta que a notícia de que o Estado poupou dinheiro em 2020, “paradoxalmente, acontece num momento de extrema vulnerabilidade e necessidade” e confirma que “o esforço de manutenção de emprego feito pelas empresas foi muito além do esperado”. A entidade liderada por António Saraiva pede, por isso, um “maior esforço público” para ajudar as empresas.

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A AHRESP (Associação da hotelaria, restauração e similares de Portugal), que representa um dos setores mais afetados pela crise, quer que seja criado “um mecanismo único de acesso aos apoios regulamentados” que permita “o reforço ágil, simplificado e alargado a todas as empresas”.

Apesar de ter sido prolongado o apoio à retoma progressiva e de haver lay-off simplificado para empresas que tenham sido forçadas pelo Governo a encerrar portas, a associação já tinha pedido um apoio alternativo, em que a Segurança Social assegure todo o salário dos trabalhadores e isenção total das contribuições sociais para as empresas durante o primeiro semestre.

Numa altura em que, de acordo com um inquérito recente da associação, 16% das empresas de alojamento turístico e 39% das empresas da restauração admitem poder avançar para a insolvência, a AHRESP pede ainda que o apoio às rendas comerciais seja reforçado, tal como foi o Programa Apoiar, por considerar “incomportável suportar a totalidade deste relevante custo de atividade” nas empresas.

Esta semana, antes de saber o resultado da execução orçamental, também a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) já tinha defendido que seria necessário mais. “Algumas das medidas em vigor carecem de ser corrigidas, e outras medidas, nomeadamente na área fiscal, carecem de ser aprovadas sob pena de encerramento de muitas empresas por incapacidade de cumprir o conjunto de obrigações financeiras que se mantêm, apesar da pandemia”, avisou a entidade liderada por João Vieira Lopes.

A CCP propõe, nomeadamente, o pagamento excecional de prestações dos impostos sobre o rendimento sem que os juros vençam e sem que seja necessário apresentar garantia; “facilidades no pagamento do IVA” que devem ser aplicadas “a todas as empresas abrangidas pela obrigação de encerramento ou suspensão, independentemente do seu volume de negócios”; a dispensa da prestação de garantia em processos de execução fiscal por dívidas vencidas; ou o alargamento do critério do lay-off simplificado a todas as empresas afetadas pela crise e não apenas às que estão obrigadas a encerrar.

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“Havia margem mais investimento público”

Além dos apoios sociais, Ricardo Cabral e Braz Teixeira apontam baterias ao investimento público. Pelo menos em parte, o dinheiro que sobrou face ao que tinha sido estimado em outubro deveria ser canalizado nesse sentido.

“Havia margem para mais investimento público”, defende Braz Teixeira, que dá o exemplo do “atraso nos apoios às escolas para reforçar o ensino à distância”. O economista considera que “não houve suficiente empenho para acelerar o processo de digitalização da economia”.

Já Ricardo Cabral entende que esse investimento deve ser “bem utilizado” e “um dos mais rápidos e que dá maior crescimento é o investimento público em infra-estruturas”. Por exemplo, na área da Saúde. E Portugal não pode esperar pelos fundos europeus, porque esse dinheiro “não vêm tão cedo”.

O economista da Universidade da Madeira junta ainda à equação a vertente do emprego público, porque “não é previsível que o setor privado venha a criar suficiente emprego”. Defende, por isso, “uma política orçamental mais expansionista”, porque “qualquer despesa pública neste momento tem um efeito multiplicador na economia muito significativo”. Se não fizerem essa despesa, “a economia afunda”.

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Ricardo Cabral considera que “o executivo deveria ter apontado para um programa permanente de emprego público que se traduziria em despesa permanente”. Mas porquê despesa permanente, se o Estado teve problemas no passado? “A despesa pública que faça tem de ser permanente, para criar confiança”, responde Ricardo Cabral. “Uma família que arranja um emprego permanente pensa: ‘eu vou comprar uma casa’, mas uma família que tenha um emprego de seis meses retrai-se”.

“Neste momento, os agentes do setor privado ou não têm liquidez, ou não têm acesso a crédito, ou estão com receio de investir — o investimento privado está a cair. Portanto, o Governo tem de criar uma expectativa positiva” que convença famílias e empresas que está a caminho uma retoma acelerada.

O economista ressalva que está em causa o “Estado como empregador de última instância”, dando como exemplo empregos na Saúde, de combate à pandemia e a outras ameaças, na investigação, nas universidades, em setores ligados a novas tecnologias. “Não estou a dizer que o Estado crie todo o emprego, mas que seja um grande impulsionador”. Se não fizerem essa despesa, “a economia afunda”.

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AFP via Getty Images

A dívida pública “é a história da cigarra e da formiga” ou “trabalho de Sísifo”?

Como pano de fundo para a poupança de João Leão está a evolução da dívida pública, que deveria disparar para 134,8% no ano passado, de acordo com as previsões do Governo no OE2021. Isto, depois de ter descido de 131,5%, em 2015, para 117,7%, em 2019. Será o resultado de uma recessão sem precedentes e do primeiro saldo primário negativo (contas públicas sem juros) desde 2015.

A pandemia significou, essencialmente, que todo o esforço feito nos últimos anos (em termos de redução de dívida) terá de ser repetido. É certo que o Governo deverá ter uma ajuda adicional do crescimento nos próximos anos — também à boleia da ‘bazuca europeia’ —, mas a dívida não deverá voltar aos níveis de 2019 tão cedo.

