Celebrar o tempo da família… com uma viagem natalícia de duas irmãs |
Por razões que não vêm agora ao caso, durante algum tempo, a minha irmã dizia que não gostava do Natal. Eu compreendia as circunstâncias e os motivos, mas aquilo custava-me. A minha maninha “pequena”, onze anos mais nova, não gostava da época mais mágica do ano, e eu sentia que tinha de a fazer mudar de ideias. Tomei-o como uma missão. |
Uma contextualização, antes de continuarmos: a minha irmã é filha do meu pai e da minha madrasta — eu chamo-lhe “boadrasta”, apesar da embirração de alguns com o vocábulo, por partir do princípio errado de que o “ma” de madrasta tem qualquer coisa que ver com “má” de maldade, quando tem, na verdade, que ver com o latim “mater”, de mãe, mas é uma liberdade criativa a que me permito, não me aborreçam os polícias da linguística. |
Durante muito tempo, pedi uma irmã ao meu pai, uma vez que à minha mãe, sem parceiro desde o divórcio (tinha eu 3 anos), ficava mais difícil. Mas não havia maneira de me fazerem a vontade. Lembro-me vividamente de quando soube que a minha madrasta estava grávida. Tinha 11 anos e chorei de emoção. Depois, ajudei a adormecê-la, a mudar fraldas, a aprender a andar, falar, e fazê-la rir tornou-se o meu passatempo preferido. |
Uma das coisas que sempre me doeram, sem que o conseguisse verbalizar ao início, era quando insistiam que ela era minha meia-irmã. Como assim, “meia”? Claro que entendia que era por ser apenas filha do mesmo pai, mas como considerar aquela pessoa tão importante na minha vida apenas pela metade? Aquilo custava-me. Até que um dia comecei a responder que não: ela não era minha meia-irmã, era irmã completa, inteira, plena. Era 100% a minha irmã e eu não conseguia imaginar que um amor tão grande pudesse ser parcelado, dividido ao meio, sentido aos bocadinhos. Mais: para mim, a minha irmã não é só uma irmã inteira como é uma “irfilha”. Como a desejei tanto e como temos tantos anos de diferença, acabei a sentir por ela um amor mais materno do que fraterno, o que fez com que fosse de certo modo uma espécie de mãe, antes mesmo de o ser. |
Voltando então ao Natal. Há muitas pessoas para quem “the most wonderful time of the year” é, na verdade, um pequeno tormento. Seja por viverem depressões que se agudizam com tanta felicidade no ar (que, por mais que tentem, não conseguem sentir), seja por terem acabado de se separar (com toda a idealização de família feliz em redor de uma mesa ou de uma árvore ou de um presépio, desfeita em pedacinhos), seja por não conseguirem engravidar, seja porque alguém importante da família está doente ou morreu há pouco tempo. Ou porque as condições económicas não são as melhores para se poder proporcionar uma Consoada como as que se veem nos filmes, nos anúncios e nas contas de Instagram. As razões para não se gostar do Natal são tantas que facilmente enchia esta newsletter só com elas. Mas eu, como vos dizia, estava apostada em fazer com que a minha irmã passasse para o lado dos que, como eu, gostavam do Natal. |
Acho que os natais em minha casa ajudaram, com os meus miúdos (que nasceram ainda ela não estava casada nem pensava, ainda, em ser mãe) e as nossas parvoíces de irmãs (ficamos ainda mais miúdas do que as próprias crianças). Mas talvez a grande mudança tenha acontecido quando ela própria foi mãe e sentiu que também lhes devia essa passagem de testemunho: o Natal dos filhos tinha de ser mais feliz do que muitos dos seus natais e, dessa vez, era ela que tinha uma missão em mãos. |
Os anos foram passando, e a minha irmã tornou-se uma adoradora do Natal. É comovente vê-la a decorar a casa ainda em novembro, a pular de entusiasmo assim que se entra em dezembro, e a enviar mensagens com uma espécie de countdown chalupa. Como tantas vezes acontece, passou de um extremo ao outro. Agora, é a verdadeira “maluquinha” do Natal, e até consegue fazer-me a mim revirar os olhos quando começa a falar na época, mal terminam as férias de verão. Ano sim, ano não, passamos juntas. Os primos adoram, nós também, e às vezes somos à volta de trinta à mesa. Este, é ano sim. E, para mim, são sempre os melhores. |
Um dia, há cinco anos, ela disse-me que queria iniciar uma tradição. Como forma de me agradecer por lhe ter devolvido, pelo menos em parte, a alegria do Natal. A ideia era genial: queria que passássemos a fazer uma viagem as duas, por esse mundo fora, onde existissem mercadinhos de Natal. Bom, a palavra “mundo” talvez tenha sido uma hipérbole provocada pela excitação do momento, até porque nenhuma das duas consegue tirar dias suficientes de férias que compensem uma viagem para lá da Europa. Mas não interessa. A ideia era boa e íamos pô-la em prática. |
E assim tem sido, já lá vão cinco anos. A primeira vez (em 2018) fomos a Frankfurt e ainda demos um saltinho a Heidelberg, a segunda vez (2019) fomos a Budapeste. Depois veio a Covid e chegámos a pensar que íamos ter de interromper a tradição, mas não! Ficámos por Portugal em 2020 e em 2021, com passeios de carro pelo norte do país e descobertas de lugares igualmente lindos e com direito a peripécias de chorar a rir (como aquele bungalow em cima de uma árvore onde ficámos, e que nos fez tremer de medo por nos terem contado, a meio da noite, uma história de horror de um casal que tinha aparecido morto com uma expressão horrorizada naquele mesmo local – a pessoa que nos contou isto merecia um Óscar, já nós estivemos à beira de uma síncope). |
