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O Governo repartiu por duas conferências de imprensa dois anúncios sobre o mesmo tema: pensões. Um foi avançado por Fernando Medina, ministro das Finanças — a atualização das pensões em 2024 vai, afinal, incorporar a fórmula da lei na sua totalidade, que não foi aplicada este ano, para que os pensionistas não fiquem a perder.
Outro foi feito por António Costa, três horas depois: os pensionistas vão ter um aumento intercalar das pensões, em julho, para que os valores da base estejam já conforme a lei quando chegar janeiro. Outra certeza: afinal, não será em 2024 que a fórmula da atualização das pensões será alterada.
Que novo aumento intercalar é este?
O Governo vai pagar, a partir de julho, um aumento intercalar das pensões para os pensionistas que recebem até 12 Indexantes de Apoios Sociais (IAS), isto é, 5.765,16 euros. Os pensionistas que se aposentaram em 2022 e que, tal como prevê a lei, ficaram de fora da atualização das pensões em janeiro, também vão receber.
O aumento, permanente, será de 3,57% face ao valor que o pensionista recebia em dezembro de 2022.
Porquê esse valor de 3,57%?
Há um racional para este valor. Em setembro do ano passado, o Governo anunciou que, em outubro, pagaria um bónus de meia pensão para compensar os pensionistas pela perda de poder de compra (mas que por isso não receberam o apoio extraordinário de 125 euros a que a maior parte dos contribuintes teve direito). Foi um extra pago de uma só vez e teve uma contrapartida: a atualização de pensões de janeiro seria limitada face ao que diz a lei, de forma a que o bónus de meia pensão e a atualização de janeiro perfizessem o aumento legal.
Governo obrigado a rever cálculos: Pensões até 960,86 euros sobem 4,83%
Só que havia um problema: a partir de 2024, os pensionistas ficariam a perder, dado que o aumento no valor base seria menor do que o que consta na lei, porque a “meia pensão” não estava incorporada nesse valor base. Uma opção que o Governo sempre rejeitou ter-se tratado de um corte, apesar de justificar com a necessidade de garantir a sustentabilidade do sistema da Segurança Social.
Feitas as contas, as pensões até 2 IAS (960,86 euros) deveriam ter subido 8,4% em janeiro, mas só subiram 4,83%; as que estavam entre 2 e 6 IAS (2.882,58 euros) deveriam ter subido 8,06% mas apenas avançaram 4,49%; e as entre 6 e 12 IAS (5.765,16 euros) deveriam ter crescido 7,46% mas só aumentaram 3,89%. Ou seja, todas elas avançaram menos 3,57% em janeiro do que deveriam ter subido de acordo com a lei.
São esses 3,57% que o Governo quer agora ‘devolver’ aos pensionistas para o cálculo da pensão de 2024. Só que em vez de esperar por janeiro de 2024 para fazer essa correção, vai já fazê-la em julho (sem retroativos a janeiro).
Quanto vai custar tudo isto?
Fernando Medina indicou que a correção da atualização das pensões vai custar mais 1.000 milhões de euros por ano. Só o aumento intercalar vai custar mais 580 milhões de euros este ano.
Já o Programa de Estabilidade projeta, para 2024, uma despesa adicional com a atualização das pensões de mais de 2,6 mil milhões de euros, num total de 3.947 milhões.
Porque é que o Governo mudou agora de ideias?
Porque, argumenta o Executivo, as contas do Estado estão melhor do que o Governo previa: em termos de défice (que será de 0,4% e não 0,9%), de crescimento da economia (que será de 1,8% e não 1,3%), de redução da dívida pública (de 110,8% para 107,5%), aumento do emprego (há mais um milhão de trabalhadores dependentes declarados desde 2015; embora a taxa de desemprego tenha sido revista em alta, de 5,6% para 6,7% em 2023), das contribuições sociais (que estão 68% acima do valor de 2015) e reforço da sustentabilidade da Segurança Social.
Na altura, o Governo foi acusado de “truques” pela oposição, ao limitar a atualização de janeiro, o que prejudicaria os pensionistas a partir de 2024 se nada fosse feito. Agora, responde ao PSD: “Fica claro que não havia truque, nem ilusão. Que tudo o que as pessoas tinham para receber receberam e até um complemento em outubro”.
O argumento do Executivo é que agiu com base na prudência: “Nos momentos de incerteza é mais importante do que nunca manter a confiança e para isso é preciso falar sempre verdade e nunca corrermos o risco de dar um passo maior do que a perna, para não termos de tropeçar ou recuar”.
Já não há perigo para o sistema?