Nós continuamos com uma estratégia de austeridade tonta”, considera Ricardo Cabral. “Foi um erro enorme fazer aquela poupança toda” no tempo de Mário Centeno, porque “é trabalho de Sísifo — empurrar a pedra lá para cima, tentando reduzir a dívida”, até atingir 117% do PIB este ano, “e depois tudo se perder”. Foi, na opinião do economista, “um trabalho inútil rolar a pedra para cima para ela descer logo”.

“A altura era boa para as pessoas aumentarem os seus rendimentos. Estariam em melhor posição para lidar agora com este choque, teriam mais poupança, a economia estaria mais robusta do que está”, acredita Ricardo Cabral, que, no entanto, entende que o Governo “poderia não ter gastado nas coisas incorretas em que gastou, nomeadamente na banca, que foi um desastre”, com cerca de 11 mil milhões de euros injetados na CGD, no Novo Banco e no Banif.

Portugal com excedente de 0,2% e a terceira maior dívida no 4.º trimestre de 2019

Já Braz Teixeira tem outra opinião, defendendo mesmo que o Governo está a ser atormentado pelos erros do passado, ao não ter consolidado ainda mais as contas públicas no tempo de Mário Centeno. Apesar da redução alcançada pelo anterior ministro das Finanças, o economista do Fórum para a Competitividade entende que se impunha então uma aceleração maior. “A despesa podia ter tido outra qualidade”, considera Braz Teixeira, que dá o exemplo das 35 horas de trabalho na função pública, e nomeadamente na saúde. “Rebenta com a despesa do Estado”.

Dá o exemplo da Alemanha, mas também de outros países ‘frugais’, como Holanda, Áustria, Dinamarca, Suécia e Finlândia — tão criticados pelas resistências que colocaram durante as negociações da “bazuca europeia”. Como “foram poupados nos tempos das vacas gordas”, agora “podem investir”. “É a história da cigarra e da formiga”, entende Braz Teixeira. Para que não haja dúvidas, “Portugal é a cigarra”.

“Poupar agora é o cúmulo do absurdo”, mas “é muito difícil alterar mentalidades”

Com a dívida a ultrapassar novamente os 130% do PIB, não deveriam as campainhas voltar a tocar? “É provável que o Governo esteja preocupado com a dívida”, diz Braz Teixeira, mas “está assustado à posteriori”. Ao contrário da crise do Euro, que afastou os investidores, a pandemia “é um fenómeno global, não há país que possa dizer que vai perder investimento por ter sido afetado”. Há, por isso, “preocupação excessiva no atual contexto”.

Além disso, diz Braz Teixeira, “o BCE já deu a entender que vai comprar toda a nova dívida referente aos défices de 2020 e 2021”. E pode não ficar por aqui: “Não me custa a acreditar que faça algo parecido para lá desses anos”. Ou seja, não só o custo da dívida está a baixar — atingindo valores cada vez mais negativos — como não haverá falta de investidores interessados em emprestarem dinheiro aos Estados.

A pandemia “é um fenómeno global, não há país que possa dizer que vai perder investimento por ter sido afetado”. Há, por isso, “preocupação excessiva no atual contexto” com a dívida pública.
Braz Teixeira, economista do Fórum para a Competitividade

Também Ricardo Cabral identifica “muito medo do défice e da dívida” no Governo o que condiciona toda a estratégia orçamental. “Estar preocupado com a dívida no atual contexto, que é uma crise como nunca vista, e um desafio enorme para evitar que a economia entre em descalabro, é a estratégia incorreta, mas eu compreendo, porque estão habituados a fazer isso nos últimos anos”, considera o economista da Universidade da Madeira. “É muito difícil alterar mentalidades e alterar estratégia”.

Em relação à dívida pública não há problema absolutamente nenhum. O fundamental é ter crescimento económico neste momento”, entende Ricardo Cabral. A grande questão “coloca-se mais na dívida externa”, mas, “mesmo neste contexto, é, para já, pouco problemático”.

O que nos leva para este ano. O que se poupou no ano passado “terá consequências em 2021”, avisa o economista. “O dinheiro que fosse gasto agora teria o efeito de minimizar o impacto da recessão económica nos próximos anos”.

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Mas até que ponto é que o Governo pode usar a margem de poupança de 2020 para melhorar o que aí vem? Na nota que acompanhou a execução orçamental, o Ministério das Finanças adiantou que “apesar desta revisão para 2020 ter um efeito base positivo, não se antecipa uma melhoria da previsão do saldo orçamental para 2021”.

Isto porque “a segunda vaga da pandemia, mais intensa do que o esperado, e as medidas restritivas de confinamento associadas, com maiores apoios ao rendimento das famílias e às empresas, deverão conduzir a uma revisão em baixa do cenário macroeconómico e do saldo orçamental para 2021”.

O contexto não é fácil, reconhece Ricardo Cabral, porque o Governo “tem, em primeiro lugar de combater a pandemia, e criar medidas de apoio às pessoas afetadas”, mas “é preciso qualquer coisa para pôr a economia a mexer — e o Governo não está a fazer quase nada. Sem isso, a economia vai contrair novamente”, entende o economista da Universidade da Madeira. “Se o Governo se deixar ficar à margem da situação, como parece que está a ficar — só dando medidas de apoio —, a situação é mais difícil. É preciso ir para o terreno já, como se estivéssemos numa guerra”.

“Quando o Governo devia ter poupado não poupou, e agora que devia gastar está a poupar”, atira, por sua vez, Braz Teixeira. “Agora é que é” para investir e ajudar a economia. “Poupar agora é o cúmulo do absurdo”.

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