Escrevo esta newsletter dois dias depois de ter regressado da quinta viagem de Natal consecutiva com a minha irmã. Este ano fomos a Zagreb, na Croácia (que ganhou dois ou três anos seguidos o prémio de melhor mercado de Natal da Europa). Como fomos cinco dias, num deles apanhámos um autocarro e fomos conhecer a capital da Eslovénia, Ljubljana, e noutro dia alugámos um carro e fomos conhecer o Parque Nacional de Plitvice (um dos lugares mais bonitos onde já estive). Tivemos sorte de ver nevar, de encontrar o parque de Plitvice todo salpicado de neve, de assistir à passagem da Croácia às meias-finais do Mundial de Futebol (eles festejaram tanto que, soubemos no dia seguinte, provocaram movimentos sísmicos na Terra), e de calcorrear vários mercadinhos de Natal encantadores. |
Mas o que mais queria destacar, é o que isto nos faz a nós, irmãs. À nossa (já tão boa) relação. Saímos sempre muito mais próximas, ainda mais unidas, sempre com redobrada vontade de repetir no próximo ano. Rimos até nos doer a barriga, somos infantis, desabafamos, resolvemos problemas ou, pelo menos, desembrulhamos temas que por vezes se nos embrulham na vida. É um tempo só nosso, sem maridos, sem filhos, sem nada que nos prenda ou obrigue. Fazemos até questão de não planear as viagens, para o efeito surpresa ser ainda melhor. Mentira, é mesmo por falta de tempo, porque no Natal estamos sempre as duas completamente atrapalhadas com trabalho, mas a verdade é que, para dar o exemplo deste ano, ambas as viagens dentro da viagem, quer a Ljubljana, quer a Plitvice, foram decididas em cima do joelho, já em Zagreb. E foram magníficas também por isso, por esse efeito “vamos e logo se vê, logo decidimos”. Sem pressões. Sem marcações. Sem regras. Sem obrigações. Disso tudo temos ambas – e muito – durante o resto do ano. |
Achava lindo se todos os irmãos pudessem fazer uma coisa como esta. Uma viagem por ano, mesmo que fosse em Portugal, só de irmãos. Sem maridos, mulheres, filhos, pais. Só mesmo os irmãos. Adorava que os meus quatro filhos repetissem a tradição. Que os meus dois sobrinhos o fizessem também. Não há nada mais triste do que irmãos desavindos. O amor entre irmãos devia ser inequívoco, inquebrável, inviolável. Bem sei que não é assim, tantas e tantas vezes, mas pelo facto de ter este amor imenso pela minha irmã, lastimo muito quem não possa viver uma relação assim. |
Por isso, deixo o repto: irmãos de todo o mundo (vá, de Portugal) uni-vos! Já temos alguns seguidores, que fazem questão de nos dizer que foi pelo nosso exemplo que deram início, também, a uma tradição semelhante. Mas adorávamos estender o conceito a mais pessoas que, desse modo, pudessem usufruir da maravilha que é passar uns dias a sós e em ambiente descontraído, divertido e de viagem, com os seus irmãos. E como vivemos na época das redes sociais e dos hashtags, temos até um para isto: #christmasistas. |
Este ano é capaz de já ser apertado, mas fica a dica para o próximo ano. De resto, se ainda não tiverem presente de Natal para o(s) vosso(s) irmão(s) ou irmã(s)… podem sempre embrulhar uma espécie de voucher onde se leia: “Vale uma viagem de Natal no próximo ano, só nós”. Vai ser épico e vão querer repetir. Se gostarem uns dos outros, claro. Se não se suportarem, deixem lá isso. Um par de meias resolve. |
Vale a pena… |
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É a história de uma jovem criativa que mergulha num universo criado pela sua própria imaginação e convida o público a suspender a realidade e a deslizar num mundo que ganha vida com incríveis projeções visuais e uma banda sonora original. Poderão encontrar ali alguns dos melhores acrobatas e patinadores do mundo.
Altice Arena, Lisboa, de 22 a 30 de Dezembro.
Bilhetes entre 35 e 89 euros |
Ler o livro Pode Tudo Mudar?, de Clare Helen Welsh e Asa Gilland |
«Adoro o verão e os quentes raios dourados de sol que tornam radiante o céu azul. Mas, este verão, a Mamã e o Papá dizem que já não conseguem viver juntos.»
E tudo muda… Esta é uma história enternecedora e reconfortante que explora as emoções sentidas quando os pais se separam.
(ed. Minutos de Leitura) |
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Um baile real, um príncipe que ainda não sabe o que quer, um patim deixado para trás e um sonho para cumprir. Conseguirá esta nova Cinderela mudar o rumo da história que alguém escreveu para si? Será ela capaz de transformar o mundo num lugar melhor? Uma aventura musical recheada de humor, energia, magia e força, e que conta com Carolina Deslandes, Irma e Maria Prata a partilharem o papel de Cinderela em sessões diferentes.
Até 8 de Janeiro, no CC Alegro, em Alfragide.
Bilhetes entre 13 e 59 euros |
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Sónia Morais Santos é autora do blogue “Cocó na Fralda“. Ex-jornalista, tem quatro filhos e dois cães, já passou por vários jornais e revistas em Portugal e publicou quatro livros [ver o perfil completo]. |
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