O que o Governo diz, quanto a este último ponto, é que a projeção para os primeiros défices do sistema foi adiada em três anos face à última previsão muito por causa da evolução das contribuições sociais. Mesmo se tivermos em conta a correção da atualização das pensões.
Na altura, um dos motivos usados para não avançar com a atualização das pensões conforme dita a lei foi, precisamente, pelas consequências que o Governo dizia ser negativas no sistema caso o pagamento fosse feito, o que iria antecipar os défices no sistema para 2027. Meses depois, atualizou o cenário e já falava em 2030. Agora, fala em 2033.
“Com este enquadramento de evolução, de previsão e aumentos incorporados garantimos pela primeira vez mais de três décadas de saldos positivos do fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), e significa que o FEFSS passa a ter provisão em 2060 de 48 mil milhões de euros”, quando em 2015, a previsão era “não durar sequer até ao final da década”, referiu a ministra Ana Mendes Godinho, na conferência de imprensa desta segunda-feira.
Mas, de facto, até há pouco tempo, não havia muitos sinais que levassem a crer que este seria o passo dado pelo Governo. Tanto que, na semana passada, no Parlamento, Fernando Medina disse que a lei “protege os pensionistas”, que não perderiam este ano face ao que dita a lei. Por outro lado, também se comprometeu a decidir até onde o Governo poderia ir quando formulasse o Programa de Estabilidade, um documento que atualiza, entre outros aspetos, o cenário macroeconómico e as contas da Segurança Social.
Há um mês a posição era outra. Quando o Governo anunciou o novo pacote de apoios às famílias a 24 de março, Ana Mendes Godinho foi questionada sobre a falta de medidas para os pensionistas e respondeu que alguns dos apoios criados eram de “banda larga” e também se aplicavam a este grupo — como o apoio criado para famílias vulneráveis que incluía pessoas com pensão social de velhice ou de invalidez ou o complemento solidário para idosos.
E em 2024, que regras se vão aplicar?
Ainda não será em 2024 que será revista a lei da atualização das pensões. Em 2024 vai, assim, aplicar-se a lei como está, se o Governo não fizer nada em contrário. Ou seja, a atualização depende de uma fórmula de cálculo que tem por base o crescimento do PIB e a inflação.
Então, mas a fórmula de cálculo não ia mudar?
Houve vários sinais nesse sentido — de alterações na fórmula de cálculo. O secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, sinalizou, em março, citado pelo Público e pelo Negócios, que o objetivo era tornar o mecanismo menos sensível a “picos de inflação”, tendo em conta períodos de referência mais alargados, e que a expectativa era que as alterações se aplicassem em 2024.
Mas mexidas na fórmula não se aplicarão em 2024. “Para 2024 não”, esclareceu Costa. O grupo de trabalho criado para se debruçar sobre a sustentabilidade da Segurança Social “existe para tratar de sustentabilidade da Segurança Social e para olhar para a fórmula, mas não é para 2024. Em 2024 será aplicada a fórmula segundo a lei”, garantiu o primeiro-ministro.
Costa admitiu que a fórmula “não é adequada” para situações de elevada inflação, “mas daí a alterar vai um passo maior do que a perna”. Será preciso estudar, “depois de estudar há de ser discutido”. “Em 2024 não há nenhuma alteração da fórmula”.
Houve mais apoios para outra categoria de rendimentos? Há mudanças no IRS?
Não é certo o que, exatamente, vai mudar. De manhã, o ministro das Finanças comprometeu-se a “desagravar” o IRS em mais de 2 mil milhões de euros até 2027. “Ter uma estratégia em relação ao IRS tem grande importância na melhoria das condições de vida” dos portugueses, disse, comprometendo-se a “continuar com o trajeto” de conseguir o desagravamento superior a 2 mil milhões de euros em 2027, no impacto acumulado das medidas que vierem a ser tomadas em relação ao IRS. À RTP Medina não se comprometeu com mudanças no IRS, dizendo apenas que prometia trabalhar para que possa haver um desagravamento.
Na conferência de imprensa, Medina só anunciou que o Governo vai avaliar o desenho do IRS Jovem, de forma a perceber se “realmente tem eficácia do ponto de vista do acesso dos jovens à medida”. “Se tivermos sinais positivos, é uma área que consideramos importante prosseguir e desenvolver no ano de 2024 e seguintes”, adiantou.
António Costa também foi questionado sobre as prometidas alterações ao IRS nos próximos anos, mas não concretizou: disse apenas que pode passar pelo desdobramento de escalões, pelo IRS jovem, o aumento de deduções para famílias com filhos — medidas que têm sido tomadas pelo Governo.
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